morte é algo natural e enfrentar e superar a dor de uma perda faz parte do desenvolvimento de todo o ser humano. Para as crianças, o processo tende a ser ainda mais complexo, por isso, os pais geralmente têm muitas dúvidas sobre como abordar o tema.

O Dia de Finados, celebrado em 2 de novembro, é tradicionalmente um momento de homenagens e lembranças. Mas, para muitas famílias, a data também desperta reflexões sobre um tema difícil de abordar: a morte. O medo não está apenas no ato de morrer, mas, para muitos pais, no que acontece depois — especialmente quando há filhos que dependem de cuidados especiais.

Muitas vezes, o luto é considerado um tabu dentro de uma família e não é exposto para as crianças. “Quando a questão é mal resolvida entre os adultos, os filhos acabam enfrentando dificuldades, por exemplo, no que se refere a lidar com as emoções e mostrar sentimentos diante do falecimento de um ente querido.  Por isso, é importante não se esquivar de  falar sobre o tema com as crianças”, indica Filipe Colombini, psicólogo especializado em orientação parental.

Para mães e pais de crianças com síndromes ou doenças raras, esse sentimento é ainda mais intenso. A preocupação em garantir o bem-estar e a segurança dos filhos após sua ausência pode gerar angústia e silêncios. Mas, segundo a psicóloga Luz María Romero, o diálogo é fundamental — inclusive com os próprios filhos.

A morte faz parte de um processo natural do ser humano. É importante que a informação seja transmitida de forma clara e objetiva, respeitando o nível de compreensão da criança. O silêncio, muitas vezes, causa mais medo e insegurança do que a própria explicação”, destaca Luz María.

Falar sobre a morte com crianças — especialmente aquelas com deficiências intelectuais ou condições que afetam a comunicação — exige sensibilidade, mas também franqueza. Luz María explica que é essencial adaptar o discurso à realidade da criança e não criar metáforas que possam gerar confusão.

Dizer que a pessoa ‘dormiu para sempre’, por exemplo, pode causar medo na hora de dormir. O ideal é explicar que o corpo para de funcionar, mas que o amor e as lembranças permanecem. Isso ajuda a elaborar o luto de forma mais saudável”, completa.

Além da conversa, o apoio emocional contínuo é parte importante desse processo. A gestora do, Instituto Buko Kaesemodel, que atua com famílias de pessoas com Síndrome do X Frágil e Autismo Sindrômico, reforça que o tema da morte precisa ser desmistificado, tratado como um ciclo natural da existência — e não como um tabu.

No fim das contas, falar sobre a morte é, também, falar sobre a vida — e sobre o amor que permanece mesmo depois da ausência física.

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4 dicas de como falar de morte com as crianças

Veja a seguir as dúvidas mais comuns dos pais, esclarecidas pelo psicólogo Filipe Colombini, fundador da Equipe AT.

  • Quando conversar sobre a morte com seu filho? “Apesar de ser uma conversa importante e necessária, o ideal é que os pais e familiares abordem o assunto à medida em que as questões forem levantadas pelos pequenos. Assim, é possível transmitir o que a criança realmente tem necessidade de saber, evitando sentimentos de ansiedade e medo”, explica Colombini.
  • Como abordar o assunto? “É importante que no momento da conversa seja levado em conta em qual fase de desenvolvimento seu filho está. Na primeira infância, a abordagem deve ser mais lúdica do que o conteúdo passado para crianças mais velhas, por exemplo”, diz o psicólogo. “Isso é essencial para não alimentar a imaginação dos pequenos com coisas que eles ainda não entendem”, conclui.
  • Devo levar meu filho a um enterro ou cremação? “O funeral é um rito que marca um término, dando um espaço importante para que alguns sentimentos relacionados ao luto, como tristeza e frustração, possam ser vivenciados. Porém, é importante ressaltar que é essencial respeitar os limites da criança, nunca obrigando seu filho a ir nesse tipo de evento”, afirma Colombini.
  • Devo procurar ajuda profissional? “Quando acontece a perda de alguém querido, um psicólogo pode auxiliar dando tanto apoio às crianças como orientação para os adultos da família. Esse amparo aos pais também é interessante para que os adultos lidem com o próprio luto e, assim, fiquem mais preparados para oferecer suporte aos seus filhos”, aconselha.

