‘A Melhor Mãe do Mundo’, novo filme de Anna Muylaert estrelado por Shirley Cruz, chega aos cinemas em agosto deste ano trazendo à tona a força da maternidade para as telonas. O filme acompanha uma catadora de materiais recicláveis em uma emocionante jornada pela cidade de São Paulo.
No centro da história está Gal (Shirley Cruz), que luta para escapar da violência doméstica imposta por seu marido, Leandro (Seu Jorge). Gal coloca seus dois filhos pequenos no carrinho de reciclagem que usa para coletar lixo nas ruas da cidade e foge. Sozinha e enfrentando os perigos da falta de moradia, ela os convence de que estão em uma aventura.
Tudo começa quando Gal decide prestar queixa em uma delegacia da mulher após sofrer abusos do marido, mas não encontra lá a proteção e ajuda que procura. Determinada a dar uma nova vida e um lar seguro para seus dois filhos, ela decide abandonar a sua casa, levando as crianças na sua carroça.
Com uma força impressionante e um amor incondicional, ela parte com seus filhos, Rihanna (Rihanna Barbosa) e Benin (Benin Ayo), em uma jornada cheia de obstáculos e perigos pelas ruas de São Paulo. O que poderia ser uma fuga desesperada se transforma, ao longo da trama, em uma verdadeira aventura, onde a coragem e o desejo de proteger a inocência das crianças são os motores de sua resistência.
A história de Gal é um reflexo de uma realidade que, infelizmente, ainda é muito presente no Brasil e no mundo: a luta pela sobrevivência em um cenário de extrema vulnerabilidade social, onde as mulheres, muitas vezes, precisam tomar decisões difíceis para proteger os filhos.
A obra se desenrola de forma comovente, explorando os sacrifícios físicos e emocionais que uma mãe enfrenta para garantir o bem-estar de seus filhos, tudo isso sem perder de vista o amor imenso que nutre por eles.
A maternidade como força primitiva e heroica
A MELHOR MÃE DO MUNDO não é apenas um filme sobre a maternidade, mas um retrato vívido e sensível das dificuldades das mulheres em se ajustar às dificuldades que lhes são impostas, trazendo à tona a maternidade como força primitiva e heroica, capaz de ultrapassar limites em nome do bem-estar dos filhos. Para a atriz Shirley Cruz, sua personagem será eternizada como uma mãe emblemática.
Para mim, a coisa mais bonita de ser uma mãe de Anna Muylaert é ser eternizada como tal. Não morro mais, todas as vezes que derem o play lá eu estarei como atriz, mulher e mãe.”, relata ela, “Mãe que sou, que amor ser uma mãe preta e apaixonada como a Gal, e a força é o meu maior elo com essa personagem”
Com este filme, Anna Muylaert reforça seu compromisso com a representação da maternidade no cinema, mostrando suas diversas formas e desafios, sempre em sintonia com a realidade das mulheres e suas lutas cotidianas.
Considero a maternidade uma das grandes forças da natureza humana, responsável não apenas pela gestação, mas muitas vezes pela manutenção e defesa da vida. E entre as mães, existem aquelas que não apenas cuidam dos filhos mas também tem coragem de lutar para que eles não herdem o ‘legado de nossa miséria’. A protagonista de ‘A Melhor Mãe do Mundo’ é uma dessas mães”, diz a diretora.
A realidade das mães que catam lixo para sobreviver
‘A Melhor Mãe do Mundo’ é uma potente homenagem às mães trabalhadoras, especialmente àquelas que, como Gal, resistem diariamente em condições adversas. A escolha de retratar a realidade dos catadores de lixo no filme vai além de um simples gesto de reconhecimento. O longa-metragem coloca no centro da narrativa aquelas mulheres que, historicamente, nunca tiveram visibilidade – as que transformam o lixo em sustento e a exclusão em força.
Dados do Cempre (Compromisso Empresarial para Reciclagem) revelam que mais de 90% do material reciclado no Brasil passa pelas mãos destas trabalhadoras. O filme se configura, assim, como um ato político, ao dar protagonismo a essas heroínas silenciosas da economia circular, um lembrete poderoso da bravura cotidiana que raramente é reconhecida — mas que merece ser celebrada todos os dias.
