Imagine apresentar inchaços pelo corpo várias vezes ao mês e não saber a causa? Você vai ao pronto-socorro, os médicos examinam os sintomas, prescrevem um medicamento para tratar alergia e você é liberado. Alguns dias ou semanas depois tem início uma nova crise e a sua busca para resolver o problema recomeça. Essa é a jornada do paciente com angioedema hereditário (AEH), uma doença rara causada pela deficiência do inibidor de C1 esterase, glicoproteína que atua junto aos anticorpos nas ações inflamatórias do organismo.

De acordo com a OMS (Organização Mundial de Saúde), é considerada doença rara aquela que afeta até 65 pessoas em cada 100 mil indivíduos. Numa proporção muito menor, está o AEH, que além de apresentar incidência menor ou igual um caso para cada 50 mil pessoas, é crônica, debilitante e pode ameaçar a vida. Características que levam à denominação ultrarrara.

No mundo, estima-se que 1 em cada 50 mil pessoas convive com o angioedema hereditário, dificultando o conhecimento sobre a doença e seu diagnóstico. De origem genética, passando de pais para filhos, o AEH ocorre por uma deficiência do sistema imune, que causam inchaços pelo corpo e dores características da doença.

No dia dedicado à conscientização sobre o angioedema hereditário (16/05), é necessário chamar a atenção para a complexidade e a gravidade da doença, ainda desconhecida por muitas pessoas, contribuindo com a qualidade de vida dos pacientes que convivem com AEH.

Crises podem ser desfigurantes

As crises de AEH duram em média cinco dias, podem ser desfigurantes e ocorrer em qualquer parte do corpo, mas os locais mais comuns são: abdômen, face, garganta, genitais, mãos e pés. Podem também atingir órgãos internos, como a mucosa do intestino, causando dor intensa e aumento do volume abdominal, se tornando potencialmente fatal quando o inchaço acomete vias respiratórias, apresentando risco de asfixia e morte.

Esses inchaços, muito comuns nas alergias, costumam surgir nas extremidades, como pés e mãos, e também afetam os genitais, a face, a laringe e a região abdominal. De uma maneira geral, as crises duram de cinco a sete dias e, normalmente, ocorrem sem um motivo aparente. Estresse, mudança de temperatura, traumas, cirurgias, tratamento dentário e exercícios físicos podem ser fatores desencadeantes.
Muitas vezes é confundida com crises alérgicas comuns, com a diferença de que não apresentam melhora nem mesmo após utilização de antialérgicos, corticoides ou outros medicamentos do tipo.

Diagnóstico correto pode levar até 17 anos

Apesar de não ter cura, o angioedema hereditário tem controle e o paciente consegue levar uma vida normal. Porém, a demora do diagnóstico correto faz a maioria das pessoas sofrer durante vários anos sem o tratamento adequado. Em média, os pacientes consultam de quatro a cinco médicos antes de serem corretamente diagnosticados.

“Por se tratar de uma doença rara que tem os sintomas muito parecidos com o de uma alergia, os pacientes demoram, em média, de 14 a 17 anos até ter a definição de que o angioedema hereditário é a causa das crises”, esclarece a médica alergista e imunologista Anete S. Grumach, responsável pelo ambulatório de imunologia clínica da Faculdade de Medicina do Centro Universitário Saúde ABC.

O AEH frequentemente surge na primeira década de vida, e o subdiagnóstico é recorrente, refletindo em um atraso de aproximadamente 15  anos entre o início dos sintomas e diagnóstico efetivo, impactando o paciente ainda na infância.

Pelo fato de ser desconhecido da maioria dos profissionais de saúde, o AEH acaba sendo subdiagnosticado, o que faz com que os pacientes percorram um longo tempo em busca de tratamento, a partir do surgimento dos primeiros sinais. Por essa razão, a especialista alerta que é importante ficar atento aos sintomas desde cedo.

“O AEH é hereditário e pode começar a se manifestar já na infância, por isso os pediatras devem investigar o histórico familiar do paciente, pois em 80% dos casos outros parentes também têm a doença”, afirma.

Segundo Dra. Anete, um dos sinais para diferenciar o angiodema hereditário de uma alergia, é que o inchaço não vem acompanhado de placas vermelhas ou outras reações na pele.

A médica explica que a doença deve ser diagnosticada com base na história clínica do paciente e por meio de exames laboratoriais. “É imprescindível que o médico peça exames de sangue, como, por exemplo, a dosagem de C4 que é usado para fazer a triagem de algumas substâncias que apresentam deficiência e, assim, pode chegar ao AEH”.

Risco de edema de glote e morte por asfixia

Em quadros mais graves, as crises do angioedema hereditário podem levar a óbito por asfixia, pois os ataques na laringe obstruem as vias aéreas. Já as crises abdominais causam dores fortes, vômitos, náusea e diarreia.

“Mais ou menos um terço dos pacientes desenvolvem o que chamamos de edema de glote. O que significa que eles podem ter dificuldade na respiração e sofrerem asfixia. É uma doença que pode trazer bastante comprometimento”, destaca a Dra. Anete.  Além disso, o AEH prejudica a vida social do paciente, muitas vezes afastando-o da sua rotina escolar e do seu emprego.

Segundo a especialista, os tratamentos para a doença evoluíram consideravelmente e são utilizados, principalmente, na prevenção das crises. No entanto, sem o diagnóstico correto, o paciente continuará sua busca para solucionar o problema. “O principal desafio, sem dúvida, é a identificação do AEH. Só com o diagnóstico preciso da doença o paciente, enfim, conseguirá levar uma vida normal”, conclui a médica.

Subdiagnóstico leva ao presenteísmo

Um estudo brasileiro aponta que 66% dos pacientes com diagnóstico de angioedema hereditário apresentam crises laríngeas em algum período da vida. Por todas essas características, os desafios desses pacientes são inúmeros.

A maioria deixa de realizar diversas atividades por medo das crises. Se o paciente for uma criança, ele tem comprometimento no rendimento escolar, se for adulto, no trabalho. Existem casos de pacientes que são demitidos por causa das crises ou por faltarem muito no trabalho.

“Existe ainda, o quadro chamado ‘presenteísmo’, que é quando a pessoa está presente no emprego, mas não consegue ter um bom rendimento porque tem medo de ter uma crise. Isso tudo gera um impacto psicológico e psíquico que por si só gera estresse, fator desencadeante de crise. Então, o paciente vive num ciclo vicioso”, detalha Régis de Albuquerque Campos, especialista em Alergia e Imunologia Clínica pela Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai).

Com Assessorias

 

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