Uma pesquisa recém-divulgada pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) projeta que, entre 2045 e 2054, a proporção de mortes causadas pelo calor deve mais que dobrar, passando de 0,87% para 2,06% do total de óbitos. O estudo analisou dados de mortalidade e projeções climáticas em 326 cidades da Argentina, Brasil, Chile, Costa Rica, El Salvador, Guatemala, México, Panamá e Peru, incluindo capitais brasileiras como São Paulo e Rio de Janeiro.

Entre os achados da pesquisa, realizada por especialistas de diversos países, constatou-se que, embora as mortes relacionadas ao frio devam diminuir nas próximas décadas, essa redução não será suficiente para compensar o aumento expressivo das mortes associadas ao calor. Os resultados do estudo, criado para compreender os impactos futuros da mortalidade relacionada às temperaturas extremas, foram publicados recentemente na revista Environment International

Liderada no Brasil pelo Prof. Dr. Nelson Gouveia, titular do Departamento de Medicina Preventiva da FMUSP, este estudo faz parte do projeto Mudanças Climáticas e Saúde Urbana na América Latina (SALURBAL-Clima) e reúne pesquisadores de instituições de nove países latino-americanos e dos Estados Unidos. Com duração de cinco anos (2023-2028), o SALURBAL visa gerar evidências que relacionam as mudanças climáticas aos impactos na saúde na região.

Impactos da desigualdade social

No Brasil, foram utilizados dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do DataSUS, e do Censo Demográfico, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Embora o estudo não forneça recortes por cidade ou grupo populacional, ele indica que as áreas urbanas densamente povoadas tendem a enfrentar maiores riscos diante do aquecimento futuro.

As pessoas idosas e as mais pobres são as que mais sofrem. Quem vive em áreas periféricas, em moradias precárias e sem acesso a ar-condicionado ou a espaços verdes terá mais dificuldade para enfrentar ondas de calor cada vez mais intensas”, ressalta o Prof. Dr. Nelson Gouveia, um dos autores do estudo.

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Agravamento de doenças comuns

O impacto das temperaturas extremas vai além das mortes, agravando também doenças já prevalentes na população, como problemas cardiovasculares e respiratórios.

As mortes são apenas a ponta do iceberg. O calor extremo aumenta o risco de infartos, insuficiência cardíaca e outras complicações, especialmente em pessoas com doenças crônicas”, afirma o professor.

O estudo destaca ainda que pessoas idosas e crianças estão entre os grupos mais vulneráveis, tanto por fatores fisiológicos quanto pelas condições sociais que limitam sua capacidade de se proteger diante do calor intenso.

Urgência na adaptação e nas políticas públicas

Os resultados do trabalho reforçam a necessidade de investimentos em adaptação urbana e em políticas de saúde pública. Entre as medidas recomendadas, destacam-se:

  • Sistemas de alerta precoce para ondas de calor, com comunicação clara e acessível à população;
  • Expansão de áreas verdes e criação de corredores de ventilação urbana para reduzir ilhas de calor;
  • Adaptação da infraestrutura urbana, incluindo telhados verdes, pavimentos permeáveis e sombreamento em espaços públicos;
  • Protocolos de saúde pública para atendimento prioritário a pessoas idosas e pessoas com doenças crônicas, como o já implementado no Rio de Janeiro;
  • Educação comunitária sobre os riscos do calor e formas de proteção individual e coletiva.

Mitigar as emissões de gases de efeito estufa é fundamental, mas também precisamos nos preparar para viver em um clima mais quente. Isso envolve desde políticas governamentais até mudanças individuais de comportamento, como reduzir o uso do carro, economizar energia e evitar a exposição ao Sol em horários de maior calor”, conclui o Prof. Dr. Nelson Gouveia.

O estudo completo está disponível na Environment International (clique aqui)*

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