Além de filtrar o sangue, eliminando as toxinas do corpo, os rins têm inúmeras outras funções, como manter o equilíbrio nos níveis de potássio e o pH, controlar a quantidade de sal e água do organismo, regular a pressão arterial, produzir hormônios que evitam anemia e doenças ósseas, entre outras. Mas nem todo mundo tem os rins funcionando a plena capacidade.
Mais de 140 mil brasileiros, neste momento, não possuem mais seus rins funcionando normalmente e sobrevivem apenas por terem acesso a um tratamento que substitui a função renal: a diálise (ou hemodiálise). Mas mesmo para aqueles que têm acesso à diálise, a taxa de mortalidade ainda é muito elevada, cerca de 20% ao ano no Brasil.
A doença renal não é simples. E no Brasil, a condição se agrava por falta de acesso tanto à hemodiálise comum, sobretudo para pessoas que vivem longe das maiores cidades, onde há clínicas especializadas, como pela dificuldade em se oferecer no país as melhores terapias existentes no mundo atualmente”, afirma Ana Beatriz Barra, nefrologista e diretora médica da Fresenius Medical Care.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Nefrologia, a doença renal crônica (DRC) se caracteriza por lesão nos rins que se mantém por três meses ou mais, com diversas consequências à medida que a doença progride. Já a Doença Renal Aguda é a que aparece repentinamente, normalmente em hospitalizados, como ocorreu em até 30% dos pacientes atingidos pela Covid em estado grave.
O número de pacientes com doença renal crônica vem aumentando consideravelmente a cada ano e neste 11 de março, Dia Mundial do Rim, autoridades de saúde do mundo todo estão apelando: cuidem melhor dos seus rins e previnam-se das doenças renais no futuro.
Um simples exame de sangue pode diagnosticar DRC
Em geral, nos estágios iniciais, a DRC é silenciosa, ou seja, não há sintomas ou são poucos e inespecíficos. Por isso, o diagnóstico pode ocorrer tardiamente, quando o funcionamento dos rins já está bastante comprometido, muitas vezes em estágio muito avançado, sendo necessário o tratamento de diálise ou transplante renal. Assim, são fundamentais a prevenção e o diagnóstico precoce da doença, com exames de baixo custo, como a creatinina no sangue e o exame de urina simples.
Na maioria dos casos, são os maus hábitos no dia a dia que indiretamente estão relacionados ao desenvolvimento da doença renal no longo prazo. A má alimentação – com alta ingestão de gorduras, açúcares e sal e poucos líquidos -, o sedentarismo, o tabagismo, a automedicação – sobretudo com drogas nefrotóxicas, como os anti-inflamatórios – e a falta de acompanhamento médico são inimigos dos rins”, alerta a nefrologista.
Segundo ela, um simples exame de sangue com dosagem de creatinina, pode indicar se os rins estão falhando e em que estágio da doença renal o indivíduo está.
Mas se as pessoas não fazem checkup, principalmente aquelas de maior risco, que são os diabéticos, os hipertensos, os idosos e os que têm história familiar de doença renal, elas nem ficam sabendo. E a doença renal não costuma dar muitos sinais, principalmente nos estágios mais precoces, onde seria possível evitar a progressão para a diálise. Quando a pessoa descobre, muitas vezes, infelizmente já está tarde para recuperar seus rins”, alerta.
Desafios para tratar o problema no SUS
Uma terapia que poderia aumentar o acesso dos pacientes que vivem longe de clínicas, seria a diálise peritoneal, que é feita em casa, pelo próprio paciente, sob orientação, já que a imensa maioria dos municípios brasileiros não têm clínicas de diálise. Mas seu uso ainda é muito restrito por conta das dificuldades logísticas de distribuição e dos custos dos insumos utilizados e pelo sub-financiamento deste tratamento pelo SUS.
O transplante de rim é considerado a melhor opção de tratamento para os pacientes com falência renal, desde que tenha condições para este procedimento. Os pacientes transplantados têm melhor qualidade de vida e uma sobrevida mais longa do que aqueles que permanecem em diálise. Porém, o número de novos pacientes inscritos anualmente na lista de espera é muito maior do que o número de órgãos doados e o tempo de espera por um rim compatível pode ser de anos.
Nossa luta é para mostrar que hoje é possível viver melhor com a doença renal. Uma parte depende do paciente e de seus cuidadores, para se alimentar adequadamente, fazer atividades físicas, tomar os medicamentos corretamente, fazer acompanhamento médico e os exames solicitados. E a outra, depende mesmo dos planos de saúde e do governo para ofertarem os melhores tratamentos existentes”, afirma a médica nefrologista Ana Beatriz.
Segundo ela, na Europa, se usa um dialisador uma única vez, enquanto no Brasil, reutiliza-se até 20 vezes. “Claro que isso impacta na qualidade do tratamento, no dia-a-dia e na sobrevida dos pacientes”, comenta.
Nova técnica reduz desconforto da hemodiálise
Uma novidade acaba de ser incorporada no rol dos tratamentos obrigatórios que os planos de saúde devem cobrir. A hemodiafiltração online já é utilizada pela grande maioria dos pacientes em Portugal, no Japão e em outros países. Mas no Brasil, a terapia não estava ainda no rol determinado pela Agência Nacional de Saúde (ANS).
O mineiro Fernando Augusto Figueiredo Braga, de 46 anos, segue a rotina da diálise, indo à clínica três vezes por semana. Os dias do tratamento nem sempre eram fáceis e, por diversas vezes, Fernando apresentava pressão baixa e indisposição. Mas há dois anos, passou a utilizar a hemodiafiltração de alto volume e viu a sua vida mudar. “Com a nova terapia, minha pressão se estabilizou e posso dizer que sou outra pessoa. Ter acesso a esse tratamento fez muita diferença, me sinto muito melhor. Foi um divisor de águas na minha vida”, comemora.
