O Censo Demográfico do IBGE, divulgado na última semana, aponta que no Brasil as mulheres são maioria – 51,5% (104.548.325) contra 48,5% (98.532.431) em 2022 – ou seja, havia cerca de 6 milhões de mulheres a mais do que homens em 2022. Mas, infelizmente, elas ainda estão longe de ter representatividade equivalente nas empresas, especialmente em postos de liderança, e também nas áreas da Ciência e da Medicina. 

Isso também se dá em nível mundial, onde a diferença entre homens e mulheres é ligeiramente inversa, de apenas 2% – em números aproximados e arredondados, o mundo tem 51% de população masculina e 49% de população feminina. A previsão de paridade entre os gêneros masculino e feminino deve ocorrer em 2050, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas). 

Uma comprovação da pouca presença feminina em áreas de destaque em nível mundial é o Prêmio Nobel, que contemplou, ao longo de 122 anos de história, somente 64 mulheres do total nas seis categorias em que são entregues – veja mais detalhes abaixo. Na Fisiologia e Medicina, por exemplo, somente 13 dos 227 premiados foram mulheres.

A mais recente mulher contemplada pelo Nobel nesta categoria é a bioquímica Katalin Karikó, que divide a premiação em 2023 com o imunologista norte-americano Drew Weissman. Eles foram laureados pelo trabalho pioneiro em modificar as bases nucleotídicas do RNA que levaram ao desenvolvimento de vacinas eficazes de RNA mensageiro (mRNA) contra o vírus Sars-Cov-2.

Conheça as mulheres que ganharam o Nobel de Medicina entre 1947 e 2015

‘Efeito Matilda’: por que elas se destacam menos nas Ciências?

Em 1983 a pesquisadora norte-americana Barbara McClintock foi a primeira e única mulher a conquistar o Nobel de Medicina sem compartilhar com outros cientistas nesta categoria (Foto: Wikimedia Commons)

Se for feita uma avaliação temática, pode ser notado que Ciências Exatas tem uma maior defasagem. Podem existir vários fatores explicativos para essa discrepância. Não era permitido às mulheres por muito tempo estudarem Matemática, a carga doméstica e a demanda afetiva geralmente recai sobre elas, muitas ainda recebem o encargo de jornadas duplas ou triplas fora de dentro de casa.

Muitos fatores já foram plenamente estudados. Um deles, no entanto, foi levantado, que é o chamado ‘Efeito Matilda’, percebido primeiramente por Matilda Joslyn Gage e foi cunhado e publicado em artigo por Margaret W. Rossiter em 1993.

Trata-se de uma injustiça social de gênero que tem como resultado a menor representatividade de mulheres em círculos científicos. É um tipo de preconceito contra as mulheres na ciência, em que seus resultados públicos demonstram que o papel feminino é ignorado ou negado sistematicamente. Ou ainda, em que o trabalho de uma mulher cientista é atribuído a um homem. 

A neurologista italiana Rita Levi-Montalcini levou o Prêmio Nobel de Medicina em 1986 (Foto: Wikimedia Commons)

Na verdade, o ‘Efeito Matilda’ se origina do Efeito Matheus’. Nesse último caso, o cientista homem, mas menos proeminente não tem seu trabalho reconhecido por não ser uma pessoa notória. Assim, o mesmo trabalho de um pesquisador famoso teria mais visibilidade do que um desconhecido.

No caso das mulheres, é mais perverso, sistemático e consistente. Não somente no Nobel, mas também na menor quantidade de citações de mulheres em artigos científicos, ou a citação de contribuição feminina em rodapés ou asteriscos

Para combater o preconceito de gênero nas ciências, a Associação de Mulheres Pesquisadoras e Tecnológicas (AMIT) criou uma campanha em 2021 uma campanha chamada de “No More Matildas”, buscando colocar mais mulheres em livros de textos didáticos. Não ter mulheres representadas teria de fato efeito negativo sobre as meninas sobre suas possiblidades de participação nas ciências.

Entenda a origem do Prêmio Nobel e seus números por gênero

A penúltima mulher a ser premiada com um Nobel de Medicina ou Fisiologia foi a farmacologista chinesa Tu Youyou, em 2015 (Foto: Wikimedia Commons)

O último desejo de Alfred Nobel em 27 de novembro de 1895 foi deixar parte de sua fortuna para prêmios em física, química, fisiologia ou medicina, literatura e paz – os Prêmios Nobel. Já em 1968, o banco central sueco Sveriges Riksbank iniciou o Prêmio Sveriges Riksbank em Ciências Econômicas em homenagem a Alfred Nobel. Então, a Academia pode premiar aos indicados com um desses dois prêmios. 

