A talassemia é um tipo de anemia hereditária, transmitida de pais para filhos, e que faz parte de um grupo de doenças do sangue chamadas hemoglobinopatias (doença da hemoglobina). Pessoas com talassemia enfrentam uma série de dificuldades no Rio de Janeiro, desde a falta de bolsas de sangue para as transfusões até o baixo conhecimento sobre a doença por grande parte dos profissionais da Saúde no estado.
“Olham os exames de pacientes de talassemia e analisam como se fossem indicadores de anemia falciforme. Os profissionais nos tratam bem, mas não têm olhar específico para talassemia”, comentou Wendell, estudante, de 24 anos, diagnosticado com a doença aos dois anos.
O alerta ocorreu durante evento realizado esta semana no Rio de Janeiro pela Associação Brasileira de Talassemia (Abrasta). O terceiro encontro do ‘Projeto Ver, Ouvir e Transformar: atenção às vidas com talassemia’ contou com a participação de pacientes e familiares. Nesse encontro, os participantes falaram sobre as dificuldades de acesso ao tratamento adequado e completo.
Uma queixa importante são as dificuldades de acesso a exames essenciais, como o ecocardiograma e a ressonância magnética com a técnica T2*, procedimentos essenciais para monitorar o quadro clínico e orientar ao melhor tratamento possível.
Eduardo Fróes, presidente da Abrasta, atual conselheiro nacional de Saúde e paciente de talassemia maior, enfatizou a importância de garantir não só o acesso à realização anual desses exames, mas também assegurar que os laudos sejam emitidos com a qualidade necessária
Entre outros problemas apontados estão centros de tratamento distante das residências, dificuldades de encaminhamento às especialidades multidisciplinares, tratamento inadequado causado por problemas estruturais.
“As negligências vivenciadas no estado e o tratamento inadequado já acarretaram a perda de vidas de pacientes, o que é inaceitável. Não podemos permitir que essa situação continue ocorrendo. Mesmo sendo uma doença rara, as pessoas com talassemia merecem um cuidado digno e eficiente”, disse Talita Garrido, responsável pelo departamento de Políticas Públicas e advocacy da Abrasta.
Realizado entre 1 e 3 de agosto, o evento trouxe a equipe da Abrasta ao Rio de Janeiro para identificar os gargalos no acesso ao tratamento da talassemia, bem como os desafios que os pacientes encontram na sua jornada de cuidado. O objetivo é mapear os principais pontos e levá-los aos gestores e tomadores de decisão para identificar melhorias.
“Escolhemos trazer o encontro para o Rio de Janeiro pois entendemos ser essencial fazer uma avaliação in loco nos centros de tratamentos, bem como, escutar das pessoas com talassemia e seus familiares, profissionais da saúde e gestores quais são as principais ineficiências e demandar, como sociedade civil organizada, a melhora do cenário de atenção”, disse Fróes.
Promessas de melhorias no atendimento
A equipe da Abrasta realizou reuniões estratégicas com representantes de instâncias públicas responsáveis pela atenção às pessoas com talassemia. Nessas agendas, também estavam presentes Joice Aragão, coordenadora nacional de Sangue e Hemoderivados do Ministério da Saúde e membros da Secretaria Estadual de Saúde, Fundação Saúde e do Hemorio.
Para melhorar a jornada de cuidado da pessoa com talassemia, o diretor geral do Hemorio, Luiz Amorim, se comprometeu a aumentar o quantitativo de fenotipagem, bem como fomentar a busca ativa por doadores de sangue.
Já a diretora técnica da Fundação Saúde, Carla Boquimpani, e a subsecretária estadual de Atenção à Saúde, Fernanda Fialho, propuseram criar um fluxo de agendamento e regulação dos exames fundamentais, centralizando o encaminhamento do ecocardiograma, garantindo o acesso à ressonância e criando um protocolo específico para doenças raras.
Ainda em relação aos projetos para melhoria, Joice Aragão compartilhou, durante o encontro com os pacientes, que a Coordenação Nacional do Sangue está com algumas ações em andamento, como a instituição da Câmara Técnica de Talassemia e a atualização do Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) de Sobrecarga de Ferro.
Atual conselheira nacional e líder do Projeto Ver, Ouvir e Transformar: atenção às vidas com talassemia’, Talita Garrido se comprometeu – como membro atuante no controle social do SUS – em acompanhar e monitorar os protocolos, reivindicando a efetivação dos princípios dos SUS de universalidade, equidade e integralidade.
“Esperamos que os encaminhamentos sejam efetivamente implementados, de modo a melhorar a qualidade do tratamento. Observamos o comprometimento de muitos profissionais, gestores, técnicos de assistência e enfermagem, mas melhorias são urgentes, pois cada vida importa e o tempo é precioso”, ressaltou.
Por meio do Ver, Ouvir e Transformar, representantes da Abrasta visitam os hemocentros de diversas cidades do país, com o objetivo de disseminar informações sobre talassemia, mapear as condições gerais da atenção à saúde desses locais e elaborar relatórios que sirvam como substrato argumentativa para as reivindicações junto às secretarias de Saúde municipais e estaduais, direção dos hemocentros e Ministério da Saúde.
Fundada em 1982 por um grupo de pais de pessoas com talassemia, a Abrasta é uma entidade beneficente, sem fins lucrativos, formada por especialistas nacionais e internacionais. Nossa missão é oferecer ajuda e mobilizar parceiros para que todas as pessoas com talassemia no Brasil tenham acesso ao melhor tratamento.
Entenda a talassemia
Nosso sangue é formado por milhões de glóbulos vermelhos. As hemácias são arredondadas, achatadas e elásticas, e carregam dentro delas a hemoglobina que leva oxigênio para todo o corpo, possibilitando que todos os órgãos funcionem normalmente.
Cada hemácia possui milhões de moléculas de hemoglobina. Cada hemoglobina normal é formada por dois tipos de proteínas (ou globinas) – alfa e beta – unidas por um átomo de ferro.
A talassemia acontece quando há um defeito na produção dessas globinas. As células humanas têm 23 pares de cromossomos cada, totalizando 46 cromossomos. Os cromossomos têm as informações genéticas para produzir cada parte do nosso corpo. No cromossomo 11 temos a informação genética para produzir a globina beta e no cromossomo 16 para a globina alfa.
Talassemia alfa e Talassemia Beta
A talassemia é um defeito da hemoglobina em seres humanos, que pode acontecer de duas formas: pessoas com a talassemia beta tem mutação (alteração) no cromossomo 11 e com a talassemia alfa tem a mutação no cromossomo 16.
Assim, a hemoglobina não é produzida adequadamente. O problema no cromossomo 16 se manifesta pela falta de produção de cadeias (globinas) alfa e no cromossomo 11 pela falta de produção de cadeias (globinas) beta.
A talassemia beta, dependendo do número de genes comprometidos, pode se manifestar de três formas: talassemia maior, talassemia intermediária ou talassemia menor.
A talassemia alfa, dependendo do número de genes comprometidos, pode se manifestar de quatro formas: portador silencioso, traço alfa talassemia, doença da hemoglobina H e hidropsia fetal.
Talassemia tem cura? Quem tem talassemia pode doar sangue? Talassemia pode virar leucemia? Como combinar talassemia e alimentação, talassemia e gravidez? Quais são exames para talassemia? Essas e outras dúvidas podem ser tiradas no site da Abrasta.