Preso pela morte da bancária Lilian Calixto, de 46 anos, horas após um procedimento estético em seu apartamento na Barra da Tijuca no último dia 14, Dênis César de Barros Furtado, 45, conhecido como Dr. Bumbum, é dono de uma ficha criminal extensa, com 21 ocorrências, incluindo acusações de falsificação de assinaturas, estelionato, porte de arma, ameaça e até um homicídio. Em 1997, na época com 24 anos, Dênis foi considerado suspeito, junto com a mãe, pela morte do então companheiro dela, José Roberto Camillo Monteiro, com um tiro na cabeça dentro de casa no Recreio dos Bandeirantes, no Rio de Janeiro, como informou o ‘G1’.
Na ocasião, um detetite da Polícia Civil que investigava o crime chegou a registrar que os dois caíram em contradição em seus depoimentos, mas o caso não chegou a ser elucidado. O processo foi arquivado em agosto de 2017, a pedido do Ministério Público, meses depois que o crime prescreveu ao completar 20 anos. O médico ainda responde a mais de 10 processos no Tribunal de Justiça do Rio. Um deles, junto com a mãe, por conta da venda de um apartamento.
Formado em Medicina, mas sem especialização em Dermatologia ou Cirurgia Plástica – como seria indicado a quem atuava na área de estética, como ele -, Dênis só poderia atuar como médico no Distrito Federal e Goiás.Por pelo menos seis vezes Dênis foi indiciado pela Polícia Civil de Brasília, por exercício ilegal da Medicina e crime contra o consumidor. No entanto, passou a exercer a Medicina ilegalmente no Rio de Janeiro desde o início de 2017. O Cremerj informou que ele não teria autorização para trabalhar no Estado do Rio.
Em novembro do ano passado o médico foi alvo de uma operação para desmonte de clínica clandestina no Lago Sul, área nobre de Brasília. Como não foi denunciado à Justiça, não é considerado réu. A maioria dos processos sobre o médico relacionados à má prática do exercício corre em sigilo no Tribunal de Justiça do DF.
De acordo com o Conselho Federal de Medicina (CFM), Denis responde a “processo ético-profissional” no CRM-DF. Também segundo o órgão, ele foi alvo de uma “interdição cautelar para o exercício da profissão” em março de 2016, medida suspensa três meses depois pela Justiça. Após a prisão no Rio, o Conselho Regional de Medicina de Brasília (CRM-DF) decidiu cassar o direito de Dênis exercer a atividade. Ele também é primeiro tenente médico do Exército e tem fotos em que aparece fardado em sua clínica particular, o que seria proibido pela organização militar.
Mulher se recusou a fazer procedimento na casa do médico
Este ano, uma mulher que havia pago 18 mil reais contou que desistiu de se submeter ao procedimento depois de saber que seria atendida na casa do médico e não em uma clínica especializada. A paciente registrou queixa na Delegacia da Barra da Tijuca, informando que o médico pretendia atendê-la em uma residência e não num consultório. Exatamente como ocorreu com Lilian Calixto.
Um áudio com o que seria a conversa entre a mulher e a mãe de Dênis, Maria de Fatima Furtado, a paciente questiona sobre o local do procedimento. E Maria de Fátima responde: “Você acha que uma casa é diferente de um consultório? Acho que acabou a relação médico paciente, então só resta lhe devolver o dinheiro”, disse.
“Se eu fosse uma pessoa muito nervosa, extremamente estressada, eu iria para a delegacia agora, agora! Porque eu depositei R$ 18 mil. Agora você quer que eu faça esse procedimento dentro de casa, gente? Pelo amor de Deus!”, disse a paciente.
Maria de Fátima diz que o local era seguro. “Você acha que uma casa é diferente de um consultório?”, ela destaca. “Doutora Fátima, eu contratei o serviço para fazer em uma clínica!”, disse a paciente, indignada. E a mãe do médico encerrou a conversa. “Eu acho que acabou a relação entre paciente e médico, que é uma coisa muito importante, né. Então não tem mais nada para fazer com você. Só devolver o seu dinheiro mesmo”.
Mãe teve o registro de médica cassado em 2015
Também presa por homidício qualificado e associação criminosa, Maria de Fatima, mãe de Dênis, é formada em Medicina e teve seu registro cassado em 2015 pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio (Cremerj), por propaganda enganosa; realização de propaganda de método ou técnica que não são aceitos pela comunidade científica; permissão para que o nome circule em qualquer mídia em matérias desprovidas de rigor científico e promessa de bons resultados a qualquer tipo de tratamento, além de desrespeitar outras normas e resoluções do próprio conselho.
Sobre usar a própria residência para realizar os procedimentos estéticos, o médico não vê nenhuma anormalidade. “É um procedimento padrão a nível ambulatórial, não é necessário atendimento hospitalar, como ocorre nos procedimentos de risco”, disse Dênis nesta quinta-feira (19) logo após ser preso, durante entrevista coletiva em que mais parecia uma celebridade e não um preso por crime contra a vida. “É possível realizar o procedimento em qualquer área aonde esteja presente o médico capacitado em bioplastia. Eu tenho meu livro escrito sobre técnicas de bioplastia. Aonde eu vou eu levo minha maleta médica e dou aulas sobre isso”, argumentou.
