O Rio de Janeiro enfrenta uma das ondas de calor mais severas dos últimos tempos, com os termômetros ultrapassando a marca dos 40°C e a cidade operando em estágio 3 de calor (em uma escala até 5). Diante do cenário crítico, que tem sobrecarregado o sistema de saúde, órgãos de controle e esferas governamentais intensificaram ações para proteger a população, com foco especial nos grupos mais vulneráveis.

O agravamento do calor extremo, que tem levado diariamente mais de 450 pessoas às emergências da cidade, levou o Ministério Público Federal (MPF), em conjunto com as Defensorias Públicas da União (DPU) e do Estado (DPRJ), a encaminhar um ofício às autoridades estaduais e municipais cobrando providências imediatas.

Ministério Público Federal (MPF) e as Defensorias Públicas da União (DPU) e do estado do Rio de Janeiro (DPRJ) encaminharam ao governo do Rio de Janeiro e à prefeitura da capital fluminense um pedido para que adotem recomendações urgentes de enfrentamento à onda de calor dos últimos dias.

O ofício assinado na noite de sexta-feira (26) trata de “adoção de providências urgentes, coordenadas e intersetoriais de proteção dos grupos vulnerabilizados diante de cenários de calor extremo”. O documento foi enviado ao governador Cláudio Castro, ao prefeito Eduardo Paes e secretários, como os da pasta da Saúde, tanto na esfera municipal quanto estadual.

O documento  aponta que as elevadas temperaturas configuram cenário de risco à saúde e à integridade física da população, destacando que os efeitos do calor extremo são sentidos de forma desigual, “afetando desproporcionalmente populações historicamente marginalizadas e em situação de vulnerabilidade social”.

Entre os impactos à saúde, os órgãos citam “desidratação, exacerbação de doenças crônicas, insolação, exaustão térmica e, em casos extremos, o golpe de calor (heatstroke), que apresenta elevada taxa de mortalidade”.

Recomendações urgentes do MPF e Defensoria

O MPF, DPU e DPRJ lembram que o próprio protocolo municipal orienta medidas como:

  • Pontos de resfriamento: Criação de locais com ar-condicionado ou refrigeração e áreas sombreadas abertas ao público, com ampla divulgação à população;

  • Atenção à população de rua: Ampliação da oferta de estações de hidratação ou distribuição de água nos locais de acolhimento das populações mais vulneráveis;

  • Centros de hidratação: Ativação dessas estruturas nas unidades de Atenção Primária à Saúde.

  • Pronto-atendimento: Preparo do Corpo de Bombeiros para resgates específicos e garantia de leitos na rede hospitalar.

  • Ampliação de horários: ossibilidade de ampliação dos horários de funcionamento dos locais públicos com ar-condicionado, refrigeração ou áreas sombreadas.

Recomendação e prazos

Entre as recomendações ao estado estão o preparo do Corpo de Bombeiros para o resgate de pessoas e garantia da disponibilidade de leitos e capacidade de atendimento na rede de saúde. O MPF e as Defensorias cobram que município e estado informem, dentro de 24 horas, medidas concretas deflagradas, com “indicação precisa” de:

  • pontos de resfriamento ativados, com endereços e horários de funcionamento;
  • locais e horários de distribuição de água e hidratação;
  • unidades de saúde atuando como centros de hidratação;
  • fluxos de atendimento e encaminhamento ativados;
  • operações de resgate e atendimento pré-hospitalar realizadas.

Leia também em Vida e Ação

Calor extremo: por que o corpo humano começa a falhar acima dos 35°C?
Rio 40 graus e o alerta de calor severo no Natal: entenda os cuidados
Calor extremo acende alerta para riscos de AVC e infarto
Mortes por calor extremo devem dobrar na América Latina até 2050

Em resposta à crise climática e ao aumento do fluxo de pessoas neste fim de ano, o Governo do Estado e a Prefeitura do Rio deflagraram operações integradas. No sábado (27), após o alerta do MPF e Defensorias, o Governo do Estado anunciou uma força-tarefa com  representantes do Corpo de Bombeiros, das secretarias de Saúde e do Ambiente e da Cedae para monitorar e coordenar ações para enfrentar as altas temperaturas  e as ondas de calor que atingem o Estado do Rio de Janeiro.

