A saúde e o bem-estar dos animais, dos seres humanos e do meio ambiente estão intimamente relacionados. O desequilíbrio de uma das partes acarreta o desequilíbrio das outras. Por isso, inúmeras doenças que surgem após a catástrofe que acomete o Rio Grande do Sul impactam significativamente na saúde humana e animal.
Uma das principais preocupações com a saúde da população e dos animais expostos à água contaminada são as doenças infecciosas, haja vista a grande diversidade de doenças que, através da água, das condições de aglomeração e vulnerabilidade em que as pessoas e os animais se encontram, apresentam maior facilidade de propagação.
Neste cenário, a água presente nos esgotos se mistura à água e à lama formada, se espalhando por todos os lugares e levando junto uma grande variedade de agentes infecciosos. A médica veterinária Luciana Salini Abrahão Pires, professora do Centro Universitário UniBrasil, enfatiza que microrganismos como bactérias, protozoários e vírus podem encontrar condições propícias para a sua manutenção no ambiente e também são mais facilmente disseminados.
Para além dos impactos emocionais e psicológicos, praticamente as mesmas doenças infecciosas e também afetam os animais, sobretudo os domésticos, atingidos pelas cheias e inundações, e ainda se somam a outras como doenças diarreicas agudas, cólera, raiva, tétano, difteria, hepatite A, toxoplasmose, infecções respiratórias e de pele.
Luciana acrescenta que os animais também são vítimas e expostos a diversos agentes infecciosos como leptospirose, esporotricose, giardíase, verminoses, tétano, doenças de pele, além de doenças infecciosas virais. Além das doenças próprias de cada espécie, muitas podem ser transmitidas entre as espécies animais e os seres humanos. São as chamadas doenças zoonóticas ou zoonoses.
Algumas doenças possuem ciclos de transmissão entre animais da fauna silvestre, ou entre animais da área rural. Nestas condições de enchentes, temos o deslocamento dos animais, propiciando uma transmissão de diversas doenças entre as espécies”, explica.
Os animais também estão mais sujeitos a doenças transmitidas por mosquitos, uma vez que as condições ambientais se tornam favoráveis ao desenvolvimento e procriação de mosquitos transmissores.
Sem falar que, tanto animais como os seres humanos estão sujeitos a uma diversidade de traumas e ferimentos, expostos a descargas elétricas levando a choques, e também sujeitos à hipotermia”, complementa Luciana.
Medidas preventivas para humanos e animais
A boa notícia é que, tanto para humanos quanto para os animais, existem medidas preventivas, como a administração de vacinas, explica a professora do curso de Medicina Veterinária.
Raiva
É o caso da raiva para cães e gatos e da leptospirose para cães. Os gatos podem ser acometidos pelo vírus da Leucemia Viral Felina, a FelV, uma doença que leva o animal à queda da imunidade ficando vulnerável a outras doenças, e que também pode ser prevenida com vacina específica“.
Por tudo isso, manter os animais em ambientes seguros e higienizados é fundamental. “Os animais que recebem alimentação adequada e que possuem um acompanhamento veterinário frequente têm maiores chances de combaterem os agentes infecciosos em um primeiro momento”, orienta Luciana.
Leptospirose
A leptospirose é uma das doenças de grande preocupação, por ser transmitida pelo contato com a urina do rato. No momento da enchente, a bactéria Leptospira se mistura com a água e a lama, e tanto os seres humanos quanto os demais animais podem contrai-la se a água contaminada entrar em contato com algum ferimento na pele.
Desta forma, deve-se evitar ao máximo o contato direto com a água das enchentes. O consumo de alimentos e água também deve ser feito com todo o cuidado, evitando possíveis doenças transmitidas pela ingestão de água e alimentos contaminados”, salienta o médico veterinário e professor do UniBrasil, André Reis.
Animais peçonhentos
De acordo com Luciana, historicamente, as regiões dos vales (incluindo a Região Metropolitana de Porto Alegre), a região central e litoral norte do estado possuem maior incidência de acidentes com animais peçonhentos.
Com a subida do nível das águas podem ocorrer mais acidentes com aranhas e serpentes, assim como aumenta o risco da transmissão de doenças transmitidas por água contaminada e vetores, como leptospirose, diarreias e dengue.
Pulgas, piolhos, carrapatos e sarna
Mesmo os animais que foram resgatados precisam de cuidados quanto à presença de pulgas, piolhos e carrapatos. Esses podem causar grandes infestações ambientais, além de serem causadoras de diversas doenças internas aos animais.
