Por Mario José Mello Martins*

Neste século e no século passado, nunca o Brasil e o mundo se mobilizaram nessa proporção em combate a uma pandemia global, como acontece em relação ao coronavírus. Se a preocupação em resguardar a saúde física e a vida é o foco de todas as ações, agora é a vez de saúde mental entrar em pauta. A crise causada pela doença impôs à sociedade um novo estilo de vida, ao qual ela não está habituada.

O isolamento e o distanciamento social, que vêm sendo chamados de quarentena, têm causado alterações psicológicas em boa parte dela, que se vê obrigada a trabalhar em casa, a manter distância de pessoas próximas e queridas e a abrir mão de um bem valioso: a liberdade de ir e vir.

Nenhuma outra crise mundial de saúde pública provocou tanto pânico na população em geral. O medo do que é desconhecido, invisível e daquilo que vai acontecer pode ser paralisante. Não sem razão. O Covid-19 tem uma capacidade assustadora de se multiplicar entre as pessoas, e, para complicar, ainda não tem cura. Em algumas delas, mais jovens e saudáveis, os sintomas podem não passar de febre amena, coriza e dores no corpo, embora não haja garantias.

Mas a população acima de 60 anos é mais vulnerável ao vírus, que pode acarretar complicações respiratórias, uma espécie de pneumonia severa, e levar à morte. Por incrível que pareça, nessa conjuntura, soa menos duro lidar com doenças graves e raras, já embasadas e para as quais há tratamento medicamentoso, do que com o coronavírus.

Vivemos uma era tecnológica, em que o homem dispõe de cada vez mais possibilidades na palma das mãos. Chegamos a testar carros voadores e, paradoxalmente, nos vemos retomando a atenção para atos simples, como… Lavar as mãos.

É impossível que essa situação não mexa com a vida de todos. Como agir, como se comportar daqui para a frente, como olhar o mundo de uma forma sensata nessa que pode vir a ser uma nova ordem mundial? Ficará um aprendizado, quando tudo se normalizar.

Posso ou não sair agora para a rua? Serei contaminado durante a compra no supermercado? Toquei a maçaneta da porta e levei a mão ao rosto – peguei o coronavírus? Não consigo me concentrar ou render trabalhando em home office – e a minha empresa vai perceber. Em uma semana confinado em casa, a ansiedade está me matando. Fico o tempo todo da sala para a cozinha e da cozinha para a sala, estou comendo demais! Há uma solução?

São inúmeras as questões sobre a (nova) vida cotidiana e aos efeitos que vem causando na saúde mental da sociedade. A seguir, compartilho algumas dicas que podem ajudar a passar pelos dias turbulentos com mais serenidade.

1. Todos contra o pânico

Trabalhando em casa ou apenas em retiro doméstico, a sensação de desespero frente ao Covid-19 tem sido comum. Porém, existem meios de combater essa sensação. Em primeiro lugar, manter-se informado é essencial, mas deve-se evitar o contexto atual de informações discordantes e excessivas. Uma sugestão é parar de acompanhar os números de infectados, sob suspeita e mortos – um terrorismo contra si próprio e com quem nos relacionamos pessoal ou virtualmente.

Há, portanto, o momento de se desligar do mundo exterior. Pesquisar a fonte das notícias para checar sua confiabilidade é essencial, como é imprescindível ignorar as fake news, bloqueando a sua disseminação. O bem-estar deve ser valorizado como nunca, estipulando-se horários do dia para fazer atividades que trazem prazer, como cozinhar, ler e assistir a filmes leves, belos e inspiradores. Respirar corretamente e meditar também podem ser um ótimo remédio. A vida pessoal não pode, de jeito algum, ser deixada de lado.

2. Ansiedade tem limite

Sensação de impotência perante a crise e de não cumprimento dos deveres, medo de perder o emprego. Para aqueles que estão em home office, sugiro criar uma rotina semelhante à do escritório, inclusive nos horários: início, pausa principal para a refeição, pausa secundária, fim do expediente. Usar a mesma roupa do trabalho em casa chega a ser exagero, mas vestir pijama o dia inteiro é ainda mais prejudicial. Escolher um local arejado, iluminado e distante da movimentação familiar para trabalhar favorece, e muito, a disciplina e o consequente rendimento. São atitudes que ocupam a mente e trazem a sensação de produtividade, de vida que segue.

Atividade física sempre foi e continua sendo essencial para a saúde do corpo e da mente. A atitude “não vou fazer mais nada” deve, portanto, ser combatida. A ideia é se movimentar. Alongamento, caminhada, exercícios abdominais e com pesos leves – ou só com o peso do corpo -, antes ou depois do trabalho, em um ambiente ventilado e claro da casa, só vão fazer lhe fazer bem.

3. Cuidados com a alimentação

Temos ouvido comentários de pessoas se queixando de sobrepeso nesses dias de confinamento doméstico. Embora não seja possível afirmar que trabalhar ou ficar mais tempo em casa engorda, valem algumas precauções. Assim como na questão laboral, os esforços para manter a rotina quanto à alimentação no lar são cruciais.

Ou seja, alimente-se da mesma maneira que fazia antes do Covid-19, rigorosamente. O almoço ideal era uma carne e uma salada? Mantenha o cardápio. Permitia-se degustar sobremesas só aos fins de semana? Por que então assar bolos e fazer doces durante a quarentena, e no meio da semana? O mesmo serve para o consumo excessivo do álcool, outro vilão contra a saúde e o bem-estar pessoal.

4. Antídoto contra a solidão

O ser humano é, por natureza, relacional – com pessoas e animais. Ver-se apartado da vida social e cultural pode ser traumático para algumas pessoas. A primeira queixa: a solidão. Para aqueles que estão em casa acompanhados da família, tudo fica mais fácil, ainda que com certo distanciamento. Há companhia. E para os solteiros? Como o contato físico foi fortemente restringido, é hora de lançar mão das armas que a tecnologia nos oferece.

Mesmo à distância, é possível manter a proximidade de amigos e familiares, fazendo uso de conversas salutares no WhatsApp, por meio de vídeo chats etc. Distração é fundamental. Os que possuem bichos de estimação, como cachorro e gato, conseguem desviar um pouco o foco dos problemas ao dedicar atenção a eles, seres dependentes. De uma forma ou de outra, é preciso se relacionar e “conviver” para que a sanidade mental não seja afetada.

Se, mesmo tomando esses cuidados, o sentimento for de mal estar, pânico, paralisia e total falta de rendimento, é hora de buscar ajuda médica.

* Médico do trabalho e gerente de Gente e Cultura da GOL Linhas Aéreas

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