A iniciativa inclui medidas já adotadas pelo governo e que serão ampliadas durante este período, como uma megaoperação de hidratação em locais de grande circulação, equipes com motolâncias para atendimento de emergência e emissão diária de alertas”, informou o Governo.

Pela Prefeitura do Rio, a Secretaria de Saúde reforçou que segue o protocolo de proteção para calor extremo, sendo uma das pioneiras no país a estabelecer diretrizes para este tipo de evento climático. “A prefeitura do Rio foi a primeira e uma das únicas cidades do país a ter um protocolo de proteção para o calor extremo, e obviamente seguirá o protocolo publicado”, disse em nota a SMS-Rio.  “A recomendação para todo o estado deve ser avaliada por cada cidade, não cabendo à Secretaria Municipal de Saúde do Rio comentar”, completa a nota.

Distribuição gratuita de água potável: um alívio para cariocas e turistas

Uma das ações adotadas para minimizar os impactos das altas temperaturas é a hidratação da população. A Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae). iniciou neste último final de semana de 2025 uma megaoperação de hidratação com a distribuição de  15 mil litros de água e 3,4 toneladas de gelo.

A iniciativa utiliza a “Frota da Hidratação“, composta por uma kombi e bicicletas posicionadas em postos de salvamento nas praias da Zona Sul, como Leme, Copacabana, Arpoador, Ipanema r Leblon, além do Parque Madureira.

Nesta segunda-feira (29), a ação foi estendida a outras regiões da cidade: foram instalados pontos em terminais de transportes na estação Central do Brasil, em Bangu, Campo Grande e Madureira que, além de concentrarem grande quantidade de pessoas, são ‘ilhas de calor’ no Rio.

Para quem circula pelas ruas, a iniciativa é mais do que um serviço; é uma questão de saúde pública. A médica Georgette Moritz, que aproveitava a caminhada na orla de Copacabana, ressaltou a importância da ação preventiva. “Oferecer água é uma iniciativa maravilhosa para a população da cidade e para os turistas. Isso ajuda a evitar até o aumento de atendimentos nos postos de saúde”, afirmou.

O impacto é sentido especialmente por quem não tem onde se abrigar. Giovan da Silva, que vive em situação de rua, relatou a dificuldade de conseguir o básico em dias de sol escaldante. “Fui pedir água num bar ainda agora porque está calor demais e me negaram. Aqui no posto de hidratação eu consegui pegar e beber”, contou.

Até quem vem de regiões naturalmente quentes se surpreendeu com o clima fluminense. “Apesar de ser amazonense, essa onda de calor aqui está muito forte. Estou visitando o Rio e achei a ação de extrema importância para todos nós”, declarou a turista Glauciane Dias.

De acordo com o diretor-presidente da Cedae, Aguinaldo Ballon, a intenção é expandir o esquema de hidratação a outros locais do Rio como Nova Iguaçu Ele afirmou que não há risco de desabastecimento de água no estado, mesmo com o aumento de consumo no período do verão.  Ballon explicou que o Sistema Guandu, responsável pela maior parte do abastecimento, recebe água via região de Piraí e não registra problema.

“O abastecimento está normal e a previsibilidade para o verão é não ter nenhuma restrição hídrica”, disse, revelando ainda que o único sistema que tem alguma restrição é o de Acari, que é compensada pela produção do Guandu.

Atendimento nas UPAs e monitoramento

A Secretaria de Estado de Saúde (SES) instalou bebedouros nas 27 unidades de pronto atendimento (UPAs), a serem usados por pacientes ou por qualquer pessoa que esteja perto do local e queira beber água. As UPAs também funcionam como pontos de hidratação externa para a população em situação de vulnerabilidade.

Segundo Michel dos Santos, segurança da UPA de Copacabana, a procura é democrática: “Tem vindo muita gente beber água no posto de hidratação. Desde um juiz a banhistas saindo da praia e também muitas pessoas em situação de rua”.

Na frente de emergência, foram mobilizadas cinco duplas de motolâncias e veículos de intervenção rápida estrategicamente posicionados para realizar atendimentos ágeis em casos de insolação e exaustão térmica. As equipes assistenciais serão compostas por médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem, devidamente capacitados e equipados com os insumos necessários.

