Portaria do Ministério da Saúde publicada no dia 14 de fevereiro, no Diário Oficial da União, institui estratégia excepcional de ampliação do acesso à reconstrução mamária para mulheres com câncer de mama no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Serão destinados, ao todo, mais de R$ 105 milhões aos estados e ao Distrito Federal.

De acordo com o texto, serão consideradas candidatas mulheres com diagnóstico de câncer de mama submetidas à mastectomia total (radical ou simples) prévia e aquelas com indicação de reconstrução mamária no mesmo ato cirúrgico. Dados da pasta indicam que mais de 20 mil mulheres aguardam na fila pelo procedimento na rede pública.

Para a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SPCP), este número é preocupante uma vez que a incidência desse tumor no país é crescente. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), só em 2022, foram mais 66 mil novos casos. A taxa demonstra a magnitude do problema e a nova portaria explicita a preocupação federal com o tema.

Segundo a publicação, a duração da estratégia de ampliação das cirurgias será de 24 meses. Caberá ao ministério, por meio da Secretaria de Atenção Especializada à Saúde, acompanhar e monitorar a execução nacional; estabelecer os requisitos e a forma de adesão dos entes federativos; e acompanhar e monitorar os resultados obtidos.

Para Lydia Masako Ferreira, presidente da SBCP, trata-se de uma iniciativa de grande impacto social, pois a qualidade de vida é comprovadamente melhorada para as mulheres que têm acesso a essa cirurgia.

“A reconstrução mamária é fundamental para restabelecer as integridades física e emocional da paciente após o trauma. Sabemos, inclusive, que o acesso a essa cirurgia aumenta a aderência das mulheres aos tratamentos contra o câncer”, afirma.

Reconstrução mamária é garantida por lei desde 2018

Desde 2018, a reconstrução mamária pós-mastectomia é garantida por lei (13.770) e pode ser exigida pelas mulheres que terão de passar pela mastectomia. A cirurgia de reconstrução é realizada logo após a retirada do tumor quando há condições técnicas, caso não seja possível realizar imediatamente, a paciente será encaminhada para acompanhamento e terá garantida a realização da cirurgia após alcançar as condições clínicas necessárias.

“Atualmente não se pode dissociar o tratamento do câncer da realização da reconstrução mamária. Sabemos, inclusive, que o acesso a essa cirurgia aumenta a aderência das mulheres aos tratamentos contra o câncer de mama”, informa Lydia Masako Ferreira.

O protocolo mais utilizado de tratamento prevê a cirurgia seguida de quimioterapia e radioterapia. Em alguns casos, podemos ver a quimioterapia ser administrada antes, mas ainda assim, a cirurgia tem de ser feita, de acordo com Alexandre Piassi, cirurgião plástico e diretor do Demid, da SBCP.

“Mesmo quando o tumor desaparece após a quimioterapia neoadjuvante, a conduta hoje é realizar a cirurgia e retirar os tecidos da região afetada pela doença, com uma margem de segurança”, explica.

Para as mulheres que não conseguiram realizar a cirurgia de reconstrução imediatamente, a indicação é esperar um período. “A quimioterapia costuma durar seis meses e a radioterapia um mês. Só após oito meses da finalização das sessões de radioterapia que é indicado realizar a cirurgia, pois durante esse período a cicatrização fica prejudicada”, completa.

 

A reconstrução da mama é realizada para restabelecer a forma estética. Restaura-se o volume e o formato, e após um período – de três a seis meses – é realizada uma avaliação para verificar se serão necessários reparos como um enxerto de gordura, por exemplo.

Para a reconstrução da mama, o volume é reconstituído com implantes de silicone ou retalhos. Para a área dos mamilos muitas vezes recorre-se à tatuagem que traz resultados bem satisfatórios.

Mulheres de qualquer idade podem fazer a reconstrução. Só há contraindicações relativas para casos clínicos graves como problemas cardíacos, casos de obesidade ou doença muito avançada.

A reconstrução mamária impacta positivamente a vida da mulher, ajudando-a a resgatar a autoestima e o bem-estar psicológico que a impulsionam para um dia a dia com mais qualidade e saúde.

“Há estudos científicos que, inclusive, comparam a retirada da mama com a mutilação genital no homem. Mas a reconstituição mamária ameniza essa perda, resgatando a dignidade, a autoestima e a qualidade de vida da mulher. Por isso a importância da cirurgia plástica no tratamento global do câncer de mama”, conclui Piassi.

Conheça os tipos de reconstrução mamária

O procedimento cirúrgico depende de vários fatores, entre eles o tamanho da mama, a localização e tipo do tumor e o tipo da cirurgia realizada pela equipe de mastologia. Alguns tipos de cirurgia mamárias mais realizadas:

• Mastectomia poupadora de pele: O tumor é removido e quase todo tecido mamário também, porém a pele da mama é poupada.

• Cirurgia conservadora: um quarto ou menos da mama é retirado, dependendo da característica do tumor.

• Mastectomia não poupadora de pele: é extraída a mama em sua totalidade, tumor, parênquima mamária (conjunto de células que são responsáveis pela função de um determinado órgão) e uma porção grande da pele.

Número de cirurgias plásticas mamárias cresceu quase 50% em 5 anos

Mulheres com câncer de mama não raramente precisam passar por mastectomia (cirurgia que retira a totalidade da mama afetada pela doença), além de, em muitas ocasiões, necessitarem de tratamento radioterápico. Todos esses procedimentos, claro, deixam cicatrizes não somente físicas como emocionais.  Buscando minimizar estas sequelas é que muitas mulheres optam pela reconstrução mamária. Não à toa, segundo dados extraídos do Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS) por meio do DataSUS, entre 2014 e 2019, o número de cirurgias plásticas mamárias não estéticas aumentou em 49,44%.

