Madrugada de 8 de março de 2021. Henry Borel, de 4 anos, chega sem respirar e com o corpo gelado à emergência do Hospital Barra D´Or, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro. Enfermeiras e um segurança correram em direção à criança e a pegaram dos braços da mãe, a professora Monique Medeiros.

Ela estava com o companheiro, o então vereador em quinto mandato Jairo Souza dos Santos Júnior, o Dr. Jairinho. Durante quase duas horas, médicos fizeram manobras ininterruptas de ressuscitação em Henry. Em vão. Um mês depois, Jairinho e Monique foram presos, acusados de matá-lo.

A investigação da morte do menino tinha tudo para ser arquivada por falta de provas. Mas o poder e o prestígio de Jairinho esbarraram em médicos comprometidos com a vida, em policiais focados em descobrir a verdade e na determinação da jornalista Paolla Serra, em sua busca incansável pelos fatos.

Foi ela quem publicou a primeira reportagem na imprensa sobre o caso.  Paolla acompanhou cada passo da investigação, fez mais de 200 reportagens nos jornais “O Globo” e “Extra” e agora, em Caso Henry – Morte anunciada, apresenta, com riqueza de detalhes, os bastidores do crime que chocou o país, uma trama que mistura romances, vaidade, conflitos, dinheiro, poder e, infelizmente, violência.

Livro lançado às vésperas de nova audiência

O livro chega ainda no início de dezembro às principais livrarias e sites do país, no formato físico e também em e-book será lançado pela Editora Máquina de Livros, no dia 9 de dezembro, na Livraria da Travessa do Shopping Leblon.

No dia 14, a Justiça marcou o início da continuidade da audiência para ouvir as testemunhas do processo sobre a morte do menino Henry Borel. A previsão é de que sejam ouvidas outras duas testemunhas de acusação e as de defesa nos dias 14 e 15.

A juíza Elizabeth Machado Louro, da 2ª Vara Criminal da Capital, iniciou a oitiva no dia 6 de outubro com o depoimento de dez testemunhas de acusação durante mais de 14 horas de audiência.

De acordo com a denúncia, foi vítima de torturas realizadas por Dr. Jairinho, no apartamento em que residiam, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio. O casal está preso desde abril deste ano.

Autora entrevistou a mãe em presídio

Para escrever a história, Paolla mergulhou em centenas de documentos, vasculhou redes sociais e teve acesso aos mais de 20 mil arquivos de texto, aúdio e vídeo recuperados nos celulares de Jairinho e Monique, graças ao software israelense Cellebrite Premium.

A autora, que também é advogada, ouviu mais de uma centena de pessoas, como parentes dos principais envolvidos, médicos, advogados, peritos, legistas e investigadores à frente do caso. Entre as entrevistas, está uma feita em julho com Monique, dentro do presídio, a única que a mãe de Henry deu desde que foi presa, em 8 de abril.

“Procurei jogar luz na história, com máxima atenção aos detalhes e aos relatos que colhi, sempre checando e rechecando as informações. Minha preocupação foi não fazer pré-julgamentos, nem ter uma visão parcial, como reza a cartilha do jornalismo investigativo”, diz Paolla.

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Patrulha protetora não saiu do papel

Henry, infelizmente, não é único. Cerca de 103 mil crianças foram vítimas fatais de maus tratos no Brasil em 2020. A grande maioria (75%) dos casos os agressores foram os próprios pais ou seus acompanhantes, segundo dados da Fundação da Infância e do Adolescente (FIA) e da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).

No Rio de Janeiro, a morte do pequeno Henry Borel, um dos casos mais comoventes de 2021, foi o que inspirou o deputado estadual Wellington José a criar a lei 9296/21, que estabelece a primeira Patrulha Protetora dos Direitos da Criança e do Adolescente do país, a já batizada “Patrulha Henry Borel”.

Embora tenha sido sancionada pelo governador Cláudio Castro há seis meses, a política pública ainda não foi instituída no estado. Para viabilizar a sua implementação, o autor da lei destinou, recentemente, duas emendas que totalizam R$ 2,7 milhões para o início das suas atividades. O projeto propõe que as Patrulhas funcionem para atendimento específico às denúncias de maus tratos a menores, utilizando a estrutura pública já existente para tanto.

Os chamados poderiam ser feitos de maneira anônima, pelo 190 ou Disque-Denúncia – ambos já conhecidos da sociedade. As viaturas receberiam uma identificação específica e os agentes de segurança (policiais militares ou guardas municipais, por exemplo) atuariam de maneira protetiva à cada demanda recebida, fiscalizando as queixas e interrompendo ciclos de violência. Essa capacitação poderia ser obtida por meio de convênios com conselhos tutelares e delegacias especializadas, dando aos mesmos o treinamento adequado para lidarem de maneira mais assertiva com essas ocasiões.

