Menos de 30% dos jovens brasileiros discutem frequentemente questões ambientais, mostra o levantamento “Juventudes, Meio Ambiente e Mudanças Climáticas” das redes Em Movimento e Conhecimento Social. O estudo revela que, para essa faixa etária, o meio ambiente vem atrás de outros temas como qualidade na educação e direitos das mulheres. Além disso, o resultado não está relacionado à baixa escolaridade, uma vez que quatro em cada 10 entrevistados já haviam concluído o ensino superior ou pós-graduação.
A discussão sobre sustentabilidade é fundamental para a formação de cidadãos conscientes e responsáveis e ganha ainda mais relevância com a aproximação da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), que será realizada em novembro deste ano em Belém (PA). O evento reunirá líderes mundiais, cientistas e representantes da sociedade civil para debater soluções sobre a crise climática global, reforçando a necessidade de medidas concretas em diversas áreas, incluindo a educação.
Neste Dia do Professor e Dia do Educador Ambiental, lembrados em 15 de outubro, o Portal Vida e Ação traz algumas reflexões importantes de especialistas sobre a educação ambiental no Brasil. Confira!
Educador defende alfabetização para a sustentabilidade
Paulo Chagas Dalcheco, mestre em Linguagem e Educação e orientador educacional nos Anos Finais do Ensino Fundamental da Escola Lourenço Castanho, ressalta que a questão ambiental demanda a implementação de políticas públicas eficazes. Ele destaca a importância de abordar tanto a proteção quanto a educação ambiental, defendendo uma abordagem pedagógica que inclua a alfabetização para a sustentabilidade.
Assim como aprendem a ler, escrever e fazer contas, os alunos deveriam aprender a gerir os recursos, evitar desperdícios e reaproveitar materiais. A escola deve dar os primeiros passos, mas o engajamento só é realmente possível com a adesão da comunidade escolar e da sociedade”, afirma.
O estudo revela que, apesar das limitações no conhecimento sobre questões ambientais e climáticas, mais de 70% dos entrevistados estão familiarizados com termos como “aquecimento global” e “mudanças climáticas”. Dalcheco observa que, embora os estudantes possam entender conceitualmente o que são mudanças climáticas, ainda existem desafios no ensino dessa temática.
O grande desafio em qualquer escola é que esses próprios alunos ultrapassem o mero discurso e consigam perceber que suas ações diárias, seus costumes e modos de vida também contribuem para o aumento da temperatura no planeta ou a poluição no rio Tietê, por exemplo. Isso está acontecendo agora, no presente, mas também trará consequências futuras”, comenta.
Âmbito escolar é crucial para abordar assuntos emergentes e conectar os alunos com o mundo, a natureza e o meio ambiente
Sustentabilidade na escola: como implementar práticas verdes?
Para Paulo Chagas Dalcheco, o impacto de uma ação pedagógica pode ser difícil de medir, pois muitas aprendizagens ocorrem no campo da subjetividade. No entanto, um planejamento adequado pode permitir a coleta de dados antes, durante e após a implementação da proposta.
Quando se trata de sustentabilidade, não se mede a aprendizagem aplicando uma prova ao fim de uma sequência, mas observando as ações diárias dos alunos e demais pessoas da comunidade escolar, qual seu comportamento em relação aos ambientes que frequenta, se as atitudes demonstram responsabilidade para com o meio ambiente”, explica Dalcheco.
Para alcançar esse objetivo, a escola é crucial para conectar os alunos com o mundo, a natureza e o meio ambiente. Estudos de campo são um exemplo eficaz, pois permitem que os estudantes se engajem e aprendam por meio da experiência prática, gerando resultados positivos no processo de aprendizagem.
Em geral, as crianças ficam bastante sensibilizadas com a preservação da fauna, com a poluição do plástico nos oceanos e, certamente, são muito atraídos pela temática dos desastres naturais. Todas essas coisas parecem ficção científica, e as crianças se surpreendem quando se dão conta de que é tudo real, e que também somos responsáveis pelo nosso planeta”, enfatiza.
As iniciativas devem ir além da teoria e envolver diversos grupos da sociedade, incluindo as famílias. Os pais podem se voluntariar para projetos escolares, colaborar com os educadores e contribuir para a promoção da sustentabilidade e da conscientização ambiental. Essas atividades podem ocorrer tanto na escola quanto em casa, fortalecendo a integração entre o ambiente escolar e familiar.
É possível promover algumas ações pontuais, como o ‘dia sem consumo’, o ‘dia sem lixo’, assim como organizar competições e outros eventos que tematizem o respeito ao meio ambiente, a promoção e divulgação de ações realizadas. Essas ações e tantas outras podem partir tanto da escola quanto das famílias. A responsabilidade é de todos”, conclui Dalcheco.
COP 30 pode ser uma ‘virada de chave’ para novas gerações?
Com a COP30 no Brasil, espera-se que instituições de ensino intensifiquem suas iniciativas sustentáveis, contribuindo para uma geração mais engajada na luta contra as mudanças climáticas e reforça ainda mais o papel dos profissionais da Educação.
A COP30 nos convida a refletir sobre o papel da educação na formação de cidadãos conscientes e protagonistas na construção de um mundo mais equilibrado. Com objetivo de despertar nos alunos não apenas o conhecimento sobre os desafios ambientais, mas também a capacidade de agir para transformar a realidade”, afirma Carolina Han, coordenadora pedagógica do Ensino Fundamental Séries Finais e Ensino Médio do Colégio Rio Branco.