Referência em cirurgia plástica e oncológica no Brasil e um dos pioneiros de técnicas reconstrutivas em câncer mamárioWandemberg Barbosa define a cirurgia de reconstrução de mama como um procedimento física e emocionalmente gratificante.

“A mulher tem nas mamas dois grandes símbolos: a vida através da amamentação e a sensualidade. Quando existe a eminência de perder as mamas, ocorre um impacto psicológico fortíssimo, pois a mutilação física e psicológica é também a perda desses símbolos”, diz.

De acordo com o médico cirurgião, além desses dois elementos simbólicos, vem acrescentar-se um outro, que ao interagir com eles torna ainda mais doloroso processo da descoberta do câncer e da necessidade da cirurgia para a retirada das mamas. Este elemento é a perspectiva de perder a vida.

“Nesse sentido, a atuação do médico responsável pela cirurgia torna-se extremamente difícil, pois necessita ser emético e ao mesmo tempo transmitir ao paciente que uma grande luta está prestes a começar”, afirma.

A respeito da cirurgia, Dr. Wandemberg alerta primeiramente que se trata de um procedimento individualizado e que se a mulher optar por ele, deve fazê-lo para si mesma e não para satisfazer os desejos de outra pessoa ou para tentar se adaptar a qualquer tipo de imagem ideal.

Dr. Wandemberg explica também que o procedimento de reconstrução da mama é constituído de várias técnicas de cirurgia plástica (retalhos, enxertos e implantes), que levam em consideração a forma, a aparência e o tamanho da mama antes da mastectomia.

O médico cirurgião afirma que ao decidir pelo procedimento a paciente precisa estar ciente de que os resultados são variáveis. “Primeiro, ela deve saber que a mama reconstruída não terá a mesma sensibilidade da mama que substitui”, diz. Além disso, a paciente deve estar consciente que ficará com cicatrizes, tanto na mama, quanto no local de onde será extraído o enxerto, que costuma ser costas, abdômen ou glúteo.

Conheça as técnicas empregadas na reconstrução mamária

A cirurgia de reconstrução mamária constitui-se de várias técnicas. São elas:

  • Retalho com músculo, gordura e pele para criar ou cobrir o local da mama mastectomizada
  • Wandemberg explica que nem sempre é possível retirar pele da própria região torácica para fazer o enxerto, haja visto que a mastectomia ou às vezes o tratamento com radiação pode deixar tecido insuficiente para tal.
  • Nesse caso, segundo o médico cirurgião, opta-se por técnicas como o retalho TRAM, que usa como doador músculo, gordura e pele do abdômen; os retalhos SGAP, que não usam músculo, mas sim tecido do tórax posterior ou da nádega; ou o retalho latissimus dorsi, que utiliza músculo, gordura e pele tunelizados no local da mastectomia, permanecendo com seu suprimento sanguíneo original.
  • Expansão da pele saudável para dar cobertura a um implante mamário
  • Trata-se de uma alternativa aos retalhos. Nesse procedimento coloca-se um expansor que é preenchido através de uma válvula interna, dilatando a pele. Conforme Wandemberg essa técnica tem como vantagem possibilitar uma recuperação mais rápida do paciente do que os procedimentos com retalhos. Contudo, costuma ser um processo de reconstrução mais demorado, já que o paciente precisa retornar algumas vezes ao consultório para, por exemplo, passar por uma segunda cirurgia com o objetivo de substituir o expansor, que não é concebido, segundo Wandemberg, para servir como implante permanente.
  • Colocação do implante mamário
  • De acordo com o médico cirurgião, o implante de silicone pode ser um complemento ou uma alternativa para técnicas de retalhos. Quando utilizado como alternativa, ou seja, para reconstruir a mama, requer geralmente o emprego do expansor de tecido.
  • Enxertos e demais técnicas especializadas para criar o mamilo e a aréola
  • Segundo Dr. Wandemberg, essa é a etapa de finalização da cirurgia de reconstrução de mama, quando, através de uma variedade de técnicas, o mamilo e a aréola são também reconstituídos.

Cirurgia pode deixar cicatrizes e perda de sensibilidade nas mamas

Cicatrizes e perda de sensibilidade podem ser algumas das consequências do procedimento de reconstrução mamária. Dr. Wandemberg destaca outros desdobramentos como a perda parcial ou completa do tecido doador e a rigidez da mama (contratura capsular) que advém do uso de implantes, assim como o risco de ruptura.

“No entanto, é sempre bom destacar que implantes mamários não prejudicam a mama. Pesquisas científicas realizadas por grupos independentes não relataram nenhuma relação comprovada entre implantes mamários e doenças autoimunes e sistêmicas, por exemplo”, diz.

Dr. Wandemberg pondera que algumas dessas consequências tendem a ser amenizadas com o passar do tempo. “A sensibilidade na mama pode voltar e as cicatrizes tendem a melhorar, por exemplo”, afirma. O importante, segundo o médico cirurgião é que os resultados finais da construção, após a mastectomia, auxiliam a minimizar o impacto físico e emocional da cirurgia de retirada da mama.

“A maioria das mulheres acredita que as limitações deixadas pela cirurgia são pequenas em comparação à melhoria da qualidade de vida”, conclui.

Da Agência Brasil com SBCP (atualizado em 1/3/23)

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