Compreender a tuberculose (TB) – uma doença milenar causada pelo Mycobacterium tuberculosis – é extremamente importante no cenário atual do Brasil com a pandemia do novo coronavírus. A doença afeta, principalmente, os pulmões e é a principal causa de morte no mundo por um único agente infeccioso. Em 2018, foram aproximadamente 10 milhões de casos e 1,5 milhão de mortes. Já a Covid-19, até julho de 2020, teve 2.118.646 casos confirmados e 80.120 mortes.

Pacientes com tuberculose (TB) e tuberculose multirresistente na cidade do Rio de Janeiro serão o público-alvo de um novo estudo da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz. No mês de agosto, o Centro de Referência Professor Hélio Fraga (CRPHF) da Esnp/Fiocruz, que é considerado uma Referência nacional no atendimento a esses pacientes, realiza um inquérito sorológico e do diagnóstico molecular da Covid-19 nos pacientes atendidos pelo ambulatório.

O fato de a Covid-19 atuar principalmente nos pulmões parece tornar os pacientes com TB um grupo de risco, apresentando mais chances de progredirem para casos severos e críticos. A maioria dos resultados publicados aborda casos de pacientes internados, público que está sendo priorizado para a realização de testes devido à sua escassez durante a pandemia. Entretanto, a limitação dos testes a grupos com quadros mais graves prejudica a real visualização do panorama da doença e implicações nesse grupo de risco”, advertiu o chefe do Setor de Pesquisa do Centro de Referência Hélio Fraga, Paulo Victor Viana.

Situação crítica na cidade do Rio de Janeiro

Atualmente, o Rio de Janeiro também é uma das cidades do Brasil com os maiores números de casos de Covid-19, com 68.334 casos até o dia 22 de julho de 2020, segundo o boletim diário do Estado do Rio de Janeiro. É também a capital brasileira que apresentou o maior número de casos novos de tuberculose em 2019 (6.293 casos novos; 93,7 casos por 100 mil habitantes). Somado a isso, existe uma elevada carga de tuberculose resistente no município, correspondendo a 15,5% de todos os casos de TB resistente do Brasil em 2019 (n= 1356).

Segundo Paulo Victor, a tuberculose resistente se torna mais preocupante pelo fato de que a bactéria causadora da TB pode evoluir para formas resistentes aos medicamentos para o tratamento da TB, que variam desde uma monorresistência (apenas um medicamento), a uma multirresistência (TB-MDR) e até mesmo uma resistência extensiva (TB-XDR), tornando-se uma doença com cada vez menos possibilidade de tratamento e elevadas chances de transmissão de bactérias resistentes.

Segundo o chefe do Setor de Pesquisa do Centro de Referência Hélio Fraga, o resultado será utilizado para a realização de um inquérito sorológico que verificará a prevalência de pacientes atendidos no ambulatório que já entraram em contato com o novo coronavírus.

Desses mesmos pacientes, também serão coletados material de naso e orofaringe, que serão utilizados para a realização do teste de RT-PCR, uma vez que seu intuito é verificar o diagnóstico da Covid-19 por meio da detecção do material genético viral. Além disso, iremos realizar um relacionamento das bases de dados dos principais sistemas de informação mediante o acompanhamento dos quadros clínicos e desfechos dos casos que vierem a precisar de internação ou até mesmo aqueles que evoluíram para óbito”, explica Paulo Victor.

Qual é o percentual de pacientes contaminados pelo coronavírus?

O inquérito sorológico permitirá avaliar quantos de seus pacientes já tiveram contato com o novo coronavírus, enquanto a realização da testagem RT-PCR possibilitará o acesso mais rápido ao diagnóstico de casos suspeitos. Segundo a coordenadora do estudo, a pesquisadora Karen Gomes, a pesquisa trará um retrato do impacto da Covid-19 dentro de uma população fortemente vulnerável. Também será possível identificar a força de transmissão do vírus nesse grupo.

Com a realização do inquérito, temos o objetivo de verificar a porcentagem de pacientes com tuberculose resistente já infectados pelo novo coronavírus e correlacionar com a gravidade e desfecho desses casos. Com os resultados, teremos um retrato inédito do real impacto da Covid-19 e de seu comportamento entre os adoecidos por tuberculose resistente, o que poderá subsidiar decisões de políticas públicas direcionadas aos gestores dos programas de controle da tuberculose”, explicou ela.

De acordo com Paulo Victor, devido ao forte potencial de vulnerabilidade à Covid-19 dos pacientes com TB, o monitoramento desses pacientes é de extrema importância, pois permite um diagnóstico precoce e o cuidado dessa população que é mais suscetível a resultados desfavoráveis.

À medida que a pandemia avança, mais pessoas – incluindo pacientes com TB – são expostas ao Sars-CoV-2. Alguns estudos mostram que a associação de infecção pulmonar viral e bacteriana, incluindo a TB, pode resultar em quadros mais graves e maiores índices de mortalidade”, detalha.

Acesso ao exame diagnóstico e seus benefícios

Para o pesquisador, a vigilância epidemiológica e laboratorial da Covid-19 nos pacientes com tuberculose resistente pode ser uma importante ferramenta para compreender melhor a realidade dos pacientes no contexto da pandemia.

A coordenadora do projeto destacou que o principal benefício da pesquisa é o acesso ao exame diagnóstico para Covid-19 dos pacientes com TB. “O diagnóstico precoce permite o acompanhamento desde as primeiras etapas da infecção e possibilita que intervenções sejam realizadas antes de seu agravamento, contribuindo para um desfecho mais favorável”, ressaltou Karen Gomes.

O estudo vai auxiliar, também, na geração de conhecimento e na compreensão de como os pacientes com tuberculose reagem a quadros de Covid-19 e têm reagido às situações geradas pela pandemia, como o isolamento social e seus impactos financeiro e psicológico.

Saiba mais sobre o estudo

O estudo Vigilância Epidemiológica e Laboratorial da Covid-19 em pacientes com tuberculose e tuberculose resistente visa ao monitoramento de casos de infecção por Sars-CoV-2 e será realizado nos pacientes durante suas visitas de acompanhamento médico. Durante a visita, o paciente, primeiramente, será convidado a participar da pesquisa e a ele apresentado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Após a assinatura do TCLE, o paciente será submetido a um questionário, que, em seu primeiro bloco, será composto de informações pessoais e, no segundo bloco, de informações sobre a Covid-19. O terceiro bloco do questionário contará com informações a respeito do quadro de tuberculose e será coletado do prontuário. Após o questionário, o paciente será encaminhado para a coleta de sangue, que será utilizada para realizar o teste rápido para Covid-19.

O estudo conta com a parceria do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz), no âmbito do fornecimento de testes rápidos para Covid-19, e também do Laboratório de Vírus Respiratórios e Sarampo, do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), para as análises de testagem RT-PCR dos pacientes atendidos no Centro de Referência Professor Hélio Fraga.

Segundo ele, esse relacionamento será realizado por buscas nos seguintes sistemas de informação: Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), Sistema de Informação de Tratamentos Especiais de Tuberculose (SITETB) e Sistema de Informação Sobre Mortalidade (SIM).

Da Fiocruz, com Redação

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