Devido às condições de abrigo com grandes quantidades de animais, devem ser tomados cuidados com parasitos externos e ácaros causadores de sarnas, uma vez que são transmitidas pelo contato direto com os animais ou das camas que podem alojar estes microrganismos. A escabiose é uma sarna que acomete animais e também os seres humanos”, ressalta.
Cuidados para proteger os animais
Pensando nisso, André Reis lista os principais cuidados para proteger e salvar os pequenos animais em casos de chuvas fortes e possíveis enchentes. “Proteger e salvar pequenos animais como cães, gatos e coelhos durante chuvas fortes e possíveis enchentes requer planejamento, mas com intervenção rápida. Algumas ações precisam ser tomadas de forma antecipada e preventiva”, reforça o professor.
Para isso, ele divide três principais itens:
- ter os animais com vacinação em dia;
- dispor de um plano de evacuação, com coleiras e caixas de transporte;
- ter dispositivos de identificação dos animais, como placas em coleiras ou microchipagem, além de kits de alimentos e medicamentos sempre de fácil acesso.
No momento da evacuação é importante lembrar que a vida dos animais depende de você. Logo, deixá-los presos ou amarrados é condená-los à morte”, considera a professora Luciana.
Pós-resgate
Uma vez resgatados e salvos, vem a etapa do pós-resgate, em que os animais estão longe dos seus familiares, em estado de estresse elevado e com a saúde debilitada. Portanto, as medidas iniciais visam a manutenção da segurança e da estabilização de condições vitais.
Os animais precisam ser avaliados quanto à presença de ferimentos visíveis que necessitem de intervenções imediatas, identificação de estados de desidratação ou de estados de maior vulnerabilidade como o caso de animais filhotes ou idosos”, pontua a professora Luciana.
Na sequência, precisam ser examinados para a investigação de possíveis doenças infecciosas que possam colocar o animal em risco e também, a fim de evitar a proliferação de doenças a outros animais e aos seres humanos.
Ao mesmo tempo em que as equipes de trabalho atuam nesta etapa de triagem e estabilização, é necessário que haja a busca paralela pela identificação de possíveis lares provisórios para os animais. Vale ressaltar que todas as pessoas envolvidas nos resgates utilizem de dispositivos de proteção para evitar acidentes, como mordidas e arranhões no momento das capturas”, acrescenta.
Importância do médico veterinário
Nestas condições, o médico veterinário tem um papel fundamental, pois é o profissional que detém o conhecimento para atuar diretamente no processo de triagem e cuidado aos animais, assegurando as condições de bem-estar e saúde dos mesmos, justifica o professor André.
Nestes casos, o profissional estará apto a identificar situações de riscos e doenças, realizar os procedimentos para estabilização e tratamento e indicar as principais medidas de prevenção e controle para evitar contaminações dos animais e também prevenir a contaminação do meio ambiente e dos seres humanos”, complementa.
Educação ambiental
Por fim, ambos os professores reforçam que situações de catástrofes podem ter os efeitos minimizados se forem adotadas medidas preventivas. No entanto, para isso, é importante destacar que a educação ambiental deve ser constante, informando e alertando a população sobre os riscos e medidas de prevenção de doenças animais e também de possíveis doenças zoonóticas.
É fundamental atentar-se, também, à exposição dos alimentos à água da enchente. Como citado anteriormente, há uma grande contaminação da água que pode contaminar os alimentos, preparados ou não, e, por isso, é extremamente importante monitorar se os alimentos foram expostos à água antes de prepará-los e ofertá-los. Nos casos de contaminação, devem ser descartados e não devem ser consumidos nem por animais, pois estes também podem adoecer”, orienta o médico veterinário e professor do UniBrasil.
André esclarece que, mesmo após a água baixar, o ambiente permanece sujo e contaminado. Por isso, é extremamente importante realizar a limpeza e desinfecção das áreas para que possam servir como locais seguros para preparo e armazenamento de alimentos.
“Diante disso, é importante que tenhamos uma visão ampla das medidas de controle, vigilância e políticas públicas para a manutenção da saúde e bem-estar de todas estas partes adotando a abordagem da Saúde Única. Para que esta abordagem seja eficaz, é essencial que existam profissionais de diversas áreas trabalhando juntos na promoção do cuidado com animais, com as pessoas e com o meio ambiente”, finaliza e reforça a professora Luciana Pires.
