O custo dos planos de saúde no Brasil disparou nos últimos 18 anos, acumulando uma alta de 327% entre 2006 e 2024 — quase o dobro da inflação oficial do período, de 170%, medida pelo IPCA. Os dados foram revelados em estudo do Instituto de Estudos de Políticas de Saúde (Ieps), divulgado pelo jornal O Globo neste domingo (29).
O levantamento, elaborado a partir de estatísticas do IBGE, indica que os planos de saúde se tornaram o item que mais pressiona os gastos com saúde e cuidados pessoais na cesta de consumo dos brasileiros.
O objetivo era olhar o quanto está saindo do bolso e sendo pago por famílias e empresas ao longo do tempo comparado a outros itens da cesta de consumo”, explicou Vinicius Peçanha, economista e um dos autores do estudo.
A pesquisa mostra que o aumento dos preços dos convênios supera com folga o de outros setores essenciais: alimentos e bebidas subiram 276% no mesmo intervalo; educação, 203%; habitação, 176%. Já serviços médicos e dentários acumularam 233% de alta, enquanto os laboratoriais e hospitalares ficaram em 179%.
Regulação desigual
Enquanto os planos individuais têm reajuste limitado pela ANS — com teto de 6,06% para 2025 —, os coletivos, que atendem a maioria dos beneficiários, não seguem essa limitação. Essa brecha tem levado muitos consumidores a migrar para contratos coletivos por adesão, mais vulneráveis a aumentos abusivos.
Em nota, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) afirmou que os custos em saúde crescem, em todo o mundo, a taxas superiores à inflação média da economia, e que análises sobre comprometimento da renda devem considerar outros fatores, como a variação da renda do trabalho e a troca de planos.
O estudo do Ieps alerta, no entanto, que, mantida a tendência, o acesso à saúde privada pode se tornar inviável para milhões de brasileiros, aprofundando desigualdades e ampliando a demanda sobre um Sistema Único de Saúde já sobrecarregado.
Custo elevado e acesso comprometido
Hoje, cerca de 72% dos 52,3 milhões de usuários de planos de saúde no Brasil estão vinculados a contratos coletivos empresariais. Para Peçanha, além da incorporação de novas tecnologias e mudanças demográficas — como o envelhecimento da população —, há fatores estruturais que explicam a escalada dos custos, incluindo ineficiências regulatórias e a própria lógica dos reajustes autorizados por órgãos reguladores.
O Brasil tem gasto privado per capita de saúde muito mais alto do que a renda per capita, e muito disso vem do plano de saúde. O aumento acelerado dos preços pode tornar o mercado proibitivo para parte da população e pressionar mais o SUS”, alertou.
O advogado Marcos Patullo, especializado na área, aponta que esse cenário se repete com frequência entre aposentados. “Temos clientes em que o benefício do INSS vai quase inteiro para o plano, e os familiares precisam ajudar a fechar o orçamento”, relatou.
Empresas também sentem o impacto
Segundo Marcelo Borges, diretor executivo da consultoria Mercer Marsh, que assessora cerca de 5 milhões de usuários de planos coletivos empresariais, o impacto nos custos corporativos é direto. “O plano já representou 7% da folha de pagamento. Hoje é o segundo maior custo, chegando a 15,79% em 2024”, disse.
A conta, afirma ele, é composta por dois fatores: o perfil de uso dos usuários e a chamada inflação médica — que reflete aumentos em insumos, equipamentos e frequência de utilização. “Empresas que não investem em prevenção e gestão da saúde ocupacional acabam pagando mais”, afirmou.
Judicialização e incorporação de terapias pressionam preços
Bruno Sobral, diretor executivo da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), reconhece que o problema é global, mas ressalta: “A tecnologia em saúde não substitui a anterior, ela se agrega. Isso tem um custo”. Ele também aponta a judicialização da saúde como um fator que dificulta o planejamento financeiro das operadoras.
Marcos Novais, superintendente executivo da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), lembrou que os tratamentos atuais são muito mais caros do que há duas décadas. “Em 2006, um exame de ressonância custava R$ 1 mil. Hoje, há medicamentos que custam R$ 20 mil por caixa”, exemplificou.
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