Aos 90 anos, ativo e independente, Pedro Ferreira Gomes enfrentava limitações marcantes impostas pela estenose aórtica, um estreitamento progressivo da válvula que conduz o sangue do coração para o restante do corpo, causando falta de ar e desmaios. Em outubro, o aposentado se tornou o primeiro paciente a receber um implante percutâneo de válvula aórtica (TAVI) pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF), conhecido como Hospital do Fundão, no Rio de Janeiro.
O TAVI é um procedimento menos invasivo que a cirurgia convencional e é indicado principalmente para idosos com estenose aórtica e alto risco. Diferente da cirurgia aberta, não há necessidade de abrir o tórax nem de pontos. Isso reduz dor, complicações e tempo de recuperação, segundo especialistas. Na rede privada, o procedimento chega a custar R$ 70 mil, como informou a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), que administra o hospital, em conjunto com o Instituto do Coração Edson Saad (ICES-UFRJ).
Esse procedimento não é uma coisa tão comum, mas é muito importante e, felizmente, foi maravilhoso para mim. Não me dá trabalho nenhum, sofrimento algum. Depois que a válvula é colocada, fui para casa e nunca mais senti nada, nem parece que colocaram algo. Simplesmente aumentou minha resistência. As dores nas pernas acabaram e o cansaço somiu. Tudo funciona perfeitamente”, relata.
Pedro destaca a tranquilidade durante a intervenção: “Quando terminou, os médicos faziam perguntas e eu respondia sem dificuldade. Estava totalmente consciente”. Segundo ele, a recuperação em casa “também foi simples”. Sobre o receio de se submeter a uma técnica inovadora, ele sentencia: “Na idade de 90 anos, fazer um procedimento desses é um prêmio. Não tive medo nenhum”, demonstrando confiança na equipe e no processo.
De acordo com os médicos envolvidos na cirurgia, o primeiro TAVI do HUCFF representa um ganho significativo de qualidade de vida para o paciente. Responsável pela execução do primeiro procedimento no Hospital do Fundão, o cardiologista Ângelo Tedeschi assegura:
Conseguimos realizar o procedimento graças a uma avaliação criteriosa. Por ser um tratamento de alto custo, a seleção é essencial para garantir benefício real. O paciente teve alta rapidamente, sem complicações, e voltou a ter uma vida muito mais ativa”, relata.
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Uma alternativa menos invasiva
Ângelo Tedeschi detalha a diferença entre a cirurgia tradicional e a técnica minimamente invasiva empregada na cirurgia do senhor Pedro. Na cirurgia tradicional, a válvula é removida por meio de abertura do tórax e circulação extracorpórea. Ou seja, uma abordagem mais arriscada para pacientes idosos e com múltiplas doenças associadas.
O TAVI mudou a história da estenose aórtica em pacientes frágeis. A recuperação é mais rápida e o risco é menor”, resume o médico.
Segundo ele, a válvula nova é comprimida dentro de um cateter fino. Através de uma punção na virilha, ela é levada até a válvula doente e aberta ali dentro, esmagando a válvula antiga e passando a funcionar imediatamente.
O médico destaca ainda que o sucesso desse primeiro caso reforça a capacidade do hospital em oferecer tratamentos de ponta na área cardiovascular.
Esse tipo de intervenção exige equipe treinada, equipamentos adequados e grande precisão técnica. Realizar o TAVI aqui demonstra que estamos preparados para expandir nosso alcance, oferecer mais segurança aos pacientes e incorporar terapias modernas ao sistema público”, acrescenta.
Hemodinâmica em expansão
O HUCFF planeja expandir o número de procedimentos estruturais realizados no setor de Hemodinâmica, incluindo o TAVI. Para isso, o hospital se prepara para uma modernização completa da área, que envolve a reativação de uma sala e a instalação de um novo angiógrafo, mais moderno e preciso.
Nosso objetivo é iniciar com um implante a cada dois meses — cerca de seis por ano — e avançar até chegarmos a uma realização mensal”, projeta o chefe da Unidade de Sistema Cardiovascular do HUCFF, Juliano Carvalho.
Segundo ele, com essa renovação, o HUCFF ampliará não só os TAVI, mas também outros procedimentos estruturais que evitam cirurgias abertas. Tudo isso irá impactar diretamente a fila de espera local e o ensino, a pesquisa e a formação, uma vez que os procedimentos fortalecem o papel do HUCFF como centro de referência acadêmica.
Com mais procedimentos estruturais, nossos residentes e jovens hemodinamicistas terão acesso a técnicas avançadas, que geram novas pesquisas e publicações”, avalia Juliano.
Com informações do HUCFF





