Com sua orla privilegiada, o Rio de Janeiro respira lifestyle saudável e, desde a música ‘Garota de Ipanema’, de Vinicius de Moraes, é símbolo de beleza, mas, infelizmente, ao longo das últimas décadas, a população vem aumentando de peso e ficando cada vez mais sedentária – um fenômeno mundial. Mas quem mora na ‘cidade maravilhosa’ não tem motivo para deixar de fazer atividade física – seja em praças, parques, jardins, na areia das praias ou nos calçadões, não faltam opções gratuitas.

Uma delas é a Academia Arpex, criada na década de 1980 na Praia do Diabo, no Arpoador – entre as praias de Copacabana e Ipanema – no coração da zona sul carioca, num dos pedaços com o metro quadrado mais caro do Rio. O espaço, em meio a cenários paradisíacos, já ganhou apelidos carinhosos, como ”SmartFlintstones’ (em homenagem ao desenho animado que se passa na Idade da Pedra) ou ‘BodyTreco’ , brincando com nomes de algumas das principais redes fitness do país.

A ‘filial’ no Aterro do Flamengo – onde visitamos – também funciona há décadas em um endereço privilegiado: entre o Cristo Redentor e o Pão de Açúcar. Ali, os frequentadores malham ao ar livre e ouvindo o barulho do mar, exibindo seus corpos sarados, geralmente sem camisas, levantando pesos feitos com concreto ou sucata. E o melhor de tudo: o valor da mensalidade é de zero real. Confira nosso vídeo no Instagram:

Saúde, bem-estar e atitude sustentável

O conceito da Arpex tem tudo a ver com ViDA & Ação: saúde, bem-estar e atitude sustentável. Os pesos utilizados pelos frequentadores – em sua maioria homens, de todas as idades – aproveitam sobras de materiais de construção civil, embalagens plásticas sem uso, entre outros resíduos nocivos ao ambiente.

“Estamos interessados em criar um ambiente acolhedor, na qual as pessoas se sintam bem e cuidem de si e dos outros em sentido amplo. Nossa missão é democratizar a prática esportiva e fomentar um estilo de vida saudável e sustentável para o desenvolvimento da sociedade”, dizem os criadores do espaço, que tem até site e perfil na internet.

Ainda segundo eles, prosseguem, “o ganho imunológico de malhar exposto ao sol é cientificamente comprovado, ajuda a melhorar a absorção de vitamina D”. Outra vantagem é permitir que os frequentadores possam aproveitar a proximidade com a praia, se exercitando com trajes de banho e, sem suar tanto, ainda com direito a mergulho após o treino.

Nada de ‘treinar fofo’, garantem usuários

Equipamentos rústicos instalados na década de 80 e renovados na década de 90 são mantidos por usuários (Foto: Arpex Academia)

À beira-mar, o local dispõe de diversos equipamentos artesanalmente criados e geridos pelos próprios usuários, como halteres, kettlebells, caneleiras, bancos, pulleys...De longe, pode até parecer um pouco com o cenário das academias indoor de antigamente, mas de perto se vê como tudo é muito rústico e improvisado.

Apesar da falta de alguns aparelhos modernos, que trabalham diversos grupos musculares, nada de ‘treinar fofo’ – expressão usada quando não é empregada a máxima intensidade de um indivíduo durante um exercício, que sem concentração e nem cadência suficientes acabam utilizando pouco peso.

Como o espaço não conta com instrutores fixos para auxiliar os alunos, os colaboradores da Arpex Academia promovem “aulões” gratuitos para passar instruções. A úlltima edição foi realizada no último dia 12 de agosto, estando aberta a todos que quiserem comparecer.

Sem restrição de idade ou classe social

O aposentado Raimundo José Gomes, de 72 anos, se exercita na academia a céu aberto do Aterro (Foto: Gustavo Wanderley/G1)

Nas academias ao ar livre, não há qualquer restrição de idade e o exercício pode ser feito no horário que melhor se adaptar à rotina do frequentador. O aposentado Manoel Freitas, de 83 anos, frequenta a Arpex Academia há mais de duas décadas no Arpoador.

