O verão é a estação preferida de muitos brasileiros, mas as altas temperaturas exigem atenção redobrada com a saúde do coração e do cérebro. Especialistas alertam que o calor intenso não provoca apenas desconforto térmico; ele submete o sistema cardiovascular a um estresse severo que traz perigos silenciosos e pode desencadear eventos graves, como o infarto do miocárdio e, principalmente, o Acidente Vascular Cerebral (AVC).
No Hospital Quali Ipanema, no Rio de Janeiro, a chegada do verão costuma dobrar o número de atendimentos por AVC, saltando para cerca de 30 casos mensais. “Atendemos cerca de 30 pacientes por mês no verão, o que representa o dobro das épocas normais”, disse o neurocirurgião Orlando Maia, em entrevista à Agência Brasil.
Ele reforça que o AVC é hoje a doença isolada mais frequente na humanidade — estima-se que uma em cada seis pessoas terá um evento desses ao longo da vida. A prevenção, por meio de hábitos saudáveis e controle médico, continua sendo o melhor tratamento.
Por que o calor aumenta o risco de AVC?

De acordo com o especialista, a desidratação é um dos principais gatilhos. “Quando o corpo perde muito líquido pelo suor e não há a reposição adequada, O calor gera uma desidratação natural das células que faz com que o sangue fique mais espesso e concentrado. Isso favorece a formação de coágulos e aumenta a predisposição ao AVC isquêmico, que ocorre quando um vaso cerebral é entupido“, explica o médico. Esse tipo representa cerca de 80% dos casos.
Além disso, o calor causa a vasodilatação: os vasos sanguíneos se dilatam para ajudar o corpo a perder calor. Esse processo pode baixar a pressão arterial, o que parece positivo, mas em excesso pode gerar arritmias e favorecer a formação de coágulos dentro do próprio coração. Como 30% do sangue que sai do coração vai direto para o cérebro, qualquer coágulo formado ali tem grandes chances de causar um derrame.
O fenômeno do “sangue grosso” e a pressão arterial
O risco cardiovascular aumenta quando os termômetros ultrapassam os 32°C, causando o que os especialistas chamam de “sangue grosso”. A cardiologista Daniele Salas esclarece que, para tentar resfriar o organismo, o corpo humano utiliza dois mecanismos que sobrecarregam o coração:
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Vasodilatação: Os vasos sanguíneos se dilatam para dissipar o calor, o que pode causar queda da pressão arterial (hipotensão).
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Sudorese e vasoconstrição: A perda de líquidos pelo suor pode levar à desidratação. Para manter a pressão arterial estável, os vasos podem se estreitar em seguida, deixando o sangue mais viscoso e acelerando os batimentos cardíacos.
Esse esforço dobrado do coração para manter as funções básicas pode ser fatal para quem já possui doenças crônicas como diabetes, hipertensão e insuficiência cardíaca.
Férias, álcool, tabagismo e negligência: combinação explosiva
O comportamento típico de férias também contribui para as estatísticas. O aumento no consumo de bebidas alcoólicas agrava a desidratação e eleva o risco de arritmia cardíaca — o coração batendo fora do ritmo. Segundo o Dr. Orlando Maia, a arritmia facilita a formação de coágulos que podem viajar do coração diretamente para o cérebro, já que o órgão recebe 30% de todo o sangue bombeado.
O consumo de bebidas alcoólicas, comum em festas e praias, potencializa a desidratação e eleva o risco de arritmias. Além disso, o relaxamento com horários nas férias leva muitos pacientes a esquecerem seus remédios de uso contínuo, o que é um erro crítico.
Já o tabagismo é outro fator agravante pois atua diretamente na estrutura dos vasos sanguíneos. “A nicotina bloqueia a elastina, proteína que dá elasticidade aos vasos, favorecendo tanto o AVC hemorrágico quanto o processo inflamatório que leva ao entupimento das artérias”, pontua o Dr. Orlando Maia.
Grupos de risco e prevenção
Embora o AVC possa atingir qualquer pessoa — uma em cada seis terá a doença na vida —, alguns grupos precisam de vigilância total:
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Idosos e crianças: possuem mecanismos de compensação térmica menos eficientes.
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Hipertensos e diabéticos: a oscilação da pressão no calor pode descompensar o tratamento.
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Pessoas com varizes: a vasodilatação aumenta o inchaço e a dor nas pernas, elevando o risco de trombose venosa.
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Fique atento aos sinais de alerta: identifique uma emergência
A rapidez no socorro é a diferença entre a recuperação e a sequela permanente (ou morte). No caso do AVC, o tratamento para desobstruir vasos pode ser feito via medicação em até 4h30 ou por cateterismo em até 24h, em casos selecionados. Saiba reconhecer os sintomas:
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AVC: Fraqueza ou paralisia súbita de um lado do corpo, fala enrolada, perda de visão de um dos lados, tonteira extrema, confusão mental ou dor de cabeça intensa.
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Infarto: Dor ou pressão no peito (podendo irradiar para braço ou maxilar), suor frio, tontura, falta de ar e até sintomas atípicos como azia e má digestão.
| Sintomas de AVC | Sintomas de Infarto |
| Fraqueza ou paralisia de um lado do corpo | Dor ou pressão no peito (pode irradiar para braço ou maxilar) |
| Fala enrolada ou dificuldade de expressão | Suor frio e tontura |
| Perda súbita de visão ou visão dupla | Falta de ar e cansaço excessivo |
| Tontura extrema e perda de equilíbrio | Náuseas, vômitos ou sensação de má digestão |
Importante: Em caso de AVC, remédios para dissolver coágulos só podem ser dados até 4 horas e meia após o início dos sintomas. O uso de cateter para aspiração do coágulo pode ser feito em até 24 horas, mas quanto antes o paciente chegar ao hospital, maior a chance de retorno ao normal.
Como se proteger durante a estação
Para aproveitar o verão com saúde, siga as recomendações dos especialistas:
- Hidratação máxima: Beba água constantemente, mesmo sem sentir sede.
- Alimentação leve: Priorize frutas (melancia, melão, laranja), saladas e evite sal em excesso.
- Fuja do sol pico: Evite exposição direta e exercícios intensos entre 10h e 16h.
- Cuidado com as pernas: Em viagens longas, movimente os pés a cada duas horas para evitar coágulos.
- Check-up em dia: Se você já possui doenças crônicas, consulte seu médico antes de viajar para ajustar a medicação.
O cérebro e o coração não tiram férias. O monitoramento da pressão arterial em casa, com aparelhos certificados, pode ser um aliado vital para identificar alterações precoces e buscar ajuda médica imediatamente.
Com informações da Agência Brasil e Assessorias




