A autorização para os médicos e, sobretudo, aqueles que trabalham na área estética, como cirurgia plástica e dermatologia, exibirem imagens e fotografias com os resultados dos procedimentos, é apontada como a principal novidade da nova resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM), que entram em vigor nesta segunda-feira (11). Fotos do “antes e depois”, que até então eram proibidas, mesmo com consentimento do paciente, agora estão liberadas.
A Brazilian Association of Plastic Surgeons (Baps) espera um impacto internacional, com o chamado turismo médico, em virtude da nova resolução do CFM. Turismo médico é o nome que se dá quando um paciente viaja para outro país para se submeter a uma cirurgia. A Baps é uma associação que surgiu em março de 2022 para defender a publicidade médica livre e responsável, além de valorizar a produção e disseminação do conhecimento científico.
“O Brasil é hoje o segundo país que mais realiza cirurgia plástica, mas não possui um turismo médico internacional tão forte como a da Turquia e dos Estados Unidos. Agora, poderá finalmente ter seu lugar ao sol, já que os cirurgiões plásticos brasileiros estão entre os melhores do mundo”, explica David Castro Stacciarini, advogado da Comissão de Publicidade e Propagandas Médicas da BAPS.
Segundo ele, a partir de agora, o paciente não terá que pagar uma consulta para descobrir se o cirurgião faz a cirurgia que ele deseja, podendo facilmente conhecer o trabalho do médico em suas redes sociais e isso, por si só, já é uma vitória para todos os pacientes. “Isso abre espaço para um maior crescimento, principalmente na área internacional. E quando você conhece o trabalho do cirurgião fica mais fácil para você alinhar a expectativa da sua cirurgia”, argumenta o advogado da BAPS.
Os últimos dados da International Society of Aesthetic Plastic Surgery (Isaps) mostram que as 1.634.220 cirurgias plásticas realizadas no Brasil em 2021 representam mais que um oitavo (12,7%) do total desses procedimentos no mundo.
Medida é comemorada por médicos
O cirurgião bariátrico e presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM), Antônio Carlos Valezi, considerou a atualização positiva para os profissionais.
“Mesmo o antes e depois tendo a possibilidade de gerar um grande impacto positivo na cirurgia bariátrica é importante resguardar o paciente sempre com muita cautela e ética. Essa nova atualização traz a possibilidade de publicidade médica para os tempos atuais, das redes sociais, porém o uso deve ser feito com muita parcimônia”, ressalta.
Para Ícaro Samuel, cirurgião plástico que é membro fundador da Associação Brasileira de Cirurgiões Plásticos (BAPS), membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) e da Sociedade Americana de Cirurgia Plástica (ASPS), a mudança é benéfica e deve ser comemorada.
“A comunidade médica aguardava por isto, os decretos que regulam a nossa publicidade eram bem antigos e essa modernização era necessária. Nem fake news a gente conseguia combater, então essa liberação vai ser benéfica para informar a sociedade de forma correta e responsável”, diz.
Para Mayla Carbone, médica dermatologista membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), é essencial acelerar as atualizações que se referem ao exercício da medicina.
“Em 2011, muitas redes sociais que conhecemos hoje, sequer existiam e podemos esperar pelo surgimento de novas ferramentas no horizonte. Acredito que ao otimizar nosso trabalho, estamos contribuindo para fornecer informações confiáveis aos pacientes, ajudando-os a evitar a disseminação de notícias falsas”, aponta.
Já Gustavo Soares, cirurgião e presidente da Sociedade Brasileira de Hérnia, ressalta que o paciente deve ser sempre prioridade. “Mesmo com a necessidade do uso das mídias é importante ter cautela com a exposição e com a forma na qual a informação será transmitida. O objetivo máximo de todos os médicos é cuidar da saúde e respeitar o sigilo do paciente”.
As imagens de antes e depois
A nova resolução do CFM liberou que os profissionais divulguem fotos de “antes e depois” nas redes sociais, desde que não haja manipulação na edição da imagem e que explique as possíveis complicações do procedimento. A imagem dependerá da autorização prévia do paciente. Segundo o advogado, a descrição educativa das imagens deve informar os riscos e insatisfações, justamente para evitar que o paciente seja ludibriado ou crie uma fantasia de que irá ficar igual a imagem visualizada.
“Mas, a verdade é que nenhum paciente acredita mesmo que irá ficar igual a foto. Basta analisar os processos judiciais para perceber que o ponto nevrálgico se limita sempre à insatisfação com o resultado ou intercorrências que prejudicaram o resultado. Não podemos confundir exigência de um ótimo resultado com falsa expectativa”, diz Dr. David.
Segundo a BAPS, a antiga proibição de postar fotos de antes e depois prejudicava o paciente. “Isso exigia que ele tivesse que pagar a consulta para descobrir se os resultados do cirurgião lhe agradam, e se o médico possui experiência com a cirurgia que ele deseja ou com seu biotipo. Agora, com a publicidade livre, isso beneficia o paciente”, argumenta o Dr. David.
