O uso não medicinal de medicamentos sob prescrição está se tornando uma enorme ameaça para a saúde pública e o cumprimento da lei. Os opioides são responsáveis pelos maiores danos, contabilizando 76% de mortes envolvendo distúrbios relacionados ao uso de drogas. A conclusão é do Relatório Mundial sobre Drogas, lançado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc) nesta terça-feira (26), Dia Internacional de Combate às Drogas – ou Dia Internacional contra o Abuso e Tráfico Ilícito de Drogas.
De acordo com o relatório, o fentanil e seus análogos ainda constituem um problema na América do Norte, enquanto o tramadol – um opioide utilizado para tratar dores moderadas e graves – tem se tornado uma preocupação crescente em partes da África e da Ásia. O acesso ao fentanil e ao tramadol para usos medicinais é vital para o tratamento da dor crônica, mas traficantes os produzem ilicitamente, promovendo-os em mercados ilegais e causando danos consideráveis à saúde.
A apreensão global de opioides farmacêuticos em 2016 foi de 87 toneladas, aproximadamente a mesma quantidade de heroína apreendida naquele ano. Desse total, 87% foram de tramadol na África Central, Oriental e do Norte. Países da Ásia, que contabilizaram no passado mais da metade das apreensões globais, representaram apenas 7% do total global em 2016.
Cocaína manufaturada na Colômbia
A manufatura global de cocaína alcançou, em 2016, seu nível mais alto de toda a história, com uma estimativa de produção de 1.410 toneladas. A maior parte da cocaína mundial vem da Colômbia, mas o relatório também mostra que a África e a Ásia estão emergindo como centros de tráfico e consumo da droga.
De 2016 a 2017, a produção global de ópio aumentou 65%, atingindo 10.500 toneladas, a mais alta estimativa já registrada pelo UNODC desde que começou a monitorar a produção de ópio global, no início do século 21. A expansão acentuada do cultivo de papoula de ópio e o aumento gradual de rendimentos no Afeganistão resultaram em uma produção de ópio nesse país que atingiu 9.000 toneladas.
“As descobertas do Relatório Mundial sobre Drogas deste ano mostram uma expansão dos mercados de drogas ilícitas, com a produção de cocaína e de ópio atingindo recordes altíssimos, o que apresenta vários desafios em diversas frentes”, afirmou o diretor-executivo do UNODC, Yury Fedotov.
Ele destacou ainda que “o UNODC está comprometido em trabalhar com os países-membros com vistas a buscar soluções equilibradas e balanceadas para os desafios atuais de drogas, para avançar no atingimento das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)”.
“O Relatório Mundial sobre Drogas representa um pilar fundamental que, juntamente com a assistência para traduzir obrigações internacionais em ações e capacitações no país, permitirão respostas eficazes e a proteção da saúde e do bem-estar mundial”, disse Fedotov.
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Maconha foi a droga mais consumida em 2016
A cannabis foi a droga mais amplamente consumida em 2016, com 192 milhões de pessoas tendo-a utilizado ao menos uma vez ao longo do último ano. O número global de usuários de cannabis continua a aumentar e aparenta ter expandido em aproximadamente 16% na ultima década até 2016, refletindo assim um aumento similar na população global.
Drogas como a heroína e a cocaína, que tem estado disponíveis por um período significativo, coexistem de modo crescente com novas substancias psicoativas (NSP) e medicamentos sob prescrição. Houve aumento no fluxo de preparações farmacêuticas de origens pouco claras destinadas ao uso não medicinal, juntamente com o poli uso de drogas e o poli tráfico de drogas “poly drugs”, adicionando níveis sem precedentes de complexidade no tema das drogas, disse o UNODC.
Jovens e adolescentes são os mais vulneráveis
O número de pessoas em todo o mundo que usou drogas ao menos uma vez por ano permaneceu estável em 2016, com cerca de 275 milhões de pessoas, ou cerca de 5,6% da população global entre 15 e 64 anos.
Olhando para as vulnerabilidades de vários grupos etários, o relatório concluiu que o uso de drogas e os danos associados a ele são os mais elevados entre os jovens em comparação aos mais velhos. A maioria das pesquisas sugere que a adolescência precoce (12-14 anos) e a tardia (15-17 anos) é um período de risco crítico para o início do uso de substâncias e pode atingir o pico entre os jovens (com idade entre 18 e 25 anos).
