Em um vídeo publicado em suas redes sociais no início de junho, a cantora e compositora britânica Jessie J revelou que foi diagnosticada com câncer de mama em estágio inicial e terá que passar por uma cirurgia para remoção das mamas. O caso de Jessie reforça um alerta que vem mobilizando especialistas em todo o mundo: o câncer tem atingido cada vez mais pessoas jovens. Dados recentes da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da American Cancer Society (ACS, sigla do inglês American Cancer Society) mostram que, nos últimos 30 anos, os casos de câncer entre adultos com menos de 50 anos aumentaram quase 80% no mundo.
Os dados revelam uma tendência preocupante: o câncer está afetando cada vez mais mulheres jovens e de meia-idade. O estudo, que projeta mais de 2 milhões de novos casos da doença em 2025 nos Estados Unidos, indica uma mudança significativa no perfil dos pacientes, especialmente em relação ao câncer de mama.
De acordo com o relatório, seis dos dez tipos mais comuns de câncer na população norte-americana estão em ascensão, com destaque para os cânceres de mama e colo de útero. Entre 2012 e 2021, a incidência do câncer de mama aumentou cerca de 1% ao ano na população geral, mas o crescimento foi ainda mais expressivo – 1,4% ao ano – entre mulheres com menos de 50 anos.
Os pesquisadores apontam diversos fatores que podem estar contribuindo para esse aumento, incluindo mudanças nos padrões de fertilidade e estilo de vida. O adiamento da maternidade ou a decisão de não ter filhos, por exemplo, pode reduzir o efeito protetor que a gravidez e a amamentação exercem contra o câncer de mama.
Aumento de 59% no número de casos em 6 anos
No Brasil, a situação não é diferente. Dados do Painel Oncologia Brasil, analisados pelo Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem (CBR), indicam que mais de 108 mil mulheres com menos de 50 anos foram diagnosticadas com câncer de mama no Brasil no período entre 2018 e 2023 – uma média de uma em três mulheres diagnosticadas com a doença.
O levantamento mostra que, entre janeiro de 2018 e dezembro de 2023, o Brasil registrou mais de 319 mil diagnósticos de câncer de mama, sendo 157,4 mil em mulheres de 50 a 69 anos, faixa etária atualmente recomendada para o rastreamento.
Entre mulheres com idade entre 40 e 49 anos, foram registrados 71.204 casos de câncer de mama, enquanto 19.576 mulheres de 35 a 39 anos também receberam o diagnóstico da doença. Juntas, ambas as ocorrências representam 33% do total de casos diagnosticados no período. Já entre mulheres acima de 70 anos, foram identificados 53.240 casos de câncer de mama.
Mulheres de 40 a 50 anos já são 30% dos casos de câncer de mama no Brasil
Sociedade Brasileira de Mastologia alerta para morosidade para diagnóstico e tratamento da doença, que deve chegar a 74 mil novos casos em 2024
Em outubro de 2024, durante a campanha Outubro Rosa, a Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM), com base em dados nacionais, revelou que um terço das mulheres diagnosticadas com câncer de mama têm entre 40 e 50 anos de idade. Diante do “rejuvenescimento” da doença no Brasil, a entidade considera imperativo que o Ministério da Saúde reveja a idade mínima para o início do rastreamento do câncer de mama aos 40, e não mais aos 50 anos.
Como fator de atenção, a SBM também destaca a morosidade para diagnosticar os casos. Da mamografia alterada até a realização da biópsia, o tempo de diagnóstico é de 56 dias na região Norte. No Estado de São Paulo, são 26 dias. Da biópsia ao tratamento, o período é ainda maior, com 196 dias no Norte e 164 no Estado de São Paulo.
Com base em estatísticas do SUS (Sistema Único de Saúde) e do Observatório de Oncologia, plataforma dinâmica de monitoramento de dados abertos e compartilhamento de informações relevantes da área de oncologia do Brasil, a SBM indica que mulheres dos 40 aos 50 anos de idade respondem hoje por 30% dos casos de câncer de mama no País. “Estamos diante de uma realidade preocupante, que aponta o ‘rejuvenescimento’ da doença”, afirma a mastologista Rosemar Rahal, membro da diretoria da SBM.
De acordo com o Panorama do Câncer de Mama, painel interativo aberto a médicos, gestores e sociedade civil que reúne informações sobre o SUS, entre 2015 e 2022 mulheres de 40 a 49 anos tiveram diagnóstico tardio em 39,6% dos casos. A faixa etária considerada de risco (entre 50 e 69 anos) responde por 35,3%.
Estes dados também vêm corroborar para uma mudança de paradigma. Atualmente, o Ministério da Saúde preconiza 50 anos a idade mínima para início do rastreamento do câncer de mama, mas é preciso considerar a possibilidade de realizá-lo a partir dos 40 anos”, destaca Rosemar.
Número de óbitos por câncer de mama cresceu 38%
O Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem alerta ainda para o crescimento do total de casos de câncer de mama no país – em 2018, foram registrados 40.953 diagnósticos, contra 65.283 em 2023, um aumento de 59% em seis anos.
São Paulo lidera os diagnósticos em números absolutos, com 22.014 casos no período observado, seguido por Minas Gerais (11.941 casos), pelo Paraná (8.381 casos), pelo Rio Grande do Sul (8.334 casos) e pela Bahia (7.309 casos).
Na faixa etária entre 50 e 69 anos, atualmente contemplada pelo rastreamento prioritário, São Paulo também apresenta o maior número de casos (36.452), seguido por Minas Gerais (18.489 casos), pelo Rio de Janeiro (13.658 casos), pelo Rio Grande do Sul (13.451 casos) e pelo Paraná (10.766 casos).
Os números também mostram que 38.793 mulheres com menos de 50 anos morreram de câncer de mama, o que corresponde a 22% do total de óbitos no período. Entre as mulheres acima de 70 anos, foram registradas 56.193 mortes (32% do total).
Os dados revelam ainda um total de 173.690 mortes por câncer de mama no país entre 2018 e 2023. O número de óbitos passou de 14.622 em 2014 para 20.165 em 2023 – um aumento de 38% nesse período.
Embora tenha ocorrido redução nos óbitos entre 2020 e 2021, especialmente em algumas faixas etárias, os números voltaram a crescer em 2022 e 2023, possivelmente devido ao impacto da pandemia de covid-19, que prejudicou o acesso ao diagnóstico e tratamento adequados”, destacou o CBR.
Ainda de acordo com a entidade, “a interrupção do rastreamento durante esse período gerou um efeito acumulado, contribuindo para o aumento da mortalidade”. O rastreamento precoce, de acordo com o CBR e com base em relatos de especialistas, pode reduzir em até 30% a mortalidade por câncer de mama.
Isso significa que metade das vidas perdidas para a doença poderia ser salva com um diagnóstico no momento certo”, reforçou o colégio.
Para a entidade, os números reforçam a importância de ampliar o rastreamento do câncer de mama por meio da realização de mamografia em mulheres abaixo dos 50 anos e acima dos 70 anos, faixas etárias que não estão incluídas na recomendação padrão de exames preventivos no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
Da Agência Brasil e Assessorias