Jenny Carlson, a talentosa jogadora sueca de handebol que brilhou nas Olimpíadas de Paris 2024, chamou atenção também por outro motivo. Aos 29 anos, ela vive com uma ostomia, por conta da retocolite ulcerativa, uma doença inflamatória intestinal. No Brasil, famosos como a cantora Preta Gil e o empresário, modelo e ator Luciano Szafir deram visibilidade ao assunto, contribuindo para desmistificar e combater o preconceito em torno das pessoas ostomizadas.
Há mais de 600 mil pessoas que passaram pela ostomia ou estomia – um procedimento cirúrgico que cria uma abertura externa no corpo – e usam os acessórios externos para eliminar as fezes, conforme estimativa do Movimento Ostomizados do Brasil (MOBR). O procedimento garante maior qualidade de vida para pacientes com câncer, doenças inflamatórias que atingem o sistema digestivo e outras patologias.
Para muitas pessoas que passaram por cirurgias intestinais devido a condições médicas como câncer de cólon, doença de Crohn ou colite ulcerativa, a bolsa de ostomia é uma solução que possibilita uma vida funcional e com mais qualidade. Neste Dia Nacional dos Ostomizados (16/11), especialistas explicam que diferentes condições exigem a cirurgia para a realização de estomas, que podem ser permanentes ou temporários, conforme informações da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
A adição de uma bolsa na parte externa do corpo nem sempre é bem aceita. Para os pacientes pode ser necessário o acompanhamento psicológico durante o processo. Já a sociedade carece de conscientização, pois há episódios em que os ostomizados são vítimas de preconceito. O posicionamento de famosos que falam abertamente sobre o assunto, mostram os cuidados após a cirurgia e expõe suas bolsas contribui para uma melhor aceitação.
Quando a ostomia é necessária?
Estoma é uma palavra de origem grega que significa “abertura”, “boca” ou “orifício”. No campo da medicina, se refere à cavidade feita em um órgão ou víscera oca para o meio externo, por meio de intervenções cirúrgicas no sistema digestório, nas vias urinárias ou nas respiratórias, de acordo com a Associação Brasileira de Estomaterapia (Sobest).
A ostomia temporária é fechada após um determinado prazo por meio de uma nova cirurgia. Já a definitiva requer que o paciente conviva com ela durante toda sua vida. Segundo a Unifesp, a necessidade para a adição de um estoma pode acontecer por decorrência de vários fatores. Pessoas com doenças de Chagas ou Crohn, malformações congênitas e traumas abdominoperineais podem necessitar do procedimento.
Pacientes com alguns tipos específicos de câncer também podem passar pelo processo. Quem recebe o diagnóstico e as orientações sobre o câncer de colon e de reto – como Preta Gil, por exemplo – também pode apresentar a necessidade de uma ostomia temporária ou definitiva.
A Unifesp explica que o procedimento pode receber nomes variados, conforme a região em que é feita a intervenção cirúrgica. Os pacientes que realizam um estoma no intestino grosso recebem a nomenclatura de “colostomizados”, já os que fazem o procedimento que liga o intestino delgado ao meio externo são chamados de “ileostomizados”.
A rotina de uma jovem atleta ostomizada
A condição de Jenny não a impediu de se destacar no esporte. Desde muito jovem, Jenny demonstrou paixão pelo esporte. Filha de pais atletas, ela começou sua jornada no handebol aos cinco anos, inspirada por sua mãe, que era técnica do time de handebol de seu irmão.
A atleta de Gotemburgo jogou em sua cidade natal até os 19 anos. Quatro anos depois, ela se mudou para a Dinamarca para jogar pelo Ringkøbing Håndbold. A trajetória de Jenny, no entanto, não foi fácil. Nessa época, ela começou a enfrentar os sintomas da retocolite ulcerativa.
Fiquei muito tempo no hospital no verão de 2013. Depois melhorei, e quando chegou a primavera de 2014, aconteceu o mesmo”, contou Jenny à Federação Europeia de Handebol (EHF).
O diagnóstico oficial de retocolite ulcerativa veio em 2014, e os anos seguintes foram uma batalha constante entre altos e baixos. Quando nada mais funcionava, a solução proposta foi uma ostomia, uma cirurgia que remove partes inflamadas do intestino, necessitando o uso de uma bolsa de ostomia.
Essa intervenção cirúrgica envolve a criação de uma abertura artificial na parede abdominal (chamada ‘estoma’), que exterioriza uma parte da alça intestinal, permitindo que as fezes sejam eliminadas diretamente para uma bolsa externa.
A operação marcou um novo começo para sua carreira. Jenny se juntou ao clube Brest Bretagne da Champions League de Handebol e passou a integrar a seleção sueca. Ela ganhou destaque mundial e, atualmente, utiliza sua conta no Instagram (@athletewithstoma) para compartilhar sua rotina como atleta ostomizada e aumentar a visibilidade da condição, que ainda hoje acaba sendo pouco conhecida.
Eu queria ter esse modelo quando passei por isso, que você pode continuar com sua vida, que você pode ser fisicamente ativo e jogar handebol”, afirmou Jenny ao podcast The (Un)informed Handball Hour.
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Famosos compartilham suas histórias com o público
Em 2023, a cantora e compositora Preta Gil mostrou, pela primeira vez, a bolsa de ileostomia em seu perfil no Instagram. A artista foi submetida ao procedimento após ser diagnosticada com câncer no intestino e retirar o tumor. Na publicação, Preta escreveu:
Sim, eu uso bolsa de ileostomia e não tenho vergonha de mostrar, pois essa bolsinha salvou minha vida e me deu a possibilidade de me restabelecer de uma cirurgia que retirou o tumor que eu tinha!”
A ostomia da cantora foi temporária. No final do mesmo ano, ela deixou de usar a bolsa, recomendada pelos médicos apenas durante o tratamento contra o câncer. Uma nova intervenção cirúrgica foi feita, e a artista teve o trato intestinal reconstruído.
Novamente, Preta publicou uma foto exibindo a bolsa nas redes sociais, se mostrando grata ao tempo em que precisou ficar ileostomizada. “Quis deixar registrado uma última foto com a minha bolsinha de ileostomia, ela que tanto me ajudou nesses últimos três meses e meio. Sou grata demais por ter tido a oportunidade de usá-la enquanto meu corpo cicatrizava.”
Outro famoso que também precisou passar pelo procedimento foi o ator e modelo Luciano Szafir. A necessidade de uma ostomia veio após sequelas da Covid-19, em 2021. Na ocasião, ele passou por duas cirurgias.
Uma delas foi para a retirada de um hematoma no intestino, causado por uma embolia pulmonar provocada pela reinfecção do vírus, o que trouxe a necessidade do uso da bolsa de colostomia. O caso do modelo também foi de uso temporário e, em 2022, ele fez a retirada da bolsa de colostomia.
Assim como Preta, Luciano também compartilhou sua história com o público. Na edição do São Paulo Fashion Week de 2021, ele desfilou com a bolsa de colostomia à mostra. Em entrevista à imprensa, ele explicou a relação com a condição.
No início, tive medo e um pouco de dificuldade, algo normal diante do novo. Mas tudo é uma questão de adaptação e logo isso virou rotina. Não deixei de fazer nada por causa da bolsa. Voltei à vida normal e a proposta é justamente mostrar que a bolsa não define ninguém“, declarou.
Com Assessorias