Palavra de Especialista

Como falar da morte para uma criança?

Por Marília Lacerda, da Azos*

Falar para uma criança que alguém próximo, que ela ama, partiu, pode parecer uma situação muito complexa. Apesar disso, não podemos permitir que os medos da vida adulta e a vontade de não deixar a criança sofrer, interfira no processo dela de lidar com o luto da perda. De qualquer maneira, haverá o rompimento do vínculo na relação que ela tinha com a pessoa que se foi. Por isso, a transparência pode ser fundamental para o presente e, muito mais, para o futuro. 

É na infância que os seres humanos passam pelo principal processo de desenvolvimento e aprendizado da vida e, a morte, por mais difícil que seja, também precisa ser uma das situações que ela deve conhecer. Por esse motivo, da mesma forma que os adultos encaram o luto, a criança também tem o direito de saber, dentro dos limites que ela possa sustentar (sem tantos detalhes literais, por exemplo) o que está acontecendo e escolher como ela quer enfrentar essa situação.  

Mas na prática, você deve estar se perguntando: Mas como eu conto essa história? Devo levar as crianças aos rituais funerários?

No momento da morte de um ente, os responsáveis podem, primeiro, sentar com a criança e ser transparentes com o que aconteceu, tomando cuidado para manter um discurso leve e infantil. Ao explicar que a pessoa se foi, você pode apresentar a ela que haverá um ritual para se despedirem, contando como funcionará todo o processo.

Um modo de fazer isso é dizendo que a pessoa estará deitada, como se estivesse dormindo, que ela não vai falar; pontuar que algumas pessoas vão estar chorando, também é uma estratégia para que não seja um fato estranho. No final, a caracterização de que o ente está “indo para uma nova casa” pode ajudar a ilustrar o enterro ou cremação.

Mencionar o tempo que vai demorar pode ajudar a criança a lidar com o processo. Ao contar como será todo o evento, você estará dando espaço para que a própria criança escolha se ela gostaria ou não de participar daquele momento. 

É muito comum que nós, adultos, tenhamos o pensamento de: “Se é difícil para nós, imagina para as crianças”. Contudo, na maioria das vezes, as crianças tendem a encarar esses momentos com muito mais naturalidade que os mais velhos. Tudo ainda é muito novo, por isso, é esperado que elas apresentem mais curiosidade do que a angústia que os adultos acabam enfrentando. Todo o processo: pré, durante e pós despedida é muito importante para a construção do sentimento com menos traumas.  

Apesar de ser um momento desafiador, a morte não precisa se tornar um tabu na vida familiar. A criação do vínculo entre você e a criança, será muito importante, principalmente, para o futuro. Não esconder a dor e os sentimentos que a morte de alguém traz, ajuda a criança a também expressar os seus sentimentos e se fortalecer diante da perda, passando pelo processo do luto e ressignificando aquela relação. 

Literatura infantil: uma grande aliada na hora de conversar sobre o luto com as crianças

Por meio dos contos de fadas, os pequenos conseguem explorar seus sentimentos em um ambiente seguro e simbólico

 

luto na infância é um assunto delicado que merece atenção e compreensão. Abordar esse tema desde cedo é fundamental para ajudar as crianças a desenvolverem resiliência emocional, permitindo que lidem com as dificuldades da vida. Informar o membro da família sobre a morte de um ente querido ou de um bichinho de estimação requer um cuidado especial, sendo essencial que essa conversa seja conduzida com sensibilidade e respeito ao nível de entendimento do menor.

Entender o que se passa na mente infantil pode ser um desafio. A abertura de um diálogo a partir da ficção surge como uma estratégia valiosa para ajudar os responsáveis a abordarem o tema de forma mais simbólica e acessível. Segundo a psicopedagoga e escritora Paula Furtado, as narrativas permitem que os pequenos explorem o que sentem (seja tristeza, confusão, medo ou raiva) em um ambiente seguro e simbólico, facilitando a comunicação.

