Com a promessa de resultados rápidos, as ‘canetas emagrecedoras’ se tornaram objetos de desejo nos consultórios médicos, clínicas estéticas e sites de busca da internet. Segundo dados do Google Trends, o termo já superou até mesmo a palavra ‘dieta’ em número de pesquisas. Nos últimos seis anos, as vendas desses produtos cresceram mais de 660%.

Recentemente, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) acelerou a fila de análise dos registros de medicamentos à base de liraglutida e semaglutida, princípios ativos das canetas emagrecedoras, em atendimento ao pedido do Ministério da Saúde. Essa medida foi tomada em um momento de alta procura por essas canetas no país, ampliando a discussão sobre a sua finalidade.

As polêmicas envolvendo esse tipo de medicação, originalmente usada no tratamento de obesidade e diabetes, incluem desinformação e muitas dúvidas de quem busca, nas canetas, uma forma de perder peso. A questão perpassa temas que vão além da saúde, concentrando-se também em demandas estéticas, culturais e sociais, como o culto à magreza e a gordofobia.

Regulamentação e cuidados

As canetas emagrecedoras disponíveis no mercado brasileiro são medicamentos regulamentados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Elas foram desenvolvidas originalmente para o tratamento de Diabetes Mellitus tipo 2 ou obesidade. O preço varia de R$ 600 a R$ 1.800 por unidade.

Quando injetam substâncias que imitam hormônios intestinais, elas promovem a saciedade e retardam o esvaziamento gástrico. A sensação de ‘estômago cheio’ diminui o apetite e, consequentemente, o peso.

Elas são consideradas fármacos de uso controlado, que exigem prescrição médica e acompanhamento especializado. Não são suplementos ou produtos de beleza”, ressalta Janaiara Moreira Sebold Berbel,  coordenadora do curso de Nutrição do Centro Universitário Integrado de Campo Mourão (PR).

“O endocrinologista é quem vai determinar a dose, o princípio ativo e o tempo do tratamento. Fazer uso desses remédios sem acompanhamento pode trazer graves problemas de saúde; seja por efeitos colaterais, reganho de peso ou emagrecimento ineficiente”, alerta a professora do curso de Nutrição do Integrado, Camila Frazão.

Quem consome e por quê?

Segundo Janaiara, quem mais consome as canetas emagrecedoras são as mulheres jovens e adultas. “A cobrança pelo corpo ideal ainda recai de forma mais intensa sobre elas. Muitas já tentaram várias dietas e métodos convencionais sem sucesso. Por isso, recorrem a uma solução aparentemente definitiva”, explica.

A nutricionista alerta que a proximidade do verão faz a procura aumentar ainda mais. “O fator estético ganha pessoa adicional nesta época do ano. Muitas mulheres querem perder de 5 a 10 quilos em poucos meses e alcançar o chamado ‘corpo de praia’, mas isso pode colocar a própria saúde em risco”, adverte.

A palavra dieta continua associada à restrição, disciplina e tempo. Já as canetas oferecem a ideia de emagrecimento sem sofrimento, sem mudança de hábitos; um tipo de solução rápida para um problema complexo, como a obesidade”, alerta

Perigos do uso indiscriminado

Apesar da popularidade, as canetas emagrecedoras não podem ser compradas livremente nas farmácias, drogarias e internet. Por serem de uso controlado, exigem receita médica, que fica retida no estabelecimento.

Embora apresentem benefícios à saúde, quando bem indicadas, as canetas emagrecedoras podem causar efeitos colaterais como náuseas, vômitos, diarreia, constipação e dores abdominais. Em situações mais raras, podem ocorrer pancreatite e hipoglicemia.

Emagrecer deve ser entendido como um processo de saúde, de cuidado e não apenas como uma questão de aparência estética. Quando a pressa supera o cuidado, o risco aumenta”, destaca a especialista e nutricionista.

Não existe solução mágica

Camila Frazão reforça que os injetáveis não substituem bons hábitos de vida, como a prática de atividade física e a reeducação alimentar.

“Quando isso acontece e o tratamento farmacológico é realizado com acompanhamento médico regular e multidisciplinar – envolvendo nutricionistas, psicólogos e educadores físicos especializados – o emagrecimento é mais eficiente, preserva a massa magra e garante maior estabilidade ao metabolismo”, explica.

Segundo as especialistas, o medicamento deve ser visto como uma ferramenta auxiliar, mas não como solução mágica. “O foco é garantir saúde e qualidade de vida. Não há atalhos seguros para o emagrecimento verdadeiro e sustentável, que passará pela mudança de hábitos e pelo cuidado contínuo com o próprio corpo”, conclui Janaiara Moreira Sebold Berbel.

Entenda como funcionam as canetas emagrecedoras e os riscos do seu uso indiscriminado

Gastroenterologista Yael Albuquerque, do Brasil Private Check-up (BPC), que integra a AFIP, comenta os perigos da popularização de inibidores de apetite

A fim de esclarecer dúvidas e elucidar essas questões, a médica gastroenterologista Yael Albuquerque, especialista do Brasil Private Check-up (BPC)que integra a AFIP, comenta a regulação nacional desses medicamentos, a finalidade, ação no organismo e os riscos causados pelo uso sem prescrição médica.

Segundo a médica, essas medicações não são inofensivas. “Quando usadas sem acompanhamento, podem causar enjoos, vômitos, diarreia ou prisão de ventre. Em alguns casos, há risco de inflamação no pâncreas, pedras na vesícula, alteração na função dos rins e até quedas no açúcar do sangue”, comenta. Ela alerta ainda sobre a proibição de uso para casos de pessoas com histórico de certos tipos de câncer.

