A biomédica baiana Jaqueline Goes de Jesus, uma das cientistas escolhidas pela fabricante de brinquedos Mattel para ser homenageada com uma boneca Barbie, é uma das homenageadas da exposição Nós – Arte e Ciência por Mulheres, que ocupa o Paço das Artes, em Higienópolis, São Paulo, até 11 de junho. A mostra apresenta as trajetórias e conquistas de cerca de 60 cientistas mulheres em distintos campos do conhecimento, como os da saúde, educação e tecnologia.

A baiana de 33 anos (@drajaquelinegoes) ganhou o noticiário e o reconhecimento mundial durante as Olimpíadas, em 2021, em plena pandemia. quando recebeu o reconhecimento acadêmico e científico como uma das responsáveis pelo sequenciamento genético do coronavírus nos primeiros casos que surgiram da doença na América Latina.

Boneca Barbie em homenagem à biomédica Jaqueline Goes está exposta em mostra no Paço das Artes, em São Paulo (Foto: Karim Kahn / Divulgação)

Doutora pela UFBA (Universidade Federal da Bahia), instituição associada à Fiocruz, e mestre em Biotecnologia em Saúde e Medicina Investigativa, Jaqueline e seus colegas, sob coordenação da imunologista Ester Cerdeira Sabino, conseguiram sequenciar o genoma do vírus SARS-CoV-2 apenas 48 horas após o registro do primeiro caso de covid-19 no Brasil — um tempo abaixo da média mundial, de 15 dias.⁠

A pesquisadora coordena o projeto CADDE (Centro de Descoberta, Diagnóstico, Genômica e Epidemiologia de Arbovírus), uma parceria do Brasil com o Reino Unido. Antes de se debruçar sobre a pesquisa do novo coronavírus, a cientista participou da equipe que sequenciou o genoma do vírus da zika.⁠

“Só consigo pensar em quantas meninas podem ser inspiradas por esta boneca, quantas meninas negras podem olhar e sonhar em seguir a profissão de cientista, onde mulheres ainda são sub-representadas no mundo todo. Essa homenagem destaca a dedicação e o comprometimento que todos os profissionais da linha de frente exibiram no combate à pandemia”, disse Jaqueline à época ao Estadão.

Exposição homenageia outras mulheres negras

Dentre as homenageadas da a exposição Nós – Arte e Ciência por Mulheres, estão marcantes mulheres negras brasileiras que, por meio de suas áreas de estudo, especializações e descobertas, contribuíram e contribuem até hoje para o avanço da ciência e sociedade, ainda que muitas vezes sem o devido reconhecimento por suas conquistas.

Também da Bahia, a médica Maria Odília Teixeira (1884-1970) é considerada a primeira mulher negra brasileira a se formar no curso de medicina em uma época em que as mulheres brasileiras não tinham nem mesmo o direito ao voto.

Maria escreveu sua tese sobre a cirrose alcoólica, em um estudo classificado como pioneiro por tratar com neutralidade um suposto comportamento degenerado de pessoas negras associadas ao consumo excessivo de álcool. Ela trabalhou como médica em sua terra natal e, mais tarde, foi convidada a dar aulas de clínica obstétrica, tornando-se a primeira mulher negra a lecionar na Faculdade da Bahia.

No campo das ciências humanas, a escritora Conceição Evaristo (1946-) também é lembrada pela mostra e homenageada em uma bela obra da artista contemporânea Paty Wolff. Maria da Conceição Evaristo de Brito nasceu em Belo Horizonte e, até concluir o estudo secundário, trabalhou como empregada doméstica.

Graduou-se em letras pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), é mestre em literatura brasileira e doutora em literatura comparada. Em 1990, publicou contos e poemas na série Cadernos Negros e, em seguida, produziu obras que receberam destaque no Brasil e no mundo, escrevendo sobre temas como a discriminação de raça, gênero e classe. É uma das mais importantes escritoras e ativistas pela cultura negra do Brasil.  

Outra mulher negra marcada pelo pioneirismo em sua área de atuação é Enedina Alves (1913-1981), considerada a primeira engenheira negra do Brasil. Formada em Engenharia Civil pela Universidade Federal do Paraná, seus estudos foram financiados pelo dono da casa onde a mãe trabalhava.

Como engenheira, Enedina participou da construção da maior hidrelétrica subterrânea no sul do Brasil, a atual Usina Governador Pedro Viriato Parigot de Souza. O legado de Enedina deu origem ao Instituto de Mulheres Negras Enedina Alves Marques, em Maringá, no Paraná, e, em 2023, o Google homenageou seu 110º aniversário.

