“Numa sociedade racista, não basta não ser racista. É necessário ser antirracista”. A conhecida frase da filósofa Angela Davis traz uma importante reflexão no Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra (20 de novembro), lembrado neste 20 de novembro, pela primeira vez feriado em todo o Brasil. Os números mostram de forma explícita que a desigualdade racial é uma realidade percebida por praticamente todos os brasileiros.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 56,1% da população brasileira autodeclaram-se pretas e pardas, o que corresponde a mais de 119 milhões de pessoas, em um universo 212,6 milhões. Conforme o Censo 2022 (IBGE), 20,6 milhões (10,2%) se reconhecem como “pretos” e 92,1 milhões (45,3%) se identificam como “pardos”.  Apresentar de representarem a maioria da população, os negros continuam sendo vítimas de racismo estrutural.

Pesquisa do instituto DataFolha, divulgada neste dia 19, mostra que 40% acreditam que a população brasileira são racistas e 5% acham que todos praticam o racismo. Outra pesquisa realizada pelo Instituto Locomotiva e pela plataforma QuestionPro mostrou que sete em cada dez pessoas negras já passaram por algum constrangimento por causa de preconceito ou discriminação racial.

Os sentimentos de discriminação e preconceito foram vividos em diversas situações cotidianas e são admitidos inclusive por brancos. Conforme a pesquisa, a expectativa de experimentar episódios embaraçosos pode tolher a liberdade de circulação e o bem-estar de parcela majoritária dos brasileiros.

Tais situações podem causar desgaste emocional e psicológico: 73% dos negros entrevistados na pesquisa afirmaram que cenas vivenciadas de preconceitos e discriminação afetam a saúde mental.

Do total de pessoas entrevistadas, 68% afirmaram conhecer alguém que já sofreu constrangimento por ser negro. Entre os brancos, 36% admitem a possibilidade de terem sido preconceituosas contra negros, ainda que sem intenção.

Preconceito no transporte, no comércio, bancos e o medo de abordagem policial

O levantamento do Instituto Locomotiva revela que 39% das pessoas negras declararam que não correm para pegar transporte coletivo com medo de serem interpeladas. Também por causa de algum temor, 36% dos negros já deixaram de pedir informações à polícia nas ruas.

O constrangimento pode ser também frequente no comércio: 46% das pessoas negras deixaram de entrar em lojas de marca para evitar embaraços. O mesmo aconteceu com 36% que não pediram ajuda a vendedores ou atendentes, com 32% que preferiram não ir a agências bancárias e com 31% que deixaram de ir a supermercados.

A pesquisa feita entre os dias 4 e 13 de novembro, tem representatividade nacional e colheu opiniões de 1.185 pessoas com 18 anos ou mais, que responderam diretamente a um questionário digital. A margem de erro é de 2,8 pontos percentuais.

Seis em cada dez negros sofreram discriminação em 2023

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Outra pesquisa divulgada no início do mês pela Kantar Insights mostrou que seis entre 10 pretos e pardos (61%) sofreram discriminação em 2023. Os ambientes e circunstâncias mais violentos nesse sentido foram o local de trabalho (31%), locais públicos (26%) e enquanto faziam compras (24%). Ao todo, 11% dos participantes apontaram a cor da pele como fator que motivou a discriminação. Uma parcela de 10% ainda indicou a etnia ou a raça.

Outro dado de destaque do levantamento é o de que apenas um em cada cinco dos entrevistados (20%) se vê representado sempre em veículos de comunicação. As parcelas que disseram se enxergar no que é disseminado algumas vezes e nunca são, respectivamente, de 69% e 6%.

A pesquisa Brand Inclusion Index 2024 entrevistou 1.012 brasileiros, abarcando quatro grupos minoritários: mulheres, negros (pretos e pardos), pessoas com deficiências (PCDs) e comunidade LGBTQIA+. A empresa pretendia captar sua percepção sobre aspectos como diversidade, equidade e inclusão de uma marca.

