Os malefícios da utilização do cigarro eletrônico voltaram ao debate, após a morte de 11 pessoas em decorrência de doenças pulmonares relacionadas ao uso do aparelho nos Estados Unidos. Novo estudo realizado pela Universidade de Nova York, divulgado no início de outubro, aponta que os cigarros eletrônicos podem, da mesma maneira que o tabaco comum, causar câncer de pulmão. A pesquisa foi realizada inicialmente em ratos, mas os cientistas acreditam que os efeitos sejam semelhantes em humanos.

Durante 54 semanas, grupos de roedores foram expostos quatro horas por dia, cinco dias por semana, a três condições diferentes: um em uma câmara com vapor característico do e-cigarro; outro, com solventes; e o último, com ar filtrado. Nove dos 40 sujeitados ao vapor do cigarro eletrônico desenvolveram câncer de pulmão. Nos dois outros grupos, apenas um camundongo foi acometido com a doença.

Em outubro, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) solicitou a 252 hospitais de todo o Brasil, dentre instituições públicas e privadas, que informassem os casos relacionados ao uso de cigarros eletrônicos. O mapeamento busca prevenir uma crise de saúde. A comercialização do produto no País é proibida desde 2009. Contudo, a venda dos aparelhos é realizada em lojas físicas e on-line no Brasil.

De acordo com a Anvisa, o monitoramento envolve os cigarros eletrônicos, os vaporizadores e os cigarros de tabaco aquecido, dentre outros dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs). O Conselho Federal de Medicina (CFM) também é parceiro da ação, solicitando aos médicos que fiquem atentos e relatem casos suspeitos.

A Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp) alerta para os riscos do cigarro eletrônico. De acordo com o presidente da Socesp, José Francisco Kerr Saraiva, os dois cigarros, comum e eletrônico, contêm nicotina, substância altamente danosa ao organismo: os sistemas respiratório e cardiovascular são os principais lesados.

Estimulante da produção de dopamina e serotonina, hormônios ligados ao prazer e bem-estar, o elemento contrai os vasos sanguíneos, aumentando a pressão sanguínea e acelerando o coração, podendo ocasionar um infarto ou um Acidente Vascular Cerebral”, explica o cardiologista.

Uma pesquisa realizada pelo Centro de Prevenção e Controle de Doenças, nos Estados Unidos, em 2015, mostrou que o vapor gerado pelo aparelho também pode causar inflamações pulmonares. Substâncias como a acroleína, presente neste tipo de cigarro, são danosas às moléculas que mantêm as células endoteliais unidas.

De acordo com o pneumologista Álvaro Gradim, presidente da Associação dos Funcionários Públicos do Estado de São Paulo (AFPESP), ainda não existem estudos conclusivos sobre o chamado “vape” e, por isso, seu uso deve ser evitado ao máximo. “Não se sabe exatamente quais são os malefícios que o cigarro eletrônico provoca no organismo, mas é preciso estar alerta e prevenir o vício na população mais jovem, principalmente com essas primeiras evidências de que o aparelho pode gerar enormes complicações ao organismo”, explica o especialista.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 428 pessoas morrem por dia no Brasil por causa do tabagismo. Liberar cigarros eletrônicos ou de tabaco aquecidos não é uma saída para diminuir a dependência ao fumo. Ao contrário, já que a quantidade de nicotina nos vaporizadores é ainda maior”, alerta o diretor executivo da Fundação do Câncer, Luiz Augusto Maltoni Jr.

Para conquistar o consumidor jovem, os novos cigarros eletrônicos assumem um ar tecnológico, se assemelhando a pen-drives. Suas fórmulas, com aromas diferenciados funcionam como atrativos. “Até o dia de hoje, a comercialização, a importação e a propaganda dos cigarros eletrônicos permanecem proibidas no Brasil. Mas a indústria do tabaco faz pressão para isso mudar, alegando que estes similares funcionam como auxiliares àqueles que desejam parar de fumar e que são menos danosos.”, esclarece.

Falsa sensação de segurança é atrativa

O “e-cigarro” é composto, normalmente, por uma lâmpada de LED, bateria, microprocessador, sensor, atomizador e cartucho de nicotina líquida. Esta última é aquecida por uma pequena resistência, fazendo com que se torne vapor. Mesmo as opções vendidas como sendo menos prejudiciais, como os cigarros eletrônicos sem nicotina, não devem ser consumidas.

Existe uma falsa sensação de segurança conferida ao fumante, conforme documento elaborado pela Anvisa em 2017. Por isso, é muito importante restringir esse tipo de aparelho”, afirma Márcio Sousa, especializado em Tabagismo e cardiologista da Socesp.

Relatório da Convenção Quadro para o Controle do Tabaco, da Organização Mundial da Saúde (OMS), pede para que os 181 países participantes proíbam dispositivos eletrônicos para fumar. “Uma das estratégias da indústria para driblar as restrições e atrair jovens é colocar sabores no aparelho. É uma espécie de armadilha para fazer com que as pessoas se viciem em um produto muito lucrativo para um mercado ilegal”, ressalta Dr. Sousa.

