Existe muita confusão com relação às diferenças de orientação sexual e identidade de gênero. E muita gente ainda usa um termo inadequado – ‘opção sexual’ – para se referir à complexa questão da sexualidade. Na semana do Orgulho LGBTQIAPN+, a psicóloga Vanessa Jaccoud, que atua diretamente no atendimento a esta população em seu consultório, esclarece as principais diferenças para ninguém cometer esses erros e procurar entender e respeitar mais a questão da diversidade sexual.
“Identidade de gênero, diferente da orientação sexual, é o ato de não ter identificação com seu gênero de nascimento, de se sentir pertencente a outra identificação, diferente da biológica. Ou seja, uma criança pode nascer menina e ao longo da vida perceber uma identificação com o feminino, ou não, como isso também pode acontecer com um menino”, afirma
Segundo ela, a orientação sexual faz com que uma pessoa busque relacionamentos afetivo-sexuais com pessoas do mesmo sexo (homo), sexo oposto (hétero) ou ambos (bi). “Isso se ela não for um indivíduo assexual (não tem interesse na atividade sexual) ou pan (que sente atração por pessoas, independentemente de seu sexo ou identidade de gênero)”, destaca. Já na identidade de gênero a questão é o sentir-se, perceber-se e identificar-se como mulher ou homem.
A psicóloga Vanessa Jaccoud é especialista em questões de identidade de gênero (Foto: Divulgação)
‘Identidade de gênero que não corresponde ao sexo ao nascer não é doença’
A Organização Mundial da Saúde (OMS) mudou esse entendimento em seu guia que serve de referência para estatísticas e diagnósticos médicos: ser transgênero – em geral, ter uma identidade de gênero que não corresponde ao seu sexo atribuído ao nascer – não é doença. Considera-se na verdade a condição de ser “trans” muito mais complexa na teoria, bem como na prática.
Além de outros impactos ligados à questão da transgeneridade, existem problemas mais evidentes como a não aceitação na sociedade, dificuldades na hora de conseguir um emprego, conquistar a redesignação sexual, mudança para o nome social, além de muita discriminação e preconceitos, os quais não faltam desde o início do percurso de transição até a fase de maturação da transição em si.
“Existem ainda outros obstáculos mais graves, que influenciam no fator psicológico. Tudo é delicado e complexo nesta área do humano”, pontua a psicossomatista Vanessa Jaccoud.
Identidade de gênero: as diferenças entre transexual, transgênero e travesti
A psicóloga esclarece que transexual, transgênero e travesti são termos que acabam confundindo muita gente sobre quais seriam as distinções entre estes indivíduos ou termos.
“Posso apontar que os travestis são exclusivamente indivíduos do gênero masculino que se percebem melhor no gênero feminino, sendo mulher, irão usar roupas do sexo feminino durante parte da vida para ter uma experiência temporária ou permanente de ser do gênero feminino. Alguns não farão a redesignação, outros sim”, explica.
Segundo ela, travestis podem enfrentar os mesmos conflitos e impactos que os transexuais e os transgêneros, além de encarar a falta de respeito à diversidade sexual. “Por razão das identidades se pautarem pela ideia da auto identificação, sempre será mais assertivo compreender como o indivíduo se percebe e aprender sempre a respeitar essa questão”, pontua Vanessa Jaccoud.
‘Disforia de gênero provoca inquietude às pessoas trans’
De acordo com Vanessa Jaccoud, o processo de percepção da própria transgeneridade se dá, através de alguns indicadores no próprio desenvolvimento humano, tal como a disforia de gênero, que provoca intensa inquietude e incômodo ao indivíduo trans, por entender que o seu corpo não reflete o que este realmente é.
“Esta falta de identificação acaba ocasionando outros problemas como ansiedade, angústia, depressão, e até mesmo questões mais graves, como ideações e tentativas de suicídio, pois, de forma perturbadora, pode transformar tanto os sentimentos da pessoa, quanto ocasionar problemas familiares e profissionais”, avalia a profissional.
Segundo Vanessa, com alguns indivíduos, podem ocorrer desconfortos indicadores da incongruência de gênero desde a infância, porém, somente no desenvolvimento da pessoa, serão evidenciados os impactos predominantes.
“Os indivíduos transexuais sentem como experienciando o corpo trocado, demandando o tratamento psicológico, o qual é de extrema importância na condução de todo processo de reconhecimento do seu próprio self”, comenta.
Como o profissional de saúde mental pode ajudar?