Entenda doenças que podem atingir animais resgatados das enchentes
A tragédia climática que assolou mais de 415 cidades no Rio Grande do Sul resultou também em muitos cães e gatos, resgatados, alojados em abrigos e precisando de cuidados. Leptospirose, traqueobronquite infecciosa canina,parvovirose, cinomose, gastroenterite e dermatopatias são algumas das doenças que podem aparecer nestes animais.
Contato com águas sujas e contaminadas e também com outros animais que possam estar com alguma doença representam graves riscos para a saúde dos pets. Entre as enfermidades mais comuns de serem diagnosticadas neste momento estão a Leptospirose, traqueobronquite infecciosa canina, parvovirose, cinomose, gastroenterite e dermatopatia, que afetam gravemente a saúde dos animais e exigem atenção redobrada.
Juliana Dhein, médica-veterinária e gerente técnica do Grupo Hospitalar Pet Support, explica algumas características de cada uma dessas doenças:
Leptospirose: causada pela bactéria Leptospira, esta doença pode ser transmitida tanto para animais quanto para humanos, principalmente através de água contaminada pela urina de roedores infectados. Nos animais, os sintomas incluem febre, fraqueza inapetência, icterícia e, em casos graves, falência renal e hepática.
Parvovirose: altamente contagiosa, a parvovirose é causada por um vírus e afeta principalmente filhotes e cães não vacinados. Os sintomas incluem vômitos, diarreia severa,desidratação, podendo levar à morte se não tratada rapidamente.
Cinomose: essa doença viral afeta o sistema respiratório, gastrointestinal e nervoso dos cães. Os sinais clínicos variam desde febre, tosse e secreção ocular/nasal, lesões cutâneas abdominais até convulsões. A cinomose, infelizmente, é frequentemente fatal.
Gastroenterite: inflamação do trato gastrointestinal, a gastroenterite pode ser causada por infecções virais, parasitárias, além de causas ambientais. Os sintomas incluem vômitos, diarreia, dor abdominal e desidratação, exigindo cuidados médicos imediatos para evitar complicações graves. Mudanças repentinas de dieta, além de ingestão de água contaminada podem ser causas.
Traqueobronquite infecciosa canina: doença contagiosa de trato respiratório, pode ter importante disseminação em locais com muitos cães. O sinal clínico mais frequente é a tosse seca de surgimento agudo.
Dermatopatias: Lesões de pele variadas podem ocorrer pelo contato com águas contaminadas, tempo excessivo em submersão e também pelo controle inadequado de ectoparasitas. O tratamento irá variar a depender do tipo de lesão e sua causa base.
Quanto ao combate dessas doenças, a médica-veterinária destaca a importância da vacinação e do controle de ectoparasitas e ambiental para prevenir a proliferação: “a vacinação regular é a maneira mais eficaz de proteger os animais contra doenças como a parvovirose e a cinomose. Além disso, isolamento e medidas de higiene rigorosas, dentro das possibilidades do momento, são essenciais para reduzir o risco de disseminação das doenças intectocontagiosas. Para quem está com seu pet em casa, é importante lembrar que ao menor sinal de doença deve procurar atendimento veterinário“.
Pós-enchentes: demora para tratamento de doenças infecto-contagiosas amplia riscos de mortalidade
Infectologista aponta atenção especial com crianças e idosos em circunstâncias de perigo
O risco de mortalidade de doenças infecto-contagiosas pode ser ampliado conforme a demora do atendimento médico. A preocupação, inerente a infectologistas, se amplia em um momento em que grande parte dos moradores do Rio Grande do Sul foram afetados por uma enchente devastadora.
Para a infectologista Thallyta Maria Tavares Antunes, que atende na rede de medicina acessível Clínica da Cidade, a atenção com o tempo de atendimento deve ser ainda mais intensa com crianças e idosos – cuja vulnerabilidade com doenças adquiridas por águas contaminadas pode ser maior.
O atendimento médico é importante para identificar a ocorrência desses tipos de doenças porque geralmente geram desidratação e podem levar ao óbito com certa velocidade, especialmente nesses tipos de pacientes. A demora do atendimento pode agravar processos de desnutrição e desidratação”, explicou.
O contato com água e alimentos contaminados pode levar ao desenvolvimento doenças como a leptospirose e hantavirose, doenças diarreicas causadas por bactérias, vírus e protozoários, a ocorrência de cólera e de hepatite A.