A secretária de estado de Saúde, Cláudia Mello, disse que o período do réveillon é preocupante, porque é maior o número de pessoas na cidade. Ela revelou que, de acordo com estudos da secretaria, o dia 18 de novembro de 2023 foi o que registrou número mais elevado de óbitos em consequência do calor extremo, mas até o momento não há registros de mortes por esta causa nos dias atuais.

A gente não tem nenhum registro de óbito com notificação nesta onda de calor”, disse sem descartar a possibilidade de novas ocorrências.

Grupos de risco e cuidados

As equipes das UPAs receberam reforço das equipes para agilizar o atendimento de pessoas que chegam aos postos com sintomas decorrentes das altas temperaturas Segundo o órgão, nos atendimentos foi adotado um protocolo de classificação de risco e o manejo clínico de pacientes com sintomas de calor.

Os sintomas associados ao calor extremo, anotados nos registros das UPAs, são náuseas, dor de cabeça, temperatura do corpo elevada, tontura, pulso rápido, taquicardia, distúrbios visuais, desidratação, insolação, respiração rápida e confusão mental.

As autoridades reforçam que determinados grupos devem redobrar a atenção, pois o corpo humano pode apresentar falhas graves ao ser exposto a temperaturas acima dos 35°C por períodos prolongados.

No ofício enviado ao estado e a prefeitura do Rio, o MPF e a Defensoria apontam os seguintes grupos de risco:

  • crianças, especialmente lactentes, recém-nascidos e prematuros;
  • idosos acima de 65 anos;
  • gestantes e lactantes;
  • pessoas de doenças crônicas e com deficiência;
  • trabalhadores ao ar livre e desportistas;
  • indivíduos com restrição de mobilidade e acamados;
  • população em situação de rua.

População em situação de rua

Especificamente sobre população em situação de rua, o comunicado cita que um protocolo municipal reconhece que a condição clínica é agravada pela vulnerabilidade social, uma vez que:

  • estão mais expostas ao calor extremo devido ao menor acesso a ambientes refrigerados e à proteção solar;
  • sujeitas a elevada carga de morbidade por diversas condições clínicas determinadas socialmente;
  • menor acesso a água potável e resfriada, bem como a alimentos adequados.
Grupo de risco Recomendações Principais
Idosos e crianças Hidratação constante e permanência em locais arejados.
Trabalhadores ao ar livre Uso de proteção solar e pausas frequentes à sombra.
Pessoas com doenças crônicas Monitoramento rigoroso de pressão e sinais de fadiga.
População de rua Busca por postos de hidratação e unidades de saúde ao menor sinal de mal-estar.

Plano de Contingência na Saúde estadual

A Secretaria Estadual de Saúde informou à Agência Brasil que mesmo antes de receber as recomendações do Ministério Público e da Defensoria Pública “já vem adotando uma série de medidas para o enfrentamento das ondas de calor”. Em julho de 2025, por exemplo, foi elaborado o Plano de Contingência Complementar para Enfrentamento ao Excesso de Calor, que está sendo atualizado para ser lançado nos próximos dias.

Entre as ações já adotadas, a secretaria lista:

  • alertas diários enviados às prefeituras;
  • painel para monitoramento de excesso de calor;
  • pontos de hidratação nas 27 unidades de pronto atendimento (UPA) do estado para a população em situação de vulnerabilidade;
  • alerta para que as UPAs garantam manejo clínico adequado dos pacientes; e
  • reforço na comunicação.

A secretaria também realiza emissão diária de alertas e orientações aos municípios, com monitoramento pelo painel Vigidesastres, a partir do qual gestores municipais recebem informações por e-mail e por grupo de WhatsApp com pontos focais de saúde, garantindo respostas rápidas e coordenadas. Há ainda o Painel Monitora – Excesso de Calor, que reúne informações técnicas para gestores e conteúdos simplificados para a população em geral.

Outras medidas adotadas no Estado do Rio

Outras ações do governo incluem o monitoramento e alertas meteorológicos, segurança nas praias, vigilância ambiental e atuação especial a grupos vulneráveis. No centro da capital, começou nesta segunda-feira (29) o atendimento à população em situação de rua.