Por meio de iconografia histórica, acervo científico e textos informativos, os visitantes da exposição podem conhecer mais sobre a relevante história destas e muitas outras mulheres produtoras do conhecimento, como a professora Beatriz do Nascimento, a filósofa Sueli Carneiro e a cientista da computação Nina da Hora, por exemplo.

‘Nós – Arte e Ciência por Mulheres’ tem entrada franca e segue até 11 de junho de 2023, de terça a sábados, das 11h às 19h; domingos e feriados, das 12h às 18h, no Paço das Artes (Rua Albuquerque Lins, 1345 – Consolação, São Paulo). A mostra é uma realização do Estúdio M’Baraká, do Ministério da Cultura e do Governo Federal, através da Lei de Incentivo à Cultura, com patrocínio master da AstraZeneca, e apoio de acervo do Museu do Índio, Museu Nacional Museu de Ciências da Terra / CPRM, Instituto Butantan, Sítio Roberto Burle Marx e Fiocruz.

Uma Barbie à imagem e semelhança de uma heroína da pandemia

Em agosto de 2021, ao anunciar o lançamento da boneca inspirada em Jaqueline, a Mattel informou que o objetivo ao presenteá-la com “uma boneca única e feita à sua semelhança” era uma forma de “homenagear a grande marca na carreira da cientista que quebrou barreiras, lidou com muitos desafios e agora serve de inspiração para gerações futuras”.

“Enquanto cientista, mulher e negra, ser homenageada pela Barbie e me tornar um modelo para novas gerações é provar que através das oportunidades, o talento e inteligência podem alcançar e até gerar frutos positivos para uma nação”, disse a biomédica, ao destacar a dedicação e o comprometimento que todos os profissionais da linha de frente exibiram no combate à pandemia. “Crianças imaginam que podem ser o que quiserem, mas ver o que podem se tornar, ouvindo as trajetórias de outras pessoas e reconhecendo-se nelas faz toda a diferença.”

Outras cinco mulheres, consideradas heroínas da pandemia, ganharam o reconhecimento da fabricante por trabalharem incansavelmente na luta contra a Covid-19 e por impactarem positivamente a comunidade e ganharam bonecas da marca.

São elas: a enfermeira americana Amy O’Sullivan; Audrey Cruz, que atuou na linha de frente em Las Vegas e teve um importante papel no combate ao preconceito racial e a discriminação; a psiquiatra canadense Chika Stacy Oriuwa, que defendeu o racismo sistêmico na área da saúde; a professora de vacinologia Sarah Gilbert, do Reino Unido, líder no desenvolvimento da vacina de Oxford; e a australiana Kirby White, que desenvolveu uma bata que podia ser lavada e reutilizada, permitindo assim que os funcionários da linha de frente continuassem atendendo os pacientes durante a pandemia.

Jaqueline entrou para a lista de mulheres brilhantes homenageadas pela Barbie como parte da linha “Mulheres Inspiradoras” (Role Models em inglês), junto com a modelo americana Ashley Graham, a cosmonauta russa Anna Kikina, a modelo e ativista britânica Adwoa Aboah, a chef italiana Rossana Maziale e a surfista de ondas grandes Maya Gabeira – a primeira brasileira eleita pelo programa da boneca, em 2019 – dentre outras personalidades, da medicina e da música.

Mulheres inspiradoras

Lisa McKnight, vice-presidente sênior e chefe global da Barbie e bonecas da Mattel, conta como o projeto “Mulheres Inspiradoras” tem avançado fronteiras para inspirar meninas a serem tudo o que quiserem: “A Barbie reconhece que todos os trabalhadores da linha de frente fizeram enormes sacrifícios ao enfrentar a pandemia e os desafios que ela agravou”, diz ela, que complementa:

“Para iluminar seus esforços, estamos compartilhando suas histórias e aproveitando a plataforma da Barbie para inspirar a próxima geração a seguir essas heróinas. Nossa esperança é nutrir e estimular a imaginação das crianças que interpretam seus próprios enredos como heróis”.

Criada em 1959 e hoje com mais de 200 profissões, a Barbie quer mostrar às meninas que elas podem ser tudo que quiserem e que é possível criar um mundo de infinitas possibilidades. Nenhum sonho é grande demais se é possível imaginá-lo – independente se o desejo é ser fada ou astronauta.

A boneca continua a instigar as crianças no Brasil e no mundo e apresentar a conquista de diferentes mulheres, permitindo assim que se sintam inspiradas e empoderadas. Sonhar com o que querem ser é apenas o começo. Descobrir que realmente podem fazer toda a diferença.

Fonte: Mattel, Paço das Artes e Estadão

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