Cleanta da Silva, de 55 anos, dialisa há 4 anos e há dois iniciou a hemodiafiltração. “Tive muita melhora de vida, é como se nem tivesse dialisando. Faço academia, passeio, não sinto mais nada. Não fico amarela, fraca, é uma terapia excelente. Antes eu era uma pessoa cansada, sem disposição. Começava um exercício e já queria parar. Agora dou dez voltas na praça e ando 3,5 quilômetros. Vários amigos na clínica relatam a mesma coisa. Alguns viajam sem medo”, afirma.
Dia Mundial do Rim
Idealizado pela Sociedade Internacional de Nefrologia (ISN), o Dia Mundial do Rim tem como objetivo reduzir o impacto da doença renal em todo o mundo, sendo comemorado na segunda quinta- feira do mês de março. A Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN) coordena a campanha no Brasil, desenvolvendo material informativo e educativo sobre os fatores de risco para a Doença Renal Crônica (DRC) para todas as regiões do país visando estimular os cuidados com a saúde dos rins.
Um dos objetivos da campanha mundial de 2021 é ressaltar a importância de educar e conscientizar a população sobre os sintomas da DRC e mostrar que o paciente renal pode ter qualidade de vida e, conviver bem com a doença, seu tratamento e suas diversas fases”, comenta Osvaldo Merege Vieira Neto, presidente da SBN.
O empoderamento do paciente, sua autonomia, envolvimento e resiliência também são tópicos importantes da campanha. O diagnóstico da doença renal crônica pode ser um grande desafio para o paciente, seus familiares, amigos e pessoas do seu convívio social. “Por isso, é fundamental todos entenderem que a DRC, embora apresente sintomas e exija cuidados e gerenciamento com profissionais da saúde, é uma patologia que pode (e deve) ser controlada com tratamentos que visam longevidade, aliviam os sintomas e restauram/substituem a função renal”, explica Dr. Merege.
Para o presidente da SBN, o DMR deste ano repetirá o grande sucesso dos anos anteriores, com um número cada vez maior de atividades, sendo o Brasil o atual campeão em ações em todo o mundo. “Para isso, há o engajamento de diversos profissionais de saúde, assim como da maioria dos associados da Sociedade.” Com o tema “Vivendo Bem com a Doença Renal”, diversas atividades serão realizadas no Brasil visando ressaltar a importância da saúde renal e conscientizar as pessoas sobre a necessidade da prevenção e diagnóstico precoce da DRC.
Dicas para manter os rins saudáveis
1 – Cuide da sua alimentação
Líquidos – Os rins funcionam como filtros, retirando do sangue que passa por ele o excesso de líquidos e de substâncias nocivas ao organismo. Para isso, deve-se garantir que a pessoa esteja ingerindo líquidos adequadamente, pois os rins são bastante sensíveis à desidratação, principalmente em quem já tem alguma doença renal.
O volume de líquido necessário para a pessoa se manter bem hidratado depende de vários fatores, como a temperatura ambiente e o nível de atividade física. Nos dias mais quentes e em plena atividade física, haverá necessidade de ingerir muito mais para se manter bem hidratado. Uma boa dica é ver a cor e o volume de urina. Se estiver com a cor muito concentrada (escura) e com volume reduzido é sinal de que o rim está se esforçando para poupar água, sendo sugestivo que a pessoa está precisando de ingerir mais líquido. Mas cuidado, ingerir além da necessidade, também pode ter consequências negativas para o organismo. Tome a quantidade ideal e dê preferência à agua, que é sem açúcares e sem sal.
Sal, açúcar e gorduras – Alimentos ultraprocessados são muito atrativos e de fácil acesso, mas geralmente têm excesso de sal, açúcar e gorduras. A combinação destes alimentos com o sedentarismo parece ser o caminho fácil para o surgimento das comorbidades que mais tarde levarão à doença renal crônica. Reduza o sal nos seus alimentos feitos em casa também. Lembre-se: Mais de 60% dos pacientes entrando em diálise já eram diabéticos e/ou hipertensos.
2 – Pratique atividades físicas
Abandone o sedentarismo – O bom funcionamento dos rins também depende do bom funcionamento do coração e do sistema circulatório e vice-versa. Ambos atuam na regulação da pressão sanguínea. A falta de atividades físicas prejudica a eliminação das calorias ingeridas em excesso, favorece o ganho de peso, o desenvolvimento do diabetes, a piora no controle da pressão arterial e do colesterol. Suar a camisa faz bem!
3 – Jamais se automedique
Tomar medicamentos como antibióticos, anti-inflamatórios, analgésicos e aqueles para controle da acidez do estômago, desnecessariamente ou em excesso, pode danificar os seus rins. Jamais tome remédios sem orientação médica.
4 – Evite fumar
As partículas tóxicas do tabaco inaladas são prejudiciais aos rins e às artérias, podendo ainda interferir na pressão arterial.
5 – Vá ao médico uma vez por ano
Nem sempre os rins dão sinais de que não estão funcionando bem. Exames de sangue, para a dosagem da creatinina e de urina, para investigar a presença anormal de proteína, podem indicar o estado da saúde renal do indivíduo. O ideal seria que os indivíduos com maior risco de desenvolver doença renal crônica, isto é, os diabéticos, hipertensos, idosos e aqueles com história familiar da doença, fizessem avaliação pelo menos uma vez por ano.