Estima-se que 90% dos fumantes iniciaram a prática antes dos 19 anos e o “vape” pode ser um atrativo sedutor aos adolescentes, induzindo a um novo vício. Embora o Brasil tenha se tornado a segunda nação do mundo a adotar todas as recomendações da OMS para o combate ao tabagismo, a dependência do cigarro ainda mata cerca de 430 pessoas por dia, conforme dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca). Se o hábito de fumar fosse abolido, mais de 156 mil vidas seriam poupadas anualmente no País.

Em 2009, a Anvisa publicou a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 46/2009, que proibiu a comercialização, a importação e a propaganda de cigarros eletrônicos. Desde 2016, a agência atualiza e levanta novas informações sobre o tema, como a revisão técnica da publicação “Cigarros eletrônicos: o que sabemos?”, a inclusão do tema na Agenda Regulatória, em 2017, e a realização do Painel Técnico para discussão desses dispositivos, em 2018.

Cigarro faz mal ao organismo como um todo

O tabaco agride o endotélio, a parede de células que recobre os vasos sanguíneos, e interfere na produção de óxido nítrico, tornando as artérias mais suscetíveis à formação de placas arteroscletróticas. “O cigarro também acelera a oxidação do colesterol e, em associação à pílula anticoncepcional, pode aumentar o risco de Acidente Vascular Cerebral (AVC) em mulheres. Nenhuma quantidade de cigarro é segura. Apenas um já pode causar diversos malefícios à saúde”, destaca Dr. Sousa.

O cigarro eletrônico ou Vape, como também é conhecido, contém uma bateria e uma resistência que aquece o líquido em seu interior. O dispostivo possui substâncias alergênicas, explosivas, teratogênicas (responsáveis por malformações no desenvolvimento embrionário ou fetal) e cancerígenas. José Henrique de Oliveira, cirurgião-dentista e diretor do INPAO Dental – Instituto de Previdência e Assistência Odontológica, explica que esse líquido que fica dentro do DEF contém nicotina: a pessoa aspira da mesma forma como faz com o cigarro comum, mas é expelido vapor em vez de fumaça.

cigarro eletrônico possui concentração de nicotina diminuída e a pessoa que o utiliza fica exposta a uma quantidade menor de substâncias tóxicas. Porém, o produto não é inócuo e o usuário não está protegido de malefícios ou consequências”, alerta o especialista que avisa ainda que o dispositivo pode sim causar dependência assim como o cigarro comum.

Saúde bucal x cigarro eletrônico – Ir ao dentista periodicamente pode ser um bom início para evitar ou minimizar as doenças causadas pelo cigarro eletrônico, que são as mesmas do cigarro convencional. Manchas, perda dentária por comprometimento periodontal (suporte ósseo e gengival dos dentes), dificuldade de cicatrização de lesões bucais (aquecimento bucal) e até o câncer de boca. “A recomendação é não fumar, mas se a pessoa já criou o hábito ou vício, o melhor é ter consciência dos danos e fazer a prevenção e o acompanhamento com o seu dentista”, avisa Dr. José Henrique.

Riscos do cigarro eletrônico e outras formas de tabagismo

No dia 28 de outubro, das 8h30 às 15h, especialistas estarão reunidos, na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP, para o I Simpósio Internacional Sobre Formas Alternativas de Exposição ao Tabaco, organizado pela Sociedade Brasileira de Toxicologia — SBTox. O evento é aberto ao público e destinado aos profissionais das diversas áreas da saúde e afins, bem como estudantes de graduação e pós-graduação, interessados em explorar o tema.

Assuntos atuais e polêmicos, pertinentes ao uso de produtos derivados de tabaco, como cigarros eletrônicos, formas alternativas existentes e seus impactos na iniciação e cessação do tabagismo farão parte da programação. Na ocasião, será apresentada a análise de riscos associados às formas alternativas de uso de tabaco e os resultados do primeiro estudo brasileiro independente, com tabaco aquecido, que avaliou, de forma experimental, os efeitos sobre a artrite reumatoide.

As discussões do simpósio permearão as abordagens sociais, científicas e experiências clínicas internacionais. Entre os palestrantes estão Hayden McRobbie, da Queen Mary University of London, e Dr. Kamamaru Hiroya, vice-diretor da AOI Universal Hospital Japan, além de representantes do Instituto Nacional do Câncer (Inca), Fundação do Câncer e AMB.

Na Mesa-Redonda, com o tema “Como o uso das formas alternativas do uso do tabaco pode induzir o vício, como evitar a iniciação por jovens, e estabelecer uma regulamentação que não retroceda os avanços do Brasil na implementação da Convenção-Quadro?”, os especialistas, Dra. Tania Cavalcante (Inca e Conicq), Dr. João Paulo Lotufo (Associação Médica Brasileira – AMB) e Dr. Luiz Augusto Maltoni (Fundação do Câncer), discutirão os seguintes temas, respectivamente: “Avanços do Brasil com a implantação da Convenção”, “O que é vício. Como está o jovem em relação ao tabagismo” e “Políticas para redução de danos no tabagismo”.

As inscrições podem ser feitas no site da SBTox – www.sbtox.org/inscricoes – e a programação está disponível no link: www.sbtox.org/ciclo .
Com Assessorias
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