A sustentabilidade, no contexto escolar, é um valor essencial na formação dos alunos. Por meio de práticas pedagógicas integradas, projetos ambientais e ações comunitárias, as escolas têm a oportunidade de desenvolver uma consciência ecológica que transcende os conteúdos curriculares. A abordagem transversal da sustentabilidade, presente em diferentes disciplinas e vivências escolares, contribui para a formação de cidadãos críticos e comprometidos com os desafios ambientais.
A proximidade com o meio ambiente e a compreensão sobre a sua relevância despertam uma visão crítica sobre a temática ambiental e senso de pertencimento que ajudam a fortalecer a responsabilidade de conservá-lo e protegê-lo. Nesse sentido, em um momento em que eventos climáticos extremos atingem recorrentemente o Brasil e diferentes partes do mundo, é fundamental formar uma nova geração conectada com a natureza e consciente de sua importância.
Crianças e adolescentes precisam entender a relação existente entre um planeta em equilíbrio e eventos climáticos extremos, como enchentes, ondas de calor, aquecimento do oceano, incêndios, assim como a necessidade de termos cada vez mais Soluções Baseadas na Natureza no dia a dia.
A Educação Ambiental é um componente essencial e permanente da Educação Nacional. O ensino nas escolas é previsto na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) como competência que deve ir além de Ciências e ser abordada de forma interdisciplinar em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-formal. Ela é primordial para ajudar a sensibilizar e conscientizar estudantes, a fim de formar agentes transformadores e protetores de um planeta mais sustentável para todos.
Segundo Alexander Turra, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN), professor titular do Instituto Oceanográfico da USP e responsável pela Cátedra Unesco para a Sustentabilidade do Oceano, a Educação Ambiental é uma temática que vem amadurecendo desde o final do século 20 como um instrumento importante e relevante na busca de uma reconexão das pessoas com a natureza e vice-versa, já que há uma relação indissociável entre elas.
A natureza tem papel essencial no bem-estar da sociedade. E o aprendizado e a prática da Educação Ambiental, por meio do ensino fora ou dentro da escola, tem aspecto fundamental como alicerce na construção do futuro que teremos.
Na medida em que foi sendo compreendida e experimentada, a Educação Ambiental demonstrou ter diferentes vertentes que, em conjunto, criam uma possibilidade bastante abrangente de diálogo com a natureza e de promoção da transformação da relação entre a sociedade com ela. Então, é fundamental que essa abordagem esteja na base de qualquer processo educativo, uma vez que diz respeito à nossa relação com nós mesmos, com o nosso passado, com o nosso presente e com o nosso futuro. É um tema essencial para ser trabalhado tanto no ambiente escolar quanto fora dele”, afirma Turra.
O eu, o outro, o nós e o planeta
O professor acrescenta que a motivação para trabalhar a temática ambiental é variada. A vertente conservacionista busca aproximar as pessoas da natureza para que compreendam a importância do ambiente protegido e busquem sua preservação. Já a vertente crítica, trabalha com uma visão mais integrada entre ambiente e sociedade, buscando identificar as raízes dos problemas ambientais – que também são sociais.
É fundamental que os problemas ambientais sejam entendidos enquanto mazelas derivadas das escolhas e atitudes da sociedade, que acabam impactando a própria sociedade. Assim, estamos pensando não só a questão da natureza, mas o bem-estar social. A abordagem apropriada para trabalhar essas questões e promover a mudança é efetivamente trazer para a discussão aspectos críticos e complexos que vão levar a um entendimento, a uma leitura madura do sistema socioecológico, a ponto de fazer as pessoas assumirem posturas e atitudes e realizarem ações que promovam mudanças, na escala que elas conseguem. Com isso, formamos agentes de transformação da sociedade, da própria realidade e do sistema socioecológico como um todo”, aponta Turra.
Como trabalhar temas da atualidade em sala de aula
Todos os temas cotidianos relacionados à Educação Ambiental com aderência à vida das pessoas, fazendo com que cada um se veja pertencente dessa realidade e tenha motivações para mudá-la, podem e devem ser trabalhados em sala de aula. Entre eles, vale destacar a adaptação às mudanças climáticas, as Soluções Baseadas na Natureza, e a cultura oceânica.
De acordo com Turra, é necessário que as pessoas entendam a importância do oceano em suas vidas e suas responsabilidades na qualidade desse ambiente. “A cultura oceânica faz parte de uma discussão mais abrangente sobre a relação da sociedade com a natureza. Mas, no caso do oceano, essa relação é pouco compreendida. É preciso que as pessoas vejam as conexões que têm com o oceano, ainda que vivam distante dele. No ar que respiramos, na comida que ingerimos, na poluição que geramos e que pelos rios chega ao oceano. Direta ou indiretamente, essas relações acontecem.”
Já as Soluções Baseadas na Natureza mostram que desafios ambientais contemporâneos podem ser superados com a proteção da própria natureza. Exemplos desse conceito são a proteção de margens e cursos de rios para evitar alagamentos e enchentes; a criação de jardins de chuva em ambientes urbanos para aumentar a capacidade de infiltração do solo ou a arborização de ruas para amenizar o calor em dias quentes. Há vários tipos de Soluções Baseadas na Natureza que podem ser usados em diferentes realidades. São ferramentas de estudo e trabalho para as novas e futuras gerações.
Com assessorias