O Brasil vem registrando uma sequência preocupante de casos de intoxicação por metanol em bebidas adulteradas. Pessoas internadas em estado grave, relatos de cegueira permanente e até mortes foram confirmadas em diferentes cidades. O perigo está justamente na semelhança com o etanol: incolor, com odor parecido e sabor quase imperceptível, o metanol pode passar despercebido em destilados falsificados.

Se para o consumidor comum o risco está na procedência da bebida, para os especialistas a questão é mais ampla: a substância circula no mercado de forma legal, sendo usada em processos industriais, laboratórios e combustíveis. E é nesse ponto que a discussão ultrapassa a esfera da saúde pública e atinge também o mundo do trabalho.

O outro lado da intoxicação: o risco ocupacional

Segundo o professor Edgar Bull, especialista em higiene ocupacional, especialista em Segurança do Trabalho e perito assistente técnico, o metanol não é um problema restrito a bares e adegas clandestinas. Ele está presente em rotinas industriais e, quando não há controle técnico adequado, a exposição dos trabalhadores pode ser tão perigosa quanto o consumo acidental.

O mesmo produto que hoje intoxica consumidores em bebidas adulteradas é manuseado diariamente em indústrias químicas e laboratórios. Sem EPI, ventilação adequada e laudos de avaliação ambiental, o risco de intoxicação ocupacional é real e grave”, alerta Edgar.

Além de náuseas, tontura e perda de consciência, a exposição contínua pode provocar danos permanentes ao sistema nervoso e à visão. Em ambientes sem protocolos de segurança, o perigo deixa de ser invisível para se tornar um passivo jurídico certo.

Quando a negligência se encontra: sociedade e trabalho

Casos de intoxicação coletiva em bares e festas chamam atenção pela tragédia imediata. Já no ambiente corporativo, os acidentes muitas vezes são silenciosos: funcionários expostos a vapores, contato com a pele, armazenamento incorreto. Nos dois cenários, a raiz é a mesma: falta de prevenção, fiscalização falha e improviso no manuseio de substâncias perigosas.

A cultura do improviso é que conecta os dois mundos. Seja no bar que compra bebida de origem duvidosa, seja na empresa que ignora uma perícia preventiva, o resultado é o mesmo: risco elevado de tragédia e responsabilização jurídica”, explica Bull.

O papel da perícia técnica na prevenção

Nos casos de bebidas adulteradas, é a análise laboratorial que confirma a presença de metanol. Já no ambiente de trabalho, a perícia técnica atua antes, diagnosticando riscos químicos, verificando rotinas de segurança e recomendando medidas que evitam acidentes.

A perícia preventiva é o que separa uma empresa segura de um futuro processo trabalhista. O que está acontecendo hoje nas ruas, com vítimas de bebidas adulteradas, é um alerta para que os empregadores não repitam o mesmo erro dentro de suas operações”, conclui Edgar Bull.

metanol é uma substância legal e útil, mas de risco altíssimo. Quando usado sem controle, seja em bebidas adulteradas ou em ambientes de trabalho, transforma-se em veneno. O desafio está em reconhecer que a prevenção é sempre mais barata e eficaz que a indenização ou a tragédia.

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Advogada criminalista analisa possíveis enquadramentos penais e civis no caso das bebidas alcoólicas adulteradas

As recentes investigações envolvendo a falsificação e adulteração de bebidas alcoólicas com a adição de metanol levantam sérias preocupações jurídicas e sociais. A substância, altamente tóxica, pode causar intoxicações graves e até levar à morte, o que torna o caso ainda mais grave.

De acordo com a advogada criminalista Giovanna Guerra, sócia da banca João Domingos Advogados e especialista em crimes econômicos, bancários, tributários e ambientais, a conduta pode se enquadrar no artigo 272, §1º, do Código Penal, que prevê penas de quatro a oito anos de reclusão, além de multa, para quem falsifica ou adultera substância alimentícia destinada ao consumo.

Estamos diante de um crime que expõe a risco um número indeterminado de pessoas, com potencial de gerar danos de grandes proporções. A utilização do metanol intensifica a gravidade da conduta, porque não se trata apenas de fraude econômica, mas de risco real à vida e à saúde dos consumidores”, explica Guerra.

Além da esfera criminal, as vítimas e familiares também podem buscar reparação na Justiça Cível, com ações de indenização por danos materiais, como despesas médicas, e danos morais, diante do sofrimento causado. Outro ponto de atenção é a possível responsabilização de comerciantes que, caso comprovado que tinham conhecimento da fraude, também podem ser responsabilizados civil e penalmente.

A advogada lembra ainda que, a depender das provas coletadas, pode surgir discussão sobre a configuração de homicídio qualificado pelo emprego de veneno. “Se ficar demonstrado que os envolvidos tinham, ao menos, a previsibilidade do resultado morte ao colocar o produto adulterado no mercado, o enquadramento no crime de homicídio se torna factível”, afirma.

Giovanna Guerra reforça que apenas com o avanço das investigações será possível determinar com precisão as responsabilidades e os crimes a serem aplicados. “O caso evidencia a importância da atuação rigorosa das autoridades competentes para a proteção da saúde pública e para a responsabilização adequada de práticas tão graves”, conclui.

Com Assessorias

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