Em relação às marcas, o resultado foi de que 86% dos negros (pretos e pardas) afirmaram ser importante que promovam ativamente a diversidade e a inclusão em seus próprios negócios ou de modo mais abrangente, de modo a beneficiar toda a sociedade.

Mulheres e estudantes negros são principais vítimas de preconceito racial no RJ

O painel interativo Discriminação, nova ferramenta que reúne dados sobre crimes de preconceito registrados no estado do Rio de Janeiro, lançado neste feriado da consciência negra, aponta a predominância de mulheres negras, entre 30 e 59 anos, como vítimas. Nos registros de preconceito por raça e cor, estudantes negros também estão entre os mais afetados, com maior concentração de casos em ambientes residenciais.

Dentre os crimes analisados no primeiro semestre de 2024, a maioria das vítimas sofreu injúria por preconceito (1.106); seguida por preconceito de raça, cor, religião, etnia ou procedência nacional (436). Outros números incluem intolerância e/ou injúria racial, de cor e/ou etnia (60); praticar, induzir ou incitar discriminação de pessoa em razão da sua deficiência (41); intolerância por orientação sexual e intolerância religiosa, ambos os títulos com 18 vítimas cada. Nos registros de injúria por preconceito, o local mais comum de ocorrência é a via pública.

O racismo estrutural vai além de ofensas e agressões; ele é uma força silenciosa que impede a ascensão e igualdade da população negra, limitando acessos e oportunidades. Dados do IBGE mostram que a taxa de desemprego entre negros é quase o dobro da taxa entre brancos, reflexo de barreiras sociais que ainda definem quem tem direito a certos espaços.

RJ lança painel de monitoramento de crimes de preconceito

O painel interativo Discriminação mostrou que no primeiro semestre deste ano, 1.719 pessoas procuraram delegacias de polícia para denunciar algum tipo de crime relacionado à intolerância — uma média de nove vítimas por dia. Um dado que se destaca é a quantidade de crimes de intolerância cometidos no ambiente virtual: 46 ocorrências em seis meses.

No primeiro semestre deste ano, 60 pessoas foram vítimas de intolerância e/ou injúria racial, 41 sofreram discriminação por motivo de deficiência, 25 por ultraje a culto, 18 por intolerância por orientação sexual e também por intolerância religiosa, 7 foram discriminados por serem portadores de HIV, 5 por serem de outro país e 3 sofreram intolerância por identidade ou expressão de gênero.

O lançamento do painel ocorre no dia seguinte à reunião de cúpula do G20 na cidade do Rio de Janeiro. Em nota, o Governo do Estado diz que a iniciativa “destaca o compromisso em abordar questões sociais de forma prioritária” e que está “alinhada às discussões do G20 Social, reforça a importância de formular políticas públicas inclusivas, baseadas em evidências”. Para acessar o painel Discriminação, acesse aqui.

Racismo é crime: saiba como denunciar

De acordo com a Lei nº 7.716/1989, racismo é crime no Brasil. A lei batizada com o nome do seu autor, Lei Caó, em referência ao deputado Carlos Alberto Caó de Oliveira (PDT-BA), que morreu em 2018. A lei regulamenta trecho da Constituição Federal que tornou o racismo inafiançável e imprescritível.

A Lei nº 14.532, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em janeiro de 2023, aumenta a pena para a injúria relacionada a raça, cor, etnia ou procedência nacional. Com a norma, quem proferir ofensas que desrespeitem alguém, seu decoro, sua honra, seus bens ou sua vida poderá ser punido com reclusão de 2 a 5 anos. A pena poderá ser dobrada se o crime for cometido por duas ou mais pessoas. Antes, a pena era de 1 a 3 anos.

As vítimas de racismo devem registrar boletim de ocorrência na Polícia Civil. É importante tomar nota da situação, citar testemunhas que também possam identificar o agressor. Em caso de agressão física, a vítima precisa fazer exame de corpo de delito logo após a denúncia e não deve limpar os machucados, nem trocar de roupa – essas evidências podem servir como provas da agressão.

Com informações da Agência Brasil e Assessorias

 

 

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