A assistente comercial Ana Geórgia Simão, de 42 anos, faz aniversário no Dia Mundial do Lúpus, 10 de maio. Ela nasceu no Dia das Mães de 1981 e sempre sonhou em ser mãe, mas teve que travar uma longa luta contra o ‘lobo’, como a palavra lúpus é escrita em latim. Ela levou quase 18 anos convivendo com inúmeros sintomas até descobrir o diagnóstico de Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) e iniciar o tratamento adequado.

“Eu queria tanto engravidar que busquei minha remissão com unhas e dentes”, conta Ana Geórgia, que há 6 anos está sem sintomas. Ao atingir a ‘remissão’, tatuou a palavra no braço para nunca esquecer o compromisso com a cura. Hoje, ser mãe não está mais nos seus planos, mas a mudança de hábitos é para sempre.

Na adolescência, sem saber ainda o que tinha, tomou 64 injeções de bezentacil e muitos hormônios para crescimento. Sentia muitas dores e quase parou de andar. Ao descobrir definitivamente a doença numa consulta ao reumatologista, seu mundo caiu e ela resolveu se isolar numa praia paradisíaca do Nordeste. O tratamento não foi fácil e teve várias complicações.

Ana Geórgia no evento de estreia da minissérie ‘Sentindo na Pele’, na qual protagoniza um episódio (Foto: Divulgação)

Mas foi a vontade de ser mãe – após perder três bebês – que Ana Geórgia fez ‘virar a chave’ e mudar de vez sua rotina na luta contra os próprios anticorpos como impõe a doença autoimune, crônica e incurável, segundo a Ciência. Depois de 35 anos refém dos medicamentos, deixou os corticoides que inchavam seu rosto e seu corpo e descobriu sua nova face. Hoje ela leva uma vida normal e se sente, de fato, curada.

“Comprei uma bicicleta pra ir pro trabalho e incluí o cardio na minha vida. Entrei na academia, sou completamente viciada. E, então, meus exames nunca mais mudaram. Hoje 20 anos depois e todos os tratamentos possíveis, me sinto curada. Ando 6 km de bicicleta todos os dias, não fumo, não bebo e me alimento o mais saudável possível”, conta ela.

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Superação pela escrita

Se antes ela “sequer conseguia segurar uma caneta”, hoje levanta 200kg nos exercícios da academia. Ana Geórgia se sente mais saudável, disposta e fortalecida, inclusive para encorajar outras mulheres que enfrentam o mesmo drama.

Exemplo de superação, Ana Geórgia encontrou forças na escrita e mais precisamente na poesia para relatar suas dificuldades para lidar com o lúpus. Criou o blog ‘Boneca de Porcelana – A menina e o lúpus’, que depois migrou para o Instagram @ameninaeolupus, onde hoje tem mais de 26 mil seguidores.

Além de contar sua saga ao longo de três décadas enfrentando os efeitos da doença, boa parte ainda desconhecida, a blogueira cearense traz relatos de outras mulheres que sofrem com a doença e as encoraja a encarar e vencer o lúpus, como ela conseguiu.

Ela também é uma das quatro personagens reais da minissérie documental “Sentindo na Pele”, que aborda as histórias de mulheres que “têm em comum o lúpus e a coragem”. Ela protagoniza o primeiro dos quatro episódios “A menina e o lobo’, que está disponível no site amarcadacoragem.com.br.

 

Ana Geórgia e outras três mulheres que enfrentam corajosamente o lúpus, personagens reais de minissérie ‘Sentindo na Pele’ (Foto: Divulgação)

‘Era café com leite nas brincadeiras’

Selecionamos aqui trechos do relato de Ana Geórgia em seu Instagram e em sua entrevista ao ‘Diário do Nordeste’ para inspirar outras mulheres que enfrentam o lúpus e sonham em ser mães.

Por Ana Geórgia Simão*

Meu nome é Ana Geórgia Simão, tenho 42 anos e lúpus desde sempre. Nasci no dia 10 de maio, um domingo, dia das mães, dia mundial da conscientização sobre o lúpus. Eu sempre tive lúpus, não foi algo que apareceu. Não tenho como datar.

Eu não era uma criança igual às outras. Tive um sopro no coração quando bebe, tive anemias, tive fístula em todos os dentes e tinha diversas infecções urinárias. Tive que tomar diversos antibióticos, tirar todos os dentes de leite no dentista. 

Fui diagnosticada aos 17, mas sempre apresentei os sintomas e por causa deles era a ‘café com leite’ nas brincadeiras, não fazia educação física no colégio. Tive vários problemas de desenvolvimento. não crescia, tinha idade óssea atrasada, sangrava muito pelo nariz, não menstruava.

Fiz um tratamento com o hormônio premarin (nem sei se existe mais) com ele cresci 17 cm, menstruei e comecei a apresentar as dores migratórias.