“São doenças curáveis, desde que o atendimento seja breve”, destacou a médica. Os sintomas das doenças podem variar, mas incluem febre, dor de cabeça, sangramento, olhos vermelhos, dor muscular e vômitos.
Embalagens e enlatados
A infectologista orienta ainda em relação a cuidados importantes que os moradores devem tomar para evitar contaminações por meio de embalagens ou alimentos enlatados, por exemplo.
“Tem que sempre prestar atenção se essas embalagens estão bem fechadas, especialmente se os enlatados não tem nada amassado, porque esse tipo de material pode transmitir algumas doenças infecciosas como o botulismo e o tétano. Os alimentos embalados, se tiverem furos, alguma coisa, pode ter tido algum rato que passou, deixando algum dejeto neste alimento que pode transmitir doenças como a leptospirose, por exemplo”, alertou, Antunes.
Médico alerta para cuidados básicos com saúde após contato com as enchentes
Cautela é fundamental nessas situações e pode salvar vidas
O contato com águas contaminadas em desastres naturais, como o que estamos vendo no Rio Grande do Sul, traz preocupações para a saúde pública. Com pessoas se deslocando de outros estados para ajudar na linha de frente e outras retornando do local, é preciso ficar atento a possíveis sintomas de doenças como leptospirose, hepatite A, tétano e acidentes com animais peçonhentos. O médico Rodrigo Athanazio, da Melvi Saúde, explica os sintomas mais comuns de cada uma das enfermidades.
Leptospirose
“A leptospirose é uma doença bacteriana presente na urina de ratos e outros animais. É transmitida quando a água contaminada entra em contato com a pele, principalmente se houver algum ferimento exposto, mas também pelos olhos, nariz ou boca. Se apresentar febre, dor de cabeça, urina escura e dores no corpo, sobretudo nas panturrilhas, alguns dias após o contato com a água ou lama contaminada, procure o serviço de saúde mais próximo imediatamente e informe aos profissionais que você vivenciou a enchente”, diz.
A leptospirose tem cura, e o diagnóstico e tratamento podem ser feitos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Hepatite A
Dr. Rodrigo esclarece que a hepatite A é um vírus transmitido pela ingestão de água ou alimentos contaminados. Entre os sintomas mais comuns estão mal-estar, vômitos, febre, náuseas e pele e olhos amarelados.
“A pessoa pode apresentar os sintomas entre 15 e 45 dias após a exposição ao vírus. A vacina está disponível no SUS para alguns grupos prioritários ou pode ser tomada em clínicas de imunização de forma particular.”
Tétano
O tétano é uma infecção causada pela toxina de uma bactéria e pode ser encontrada em diversos ambientes. De acordo com o médico, a contração acontece através de ferimentos ou lesões de pele, como cortes ou queimaduras. Os sintomas surgem, em média, entre três e 21 dias e são febre, dificuldade de engolir e contrações musculares. Importante ressaltar que o tétano também pode ser prevenido através da vacinação que está disponível para todos indivíduos no do SUS.
Acidentes com animais peçonhentos
Durante as enchentes, animais como cobras, aranhas e escorpiões buscam locais secos para se alojarem. “Se você for picado não amarre, corte ou chupe o local da ferida. Apenas lave com água e sabão e procure o serviço de saúde imediatamente”, discorre Dr. Rodrigo.
Se você está se voluntariando para os resgates ou ajudará após as águas baixarem, mantenha boas práticas: cubra cortes, queimaduras ou arranhões com bandagens à prova de água; utilize sapatos e luvas impermeáveis e não ande descalço ou com sapatos abertos; e cuidado ao manusear entulhos.
Problemas de saúde mental decorrentes da tragédia
As enchentes no Rio Grande do Sul são um lembrete doloroso dos desafios que a natureza pode impor e da resiliência do povo gaúcho. No entanto, é essencial que não esqueçamos do impacto silencioso que essas tragédias têm na saúde mental da população. Ao reconhecer e enfrentar a crise de saúde mental desencadeada pelas enchentes, estaremos dando um passo importante para a recuperação e o bem-estar de todos os afetados por esses desastres.
Médico alerta para riscos do uso inadequado de medicamentos
As recentes enchentes no Rio Grande do Sul trouxeram consigo uma série de desafios de saúde pública, como o aumento significativo de doenças de veiculação hídrica, dermatites, infecções respiratórias e doenças transmitidas por vetores como dengue, zika e chikungunya.
O médico e diretor das áreas médica e regulatória da Sandoz, Dr. Cleber Sato, ressalta que é fundamental que as pessoas busquem orientação profissional imediato ao se depararem com sintomas graves ou persistentes.