A Secretaria de Defesa Civil, por meio do Corpo de Bombeiros e do Cemaden-RJ (Centro Estadual de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais), segue emitindo alertas aos municípios sobre baixa umidade relativa do ar e temperaturas elevadas.
As principais recomendações à população são:
  • evitar atividades físicas ao ar livre no período da tarde;
  • manter hidratação frequente e
  • redobrar atenção com crianças, idosos e pessoas com doenças crônicas.
A Secretaria do Ambiente e Sustentabilidade e o Inea (Instituto Estadual Ambiental) também acompanham os efeitos do calor intenso sobre recursos hídricos, vegetação e fauna, adotando medidas preventivas e ampliando a vigilância ambiental neste período crítico.

O objetivo das ações coordenadas é a prevenção e a resposta rápida, o que já está acontecendo”, afirmou o secretário de estado de Ambiente e Sustentabilidade, Bernardo Rossi. “É importante essa união de esforços. Nós temos até o dia 2 ou 3, uma onda severa de calor. O governo do estado está, sim, preparado e está monitorando a situação para cuidar da vida das pessoas”, pontuou.

Entenda a evolução da onda de calor no Estado do Rio

Desde a tarde da véspera de Natal (24), a cidade do Rio de Janeiro está no estágio 3 de calor, em uma escala que vai até 5. No nível 3, há registro de índices de calor alto (36°C a 40°C), com previsão  inicial de permanência ou aumento nas temperaturas por, ao menos, três dias seguidos.

Desde o dia 25 de dezembro, quando foi registrado o recorde mensal de 40,1°C, a rede municipal de urgência tem realizado uma média de 450 atendimentos diários relacionados às altas temperaturas. Os sintomas mais comuns incluem tontura, desmaios e queimaduras solares No âmbito estadual, o governo alertou todos os 92 municípios para os perigos do calor excessivo.

A cidade do Rio de Janeiro segue com tempo quente e instável até a virada do ano. Segundo o Alerta Rio, a segunda-feira (29) tem céu com poucas a muitas nuvens e pancadas rápidas e isoladas de chuva à tarde e à noite. Os ventos ficam fracos a moderados, com temperaturas entre 21°C e 36°C.

Na terça-feira (30), a previsão indica muitas nuvens e pancadas de chuva com trovoadas isoladas a partir da tarde, com mínima de 20°C e máxima de 33°C. Para quarta-feira (31), último dia do ano, o cenário se repete, com possibilidade de granizo e temperaturas entre 21°C e 34°C.

Bloqueio atmosférico mantém Brasil em ‘alerta vermelho’

Previsão de alívio é adiada para quarta-feira, enquanto Inmet estende aviso de grande perigo para diversos estados

Embora a expectativa inicial fosse de uma redução nas temperaturas já nesta segunda-feira (29), a dinâmica da atmosfera trouxe novas atualizações. O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) ampliou para esta terça-feira (30) o aviso de calor de grande perigo, a categoria mais alta da escala de risco. O alerta vermelho abrange, além do Rio de Janeiro, áreas de São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul e o Distrito Federal.

A causa dessa “fervura” prolongada é um bloqueio atmosférico que impede a chegada de frentes frias, fazendo com que o desvio de temperatura chegue a mais de 7°C acima da média em algumas capitais. Em São Paulo, por exemplo, os registros atingiram patamares nunca antes vistos desde o início das medições em 1961. No interior paulista, cidades como Pedro de Toledo chegaram aos impressionantes 42°C.

Quando vem a trégua?

A tão esperada mudança no cenário deve começar a se consolidar apenas a partir de quarta-feira (31). Uma área de baixa pressão localizada no Paraguai deve favorecer a formação de instabilidades que avançarão pelo Brasil, criando uma faixa de risco de temporais que se estende do Rio Grande do Sul até Minas Gerais.

No Rio de Janeiro, embora as pancadas de chuva possam trazer um alívio imediato na sensação térmica a partir de terça à noite, as temperaturas ainda devem orbitar os 40°C no curto prazo. A previsão é que, com a consolidação das chuvas, o estado saia da zona de calor extremo e passe a registrar temperaturas mais típicas do verão fluminense — ainda altas, mas dentro dos limites considerados seguros para a saúde humana.

Até lá, a orientação das autoridades de saúde e defesa civil permanece a mesma: hidratação rigorosa, evitar exposição direta ao sol entre 10h e 16h e atenção total aos sinais de exaustão térmica.

Com informações da Agência Brasil, G1, Inmet e Governo do RJ

 

Shares:

Posts Relacionados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *