Engatinhar, andar, bater palminhas, balbuciar, falar, abanar a mão, comer sozinho e desfraldar. Esses alguns marcos essenciais no desenvolvimento de uma criança. Cada um deles acontece em período específico e depende muito do tipo de estímulo que a criança recebe dos pais e cuidadores. Esses marcos podem variar de criança para criança. Porém, é preciso estar atento caso haja atrasos significativos, principalmente na fala, um dos principais sinais do Transtorno do Espectro Autista.
O TEA envolve vários transtornos relacionados a desordens no desenvolvimento do cérebro que interferem na capacidade funcional da pessoa ao longo da vida, trazendo prejuízos na interação e comunicação social. A criança mostra interesses incomuns, com comportamentos rígidos e repetitivos e, em alguns casos, agressivos. As pessoas com TEA têm dificuldade de se socializar e sofrem atraso e/ou dificuldade de linguagem e de comunicação.
Mas é bom discernir o que é autismo do que pode ser um simples problema de audição ou algum outro transtorno. Edyclaudia Gomes de Sousa, conselheira da Associação Mão Amiga Para Pais de Crianças Autistas e pós-graduada em doenças mentais e atenção psicossocial, alerta que algumas crianças na faixa etária de zero a três anos estão sendo diagnosticadas com autismo, mas não têm o transtorno, apenas alguma dificuldade com relação a audição.
“É muito comum uma criança autista não saber se relacionar e a pessoa com dificuldade na audição também ter este problema, inclusive de se expressar oralmente, daí vem a confusão. Ultimamente temos observado, na hora da avaliação, que tem chegado muita criança nessa faixa etária que não é autista, mas que tem problemas auditivos”, adverte.
Diagnóstico já nos primeiros meses de vida
Pesquisadores da Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, afirmam ser possível detectar o autismo antes do surgimento de seus sintomas a partir da ressonância magnética. O estudo foi publicado na revista Nature e mostra que as origens do autismo podem ser descobertas ainda no primeiro ano de vida – hoje, o diagnóstico da doença ocorre geralmente em torno dos dois anos de idade.
De acordo com especialistas, os primeiros sinais do TEA podem ser notados nos primeiros meses de vida. Mas, em muitos casos, o diagnóstico só é feito depois dos três anos de idade, perdendo assim um importante período para intervenções terapêuticas capazes de melhorar substancialmente o quadro do autismo. Uma pesquisa da Universidade do Rio Grande do Sul analisou 32 crianças diagnosticadas com TEA. Esse estudo mostrou que 61% dessas crianças apresentaram atraso na fala, que, segundo o relato dos pais, foi o principal motivo que os levaram ao consultório de um especialista. Por isso, é importante ficar atento aos marcos do desenvolvimento da fala.
Dificuldade em acreditar no diagnóstico
Mas como saber se seu filho é autista? Nem sempre é fácil entender e aceitar um diagnóstico de autismo. Edyclaudia ressalta a dificuldade da família de uma criança com sinais de autismo em acreditar no diagnóstico em um primeiro momento. Segundo ela, o fato de fisicamente a criança se apresentar perfeitamente é o principal motivador dessa descrença.
“É muito difícil a família aceitar e acreditar no diagnóstico porque fisicamente a pessoa está bem, sem nenhum problema. Eles (pais) vão começar a observar que há dificuldade com aquela criança porque ela vai começar a ter comportamentos diferentes. As pessoas falam que elas ficam no mundinho delas, mas não é isso. É que de alguma forma o nosso mundo não está chegando até ela”, explica a especialista.
De acordo com a especialista, o desenvolvimento da criança autista acontece de forma mais lenta se comparadas com outras sem a característica. “Tem muitas crianças autistas que participam, interagem, mas da forma delas, não como gostaríamos, não como as famílias ou a escola gostariam. A criança autista vai, de acordo com o desenvolvimento dela, nos dando essas respostas, mas não tão rapidamente”, diz.
Ambiente externo pode causar TEA
De acordo com a fonoaudióloga Danielle Damasceno, tem havido um aumento no número de crianças e bebês diagnosticados com TEA nos últimos tempos, mas uma gama de características devem ser levadas em consideração para o diagnóstico. Ela lembra que uma pesquisa americana revelou que os fatores relacionados ao ambiente externo chegam a deter 50% da responsabilidade pelo transtorno.
