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Um lugar que é feito para salvar vidas pode representar o fim por uma falha que poderia ter sido evitada. Uma cruel estatística, fruto da má qualidade dos serviços de saúde no Brasil, tanto na rede pública quanto na privada, acende o sinal vermelho para a falta de controle do ambiente hospitalar. Pesquisa do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS) aponta que todo dia, 829 brasileiros morrem em decorrência de condições adquiridas nos hospitais, o que equivale a três mortos a cada cinco minutos.

Erros de dosagem ou aplicação de medicamentos, uso incorreto de equipamentos e infecção hospitalar são alguns exemplos de “eventos adversos”, já considerados a segunda causa de morte mais comum no Brasil. Foram 302.610 brasileiros mortos em hospitais públicos ou privados como consequência de um “evento adverso” apenas em 2016. Isso significa que os eventos adversos matam mais do que a soma de acidentes de trânsito, homicídios, latrocínio e câncer (veja a comparação abaixo). De acordo com o IESS, os números não indicam que necessariamente houve um erro, negligência ou baixa qualidade, mas trata-se de incidente que poderia ter sido evitado, na maior parte das vezes.

De acordo com o primeiro Anuário da Segurança Assistencial Hospitalar no Brasil, do IESS, produzido pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), dos 19,1 milhões de brasileiros internados em hospitais ao longo de 2016, 1,4 milhão foram “vítimas” de ao menos um evento adverso. No mundo, de acordo com o documento, ocorrem anualmente 421 milhões de internações hospitalares e 42,7 milhões de eventos adversos, um problema de saúde pública reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Nos Estados Unidos, país com população de quase 325 milhões de pessoas, os eventos adversos causam 400 mil óbitos por ano, ou 1.096 por dia. O que faz com que esta seja a terceira causa de morte mais comum naquele país, atrás apenas de doenças cardiovasculares e do câncer. O dado mais alarmante na comparação com os Estados Unidos é que o total de falecimentos por dia causados por eventos adversos está próximo do brasileiro. São 1.096 lá e 829 aqui. Mas a população norte americana é 55,6% maior do que a nossa. Eles são 323,1 milhões, enquanto nós somos 207,7 milhões.

Triste comparação

  • Dados do Observatório Nacional de Segurança Viária indicam a morte de aproximadamente 129 brasileiros por acidente de trânsito a cada dia;
  • O Anuário Brasileiro de Segurança Pública (produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública) aponta cerca de 164 mortes violentas (por homicídio e latrocínio, entre outros) por dia
  • O câncer mata 480 a 520 brasileiros por dia, segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca)
  • Apenas as doenças cardiovasculares, consideradas a principal causa de falecimento no mundo, matam mais pessoa no país: são 950 brasileiros por dia, de acordo com a Sociedade Brasileira de Cardiologia

Os erros mais frequentes

Ainda de acordo com o Anuário, as vítimas mais frequentes de eventos adversos são pacientes com menos de 28 dias de vida ou mais de 60 anos. As infecções hospitalares respondem por 9,7% das ocorrências. As condições mais frequentes são: lesão por pressão; infecção urinária associada ao uso de sonda vesical; infecção de sítio cirúrgico; fraturas ou lesões decorrentes de quedas ou traumatismos dentro do hospital; trombose venosa profunda ou embolia pulmonar; e, infecções relacionadas ao uso de cateter venoso central.

Sequelas e danos psíquicos

Além do óbito, os eventos adversos também podem gerar sequelas com comprometimento do exercício das atividades da vida do paciente e sofrimento psíquico, além de elevar o custo assistencial.  “Não existe sistema de saúde que seja infalível. Mesmo os mais avançados também sofrem com eventos adversos. O que acontece no Brasil está inserido em um contexto global de falhas da assistência à saúde nos diversos processos hospitalares. A diferença é que, no caso brasileiro, apesar dos esforços, há pouca transparência sobre essas informações e, sem termos clareza sobre o tamanho do problema, fica muito difícil começar a enfrentá-lo”, afirma o Dr. Renato Couto, professor da UFMG e um dos responsáveis pelo Anuário.

Perdas econômicas

Além das vidas perdidas, o Anuário projeta que, em 2016, os eventos adversos consumiram R$ 10,9 bilhões de recursos que poderiam ter sido melhor aplicados, apenas na saúde suplementar brasileira. Não foi possível estimar as perdas para o SUS porque os valores pagos aos hospitais se originam das Autorizações de Internações Hospitalares (AIHs) e são fixados nas contratualizações, existindo outras fontes de receita não operacionais, com enorme variação em todo o Brasil.

 

Sem garantias de qualidade

Para Luiz Augusto Carneiro, superintendente executivo do IESS, a pesquisa reforça que é preciso estabelecer um debate nacional sobre a qualidade dos serviços prestados na saúde a partir da mensuração de desempenho dos prestadores. Com isso, se deve “prover o paciente com o máximo possível de informações para escolher a quem ele vai confiar os cuidados com sua vida”.

O executivo destaca que, hoje, quando alguém escolhe um determinado hospital para se internar, essa decisão se baseia apenas em uma percepção de qualidade, na recomendação de um médico ou na opinião de conhecidos. Mas ninguém tem condições de garantir que aquele prestador realmente é qualificado, simplesmente porque não temos indicadores de qualidade claros e amplamente conhecidos, como acontece em outros países.

“Não há como saber quantas infecções hospitalares foram registradas no último ano, qual é a média de óbitos por diagnóstico, qual é a média de reinternações e por aí afora”, critica Carneiro. O estudo aponta, ainda, que os pacientes com alguma condição adquirida em função de evento adverso permaneceram internados aproximadamente três vezes mais do que o tempo previsto quando foram inicialmente admitidos nos hospitais.

Fonte:  Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), com Redação

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