Os contos de fadas, com seus desafios e reviravoltas, ensinam que, mesmo diante de grandes dificuldades, como o luto, existem caminhos possíveis a serem trilhados. Essas histórias frequentemente levam os personagens a um final feliz, o que pode facilitar que a garotada perceba que, apesar da dor, há esperança e superação.

Por exemplo: Em Branca de Neve e Cinderela, as protagonistas perdem suas mães logo no início da história, e a ausência materna é um tema central que molda suas jornadas. No caso de O Rei Leão,luto pela morte do pai de Simba é o ponto crucial da trama e da transformação do protagonista. Mesmo quando o luto não é explicitamente destacado, ele pode ser identificado em pequenas lacunas nas histórias”, comenta Paula.

Para a escritora, trabalhar com assuntos que mexam com as memórias afetivas dos pequenos também é uma abordagem eficaz para minimizar o sofrimento da perda, onde é possível permitir-se relembrar os bons momentos vívidos com uma pessoa ou animal que se foi e entender que, apesar da perda física, o amor e os momentos compartilhados nunca desaparecem.

Falar sobre a morte alivia o sentimento de confusão e medo, e contribui na elaboração da perda. E, muitas vezes, é o adulto que tem medo de abordar o tema, acreditando que protegerá a criança ao evitar o assunto. No entanto, a curiosidade natural das crianças as levam a fazer perguntas sobre a morte e os lutos vividos, e é essencial responder essas indagações com honestidade”, explica a profissional.

Dicas de livros que abordam o luto infantil

De acordo com o dicionário Michaelis, luto é o “sentimento de pesar ou tristeza pela morte de alguém; tristeza profunda causada por grande calamidade; dor, mágoa, aflição”. Diante da perda de alguém importante, é comum sentimentos de desesperança, desalento e dúvidas sobre o futuro.

Contudo, não há regras em um manual a serem seguidas. O luto é vivenciado de maneira singular por cada pessoa. Há quem sinta muito durante um longo período de tempo, outros, encontram escapes em diferentes áreas da vida.

É importante dar tempo e espaço para a expressão das emoções e sentimentos negativos, permitindo a manifestação da dor da perda para que o momento seja elaborado e a pessoa possa seguir em frente. A situação pode tornar-se mais complicada quando quem está experienciando o luto é uma criança.

Dois livros da Cortez Editora podem ajudar as crianças a entenderem um pouco mais sobre o luto e sobre a morte. São eles:

A menina e seus pontinhos, de Silmara Rascalha

A descoberta dos sentimentos, alegrias e tristezas é apresentada por meio de uma bela amizade entre uma menina e um idoso. A autora propõe uma viagem ao próprio coração, em que identidade e memória caminham para a formação e o crescimento, anunciando valores para toda vida. Tudo isso embalado pela atmosfera do Natal, resgatando o sentido da verdadeira festa do amor.

Autores: Lisie de Lucca e Silmara Rascalha Casadei

Categoria: 6 a 8 anos

Páginas: 32

Preço: R$ 57,00

O que faço com esse buraco?, de Marilu Rodrigues

Esta é a história da Marilu e do João. A vida da Marilu virou um parque de diversões quando conheceu o João, e eles foram viver felizes, com a cachorra Amélie e o gato Haroldo. Mas um dia o João morreu. Isso mesmo. Sumiu, assim, do nada. Desapareceu. Então, esta também é a história da Marilu sem o João.

Da Marilu com um buraco gigante no peito. Só que acabou acontecendo uma coisa bem legal: ela descobriu onde o João estava vivendo e transformou sua dor em amor. Quer saber também onde é que a Marilu achou o João? As ilustrações são assinadas por Kristina Sabaite

Autor: Marilu Rodrigues

Ilustrador: Kristina Sabaite

Categoria: Literatura Infantil e Juvenil

Páginas: 36

Preço: R$ 57,00

Com Assessorias

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