“Eu sou cria daqui (…) Tem que malhar, não ficar sedentário, ficar vendo televisão em casa. Tem que vir aqui para malhar, pegar sol, fazer exercício. Daí você dura mais, ganha longevidade”, contou ele ao G1.

Já no Aterro do Flamengo, o também aposentado Raimundo José Gomes Pinto, de 72 anos, é um dos mais assíduos e marca ponto na academia ao ar livre “faça chuva ou faça sol”. Como mora perto, sai de casa de manhã.

“Venho correndo até aqui, faço um exerciciozinho e volto correndo para casa. Tranquilidade pura. Pego essa vitamina D, que é maravilhosa para a gente e mantenho o corpo”, revelou ao g1.

E para quem pensa que ultrapassar a barreira dos 70 é algum limite, Raimundo responde que o importante é sempre se manter em atividade e com o corpo em movimento. E nada de etarismo.

“Acham que estou com a idade mais elevada e não posso fazer nada, mas posso sim. Todo mundo pode fazer alguma coisa. Caminhar, fazer exercício, andar de bicicleta. Não deu para correr? Faz caminha”, aconselha.

‘Matriz’ do Arpoador oferece até escolinhas de surfe

Casal praticando yoga na Praia do Arpoador (Foto: Arpex Academia)

Mas engana-se quem pensa que é só musculação que a a Arpex oferece. Na ‘matriz’ do Arpoador, pratica-se frescobol, um esporte tipicamente praiano e carioca, futevôlei e ‘altinha’. O local também é ideal para treinos de boxe e muay thay ao ar livre. Há também quem se contorça na areia com as mais variadas posições da yoga, trabalhando ao mesmo tempo corpo e a mente.

O Arpoador concentra ainda as melhores ondas do Rio e escolinhas para quem está aprendendo a surfar. Perto dali, o Parque Garota de Ipanema possui dois bowls recém-revitalizadas para a prática do skate, novo esporte olímpico.

Frescobol, um esporte tipicamente praiano e carioca, é praticado no Arpoador (Foto: Arpex Academia)

E como democracia é o lema do lugar, em espaço público, a academia está disponível 24 horas por dia para todos. E o local ainda é totalmente petfriendly: “com responsabilidade, todos os animais são bem-vindos”, afirmam.

Equipamentos ficam ‘abertos’ 24 horas por dia para os frequentadores (Foto: Arpex Academia)

Como surgiu e como é mantida a academia ao ar livre

A Arpex surgiu na década de 1980, idealizada por Abílio Bergamini, profissional de educação física. Como o terreno é da Marinha, a União cedeu para a prefeitura e uma marca parceira instalou alguns aparelhos, como barras paralelas. “Nada muito sofisticado, tudo bem rústico”, contou ao G1 o ex-lutador de Muay Thai e colaborador da academia, Bernardo Braga.

Bernardo Braga é colaborador da Arpex Academia — Foto: Gustavo Wanderley/g1
Bernardo Braga é colaborador da Arpex Academia (Foto: Gustavo Wanderley/g1)

Em 1992, Bergamini liderou uma intervenção da comunidade para revitalizar o local, reconstruindo ou reformando os equipamentos e instalando novos. Até uma horta foi criada no terreno próximo. Tudo com o objetivo de democratizar o acesso ao esporte à saúde, principal lema até hoje do espaço, que hoje não tem mais qualquer relação com o poder público.

Para a manutenção da Arpex Academia, os “sócios” mais assíduos participam de um coletivo colaborativo, em que cada usuário ajuda com um serviço ou doação.

“A única obrigação aqui é preservar o nosso trabalho. Não atrapalhe. Não batam os pesos, eles são de concreto, eles quebram. Quem quiser ajudar, sempre vai ser bem-vindo. Tem que respeitar o coletivo. Você tem que fazer o que é melhor para o coletivo. Todos são bem-vindos, ‘everybody welcome’. Venha, treine e seja feliz”, diz Bernardo Braga.

A única “desvantagem”, brincam alguns usuários de redes sociais que gostam de postar seus treinos, é que ao ar livre não existe espelho para tirar fotos e publicar o famoso “tá pago”. Então, o foco fica totalmente na natureza. “O seu ego fica um pouquinho esquecido, e você foca no barulho do mar. É para olhar para o céu: tem sol, lua, estrela e seja feliz”, diz Braga.

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