Os profissionais também continuam permitidos a publicarem fotos com famosos após procedimento e também vídeos com depoimentos, desde que não garanta ao público algum tipo de resultado. “O médico também poderá postar os resultados positivos do próprio trabalho e repostar marcações dos pacientes mostrando o resultado do trabalho feito”, comenta.
Também será possível divulgar valores de consultas, tratamentos e procedimentos, divulgar imagens da clínica e instrumentos e equipamentos usados, mostrar o dia a dia de trabalho nas redes sociais e explicar os procedimentos, desde que não identifiquem os pacientes nem façam propagandas de empresas ou marcas. É permitido indicar produtos medicinais de forma educativa – sem que a publicidade seja feita como venda do produto.
Contradições da resolução
Apesar de a nova resolução estar mais adequada à atual sociedade e às comunidades internacionais, na avaliação da Basp, o CFM criou outras contradições nessa resolução. Uma delas é que o perfil pessoal do médico, caso esteja junto com o perfil profissional, será analisado pelos critérios de publicidade e propaganda da resolução.
“Aqui entendemos uma certa invasão na vida pessoal do médico”, diz o advogado. “A princípio, a resolução informa que o médico pode aumentar sua clientela e seguidores e ao mesmo tempo afirma que não pode angariar clientes, o que torna contraditório de certa forma”, completa.
Segundo ele, a resolução também não explica o que seria ‘não identificar paciente’, apesar de exigir isso nas postagens, como também não explica o que seria ‘promessa de resultado’. A resolução anterior, de 2011 entendia como promessa de resultado a divulgação de imagens de pré e pós-operatório, mas, agora que se tornou possível, é preciso uma nova definição.
“Existe uma discussão também sobre anunciar preços de procedimentos, já que a resolução de 2023 entende ser possível, entretanto o parecer do CFM 2836/2020 solicitado pelo CRMPR, entende que não. Acreditamos que o tempo irá resolver esses impasses”, finaliza o especialista.
Confira algumas das principais mudanças
A partir de agora é possível:
- Divulgar imagens de antes e depois dos pacientes, desde que ocorra em caráter educativo;
- Marketing sobre produtos e equipamentos utilizados no local de trabalho
- Divulgar de preços de consultas;
- Anúncios de especialidade ou pós-graduação seguindo normas pré-estabelecidas;
- Compartilhar publicações de agradecimento feitas pelos pacientes;
- Utilizar fotos do ambiente de trabalho com a equipe, desde que todos autorizem o uso da imagem;
- Falar sobre emoções relacionadas ao trabalho;
É proibido:
- Participar de propagandas ou publicidade de medicamentos, insumo médico, equipamentos ou quaisquer outros produtos;
- Induzir a garantia de resultados;
- Atribuir capacidade privilegiada para aparelhos e conferir selo de qualidade a produtos;
- Vender procedimentos de forma conjunta.
Fiscalização: médicos poderão denunciar práticas ilegais
Segundo o CFM, um aplicativo será disponibilizado para que os próprios médicos atuem como fiscais da atuação profissional, podendo denunciar práticas ilegais. As fiscalizações das redes sociais são de responsabilidade dos conselhos regionais de Medicina, de forma que a Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos (Codame) é o órgão que cuida disso.
“Acredito que essa fiscalização das fotos ocorrerá sim. Mas, mais importante que isso, o médico terá que tomar cuidado com a lei geral de proteção de dados (LGPD), pois infrações nos dados sensíveis dos pacientes, e aqui inclui fotos médicas, poderão acarretar além de indenizações ao paciente, eventuais denúncias para a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que aplica multas para cada infração”, analisa o advogado do Baps.
Antiga reivindicação também dá mais segurança a clientes
Segundo David Castro Stacciarini, advogado da Comissão de Publicidade e Propagandas Médicas da BAPS, a atualização das regras é uma reivindicação antiga de médicos, entidades e associações, como a BAPS.
“Os cirurgiões e médicos, com boa postura e boa técnica, eram limitados a se expressar em ambientes de rede social, o que fazia com que os pacientes ficassem mais expostos a profissionais menos capacitados”, afirma o Dr. David Castro, advogado da BAPS.
A BAPS sempre defendeu que a mídia social pode, por meio da educação, aumentar a conscientização e a defesa do paciente. “Por meio de links de hashtag, termos de pesquisa e perfis dedicados, as redes sociais têm sido um meio central para a disseminação de procedimentos e informações médicas.
“A publicidade médica livre e responsável reaproxima os pacientes dos médicos e está intimamente ligada ao bom conhecimento e à verdade, o que gera benefícios para o paciente”, afirma.
A associação reitera que qualquer liberdade nesse sentido tem como base a responsabilidade. “A partir do momento em que esse cirurgião tem algo de muito valor para levar às pessoas do ponto de vista técnico, de qualidade científica, há a necessidade desse cirurgião estar mais próximo da sociedade e se apresentar de forma mais clara, transparente. Justamente para que o paciente consiga entender e distinguir de forma mais clara aquilo que ele quer ter acesso”, finaliza o Dr. David Castro.
Com Assessorias