Entre 1901 e 2023, os Prêmios Nobel e Sveriges Riksbank foram entregues 621 vezes a 1.000 pessoas e organizações. Como a premiação pode ser entregue mais de uma vez a uma pessoa ou organização, 965 indivíduos e 27 organizações a receberam neste período. Desse total, foram entregues 65 vezes a mulheres – ou seja, menos de 7%. Como Marie Curie foi a única laureada duas vezes, isso significa que 64 personalidades femininas receberam o Nobel. 

A discrepância entre premiados homens e mulheres se mostra ainda mais setorialmente. Em Paz, 19 mulheres receberam o Nobel – do total de 141 prêmios distribuídos. Em Literatura, 17. Já em Fisiologia e Medicina, foram 13. Em Química, foram oito mulheres, e em Física, cinco. Na área das Ciências Econômicas, foram somente três mulheres contempladas pelo Prêmio Sveriges Riksbank. 

Albert Einstein ganhou o Prêmio Nobel de Física em 1922 (Foto: Reprodução de internet)

Curiosidade

Entre os cientistas mais famosos a ganhar o Nobel está o físico Albert Einstein. Embora tenha sido indicado 62 vezes ao Prêmio Nobel de Física, pela sua famosa ‘teoria da relatividade’, proposta em 1905 e ampliada em 1915, ele só foi contemplado em 1921, mas por uma descoberta menos revolucionária, o ‘efeito fotoelétrico’. Mas diante dos números, a pergunta que fica é: se Einstein fosse mulher teria tido tanta notoriedade?

Confira os números de vencedores do Nobel em 122 anos, por gênero

Prêmio Nobel Número de Prêmios Premiados Somente mulheres 1 Premiado Dividido por 2 premiados Dividido por 3 premiados
Física 117 225 5 47 32 38
Química 115 194 8 63 25 27
Fisiologia e Medicina 114 227 13 40 35 39
Literatura 116 120 17 112 4
Paz 104 141 19 70 31 3
Ciências Econômicas 55 93 3 26 20 9
Total: 621 1.000 65 358 147 116
Conheça as mulheres que ganharam o Nobel de Medicina antes de Karikó

Quem foram as mulheres contempladas em cada categoria

Prêmio Nobel em Física
2023 Anne L’Huillier
2020 Andrea Ghez
2018 Donna Strickland
1963 Maria Goeppert Mayer
1903 Marie Curie, nascida Sklodowska
Prêmio Nobel em Química
2022 Carolyn R. Bertozzi
2020 Emmanuelle Charpentier
2020 Jennifer A. Doudna
2018 Frances H. Arnold
2009 Ada E. Yonath
1964 Dorothy Crowfoot Hodgkin
1935 Irène Joliot-Curie
1911 Marie Curie, nascida Sklodowska
Prêmio Nobel em Fisiologia e Medicina
2023 Katalin Karikó
2015 Tu Youyou
2014 May-Britt Moser
2009 Elizabeth H. Blackburn
2009 Carol W. Greider
2008 Françoise Barré-Sinoussi
2004 Linda B. Buck
1995 Christiane Nüsslein-Volhard
1988 Gertrude B. Elion
1986 Rita Levi-Montalcini
1983 Barbara McClintock
1977 Rosalyn Yalow
1947 Gerty Theresa Cori, nascida Radnitz
Prêmio Nobel em Literatura
2022 Annie Ernaux
2020 Louise Glück
2018 Olga Tokarczuk
2015 Svetlana Alexievich
2013 Alice Munro
2009 Herta Müller
2007 Doris Lessing
2004 Elfriede Jelinek
1996 Wislawa Szymborska
1993 Toni Morrison
1991 Nadine Gordimer
1966 Nelly Sachs
1945 Gabriela Mistral
1938 Pearl Buck
1928 Sigrid Undset
1926 Grazia Deledda
1909 Selma Ottilia Lovisa Lagerlöf
Prêmio Nobel da Paz
2023 Narges Mohammadi
2021 Maria Ressa
2018 Nadia Murad
2014 Malala Yousafzai
2011 Ellen Johnson Sirleaf
2011 Leymah Gbowee
2011 Tawakkol Karman
2004 Wangari Muta Maathai
2003 Shirin Ebadi
1997 Jody Williams
1992 Rigoberta Menchú Tum
1991 Aung San Suu Kyi
1982 Alva Myrdal
1979 Madre Teresa
1976 Betty Williams
1976 Mairead Corrigan
1946 Emily Greene Balch
1931 Jane Addams
1905 Baronesa Bertha Sophie Felicita von Suttner
Sveriges Riksbank em Ciências Econômicas
2023 Claudia Goldin
2019 Esther Duflo
2009 Elinor Ostrom

Fonte: Prêmio Nobel

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