O caso do ‘tio Paulo’, um aposentado do Rio de Janeiro levado a um banco para fazer um empréstimo de R$ 17 mil quando já estava morto, revela uma situação mais frequente do que se imagina. O ex-motorista de ônibus Paulo Roberto Braga, de 68 anos, aparentemente era explorado pela sobrinha, Erika Souza Vieira Nunes. 42, que chegou a ficar presa por duas semanas.

Esse tipo de situação é chamada de violência patrimonial, um crime que responde por 5,72% dos casos de abusos praticados contra pessoas idosas no Brasil. Os mais comuns são negligência (17,51%), exposição de risco à saúde (14,68%), tortura psíquica (12,89%) e maus-tratos (12,20%). Os dados são da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos – ONDH, com base nos registros realizados nos três primeiros meses de 2024, em todo o país.

No período, foram recebidas 42.995 denúncias de violações contra pessoas de 60 anos de idade ou mais. Bem mais do que os do mesmo período de 2023, com 33.546 registros, e de 2022, com 19.764. O levantamento chama atenção num país em que a população idosa cresce a um ritmo acelerado: em 12 anos, o número de pessoas com 65 anos ou mais aumentou 57,4%, de acordo com o Censo do IBGE de 2022.

Para que casos de violações como essas diminuam em todo o mundo, a Organização das Nações Unidas (ONU) instituiu o 15 de junho como o Dia Mundial de Conscientização da Violência Contra a Pessoa Idosa. O objetivo da ação, em parceria com a Rede Internacional de Prevenção à Violência à Pessoa Idosa, é criar uma consciência mundial, social e política sobre o tema. No Brasil, a data é marcada pela campanha Junho Violeta.

‘Tio Paulo’ foi levado já morto ao banco pela sobrinha: idoso morava em cômodo sem condições dignas de vida (Fotos: Reprodução de internet)

 

Segundo estado com mais idosos, Rio tem alto número de denúncias

No Rio de Janeiro, o número de pessoas com 65 anos ou mais aumentou 47% nos últimos 12 anos. O estado é o segundo do Brasil com o mais alto índice de envelhecimento – para cada 100 crianças até 14 anos existem 106 idosos. No entanto, o respeito aos direitos garantidos no Estatuto da Pessoa Idosa ainda é um enorme desafio.

Negligência (15.259 vítimas), violência psicológica (11.115), abuso financeiro (8.110) e violência física (4.449) são as maiores violações ocorridas desde 2017, segundo dados do Ministério Público do Rio de Janeiro, divulgados nesta quinta-feira (13/6). Os números apontam 23.963 comunicações recebidas pela Ouvidoria do órgão, somando 44.091 vítimas em todo o Estado do Rio.

O número de registros entre 2022 e 2023 caiu, mas continua muito alto. Em 2022 foram 2.921 notificações, contra 2.806 no ano  passado em todo o estado. Já na capital foram 1.566 casos em 2022 e 1.460 em 2023. Até o dia 7 de junho, o MPRJ registrou 839 casos no estado, sendo 450 na cidade do Rio.

Outros dados assustam: 2.610 casos em 2023 foram na residência da vítima, 153 em hospital e 100 em instituição de longa permanência (ILPI). Já em 2023, foram 2.479 ocorrências na residência, 124 em hospital e 95 em ILPI. Nos primeiros meses deste ano de 2024, foram 703 ocorrências na residência, 76 em hospital e 39 em ILPI

As denúncias dão conta de que cerca em cerca de 77% dos casos o autor da violência é familiar da vítima. Outro dado que chama atenção é que 70,2% das vítimas são do sexo feminino, contra 30% do sexo masculino. Em 2024, até o dia 10 de junho, foram recebidas 583 denúncias via Ouvidoria, que envolvem um total de 1.137 vítimas.

Junho Violeta: Comissão da Pessoa Idosa da Alerj promove ações

Já a Comissão da Criança, do Adolescente e da Pessoa Idosa da Assembleia Legislativa (Alerj), registrou cerca de 150 denúncias ao longo dos últimos 12 meses, de forma presencial ou pelo Disque Pessoa Idosa (0800 0239191), que funciona de 9 às 17 horas em dias úteis.

Sabemos que há muita subnotificação. As pessoas idosas têm medo de denunciar ou não conhecem os meios para fazer isso. Todas as denúncias são monitoradas e uma resposta é dada aos usuários”, disse o deputado Munir Neto (PSD), presidente da Comissão.

As demandas são encaminhadas para o sistema de garantia de direitos, para os equipamentos da assistência social ou para a delegacia de polícia e demais órgãos públicos. 

Para chamar a atenção para o problema, quebrar o silêncio, para despertar na sociedade um processo de sensibilização para coibir, diminuir e amenizar o sofrimento dessa população, a Comissão promove este mês uma série de ações sob o tema ‘O respeito não envelhece’.

O Palácio Tiradentes, sede histórica da Alerj no Centro do Rio, estará iluminado na cor violeta até o dia 20. No dia 26, a partir das 9 horas, haverá uma ação de mobilização no Largo da Carioca, no Centro do Rio de Janeiro, onde a equipe da Comissão vai distribuir folhetos explicativos sobre os direitos dos idosos e conversar com o público, tirando dúvidas sobre o Estatuto e divulgando o Disque Pessoa Idosa – 0800 0239191.