Yael afirma que o uso desses medicamentos deve ser prescrito após entendimento de como ele funciona no organismo: “As canetas imitam um hormônio natural do corpo chamado GLP-1. Isso faz a pessoa sentir mais saciedade, comer menos e digerir os alimentos mais devagar. Como consequência, há uma redução na ingestão de calorias. Para quem tem diabetes, ainda ajudam a controlar a glicose no sangue”, explica.

A respeito da produção nacional das canetas, a especialista afirma que cada país tem suas próprias regras para regulação, e que, no Brasil, a Anvisa é quem garante a segurança dos medicamentos. Os problemas começam, segundo ela, quando as pessoas compram esses produtos pela internet, no exterior, sem garantia da procedência, ou integridade.

Não é um recurso para quem só quer ‘perder uns quilinhos’, é uma medicação que precisa de indicação médica e acompanhamento”, alerta.

Segundo a médica, o acompanhamento de um gastroenterologista é muito importante, já que os principais efeitos colaterais dessas medicações acontecem no sistema digestivo. O especialista vai acompanhar sintomas, ajustar a medicação se necessário, cuidar da saúde intestinal e orientar para que a perda de peso seja feita de forma segura, equilibrada e duradoura.

banalização do uso dessas medicações, vista de maneira crescente na internet, é preocupante para a médica: “As canetas podem ajudar, sim, na perda de peso, mas precisam estar dentro de um plano de tratamento, com acompanhamento médico e mudanças de hábitos. Quando usadas sem orientação, elas aumentam os riscos à saúde e diminuem as chances de sucesso a longo prazo”.

Palavra de Especialista

Uso indiscriminado de ‘canetas emagrecedoras’ é prejudicial à saúde

Por Leticia Paviani, Noemi da Silva Pereira, Cassia Regina Bruno Nascimento e Ana Paula Franco Punhagui-Umbelino*

Dentre as principais preocupações levantadas na área da saúde está a conscientização da importância de uma alimentação saudável para o controle de doenças, sobretudo da obesidade, que já é considerada epidemia global. Tanto que a Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que, em 2025, cerca de 2,3 bilhões de adultos estejam acima do peso em todo o mundo.

Além do fator estético envolvido, a obesidade pode levar os indivíduos a desenvolverem fatores de risco com consequências diversas, como acúmulo de gordura no fígado, hipertensão arterial, doenças cardiovasculares e Diabetes Mellitus.

Como forma de auxiliar no tratamento da obesidade, as famosas “canetas emagrecedoras” ganharam notoriedade, sobretudo pela promessa de rápido resultado. Isso porque, alguns compostos químicos dessas canetas, como a Semaglutida e a Liraglutida, que anteriormente vinham sendo utilizadas como aliados no tratamento da diabetes, ganharam popularidade por conta do seu principal efeito colateral entre esses pacientes: a perda de peso.

Mas será que esse é o melhor caminho a ser tomado? Até agora há mais dúvidas do que certezas.

Sabemos que o processo de emagrecimento é, muitas vezes, complexo e difícil, o que faz que muitos pacientes desistam diante da impossibilidade de alcançar o resultado desejado. Dentre os fatores determinantes para o fracasso durante o tratamento de perda de peso estão a rotina agitada, falta de atividade física, consumo exagerado de ultraprocessados e a má qualidade do sono.

Devido a isso, muitos pacientes procuram soluções com resultados mais rápidos e menos onerosos, como o uso de medicação para emagrecer. Dessa forma, o uso das canetas emagrecedoras vem sendo aplicado em pacientes de forma chamada off label, que se trata do uso de um produto com finalidade diferente do aprovado em bula.

Efeitos colaterais e alto custo dos medicamentos

Ainda que o uso das canetas para tratamento da diabetes já vinha acontecendo para a perda de peso, foi somente em janeiro deste ano que houve a liberação oficial da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) do uso da Semaglutida, especificamente, para fins de emagrecimento. Então, muito mais pessoas começaram a buscar este recurso visando a redução de peso.

Infelizmente, o uso de medicação sempre apresenta efeitos colaterais, dentre eles náuseas, vômitos, diarreia, flatulência, dor de cabeça e constipação, bem como a possibilidade de reganho de peso após o fim do tratamento. Outro fator é o alto custo dessas canetas, que chegam a custar mais de mil reais.

É importante ressaltar que o uso de canetas emagrecedoras pode ser um aliado para pacientes que apresentam resistência à perda de peso, mesmo após ajustes nos hábitos alimentares e hábitos de vida. Mas, muitas vezes, quando utilizada de forma individual, não gera os resultados prometidos.

Afinal, para o processo de emagrecimento ser eficiente, sugere-se uma alteração nos hábitos do cotidiano, incentivando a prática de atividade física e sono adequado, bem como, obviamente, alteração nas práticas alimentares, incentivando uma dieta rica em fibras, frutas e verduras, a fim de proporcionar mudanças permanentes naqueles que procuram emagrecer.

Sendo assim, faz-se necessário salientar que o uso de qualquer medicamento deve ser acompanhado por um médico especialista na área. Portanto, para que o resultado do tratamento para perda de peso seja duradouro, deve ser acompanhado de uma equipe multiprofissional, a fim de um olhar integral para todos os aspectos envolvidos nesse processo, podendo fazer parte o profissional nutricionista, médico especialista e profissional de educação física.

*Leticia Paviani, Noemi da Silva Pereira, Cassia Regina Bruno Nascimento e Ana Paula Franco Punhagui-Umbelino são professoras do curso de Nutrição na UniCesumar em Londrina.

Com Assessorias

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