Atualmente, no Brasil, mais de 70% dos casos de câncer colorretal – que engloba câncer de cólon (intestino grosso), reto e ânus – são diagnosticados em fase avançada da doença, com menos chances de tratamento e sobrevida do paciente. Para se ter ideia do tamanho do desafio na saúde pública, em 2010, foram 23 mil casos de câncer de intestino – como a doença é popularmente conhecida. Em dez anos, dobrou o número de casos. Hoje, este já é o segundo tipo de câncer mais frequente, tanto para homens, como para mulheres.
“É uma catástrofe, um problema importante e precisa ter uma sensibilidade maior do poder público para essa questão. A incidência vem aumentando de forma alarmante. Estamos falando de tratamentos caríssimos, prolongados, sofrimento imenso do paciente e da família, afastamento de trabalho, necessidade de uso de bolsas de colostomia”, aponta o presidente da Sociedade Brasileira de Coloproctologia (SBCP), Hélio Moreira, nesta terça-feira (12) à Agência Brasil.
Ele defendeu que o governo federal crie um programa nacional de rastreamento do câncer de intestino. Hoje, tanto a colonoscopia como a pesquisa de sangue oculto nas fezes são feitos no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). “Mas é preciso organizar melhor o sistema, ampliar a quantidade de clínicas que possam oferecer esses exames, para poder atender a demanda que um programa de rastreamento de câncer de intestino vai gerar”, disse.
O presidente da SBCP admitiu que, em um primeiro momento, o programa demandará muitos recursos, mas haverá bons resultados futuramente, reduzindo os números de casos e mortes pela doença.
“No médio e longo prazo, vai se observar que uma quantidade imensa de pacientes que teriam câncer não terão mais. Serão tratados endoscopicamente, uma quantidade imensa de pacientes que são diagnosticados hoje em uma fase avançada de câncer, onde o tratamento envolve cirurgia, quimioterapia, radioterapia e, mesmo assim com taxas muito baixas de sobrevida dos pacientes”, ressalta.
Moreira esclareceu que, uma vez que se implementa um sistema de rastreamento adequado, diminui o gasto com tratamento dos pacientes que têm câncer e melhora significativamente suas chances de cura. Então, no médio e longo prazo, esse investimento inicial é amplamente justificado. “Para salvar uma vida, qualquer gasto é justificado. Mas até do ponto de vista financeiro, é muito mais interessante um sistema de rastreamento do que deixar as coisas como estão hoje”, indicou.
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Remoção de lesões e pólipos evita formação de tumor
O médico observou que, diferentemente do câncer de mama e de próstata, no câncer de intestino, a prevenção é mais eficiente. .
“Quando você fala de câncer de mama ou de próstata, a recomendação para realização de exames de prevenção, na verdade, tem objetivo de diagnosticar a doença em um estágio precoce. Ela já é um câncer. Já no câncer de intestino, o rastreamento é para detectar lesões que ainda não viraram câncer e, quando tratadas com a remoção, você evita de o indivíduo ter o câncer”.
Chamadas de pólipos ou verrugas, as lesões nascem dentro do intestino e, se não diagnosticadas precocemente, podem vir a desenvolver tumores. Com a colonoscopia, esses pólipos são tratados. Tirando esses pólipos agora, o médico pode recomendar a repetição desse exame para rastrear novos pólipos em um período longo, dando aos indivíduos a chance mínima deles terem um câncer de intestino com esse tipo de rastreamento.
Hélio Moreira esclareceu que embora aquele pólipo tenha sido tratado, a pessoa pode ter novos pólipos no futuro. Mas o tempo que decorre entre surgir um pólipo e ele virar um câncer varia de 8 até 10 ou 12 anos, destacou. “Não é uma coisa rápida”.
Principal sintoma é o ‘sangue vivo’ nas fezes
Moreira reforçou que no diagnóstico do câncer de intestino na fase inicial, o sintoma mais comum é não ter sintoma. “Quando tem sintomas, normalmente já são casos mais avançados e é preciso que a população entenda que devem ser valorizados”.
O principal sintoma é a presença de sangue vivo nas fezes. Outros aspectos importantes são o emagrecimento de causa desconhecida, o surgimento de uma anemia de causa indeterminada e a presença de uma alteração do hábito intestinal.