A cannabis é uma droga de escolha comum pelos jovens; no entanto, o uso de drogas entre os jovens difere de país para país e depende das circunstâncias sociais e econômicas dos envolvidos. Há duas tipologias extremas de uso de drogas entre os jovens: drogas de casas noturnas e drogas recreativas entre jovens afluentes; e o uso de inalantes entre crianças de rua para lidar com suas circunstâncias adversas.
O uso de drogas entre a geração mais velha (com 40 anos ou mais) tem aumentado a um ritmo mais rápido do que entre os mais jovens. Embora haja apenas dados limitados disponíveis, o relatório afirmou que isso requer atenção. As pessoas que passaram pela adolescência em um momento em que as drogas eram populares e amplamente disponíveis têm mais probabilidade de usar drogas e, possivelmente, de continuar usando.
Os usuários mais velhos de drogas podem frequentemente ter múltiplos problemas de saúde física e mental, tornando o tratamento medicamentoso eficaz mais desafiador, mas pouca atenção tem sido dada aos transtornos por uso de drogas entre os idosos.
60% mais mortes por uso de drogas em 15 anos
Em todo o mundo, as mortes causadas diretamente pelo uso de drogas aumentaram em 60%, entre 2000 e 2015. Pessoas com mais de 50 anos representaram 27% dessas mortes em 2000, mas esse percentual aumentou para 39% em 2015. Cerca de três quartos de óbitos por transtornos relacionados ao uso de drogas entre aqueles com 50 anos ou mais estão entre as pessoas que usam opioides.
A maioria das pessoas que usam drogas são homens, mas as mulheres têm padrões específicos de uso, segundo o relatório. A prevalência do uso não médico de opioides e tranquilizantes pelas mulheres permanece em um nível comparável, se não superior, ao dos homens. Embora as mulheres possam tipicamente começar a usar substâncias mais tarde que os homens, uma vez que iniciam o uso, tendem a aumentar a taxa de consumo de álcool, cannabis, cocaína e opioides mais rapidamente que os homens, bem como desenvolver rapidamente desordens decorrentes do uso de drogas.
Mulheres com transtornos por uso de substâncias são relatadas como tendo altas taxas de transtorno de estresse pós-traumático e também podem ter experimentado adversidades na infância, tais como negligência física, abuso ou abuso sexual. As mulheres continuam a representar apenas uma em cada cinco pessoas em tratamento. A proporção de mulheres em tratamento tende a ser maior para tranquilizantes e sedativos do que para outras substâncias. O tratamento do uso de drogas e a prevenção, tratamento e atenção ao HIV devem ser adaptados às necessidades específicas das mulheres.
O Relatório Mundial sobre Drogas de 2018 oferece uma visão global sobre a oferta e a demanda de opiáceos, cocaína, cannabis, estimulantes do tipo anfetamina e novas substâncias psicoativas (NSP), bem como sobre seu impacto na saúde. Ele destaca os diferentes padrões de uso das drogas e vulnerabilidades de determinados grupos por idade e gênero, bem como a mudança ocorrida no mercado mundial de drogas.
Torcida sem Ressaca e outras ações de prevenção
Para o psiquiatra Jorge Jaber, membro da Associação Brasileira de Psiquiatria e especializado em dependência química em Harvard, é preciso atuar mais fortemente em prevenção. Durante a Copa do Mundo, a prevenção é na Torcida Sem Ressaca, junto a seus mais de 100 pacientes internados e atendidos em sistema de hospital-dia na clínica em Vargem Pequena (veja o vídeo).
Jaber promove atividades preventivas gratuitas e regularmente para conscientizar quanto à depressão, uso de drogas e suicídio (campanha Setembro Amarelo). Há 16 anos, também coloca na rua o bloco Alegria Sem Ressaca, na orla de Copacabana, com padrinhos como Zico, Teresa Cristina, Eduardo Dussek, José Aldo, Luiza Tomé e Ellen de Lima.
Fonte: ONU e Clínica Jorge Jaber, com Redação