“Qualificar os agentes para que eles atuem de maneira eficaz é imprescindível. O atendimento a esses chamados pode evitar que violências cometidas com menores terminem com a morte deles. Os dados de maus tratos a crianças e adolescentes no País são alarmantes e, por isso, a efetiva implantação dessa lei é tão necessária quanto urgente”, destaca o deputado.

Segundo ele, a pandemia colaborou para o aumento dos casos e que a proximidade das festas de fim de ano são pontos de atenção a mais, pois o consumo de bebida alcoólica costuma ser maior, o que pode colaborar com o aumento de ocorrências dessa natureza.

Somente no ano passado, o estado recebeu cerca de 11.500 denúncias desse tipo. “O Rio de Janeiro está tendo a oportunidade de ser protagonista nacional quanto à defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes. Quantos Henrys mais perderemos? Precisamos mudar essa realidade. Patrulha já”, conclui Wellington José.

Confira alguns trechos do livro

‘Caso Henry – Morte anunciada’

Ataques de descontrole com frequência

Calmo no dia a dia e extremamente educado em seus cinco mandatos na Câmara (nunca levantava a voz e tratava
suas funcionárias como “querida” e “meu amor”), Jairinho tinha ataques de descontrole com frequência, sempre
com mulheres.

Certa vez, uma namorada e a filha de 3 anos foram embora de um restaurante no Recreio, após uma discussão. Ele buscou o carro, mandou que entrassem, mas, como a namorada se recusou, puxou a criança pelos braços, colocou-a no veículo e arrancou em disparada. Alguns minutos depois voltou para pegar a mãe da menina.

Em outra situação, aplicou um mata-leão e arrastou pela casa uma namorada que tentou ver mensagens em seu celular. Com Monique, mãe de Henry, Jairinho teve um ataque de fúria porque chegou em casa e a televisão, recém-instalada, não estava centralizada.

Laudo psiquiátrico encomendado

No dia 5 de abril, Cristiane Izidoro, assessora e braço-direito de Jairinho, tentou agendar uma consulta de emergência para ele com um psiquiatra de prestígio. A ideia era conseguir um laudo que desmontasse a tese de que o vereador sofria de transtorno de personalidade.

“Algo que aponte que ele não tem uma personalidade agressiva ou sádica”, pediu Cristine em mensagem por WhatsApp. Jairinho já estava de prontidão para a consulta em Copacabana. O psiquiatra, porém, recusou-se a atendê-lo. Três dias depois, o vereador foi preso.

Espera na liberação do corpo

Quatro horas após a morte de Henry, Monique ainda estava no Hospital Barra D’Or tratando da liberação do corpo do filho para o IML quando percebeu que Jairinho havia desaparecido. Fez uma chamada pelo WhatsApp, que não foi atendida, e enviou uma mensagem: “Onde você está?”. Ele escreveu dois minutos depois: “Me liga”.

Irritada, a namorada perguntou novamente e Jairinho respondeu: “Estava no posto aguardando você ir na DP”. “No posto com quem? Se estivesse me aguardando estaria no hospital”. Nesse meio tempo, na verdade, o vereador voltou ao Majestic, condomínio de luxo onde morava há dois meses com Monique e Henry, a dez minutos de carro do hospital. Às 14h, um primeiro perito esteve no apartamento e constatou que o ambiente estava milimetricamente organizado.

Vaidoso, vereador fez lipoaspiração

Jairinho sempre foi muito vaidoso. Durante seu primeiro mandato, o vereador se submeteu a uma lipoaspiração, feita por um colega da faculdade de medicina, que retirou gordura de seu abdômen.

A contragosto, ele usou cinta por alguns meses e passou por sessões de drenagem linfática, mas emagreceu e gostou do resultado. Jairinho também fazia tratamentos contra a calvície e culpava o secador de cabelo por atrasos em compromissos profissionais.

Luxo e poder na vida do casal

A primeira viagem de Jairinho e Monique foi para curtir um fim de semana na luxuosa Locanda Della Mimosa, em Itaipava, Região Serrana do Rio. Monique usou um casaco de pele com botas e macacão vermelho com salto alto para jantar no sofisticado restaurante da pousada.

Depois, os dois foram para a suíte, tiraram fotos na hidromassagem com taças de champanhe e fizeram selfies nus, no espelho. Monique havia dito ao ex-marido Leniel Borel, de quem se separara há pouco mais de um mês, que estava com amigas comprando roupas na Rua Teresa, o polo de moda popular de Petrópolis.

Com Assessorias

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