A Hipertensão Pulmonar (HP) não tem cura, mas os medicamentos ajudam a aumentar a sobrevida e são de extrema importância para o tratamento. Eles ajudam a controlar os sintomas que interferem diretamente na qualidade de vida dos pacientes, como falta de ar, fadiga, tontura e episódios de desmaio.
No entanto, pacientes de todo o país vêm sofrendo com a falta de medicamentos para tratar a doença. O Ministério da Saúde não fornece a sildenafila às Secretarias Estaduais de Saúde desde janeiro. O medicamento de alto custo, fornecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS), está em falta principalmente em Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Distrito Federal, as regiões mais afetadas até o momento.
Roberta Oliveira, paciente de HP de Brasília, relata a gravidade dos sintomas e faz um apelo aos órgãos responsáveis pela distribuição do medicamento. “Nosso quadro tende a piorar a cada dia sem o remédio. Peço que olhem para cada um desses pacientes, aqueles que estão acamados, que dependem de oxigênio e que não podem ficar um dia sem a medicação”.
Susana Souza, paciente do Rio de Janeiro, está sem a sildenafila desde 2018. “A farmácia do Estado se negou a fornecer o medicamento por não aprovar a terapia combinada. Sinto muito cansaço e muita falta de ar. A terapia combinada para mim é fundamental, mas o Estado do Rio de Janeiro não contempla esse protocolo”, lamenta.
Outro fator agravante é a falta de leitos no país. Segundo monitoramento divulgado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), 24 estados e o Distrito Federal estão com taxas de ocupação de leitos de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) do SUS iguais ou superiores a 80%. Esse cenário dificulta ainda mais a situação dos pacientes de HP, que já fazem parte do grupo de risco.
Movimento para pressionar fornecimento de medicamentos
A Abraf (Associação Brasileira de Apoio à Família com Hipertensão Pulmonar e Doenças Correlatas) deu início a ações para pressionar os órgãos responsáveis pelo fornecimento dos medicamentos. Foi divulgado um vídeo-manifesto no canal do YouTube da Associação com depoimentos de pacientes, que contam como a falta da medicação afeta a vida deles.
Também foram realizadas reclamação na ouvidoria do SUS e solicitação de informação sobre a compra da medicação via Lei de Acesso à Informação Pública no Ministério da Saúde. Além disso, a instituição apresentou uma denúncia ao Ministério Público Federal, formalizada em 12 de abril.
Para Paula Menezes, presidente da Abraf, a interrupção do fornecimento de sildenafila, utilizado como primeira linha de tratamento, pode estar relacionada com a crise por conta do Covid-19. “Como a compra desse medicamento é realizada pelo Ministério da Saúde, acreditamos que tem relação com o foco da Covid no momento. O que acaba resultando no esquecimento das outras prioridades”, aponta a presidente.
Como não há cura, o tratamento da Hipertensão Pulmonar tem como objetivo melhorar os sintomas e postergar a progressão da doença, mas a dificuldade de acesso ao tratamento é preocupante. “A doença, mesmo sem cura, não tira o direito dos pacientes de viverem melhor, aprendendo a conviver com a patologia e controlando seus sintomas. Por isso mesmo, o uso dos medicamentos é necessário e importantíssimo para garantir uma qualidade de vida melhor”, ressalta.
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O dia 5 de maio celebra a vida das pessoas que convivem com a Hipertensão Pulmonar e também para sensibilizar a população em relação à doença. A data marca o falecimento de uma criança com HP na Espanha. No Brasil, a Abraf utiliza a data para conscientizar sobre essa patologia rara e fatal, e discutir as necessidades dos pacientes e a importância de políticas públicas para atendê-los.
A hipertensão pulmonar é um termo abrangente e inclusivo para um grupo de várias doenças crônicas que afetam os pulmões e o coração. A síndrome rara e incapacitante é caracterizada pelo aumento da pressão em pequenos vasos sanguíneos. A doença é crônica, progressiva e potencialmente fatal. A HP pode ter várias causas como a Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica, Fibrose Pulmonar Idiopática, Asma Grave, hepatites, HIV, embolia pulmonar, insuficiência cardíaca etc.
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Somente no Brasil, estima-se que cerca de 2 milhões de pessoas convivam com a doença. A taxa de mortalidade de pacientes com a doença é elevada, chegando a um percentual de 43% depois de cinco anos. A depender da causa da doença, ela é classificada em cinco tipos diferentes. Com o tempo, o coração sobrecarregado de trabalho se desgasta podendo causar insuficiência cardíaca e morte.
Algumas formas ou “subtipos” da HP são raras, bem como de desenvolvimento rápido, debilitantes e fatais. Na Hipertensão Arterial Pulmonar (um subtipo de HP), as artérias que levam o sangue do coração aos pulmões se estreitam, fazendo com que o órgão lute para bombear sangue através das artérias reduzidas, resultando em pressão arterial alta nos pulmões e dilatação do coração.