Com certificação mundial em cuidados aos pacientes transgêneros, a psicóloga Vanessa Jaccoud também explica o papel do profissional de saúde mental no atendimento a este público.
“Cabe ao profissional qualificado na área contribuir para que esse indivíduo primeiro seja acolhido na sua dor existencial e assim caminhem em conjunto para seu autoconhecimento e redução ou extinção dos conflitos implicados no quadro”, ressalta a psicóloga.
Segundo ela, com ajuda profissional a pessoa poderá entender o que está acontecendo consigo mesma e ser orientada a buscar a terapia hormonal, e até mesmo a cirurgia de redesignação sexual, caso deseje, recebendo orientações técnicas dos especialistas quanto a todo o processo.
Em 2021, Vanessa Jaccoud criou no Rio de Janeiro, a Associação TRANquilaMENTE, para atender, a preços populares, pessoas transgêneras e suas famílias, com uma equipe formada por psicólogos, psiquiatra, endocrinologista, fonoaudiólogo, cirurgião e outros profissionais.
Além da parte de saúde física e mental, a associação, localizada no no no Recreio dos Bandeirantes, zona oeste carioca, promove capacitação, acesso a cursos de graduação e o necessário para que haja acolhimento, esclarecimento e inclusão desse público.
“Todos os indivíduos devem ser tratados com respeito, com dignidade, acolhimento e amor. Porque todos somos humanos. Porque a diversidade existe e precisamos ouvir todas as vozes”, afirma a psicóloga.
Psicóloga enfrenta preconceito por lidar com público LGBTQIAPN+
Com formação em saúde por todo o espectro de gênero pela Stanford University (USA) e certificação em Excelência Avançada em Saúde para Transgêneros pela Harvard Medical School, Vanessa foi a primeira mulher brasileira a participar da Associação Internacional de Profissionais para a Saúde de Transgênero (World Profissional Association for Transgender Health – WPATH, na sigla em inglês).
Apesar dessas e outras titulações e especializações no Brasil e no exterior, a psicossomatista e psico-oncologista conta que enfrenta preconceito na classe médica por escolher trabalhar com esse público.
“A sociedade é transfóbica, praticamente não existe inclusão dessa população. Essas pessoas não têm segurança pessoal nenhuma, elas são identificadas como anormais; o risco de sofrerem violência ou cometerem suicídio é imenso. Quando não somos vistos da maneira que somos, é muito difícil ter boa autoestima. Ver o sofrimento na sua maior expressão é comovente”, disse em entrevista ao Globo.
Livro conscientiza sobre a transgeneridade
Em dezembro de 2021, Vanessa lançou o livro “Transgeneridade: um caso de transcendência”, escrito em linguagem acessível e voltado para o público em geral. Na obra, ela descreve sua experiência com olhar clínico e etéreo sobre a alma humana e suas múltiplas facetas. O livro traduz a necessidade de conscientização e de se falar sobre a transgeneridade, sobre respeito, empatia, acolhimento. Sobre diversidade.
Todo o percurso entre os muitos atendimentos da pessoa, desde sua chegada até a transição de gênero frente à família, vão além do consultório, sendo uma costura inteligente e empática, traduzida em mais do que um caso clínico, mas mostrando de forma acolhedora a convivência, a redescoberta e mesclas de pessoas reais. Vidas, histórias, sentidos, encontros e saberes tem papel fundamental na história.A Transgeneridade é apresentada além da materialidade da ciência, mas sem o abandono dos saberes intelectuais, pautada pela experiência clínica e humana da autora, embasada por Carl G. Jung, fundador da psicologia analítica, trazendo referências e contribuições importantes nessa conexão ocidente e a espiritualidade do oriente, conceitos muito citados no livro.
A obra retrata assuntos muitas vezes ignorados no contexto social, fazendo com que a narrativa seja uma possível alavanca para a contribuição instrutiva desta história incrível de pessoas sendo pessoas na contemporaneidade.
Os aspectos mais abordados, como medo, luto, vergonha, amor próprio e alianças familiares, são trazidos de forma iluminada, para nos fazer entender que estamos passando por uma existência, onde a validação do si mesmo é a única coisa com a qual devemos buscar, para conquistarmos todas as outras e estarmos aptos à arena do nosso viver.
Além do livro, Vanessa lança a cartilha “Vamos Falar sobre Transgeneridade?“, em formato e-book e faz diversas palestras sobre saúde mental.
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