“Se a febre não baixa com antitérmicos, se ocorrem sangramentos inexplicáveis, dor intensa, confusão mental, dores musculares e nas articulações, por exemplo, podem sinalizar a piora de quadros dessas doenças mais comuns em casos de enchentes”, comenta o diretor da Sandoz.
Sato alerta, ainda, para o uso de medicamentos específicos para prevenção de doenças pós enchentes deve ser cuidadosamente considerado e orientado por profissionais da saúde.
“Os medicamentos não devem ser utilizados sem indicação médica devido aos riscos de efeitos colaterais e resistência às moléculas, prejudicando a eficácia do tratamento”, diz o médico, que enfatiza: “os profissionais de saúde podem avaliar corretamente a condição do paciente, prescrever o tratamento adequado, monitorar os efeitos colaterais e ajustar a terapia conforme necessário”.
Doação de R$ 5 milhões em medicamentos à região
A Sandoz – farmacêutica multinacional líder em genéricos e biossimilares – doou um total de R$ 5 milhões em medicamentos à população do Rio Grande do Sul, incluindo medicamentos para leptospirose e doença de Alzheimer, hipertensão, aumento do colesterol, para atender as demandas mais urgentes dos municípios afetados. Foram 242 mil medicamentos entregues à Secretaria de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul com apoio do Sindusfarma e logística da VOAR Aviation.
O desafio oculto das enchentes no Rio Grande do Sul: a crise de saúde mental
Ulisses Jadanhi, mestre psicologia forense e criminal psicanalista chefe na clínica Enlevo
As enchentes são desastres naturais devastadores que afetam milhões de pessoas em todo o mundo. No Brasil, o estado do Rio Grande do Sul tem sido particularmente afetado por essas catástrofes, que não só causam danos materiais e econômicos, mas também têm um impacto significativo na saúde mental da população. O trauma, o estresse e a incerteza resultantes das enchentes podem desencadear uma crise de saúde mental que muitas vezes passa despercebida, mas que precisa ser abordada com urgência.
As enchentes são eventos traumáticos que podem deixar cicatrizes profundas na psique das pessoas afetadas. A perda de casas, pertences e até mesmo de entes queridos pode gerar sentimentos de desamparo, tristeza e luto. A incerteza sobre o futuro e a dificuldade de reconstruir a vida após a tragédia podem levar à ansiedade e ao estresse crônico. Além disso, a exposição a condições insalubres durante as enchentes, como a água contaminada, o risco de doenças e a falta de saneamento básico, pode agravar ainda mais os problemas de saúde mental.
A crise de saúde mental desencadeada pelas enchentes é agravada pela falta de recursos e apoio adequados. O sistema de saúde, já sobrecarregado, muitas vezes não está preparado para lidar com a demanda adicional de atendimento psicológico e psiquiátrico necessários nessas situações. Os profissionais de saúde mental, por sua vez, enfrentam uma carga de trabalho excessiva e podem não ter a capacidade de atender a todos que precisam de ajuda. Além disso, a estigmatização em torno das questões de saúde mental ainda é um obstáculo significativo, impedindo que muitas pessoas busquem o apoio de que precisam.
Para enfrentar esse desafio oculto das enchentes, é fundamental que o poder público e a sociedade como um todo reconheçam a importância da saúde mental e implementem medidas eficazes de prevenção e suporte. Primeiramente, é necessário investir em programas de preparação e resiliência, que ajudem as comunidades a se prepararem para as enchentes e a lidar com as consequências emocionais. Isso inclui a criação de planos de evacuação claros, a melhoria da infraestrutura de abrigos temporários e a promoção de treinamentos em primeiros socorros psicológicos.
Além disso, é fundamental fortalecer o sistema de saúde mental, garantindo que haja profissionais capacitados e recursos adequados disponíveis para atender às necessidades da população. Isso envolve a contratação de mais psicólogos e psiquiatras, a expansão dos serviços de saúde mental nas áreas afetadas pelas enchentes e a implementação de programas de apoio psicossocial de longo prazo para as vítimas.
Por fim, é crucial combater a estigmatização em relação à saúde mental e promover a conscientização sobre a importância do cuidado emocional em situações de desastre. Campanhas de informação e educação podem ajudar a desmistificar os problemas de saúde mental, encorajando as pessoas a buscar ajuda quando necessário e a oferecer apoio uns aos outros.