Sintomas levam a insuficiência cardíaca e morte
Na HP, as artérias que levam o sangue do coração aos pulmões estreitam por razões que ainda não são totalmente compreendidas. O coração luta para bombear sangue através das artérias reduzidas, resultando em pressão arterial alta nos pulmões e dilatação do coração. Com o tempo, o coração sobrecarregado de trabalho se desgasta, podendo causar insuficiência cardíaca e morte.
Embora seja mais comum em jovens adultos e em mulheres, a doença também afeta pessoas de diferentes idades. Os sintomas da Hipertensão Pulmonar, que podem incluir falta de ar, fadiga, tontura e episódios de desmaio, variam de paciente para paciente e, normalmente, não ocorrem até a doença ter progredido, o que atrasa o tratamento. Como esses sintomas também são comuns em outras enfermidades, como asma, bronquite ou insuficiência cardíaca, o diagnóstico da HP ainda é difícil de ser reconhecido.
“A Hipertensão Pulmonar é uma doença bastante grave, mas ainda pouco conhecida pela população. Nosso objetivo é conscientizar as pessoas e ajudar os pacientes, colocando a doença em evidência, a fim, também, de pressionar o governo a proporcionar um cenário mais digno para quem luta contra a HP no Brasil”, explica Paula Menezes.
88% dos pacientes sofrem com angústia ou ansiedade
Pouco antes do início da pandemia, a Abraf realizou uma pesquisa inédita sobre impacto emocional, social e financeiro para os pacientes. O estudo revelou que 88% das pessoas diagnosticadas desenvolveram problemas como angústia e ansiedade, e 59% ficam deprimidas a maior parte dos seus dias.
Dos entrevistados, 89% declararam que precisam de ajuda para manter a vida social. Na questão do trabalho, mais da metade da amostra, 56%, encontra-se impossibilitada de integrar o mercado de trabalho. No levantamento, 86% dos entrevistados são mulheres e mais da metade possuem entre 30 e 49 anos de idade. Os dados são resultado de levantamento feito pela Abraf com 303 pacientes e cuidadores.
Dos entrevistados, 70% são atendidos na rede pública, 19% na rede privada e 11% recorrem ao atendimento nas duas esferas. O percentual do acesso à medicação não é diferente, sendo intermediado quase por completo pelo SUS. Quando questionados sobre os problemas que mais os preocupavam, 50% afirmaram que a constante falta dos remédios é o mais difícil.
Saúde veta terapia combinada
No Brasil, a Abraf é a Associação que luta por melhores condições para os pacientes, promovendo diversas ações e eventos para chamar a atenção da sociedade e dos governantes para a causa. O SUS fornece o tratamento gratuito aos pacientes. Contudo, desde 2014, este tratamento não é atualizado: de oito medicações com registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), apenas quatro são fornecidas. Terapias modernas, com menos efeitos colaterais e maior garantia de sobrevida ao paciente, não são ofertadas.
O tratamento para Hipertensão Pulmonar necessita de uma combinação de mais de um medicamento para evitar o seu avanço, mas o governo federal não permite isso. O Ministério da Saúde, em seu PCDT (Protocolo Clínico de Diretrizes Terapêuticas), impede a realização de terapia combinada para o cuidado do paciente.
Essa objeção dá margem para que governos estaduais obriguem os pacientes a escolherem qual medicação desejam receber. A recomendação de terapia combinada faz parte de diretrizes internacionais e é realidade em países da América Latina, da Europa e nos Estados Unidos”, explica Paula Menezes.
Protocolo clínico precisa ser atualizado
No estudo realizado pela Abraf, especialistas entrevistados fizeram recomendações para que as pessoas que vivem com Hipertensão Pulmonar sejam mais bem cuidadas no Brasil. A atualização do protocolo nacional de diretrizes terapêuticas, com previsão das terapias complementares no tratamento (reabilitação e tratamento psicológico), foi uma delas.
Em outubro de 2020, foi apresentado ao Ministério da Saúde pela sociedade científica especializada uma sugestão de protocolo clínico. Ou seja, um documento em que os maiores especialistas do tema no Brasil elencam qual deveria ser o tratamento ideal para os pacientes. Até o presente momento, não houve avanço no tema.
Nesse cenário, a Abraf defende a criação de políticas públicas que atendam às necessidades dessa população, como a atualização do protocolo de tratamento pelo Ministério da Saúde, a promoção do diagnóstico precoce e o fortalecimento de centros de referência com atenção multidisciplinar. “A pandemia do coronavírus tem ratificado o que há muito vimos afirmando: cada vida importa. Não é porque se trata de uma doença rara que os pacientes merecem menos cuidado. Nossa luta é pela vida de cada um, cujo valor é imensurável”, aponta Paula.