Fui então a um clínico geral de confiança da família. Na época eu estava com muita dificuldade pra sentar e levantar, para andar e para comer. Eu estava com muitas ínguas no pescoço, e ele me pediu um exame, o FAN, deu positivo e ele me diagnosticou com febre reumática.

Ana tatuou “você não está sozinha”, frase que tomou como sinal divino de força (Foto: Theyse Viana / Diário do Nordeste)

Os sintomas

Quase parei de andar, já tinha perdido os cabelos, tava muito magra, não tinha memória. Dali se passaram dois anos com injeções de benzetacyl aos sábados. Tomei 64 injeções de benzetacil. Emagreci muito, não conseguia ir a faculdade, nem conseguia dormir tamanha eram as dores.

As dores eram como se eu tivesse levado paulada no corpo todo. E aí você tenta se levantar e o corpo todo não atende, tudo dói: segurar um copo d’água, pentear o cabelo. Na época, eu passei pra Engenharia de Pesca na UFC, mas tive que abandonar.

O diagnóstico

Aí, aos 17 anos, resolveram me levar a um reumatologista. O médico me disse que faria os exames por que era preciso, mas que já tinha a certeza de que eu tinha Lúpus.

Ele colocou minha mão em uma bacia de água gelada e em segundos apareceu o Raynaud. Meu cabelo era ralo, minhas articulações tinham edemas.

Meu rash malar (mancha vermelha que tinge as bochechas em formato de asa de borboleta, um sintoma típico entre os pacientes) era aparente, eu me achava corada (quanta ilusão).

O isolamento

Quando eu descobri, fui olhar na internet e era só imprimir o atestado de óbito, porque era como se não tivesse jeito. Isso era no final dos anos 1990. Não tinha medicação biológica, específica para o lúpus.
Pessoas se afastaram de mim porque achavam que eu ia morrer mesmo – eu achei que ia morrer mesmo. Saí do meu emprego e fui morar numa barraca de praia em Jericoacoara.

 

Ana e as outras três protagonistas da minissérie Sentindo na Pele (Foto: Divulgação)

O tratamento

Quando fiz pulsoterapia, que era tomar corticoide na veia, eu trabalhava a semana toda, no sábado me internava, e no domingo me recuperava. Passei 4 anos assim, sem fins de semana. Por isso hoje gosto muito de sair sábado à tarde. 

Foram muitas internações nestes anos, entre hemorragias, plaquetas baixas e perdas gestacionais… Mas eu nunca me importei com a opinião alheia, isso nunca me incomodou e acredito que ajudou a ser a pessoa que sou hoje!

Aos 35 fui diagnosticada com púrpura idiopática, e para tentar conter as constantes hemorragias, retirei o baço e fiz tratamento com a medicação #mabthera.

A maternidade

Ter um filho era muito significativo para mim, mas a medicação forte levou dois bebês e o terceiro se instalou nas trompas. Em 2016, após 20 anos tomando medicamentos, a médica me perguntou:  ‘Você quer parar de tomar o remédio e ver como se sente?’. Eu disse: ‘Eu quero. Eu consigo’.

Quando parei, descobri algumas coisas sobre mim. Meu rosto não era redondo, minhas unhas são normais e não gosto de doce. Eu não sabia quem eu era, como era meu rosto, porque tomava desde a adolescência.

A remissão

Ana Georgia tatuou ‘remissão’ no braço para fortalecer seu processo de cura (Foto: Theyse Viana / Diário do Nordeste)
Quando fiquei ‘descorticoidizada’, comecei a enxergar o que eu realmente era. Comprei uma bicicleta, pra ir pro trabalho, e incluí o cardio na minha vida. Entrei na academia, sou completamente viciada. E, então, meus exames nunca mais mudaram.
 
Hoje 20 anos depois e todos os tratamentos possíveis, me sinto curada. Ando 6 km de bicicleta todos os dias, não fumo, não bebo e me alimento o mais saudável possível.
 

Essa vida que eu tenho hoje era a que eu queria viver. Eu nunca desisto. Cresci achando que eu era frágil, com as pessoas dizendo que eu não podia. Meu propósito é fazer com que as pessoas se amem, antes de qualquer coisa.

Sobre o INSTA

Quando você está gripada, sua mãe fica preocupada. Quando você fica gripado por 20 anos, as pessoas pensam ‘ah, de novo? tem jeito mais não’. No começo, minha família se mobilizava, depois foi espaçando. 

Eu sentia que as pessoas precisavam daqueles textos (no blog ‘A Menina e O Lobo’ e agora no insta ‘A Menina e o Lúpus’) pros familiares delas também não esquecessem que elas têm uma doença crônica. Já faz 6 anos que não tomo mais nem medicação, mas eu tô lá todo dia, posto pra eles todo dia.

Com informações do Diário do Nordeste

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