Muito usada na Europa, a ozonioterapia, que utiliza a aplicação de uma mistura dos gases oxigênio e ozônio, pode ser liberada no Brasil como técnica complementar em diversos tratamentos no Sistema Único de Saúde. É o que prevê um projeto de lei aprovado esta semana na Câmara dos Deputados. O assunto é polêmico: a Associação Médica Brasileira (AMB) publicou uma nota na última quinta-feira (16) criticando a medida.
Em dezembro de 2017, a AMB e outras 24 entidades médicas nacionais assinaram uma nota de repúdio contra a proposta legislativa “por se tratar de técnica sem comprovação científica de qualidade, o que pode prejudicar o paciente, além de não justificar a alocação de recursos para sua realização”.
“A ozonioterapia deve continuar como tratamento experimental até que evidências científicas de qualidade possam alterar este status, o que deve ser feito pelo Conselho Federal de Medicina”, destaca o texto de posicionamento da AMB sobre a nova terapia a ser incorporada ao rol de terapias complementares integrativas do SUS.
Já especialistas defendem que a prática aumenta a circulação, a imunidade e combate o estresse oxidativo, que é um vilão para a saúde. Além disso, tem ação antiinflamatória, ação fúngica e bactericida. A técnica pode ser aplicada por diversas vias de administração – endovenosa, retal, intra-articular, local, intervertebral, intraforaminal, intradiscal, epidural, intramuscular e intravesical.
Marisa Lima, enfermeira especialista na prática, diz que as utilidades e aplicações são inúmeras, desde cuidados paliativos com câncer até a área estética, desde que bem orientados por profissionais qualificados e capacitados. “A ozônio é muito famosa na Europa, está nos cinco continentes e chegou ao Brasil há apenas 40 anos. Depois do sucesso lá fora, o brasileiro tem seguido o exemplo de países desenvolvidos para ter mais saúde, que proporciona qualidade de vida”, explica.
Ozonioterapia no tratamento da diabetes
Ela explica que a ozonioterapia é um modulador hormonal que acaba modulando a insulina, sendo muito procurada para tratar as complicações da diabetes. “Como é um detox do organismo, coloca todo o corpo em equilíbrio, inclusive protegendo contra as comorbidades dessa doença, como as neuropatias diabéticas, que acabam evoluindo para amputação, que é o caso do pé diabético”. Outro exemplo são as retinopatias, que são as doenças da retina, como catarata.
Mas ela alerta que a ozônio tem que ser acompanhada de outras terapias, por exemplo a nutricional. “Não adianta fazer ozonioterapia e não ter uma dieta equilibrada. A mudança de hábitos é fundamental para um bom resultado. Tem horas que nem a insulina consegue dar conta, fica aquela loucura do sobe e desde e nada dá conta. É aí que a ozônio entra, mas principalmente para evitar as comorbidades”, explica Marisa
“Eu tenho pacientes que tem aquela subida na insulina e, quando sobe, tem que fazer caminhada, por exemplo. É um conjunto de fatores que associados trazem bem estar a uma doença que não tem cura”.
A neuropatia, que faz o paciente perder a sensibilidade no pé, é uma das preocupações do diabético. “Ele pode se machucar que não vai sentir. A ozônioterapia vai impedir que se desenvolvam as feridas e se existir, aí pode funcionar como cicatrização dessa ferida”.
Marisa ressalta que essa é uma prática relativamente barata. “No caso do diabético, o benefício é muito grande. Um ‘pé diabético’ evolui para amputação muito rápido. Com a ozônioterapia, a cicatrização impede também que algo pior aconteça”, explica a especialista.
Posicionamento da AMB sobre projeto de lei da ozonioterapia no brasil
A Associação Médica Brasileira – AMB, no uso de suas atribuições de congregar e defender ética, social, economicamente os médicos e contribuir para a política de saúde e o aperfeiçoamento do sistema médico assistencial do país, vem a público esclarecer e manifestar seu posicionamento contrário ao Projeto de Lei nº 9001/2017 (Projeto de Lei do Senado nº 227/2017), aprovado, dia 15 de setembro, pela Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF) da Câmara dos Deputados, que agora segue para a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania – CCJC. Consideramos:
O Projeto de Lei nº 9001/2017 (Projeto de Lei do Senado nº 227/2017) pretende autorizar a prescrição da ozonioterapia como tratamento médico de caráter complementar em todo o território nacional.
A ozonioterapia é uma técnica que utiliza a aplicação de uma mistura dos gases oxigênio e ozônio, por diversas vias de administração – endovenosa, retal, intra-articular, local, intervertebral, intraforaminal, intradiscal, epidural, intramuscular e intravesical –, com finalidade terapêutica.
Em dezembro de 2017, a AMB e outras 24 entidades médicas nacionais assinaram uma nota de repúdio contra a proposta legislativa em questão, por se tratar de técnica sem comprovação científica de qualidade, o que pode prejudicar o paciente, além de não justificar a alocação de recursos para sua realização.
A Resolução CFM nº 2.181/2018 define a ozonioterapia como um procedimento de caráter experimental, que, portanto, deve ser realizada apenas no escopo de estudos que observam critérios definidos pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep).
A deputada Carmem Zanotto, na qualidade de relatora do PL 9001/2017 na CSSF, apresentou seu parecer pela aprovação da proposta legislativa em questão, mas estendendo a quaisquer profissionais de saúde, e não apenas os médicos, a prescrição da ozonioterapia.
O parecer da deputada Carmem Zanotto não se fundamenta em evidências científicas, mas em uma visita presencial a serviços públicos de ozonioterapia de Portugal, realizada por um grupo de deputados membros da CSSF em janeiro de 2019.
Durante esta visita, a deputada afirma que teriam conhecido “a rotina desses serviços e os ótimos resultados que vêm obtendo ao longo do tempo”, bem como constatado “os efeitos benéficos associados ao uso da ozonioterapia para pacientes com quadros os mais variados”.
Até o atual momento, não há evidências científicas de qualidade que justifiquem sequer a revisão da Resolução CFM nº 2.181/2018, para que a ozonioterapia deixe de ser considerada como tratamento experimental, quanto mais uma lei neste sentido.
A AMB entende que a ozonioterapia deve continuar como tratamento experimental até que evidências científicas de qualidade possam alterar este status, o que deve ser feito pelo Conselho Federal de Medicina a quem compete “editar normas para definir o caráter experimental de procedimentos em Medicina, autorizando ou vedando a sua prática pelos médicos”, conforme o artigo 7º da Lei nº 12.842/2013.”.
Pelo exposto, a AMB pede a rejeição pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania – CCJC, da Câmara dos Deputados do Projeto de Lei nº 9001/2017 (Projeto de Lei do Senado nº 227/2017).