“Ao mesmo tempo que ir ao shopping pode ser uma ‘agressão’ visual e auditiva para uma criança com o transtorno, para outra pode ser o máximo – e para esta criança, estar em um local com ‘muito’ estímulo (auditivo e visual) pode ser a porta de entrada para as aprendizagens de uma forma geral”, define Danielle, atestando que nem todo profissional está preparado para avaliar de forma eficaz uma criança autista.
“O autismo não é uma disfunção num equipamento mecânico ou elétrico que possua um manual para repará-lo. Uma das maiores dificuldades que a família da criança autista enfrenta é a inclusão na sociedade. As pessoas não sabem conviver com o diferente. A sociedade não está preparada para receber o diferente. Precisamos mudar isso”, afirma Danielle.
Importância do professor
O tratamento de uma criança autista se dá com uma equipe multidisciplinar composta por psicólogo, fonoaudiólogo, psicopedagogo, terapeuta ocupacional, psicomotricista, educador físico (de acordo com a necessidade de cada criança), e em algumas situações com intervenção medicamentosa sob a orientação e acompanhamento de um neurologista ou psiquiatra infantis. Apesar disso, conforme a psicóloga, o desenvolvimento de características como a fala vai depender de cada pessoa. “Algumas crianças autistas vão desenvolver oralidade, outras não. Não tem uma situação que garanta que uma criança vai falar”, diz.
De acordo com o médico neuropediatra Heber Maia, mestre em Medicina na área de Neurologia e doutor em Psiquiatria pela UFRJ, pesquisador do Programa de Pós-graduação em Neurologia/Neurociências e de Pós-graduação em Saúde Materno-Infantil da Universidade Federal Fluminense, o professor deve estar apto a entender as diferenças do desenvolvimento infantil, a fim de garantir uma aprendizagem adequada aos alunos.
“Se o professor não entende a forma como abordar esse aluno, como interagir com essa criança, não haverá aprendizagem. Então, passar esse tipo de conhecimento para o educador é essencial. Principalmente porque a escola é o lugar onde a criança passa boa parte do tempo. Muitas vezes será o profissional de educação que vai detectar os primeiros sinais do autismo e que vai solicitar encaminhamento para uma avaliação”, explicou o especialista.
As primeiras palavras
O atraso da fala pode trazer sérias consequências para o processo de aprendizado, assim como para as interações sociais. Segundo a fonoaudióloga Carolina Pacheco, membro do corpo terapêutico da NeuroKinder, é a partir do quarto mês que o bebê começa a balbuciar, ou seja, a emitir alguns sons repetitivos. “Esse é um dos marcos principais para o desenvolvimento da fala. Por isso, se o bebê não está balbuciando, é preciso investigar”, afirma.
A partir daí o progresso da fala acontece por etapas. Aos nove meses, a criança já entende o que é não e já começa a dar tchau. Por volta do primeiro ano de vida, ela já fala algumas palavras como mamá e papá. A partir dos 18 meses, o vocabulário infantil começa a tomar forma e os pais já conseguem entender algumas palavras.“Espera-se que aos três anos a criança utilize tempos verbais, como eu vou ou eu fui. É nessa fase que há um grande aumento da habilidade de compreensão e expressão. O normal é que, aos quatro ou cinco anos, a fala já tenha se desenvolvido por completo”, afirma Carolina.
A psicóloga destaca que é importante a família observar o transtorno o quanto antes. Segundo ela, o ideal é que ele seja identificado durante o período de zero a três anos de idade. “Se você tem uma criança nessa faixa etária e ela não corresponde a brincadeiras que você faz, se a fala dela não é aquela na qual você consegue perceber o que está dizendo, ainda não tem uma conexão de frase, mas apenas palavras soltas e você não identifica aonde ela adquiriu aquele vocabulário pode acessar os sinais de alerta. Se a criança não está interagindo, se quando você sai para um aniversário, para um parquinho, e ela não consegue ficar em contato com outras crianças, está sempre brincando com um objeto de modo repetitivo, todos estes sinais servem para identificar o transtorno”, aponta a profissional.
Quando é considerado atraso?
A grande dúvida dos pais é: como saber se a criança está com a fala atrasada? O melhor jeito é se informar e sempre estar atento ao que é esperado para cada fase do desenvolvimento. Veja abaixo alguns sinais que precisam ser investigados, lembrando que nem sempre estão ligados ao autismo:
– Quando não balbucia ou não emite nenhum som a partir do terceiro mês
– Se, aos oito meses, não fala nenhuma vogal ou consoante
– Com 16 meses não fala nenhuma palavra
– Não combina duas palavras aos dois anos
Da Redação, com assessorias