A semana dedicada ao Dia Mundial sem Tabaco (31 de maio), é uma oportunidade estratégica para conscientizar a população sobre os perigos do tabagismo e seus impactos na saúde pública. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o tabagismo é responsável por mais de 8 milhões de mortes anuais.
No Brasil, o câncer de pulmão segue entre os tipos mais letais, sendo a principal causa de morte por câncer entre homens e a segunda entre mulheres. De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA), o tabagismo está diretamente ligado a cerca de 90% dos casos da doença.
Nos últimos anos, além do cigarro tradicional, o uso crescente dos cigarros eletrônicos, especialmente entre adolescentes e adultos jovens, tem preocupado médicos e entidades de saúde. Um estudo divulgado pela Associação Paulista de Medicina indicou que usuários de cigarro eletrônico foram diagnosticados com câncer quase 20 anos antes do que fumantes convencionais.
O mesmo estudo aponta que, enquanto o risco de câncer para um fumante de cigarros tradicionais é 1,9 vezes maior em comparação com não fumantes, para usuários de vapes e cigarros eletrônicos, esse risco aumenta para 2,2 vezes.
O câncer de pulmão, historicamente associado a adultos mais velhos, tem sido diagnosticado com maior frequência em pacientes mais jovens, muitos dos quais são usuários de cigarros eletrônicos. Isso é preocupante, pois esses dispositivos são frequentemente percebidos como menos nocivos, o que não é verdade”, alerta Antonio Cavaleiro, coordenador médico do Centro de Oncologia e Hematologia do Hospital Santa Catarina Paulista.
Apesar de serem comercializados com a promessa de serem menos prejudiciais ou auxiliarem na cessação do tabagismo, os cigarros eletrônicos contêm nicotina em altas concentrações, além de substâncias tóxicas que afetam diretamente o sistema respiratório.
Os cigarros eletrônicos podem provocar inflamações severas e lesões pulmonares graves. A composição do vapor inalado, que inclui solventes, flavorizantes e metais pesados, ainda está sendo estudada, mas já sabemos que é capaz de causar danos similares, e por vezes até mais agudos, do que o cigarro convencional”, explica Alberto Cukier, pneumologista do Hospital Santa Catarina Paulista.
O cenário é agravado por dados recentes do IBGE que indicam que cerca de 17% dos adolescentes brasileiros entre 13 e 17 anos já experimentaram o cigarro eletrônico. O acesso fácil, o apelo visual dos dispositivos e a variedade de sabores contribuem para a falsa ideia de que eles são inofensivos.
É fundamental que pais e educadores estejam atentos aos sinais do uso e conversem abertamente com os jovens sobre os riscos reais. A prevenção precisa começar dentro de casa e ser reforçada com políticas públicas de regulação e informação”, completa o Dr. Cukier.
Além das doenças pulmonares, o uso contínuo do tabaco, em qualquer forma, também está relacionado a uma série de outras condições crônicas, como doenças cardiovasculares, hipertensão, diabetes e até infertilidade.
A nicotina é uma droga altamente viciante, e sua presença em dispositivos eletrônicos não muda esse fato. O risco de dependência é real e subestimado por muitos jovens”, pontua o Dr. Cavaleiro.
Para quem deseja parar de fumar, é fundamental buscar orientação profissional. “Existem diversas abordagens seguras e eficazes para cessar o tabagismo. O mais importante é dar o primeiro passo e procurar orientação. Parar de fumar, em qualquer idade, traz benefícios à saúde”, reforça o Dr. Cavaleiro.
A epidemia silenciosa dos vapes entre jovens
Entre 2018 e 2023, o Brasil registrou um aumento de 600% no número de fumantes de cigarros eletrônicos, conhecidos como vapes, de acordo com dados do Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica). A pneumologista do Hospital Sírio-Libanês, Elnara Negri, destaca que o uso desses dispositivos entre adolescentes está se tornando uma epidemia silenciosa.
“Estamos diante de uma geração que está sendo fisgada precocemente pela nicotina, muitas vezes sem perceber o risco”, alerta a médica. Disfarçados em sabores adocicados e design colorido, os vapes contêm substâncias altamente viciantes e tóxicas, como metais pesados e compostos químicos que podem causar danos pulmonares e cerebrais permanentes. De acordo com a médica, o sal de nicotina presente nesses dispositivos tem absorção até dez vezes mais rápida que a nicotina comum, o que acelera o vício.
Apesar da proibição vigente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para fabricação, importação, comercialização, distribuição, armazenamento, transporte e propaganda de dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs), como os cigarros eletrônicos, o consumo desses produtos segue em crescimento.
De acordo com Guilherme Harada, médico oncologista do Hospital Sírio-Libanês, a regulamentação já existe no Brasil por meio da proibição, mas ela precisa ser acompanhada de ações efetivas de fiscalização, especialmente nos pontos de venda físicos e online. “A ausência de controle sobre o comércio ilegal desses dispositivos favorece o acesso por adolescentes e jovens, o que representa um grave retrocesso nas políticas de controle do tabagismo”, diz Harada.
O especialista também alerta para os riscos muitas vezes subestimados pelos usuários: “Há uma falsa percepção de que os vapes são inofensivos ou menos prejudiciais que o cigarro tradicional, o que não é verdade. Estamos lidando com dispositivos altamente viciantes e prejudiciais à saúde.”
Enquanto países como Austrália, Alemanha e França já adotaram medidas rigorosas para restringir ou regulamentar o uso de cigarros eletrônicos, o Brasil enfrenta o desafio de implementar mecanismos de fiscalização que garantam o cumprimento da proibição vigente. “O Dia Mundial Sem Tabaco precisa ser um marco de conscientização não só sobre os malefícios do cigarro, mas sobre a necessidade urgente de proteger nossos jovens dessa nova armadilha da indústria do tabaco”, conclui Elnara.
Com Assessorias