“Ou seja, de repente, o intestino, que funcionava de uma forma, começa a mudar o jeito de funcionar: ele prende, tem episódios de diarreia, depois prende de novo. Quando isso acontece, valorize os sintomas e procure um médico especialista para que ele possa avaliar a necessidade de uma investigação mais aprofundada”, disse.
Este é o quarto ano da campanha Março Azul. Até o final deste mês, serão realizadas ações em todas as capitais e em algumas cidades de médio e pequeno porte, com caminhadas, distribuição de panfletos, audições públicas, entrevistas, tudo com interesse maior de alertar a população sobre esse tema, tão importante para a saúde.
Fatores de risco e prevenção
Estimativa do Instituto Nacional de Câncer (Inca), vinculado ao Ministério da Saúde, aponta 45.630 novos casos de câncer colorretal no Brasil, em cada ano do triênio 2023 a 2025, afetando potencialmente mais de 136 mil brasileiros. O risco estimado é de 21,10 casos por 100 mil habitantes, divididos entre 21.970 homens e 23.660 mulheres. Dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Datasus, referentes a 2020, indicam que 20.245 pessoas morreram pela doença.
As estatísticas reforçam a urgência de ações preventivas e de conscientização. Junto com a Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (Sobed) e a Federação Brasileira de Gastroenterologia (FBG), a entidade organiza a campanha Março Azul, que tem como objetivo conscientizar sobre a importância do diagnóstico precoce que, neste caso, pode representar a cura antes mesmo de surgirem os sintomas.
As três entidades enfatizam que o tumor intestinal pode ser influenciado por diversos fatores de risco, incluindo histórico familiar de câncer, sobrepeso ou obesidade, idade igual ou superior a 50 anos, uma dieta rica em alimentos processados e carne vermelha, tabagismo, consumo excessivo de bebidas alcoólicas e a presença de doenças inflamatórias intestinais, como retocolite ulcerativa e doença de Crohn.
A prevenção do câncer de intestino está ligada a um estilo de vida saudável, que inclui prática regular de exercícios físicos, manutenção do peso ideal, abstenção do tabagismo e consumo moderado de bebidas alcoólicas. Além disso, recomenda-se a adoção de uma dieta rica em verduras, frutas, legumes, farelos e cereais integrais, beber cerca de dois litros de água por dia e limitar o consumo de carne vermelha e alimentos ultraprocessados e embutidos.
Campanha Março Azul leva colonoscopia a populações ribeirinhas
Moradores de grupos de risco de 50 a 70 anos, da cidade ribeirinha de Óbidos (PA), de difícil acesso, onde só se chega de barco, fizeram exames de sangue oculto nas fezes. Aqueles cujo resultado foi positivo estão sendo submetidos agora a exames de colonoscopia, para prevenir o câncer colorretal, popularmente conhecido como câncer de intestino.
A ação é resultado da campanha Março Azul, que este ano tem como lema “Médico e paciente: uma parceria que salva vidas! Juntos na prevenção do câncer de intestino”. Já foram realizadas mais de 170 das 460 colonoscopias que estão previstas para esta população. Dois pacientes foram diagnosticados com a doença e cerca de 35% apresentavam pólipos ou lesões que foram removidos e, consequentemente, tratados.
“Todas são pessoas que não têm sintoma nenhum. O único fator de risco que foi levantado para definir o rastreamento foi a idade e, em seguida, presença de sangue oculto nas fezes ou não”, disse Moreira.
A cada ano, o mutirão de exames presenciais é feito em uma cidade específica. No ano passado, por exemplo, ocorreu em Cairu (BA) e, no ano retrasado, em Pilar (AL). “A gente vai escolhendo, normalmente, cidades de difícil acesso, com pouca oferta de exames de endoscopia para a região, onde realmente a campanha pode trazer um impacto gigantesco para aquela população”, disse o presidente da SBCP.
A Campanha Março Azul 2024 está disponível no site, onde podem ser encontradas informações sobre a doença, incluindo métodos de prevenção, fatores de risco, diagnóstico e opções de tratamento. A iniciativa conta com o apoio institucional da Associação Médica Brasileira (AMB) e do Conselho Federal de Medicina (CFM).
Com Assessorias