Um levantamento recente da Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta que crianças de 2 a 4 anos estão entre as mais expostas à violência física como forma de disciplina. De acordo com o relatório Corporal punishment of children: the public health impact, 330 milhões de crianças menores de 5 anos sofrem castigos físicos todos os anos no mundo.

Segundo o estudo, a punição corporal imposta para crianças de 2 a 4 anos é menos comum na Europa e Ásia Central (41%) e no Leste Asiático e Pacífico (48,2%). Na América Latina e Caribe, 55,2% das crianças dessa faixa etária foram expostas à esse tipo de violência. No Sul da Ásia o índice é de 64,6%. Já a África Subsaariana (70,6%), Oriente Médio e Norte da África (75,8%) são as regiões com maiores índices de punição física.

Os dados dialogam com a pesquisa nacional “Panorama da Primeira Infância: o que o Brasil sabe, vive e pensa sobre os seis primeiros anos de vida, realizada pela Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal em parceria com o Datafolha. O estudo mostra que embora 29% dos cuidadores admitem utilizar palmadas ou beliscões como forma de disciplina, apenas 17% acreditem na eficácia da violência física. Além disso, mais de 40% dos responsáveis afirmam recorrer a gritos com as crianças pequenas.

Nenhuma forma de violência contra crianças é inofensiva

Os dados chamam atenção neste Agosto Verde, mês de conscientização sobre a primeira infância no Brasil e também no Dia Nacional da Infância, lembrado em 24 de agosto.

A violência é o maior detrator do desenvolvimento infantil. Ela compromete o desenvolvimento emocional, cognitivo e social da criança, além de normalizar a resolução de conflitos pela força e perpetuar ciclos de violência que atravessam gerações”, afirma Mariana Luz, CEO da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal.

A pesquisa também investigou a percepção dos cuidadores sobre os impactos das práticas violentas de disciplina. Para 43%, a violência física gera comportamentos agressivos; 32% apontam que ela provoca baixa autoestima e falta de confiança; e 28% mencionam dificuldades de relacionamento com outras pessoas. Já a OMS alerta que crianças expostas a punições físicas têm 24% menos chances de alcançar um desenvolvimento adequado.
Leis de proteção

A OMS destaca que, embora 67 países já tenham proibido a punição corporal, as leis são “necessárias, mas insuficientes” para eliminar a prática. A Finlândia foi pioneira, ainda nos anos 1990, e o Quênia é o país mais recente a aprovar legislação nesse sentido — até 2001, punições físicas eram permitidas nas escolas. Hoje, estima-se que 70% das crianças africanas já sofreram algum tipo de punição corporal em ambiente escolar.

No Brasil, a proteção está prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e reforçada pela Lei Menino Bernardo (Lei nº 13.010/2014), que proíbe castigos físicos — como palmadas, beliscões ou puxões de cabelo — e qualquer tratamento cruel ou degradante.

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Caminhos para mudança

Para transformar esse cenário, especialistas apontam que é necessário alinhar políticas públicas de prevenção a estratégias de sensibilização social. A conscientização impacta diretamente a qualidade dos cuidados oferecidos às crianças. Programas de visitação domiciliar, por exemplo, ajudam cuidadores a adotar práticas mais positivas no dia a dia.

É urgente romper com a ideia de que carinho e punição podem andar juntos na criação de uma criança. O afeto é a base da aprendizagem e do desenvolvimento. A disciplina precisa ser construída com escuta, acolhimento e limites firmes — mas nunca violentos”, conclui Luz.

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