Outubro é o mês de conscientização do combate contra câncer de mama e colo de útero nas mulheres e o mês que celebra o Dia Nacional de Luta Contra Violência à Mulher (10/10). A data foi criada em 1980 em caráter nacional como um encorajamento às vítimas para buscar apoio e orientação profissional, além, claro, de denunciarem os agressores. Mas o que as campanhas têm em comum?
Além do fato de terem sido criadas em outubro, elas atingem o mesmo público: as mulheres. E por coincidências trágicas, se cruzam. Muitas vezes, as vítimas de violência são pacientes de tratamentos oncológicos ou que estão se curando de câncer de mama ou colo de útero.
Para se ter uma ideia do “problema”, dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública revelam que 76% das vítimas de agressão sexual são garotas menores de 14 anos, e 65% dos crimes ocorrem dentro de casa, cometidos majoritariamente por familiares (64%). Entre janeiro e outubro de 2023. a Central de Atendimento à Mulher (180) atendeu 74.584 denúncias de algum tipo de violência contra a mulher.
Os dados, divulgados pelo Ministério da Mulher, em novembro de 2023, demonstraram também que a maioria dos casos (73,86%) ocorrem nas residências das vítimas e familiares. O que deixa tudo ainda mais perigoso, quando se trata de pacientes em tratamento de saúde. Mesmo assim, a Lei Maria da Penha não faz distinção de vulnerabilidade. Pelo contrário.
A lei Maria da Penha se aplica de forma indistinta tanto a mulheres que tenham como as que não tenham essa doença”, afirma Rafael Paiva, professor de Direito Penal, especialista em violência doméstica e Lei Maria da Penha.
Ele aponta que justiça brasileira usa os mesmos meios para chegar ao mesmo fim, que é a proteção da mulher, em qualquer situação de violência. “Com o oferecimento de rede de apoio, lares provisórios, medidas protetivas de afastamento e proteção policial”, pontua.
Tipos de violência
A professora de Direito Penal da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Jenifer Moraes, explica que “a violência doméstica é um problema de causas multidisciplinares e, justamente por isso, demanda a implementação de políticas públicas preventivas que estão fora da esfera do Direito Penal.” E mais.
As medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha, são um instrumento de proteção importante dentro da sistemática do Sistema de Justiça Criminal, especialmente para evitar a escalada da violência a crimes mais graves. A determinação destas medidas, como o afastamento do lar, proibição de afastamento, dentre outras, podem ser determinadas independentemente da tipificação penal da violência, do ajuizamento de ação penal ou cível, da existência de inquérito policial ou do registro de boletim de ocorrência pela vítima”, ressalta a advogada
O advogado criminalista Gabriel Fonseca, que integra o escritório Celso Cândido de Souza Advogados, analisa a legislação. “A Lei Maria da Penha busca equidade, visto que em regra, o homem possui maior força física, poder aquisitivo e, culturalmente, tem voz mais ativa no âmbito familiar. A intenção da lei é proteger a mulher quando violências e abusos são cometidos e a tendência é que haja sempre atualizações em conformidade com a evolução da sociedade”.
No entanto, o especialista explica que, ao contrário do que muitos pensam, a abrangência da legislação vai além da violência física.
Existem outros tipos de violência que podem ser cometidos contra a mulher e que são amparados pela Lei Maria da Penha, dentre eles a violência psicológica, quando causa danos emocionais e diminuição da autoestima, mediante ameaças, humilhações, manipulações; violência sexual que é qualquer conduta relacionada a sexualidade não desejada; violência patrimonial e violência moral, condutas caracterizadas como calúnia, difamação e injúria”.
Vítima deve ser mulher, independente de sua orientação sexual
Gabriel Fonseca lembra ainda que não são apenas os companheiros que podem ser enquadrados na Maria da Penha. “A pessoa acusada de cometer violência doméstica, não deve ser, necessariamente, homem. Pode ser entre mulheres, em relação materna/paterna e filial, entre avós, irmãos, amigos e demais variadas situações”, detalha.
Para ser enquadrada na Lei Maria da Penha, a vítima deve ser mulher, independente de sua orientação sexual e o delito ocorrer no âmbito da unidade doméstica, familiar e existir qualquer relação íntima de afeto entre as partes”, completa.
Muitas mulheres deixam de registrar ocorrência por pensarem que não terão crédito, mas o advogado destaca que é ao contrário. “A palavra da mulher, nesses casos, possui maior relevância quando comparado a demais judicializações penais. Isso porque a grande maioria dos delitos são cometidos quando não há testemunhas ou outras provas que podem ser produzidas. Entretanto, a palavra da vítima deve estar sempre acompanhada de outros indícios, tal como o exame de corpo de delito”.
Ao longo dos anos, os homens se queixaram através de piadinhas sobre não ter uma lei específica para eles. No entanto, o especialista também fala sobre esse viés. “É nítido que não há uma lei específica quando o homem é vítima de violências cometidas por uma mulher. Nesses casos o código penal de maneira geral é aplicado”, explica Gabriel, destacando ainda um ponto que a legislação precisa melhorar.
Infelizmente, muitas mulheres utilizam dos direitos que a lei trata para se beneficiarem indevidamente, principalmente exercendo falsas acusações para ganhar vantagens no relacionamento. A lei deve ser aprimorada para tratar dessas questões, punindo severamente quando algo similar acontece, principalmente para que a Lei Maria da Penha não perca seu prestígio e aplicabilidade”.
Mais sobre a Lei Maria da Penha
Sancionada em 7 de agosto de 2006, pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a A Lei Federal nº 11.340 (Lei Maria da Penha) a, chega a sua maioridade e completa 18 anos em 2024, como uma das legislações mais avançadas no combate à violência doméstica e familiar contra a mulher.
Ela é considerada um marco na proteção das mulheres contra a violência doméstica no Brasil, ao melhorar a eficácia da legislação anterior (Lei 9099/95), que frequentemente convertia penas em prestação de serviços à comunidade, e ampliou a rede de apoio às mulheres vítimas de agressão.
A legislação também criou as medidas protetivas de urgência para as vítimas e implementou Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher, Casas-abrigo, Centros de Referência da Mulher e Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.
O seu nome é uma homenagem à farmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, que foi agredida pelo marido durante seis anos até se tornar paraplégica, depois de sofrer atentado com arma de fogo, em 1983. Inspirada na história de Maria da Penha, a lei surgiu como uma resposta do governo brasileiro para combater e diminuir os casos de violência doméstica no país.
Com Assessorias