Já no dia 27 de junho, às 14 horas, no auditório da Alerj, a Comissão vai promover uma audiência pública para discutir a importância do combate à violência contra a pessoa idosa no Estado do Rio de Janeiro. Estarão presentes membros do Ministério Público, Polícia Civil, Detro e representantes do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa e da sociedade civil organizada.

MP lança painel de monitoramento da violência contra idosos

Os números do Ministério Público foram apresentados e detalhados nesta sexta-feira (14/6), em evento que debateu o enfrentamento à violência contra a pessoa idosa. O painel online desenvolvido pela própria instituição para o acompanhamento do cenário da violência contra idosos no estado exibe, em uma interface de simples navegação, diversos dados relativos às denúncias recebidas pelo MP fluminense desde 2017.

Inicialmente aberta para membros e servidores do MPRJ, a ferramenta contém o apanhado de comunicações recebidas pela Ouvidoria/MPRJ em todos os municípios. São dados como o quantitativo geral, os tipos de violência, onde ocorreram, o sexo das vítimas e dos autores da agressão, entre outros.

O Painel foi idealizado pelo Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça da Pessoa Idosa (CAO Idoso/MPRJ) e desenvolvido pela Gerência de Análises, Diagnósticos e Geoprocessamento (GADG/MPRJ). As estatísticas são atualizadas a partir de dados coletados de forma automatizada pelo painel, a partir de um formulário alimentado pelo CAO Idoso/MPRJ.

Além da apresentação, foram realizadas mesas de debate, uma apresentação cultural e palestras para discutir três temas: Violência contra a pessoa idosa e os seus desafios; A atuação do serviço social nos casos de violência contra a pessoa idosa; e A importância da psiquiatria e a sua interação com outros profissionais nos casos de violência contra a pessoa idosa. As exposições foram feitas por promotores de Justiça, assistentes sociais, e técnicos periciais, entre outros profissionais ligados ao tema.

Números do envelhecimento no Brasil

O envelhecimento da população é um fenômeno global que está transformando a estrutura demográfica de muitos países. De acordo com o Censo  2022, o número de pessoas com 65 anos ou mais cresceu 57,4%, em 12 anos. 

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de idosos no Brasil tem crescido substancialmente. Estima-se que até 2030 o país terá mais idosos do que crianças e adolescentes.

De acordo com os dados do Censo Demográfico 2022, realizado pelo IBGE, o Brasil possui mais de 32 milhões de pessoas com 60 anos ou mais, o que representa 15,6% da população total do país. 

Esse número mostra um aumento significativo em relação a 2010, quando a população idosa era de 20,5 milhões (10,8% dos brasileiros). A população idosa do Brasil está crescendo a um ritmo acelerado: em 12 anos, o número de pessoas com 65 anos ou mais aumentou 57,4%. 

Ampliação da proteção contra a violência

Apesar dos avanços na conquista de uma vida mais longeva, muitos idosos enfrentam uma realidade alarmante: são vítimas de diversos tipos de violência, desde abuso físico e emocional à negligência e exploração financeira. 

Para enfrentar essa questão, o Estatuto do Idoso foi atualizado em 2024, visando fortalecer as medidas de proteção contra a violência à pessoa idosa, por ser um crime grave que viola os direitos humanos e causa sofrimento físico e psicológico. 

As atualizações  trazem  medidas como:

  • Criação de delegacias especializadas: cada estado brasileiro deverá criar uma delegacia especializada no atendimento à pessoa idosa, com profissionais capacitados para acolher e investigar casos de violência.
  • Aumento da pena para crimes: a pena passa a ser maior para crimes físicos, psicológicos e patrimoniais.
  • Campanhas de conscientização: o governo federal deverá realizar ações sobre a violência contra a pessoa idosa, visando prevenir e combater esse tipo de crime.

Como evitar e combater a violência contra a pessoa idosa?

Antonio Leitão, gerente do Instituto de Longevidade MAG, enfatiza a necessidade de ações efetivas para proteger o bem-estar dos idosos, mas, antes de enfrentá-los, é preciso entender como os abusos acontecem, pois só assim é possível saber como combatê-los.

Além disso, tratar deste tema é uma forma de promover o debate sobre a saúde,  segurança e  etarismo no Brasil, assim como de buscar conscientização sobre os impactos de diversos tipos de abusos na vida de pessoas com 60 anos ou mais do país”, destaca Leitão.

O Instituto de Longevidade MAG criou uma cartilha que conta com mais detalhes sobre os tipos de violências que pessoas idosas podem sofrer. Além disso, com o suporte de diversos especialistas, é possível saber como agir em casos de abusos e também como identificar os sinais em idosos que sofrem violência. Para saber mais, acesse aqui.

Como denunciar violência contra pessoa idosa no Rio e no Brasil:

Qualquer pessoa idosa vítima de violência pode procurar o MPRJ através da Ouvidoria, pelo formulário no portal institucional ou pelos telefones 127 (capital) e (21) 2262-7015 (demais localidades).

A Comissão da Criança, do Adolescente e da Pessoa Idosa da Alerj recebe denúncias de segunda a sexta-feira, das 9 às 17 horas, com ligações gratuitas para o 0800 023 9191.

Com informações da Alerj e do MP-RJ

 

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