O que você sabe sobre o frequente cansaço dos adolescentes? Será que é apenas preguiça? O quadro não é tão simples. Então, vamos aos fatos: o nosso ritmo biológico é orientado pelo ciclo luz/escuro, que é a principal fonte de informação do corpo sobre horários. A secreção do hormônio melatonina se inicia no escuro e é inibida pela exposição à luz.

A mesma passa pela retina para o núcleo localizado no cérebro, o supraquiasmático, que é considerado o relógio central do nosso organismo. Nos adolescentes, a melatonina passa a ter seu pico de excreção mais tarde, atrasando a sua sensação de sono. O hormônio cortisol, liberado pelas glândulas suprarrenais, é responsável por nos manter em alerta durante o dia. Nos adolescentes, também apresenta secreção tardia, levando ao despertar tardio, e muito sono logo de manhã.  O adolescente é um ser biologicamente programado para dormir e acordar mais tarde, sendo que, na maior parte da manhã, seu cérebro não está em estado de vigília. Isso ajuda a explicar a fama de dorminhocos, principalmente no período da manhã (que é justamente o período de aulas que, em geral, começam cedo). Há evidências de que os adolescentes, na maioria das sociedades industrializadas, não atingem as horas diárias de sono recomendadas durante o período escolar, o que é consistente com estimativas de que, nos últimos 100 anos, o sono encurtou em cerca de uma hora, nos adolescentes. Junte a isso o excessivo uso de telas e a intensa atividade social, que acabam contribuindo para a diminuição de tempo de sono noturno em adolescentes e consequente sonolência diurna. Além disso, a exposição à luz durante a noite aumenta os riscos de doenças, contribuindo para a desregulação desse ciclo diário comportamental e biológico. 

Adolescentes devem dormir de 8 a 10 horas por dia

De acordo com recomendações da American Academy of Sleep Medicine, AASM, a Academia Americana de Medicina do Sono (na sigla em inglês), em um período de 24 horas para uma saúde ideal, os adolescentes devem dormir de 8 a 10 horas por noite. Já as crianças mais novas precisam dormir ainda mais, de acordo com a seguinte tabela:

  • De 4 a 12 meses de idade: de 12 a 16 horas diárias (incluindo sonecas);
  • Entre 1 e 2 anos: 11 a 14 horas (incluindo cochilos);
  • De 3 a 5 anos: 10 a 13 horas (incluindo cochilos);
  • Entre 6 e 12 anos: 9 a 12 horas diárias;
  • Entre 13 e 18 anos: de 8 a 10 horas diariamente.

Caso não cumpram esta carga horária recomendada, também aumenta o risco de acidentes, lesões, hipertensão, obesidade, diabetes e depressão.  Em 2012, a Associação Médica Americana emitiu uma nota relatando preocupação com o ALAN (artificial light at night, luz artificial à noite), como fator de risco para alterações de humor e outras doenças, como neoplasias e obesidade.

Adolescência é a fase essencial para observar fatores de risco

A adolescência é bastante estudada por ser considerada chave para o início de transtornos mentais pelas alterações hormonais e cerebrais, ou seja, é uma fase fundamental para identificar fatores de risco.

No famoso periódico médico internacional JAMA”, de 1 de julho de 2020, foi publicado um artigo interessante sobre o sono em adolescentes. No mesmo, foram abordados os seguintes tópicos.

  • Sono é um fator chave para o desenvolvimento de transtornos mentais. É fundamental para o funcionamento do sistema nervoso central, ocupando um terço de nossas vidas.
  • O sono pode ser um dos principais marcadores do funcionamento cerebral e da saúde mental.
  • Da mesma forma, o sono adequado na infância é fundamental para um bom funcionamento mental e cognitivo.
  • Potencial associação de sono com função de uma parte do sistema nervoso central denominado de lobo frontal, especialmente na primeira infância, quando o cérebro apresenta plasticidade dinâmica, ou seja, mudanças estruturais neurológicas.
  • Alterações de sono precoces podem estar relacionadas a sintomas psicopatológicos futuros.

Insônia e privação de sono

Estima-se que entre 14% e 33% dos jovens se queixam de problemas de sono, enquanto 10% a 40% dos estudantes do ensino médio apresentam moderada ou transitória privação ou insuficiência de sono.  Adolescentes são bastante vulneráveis a distúrbios do sono, principalmente a insônia. O hábito de dormir até mais tarde nos finais de semana, para compensar a falta de sono acumulada, é denominado ‘oversleeping’ e contribui para a alteração do ritmo circadiano, isto é, do ritmo biológico. Enquanto as crianças são seres predominantemente matutinos (dormem e acordam mais cedo), os adolescentes vão se tornando mais atrasados durante a puberdade, atingindo o máximo da vespertinidade próximo dos 20 anos de idade. Geralmente, acometem primeiro as meninas, podendo ser considerado um marcador do final da adolescência.  É fundamental entender e respeitar que o organismo deles trabalha de forma diferente. Daí a importância de organizar as atividades e a vida do adolescente conforme seu ritmo. Cobrar, exigir e pressionar uma rotina fora do seu padrão biológico só irá gerar improdutividade e desgaste a todos.

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