A coleta seletiva no Brasil, que movimenta toneladas de resíduos todos os dias, é sustentada por um exército de trabalhadores invisíveis, em sua maioria mulheres. Essas mulheres, que muitas vezes atuam de forma informal, têm uma jornada extenuante de coleta, triagem e separação de materiais recicláveis, desempenhando uma função crucial para o meio ambiente ao evitar o acúmulo de lixo e contribuir para a indústria da reciclagem.
Além disso, elas enfrentam uma dupla carga: a responsabilidade pelo sustento da família e o cuidado com os filhos, frequentemente em condições de precariedade. Mesmo assim, essas mulheres criam redes de apoio entre si e continuam a lutar por reconhecimento e melhores condições de vida, tornando-se protagonistas de uma das atividades mais importantes para a sustentabilidade urbana.
Para criar a história de Gal, a diretora Anna Muylaert conviveu com mulheres catadoras de lixo e conheceu as suas histórias “Fui para a Cooperativa do Glicério, um dos lugares mais marcantes que já fui nessa vida. A gente vê o avesso do consumismo capitalista, com latas de Coca Cola e caixas da Apple misturadas em centenas de sacos pretos de plásticos. Um cheiro forte, especialmente em dias de sol”, relembra a diretora.
Daí comecei a puxar conversa com as recicladoras, comecei a conversar, saber mais sobre aquele trabalho, quanto tiravam por mês e outros detalhes. Fui criando uma relação com elas e escrevi a história a partir da minha imaginação, mas já com a materialidade dessas mulheres na cabeça.”
Assim como em “Que Horas Ela Volta?”, onde abordou a desigualdade a partir da perspectiva de uma empregada doméstica, Muylaert volta seu olhar para as trabalhadoras invisibilizadas que mantém as engrenagens sociais funcionando.
Em A MELHOR MÃE DO MUNDO, a carroça de Gal — carregada de sonhos, medo e coragem — é também símbolo de todos os trabalhadores que, apesar das duras condições, seguem em frente para garantir um futuro melhor para suas famílias.
Um olhar sensível para a maternidade
Cineasta premiada e renomada no Brasil e no exterior, Anna Muylaert é reconhecida por desenvolver personagens complexos com um olhar sensível e intimista. Ao longo de sua carreira, tem abordado a maternidade sob diversas perspectivas, sempre levantando questões pertinentes.
Em “Que Horas Ela Volta?” (2015), a maternidade é refletida nas tensões de classe, com a protagonista Val (Regina Casé) sendo uma empregada doméstica que, enquanto mãe, se vê aprisionada pelas limitações sociais, desejando um futuro melhor para sua filha.
Em “Durval Discos” (2002), a maternidade se manifesta com a relação simbiótica entre Durval e sua mãe, Dona Eulália, sendo marcada pela solidão e dependência emocional, refletindo como a maternidade também pode trazer um peso existencial.
Com distribuição da +Galeria, coprodução da +Galeria e do grupo Telefilms, e produção da Biônica Filmes, o filme tem conquistado o público e a crítica em importantes festivais e desponta como um dos favoritos a representar o Brasil no Oscar.
O drama, que teve sua estreia mundial na 75ª edição do Festival de Berlim, conquistou prêmios em festivais franceses como La Fiesta Del Cine e CinéLatino Toulouse. A obra será exibida nacionalmente como filme de abertura do CINE PE, no dia 9 de junho em Recife, e estreia nos cinemas brasileiros em agosto.
A MELHOR MÃE DO MUNDO tem roteiro de Anna Muylaert, em colaboração com Grace Passô e Mariana Jaspe. A produção é de Ricardo Costianovsky, Tomás Darcyl, do grupo Telefilms, Clara Ramos, da Galeria Distribuidora, Bianca Villar, Fernando Fraiha e Karen Castanho, da Biônica, e Gabriel Gurman. O filme tem produção executiva de Leonardo Mecchi e Deborah Nikaido. A direção de arte é de Maíra Mesquita e a direção de fotografia de Lílis Soares.