Para a delegada que investiga o caso, Dênis sabia do risco de morte no caso do procedimento realizado em Lílian, o que pode indicar que ele seja indiciado por homicídio doloso (quando há intenção de matar). “Ainda que tivesse condições (de fazer o atendimento na casa dele), não pode fazer, sai do campo da imprudência e vai para o risco de matar uma pessoa”, disse Adriana Belém.
A defesa do médico mantém a linha de que ele é inocente até que seja julgado e condenado. advogada Naiara Baldanza disse que “muitas das informações que estão circulando na internet e redes sociais acerca do médico são inverídicas”. “Ninguém é considerado culpado antes da sentença penal condenatória e que qualquer conclusão acerca da morte de Lilian Calixto e a eventual responsabilidade do meu cliente sobre essa fatalidade é precoce”, disse a advogada.
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Hospital diz que Lilian já chegou em estado grave
Nos cinco vídeos que publicou em seu Instagram pouco antes de ser preso, Dênis afirma que a morte da paciente foi “uma fatalidade que pode acontecer com qualquer médico”, que o motivo da morte ainda é “um mistério”, se diz injustiçado e tenta culpar o atendimento dado à paciente no Hospital Barra D´Or, para onde a levou por volta de 23h. Segundo ele, o procedimento em sua cobertura terminou às 19h20 e Lilian deixou o local andando, após conversar com algumas pessoas. “Ela terminou o procedimento por volta de 19h20. Ela desceu escada, conversou, riu, conversou com todo mundo e se sentindo muito bem. Passou oito, nove horas, dez horas, onze horas. Às 23h30 ela sentiu-se mal, sentiu uma queda de pressão”, detalhou.
Mais tarde – este período de tempo as circunstâncias não são esclarecidos nos depoimentos divulgados até então, nem na entrevista coletiva -, Lilian começou a passar mal, relatou enjoo e sofreu uma queda de pressão arterial. O médico verificou que sua pressão estava a 9 por 6, considerada baixa, motivo pelo qual resolveu levá-la para o Hospital Barra D’Or. No entanto, garante, ao chegar lá, Lilian estava lúcida e não se queixava de dor ou outro sintoma. Apenas usou uma cadeira de rodas porque é praxe numa emergência, disse. “Ela (Lilian) saiu do consultório muito bem”, ressalta. “Eu falei ‘vamos ao hospital’. Chegando lá, ela estava andando e lúcida. E depois ela veio a falecer horas após, dentro do hospital. eu quero saber o que é isso.”
Em nota, o Hospital Barra D´Or reafirma que prestou adequado atendimento à paciente e acionou as autoridades competentes que apuram o caso. “A paciente deu entrada na emergência do hospital, no dia 14, por volta das 23h, em quadro extremamente grave, não responsivo às manobras de recuperação e foi a óbito à 1h do dia 15”, afirma.
Sobre as alegações de Dênis Furtado de que teria sido impedido de permanecer no local e acompanhar o caso da paciente, o hospital esclarece que “em momento algum houve impedimento ao acesso de qualquer profissional, familiar ou acompanhante – respeitando as regras internas da unidade”. E ressalta ainda que o acompanhamento de pacientes por seus médicos assistentes é uma rotina no hospital.
Médico diz ser vítima de perseguição e falsas acusações
O médico também se disse vítima de perseguição e de falsas acusações na mídia por pessoas que estão em busca de holofotes. . “Tem muita coisa circulando na mídia que me ofende veementemente”, disse. “É um mistério a causa da morte, mas é uma injustiça o que estão falando de mim. É uma injustiça falarem que eu não sou médico, eu tenho CRM ativo. É uma injustiça dizerem que é um procedimento que não é habilitado”.
O médico ainda afirma que fugiu da polícia porque se assustou ao ser abordado por “homens armados”. “A minha demora nesse pronunciamento, quatro dias depois, é porque sofri um atentado com perseguição de carros, fuzil e tiros. Não sabia se era bandido ou represália da família da vítima. Mas estou sendo culpado de um crime que eu não cometi.”
Sobre a ex-enfermeira Vanessa, uma das testemunhas ouvidas pela polícia, disparou: “É uma pessoa a quem ajudei tanto, fiquei muito chateado. Já ajudei muita gente que não tinha aonde trabalhar. Por incapacidade técnica dela eu tive que demiti-la, afirmou.
“É um absurdo, estão acusando um médico de aplicar silicone industrial, que é um produto ilegal, não é de médico. Eu compro 25 litros de PMMA por mês, recebo da Biossimetric, produto exclusivamente médico para a prática de bioplastia. Tenho mil notas dele e contrato para usar”, ressaltou.
Dênis também rebateu acusações de exercício ilegal da Medicina, por não possuir especializações para atuar com procedimentos dermatológicos. “É uma injustiça me acusarem de não ser médico, eu tenho CRM antigo. É uma injustiça dizerem que é um procedimento em que não era habilitado. Eu vou requerer análise, que façam perícia do glúteo. Estão querendo tirar a boa imagem de 9 mil bioplastias realizadas e dois livros escritos sobre o assunto”, disse ele, ameaçando processar todos que o acusam.
Dênis ainda saiu em defesa da mãe – “ela tem 70 anos, já teve câncer, não atua, não trabalha como médica, não me auxilia” – e também da namorada – “Renata é minha secretária, por que foi presa, é uma injustiça da imprensa acusar a Renata de qualquer coisa, ela é de rede social. Não era auxiliar de enfermagem”. Os três foram transferidos para um presídio em Benfica, Zona Norte do Rio.
Da Redação, com agências (astualizado em 21/07/2018)