Acordar todos os dias com dor, sentir o corpo pesado, o sono quebrado, e ainda enfrentar crises de ansiedade. Essa é a realidade de quem convive com a fibromialgia — uma síndrome silenciosa e muitas vezes invisível aos olhos, mas que compromete profundamente a qualidade de vida de milhões de brasileiros. Estima-se que cerca de 6 a 7 milhões de brasileiros convivam com a fibromialgia, sendo a maioria mulheres entre 30 e 60 anos, segundo a Sociedade Brasileira de Reumatologia.

Quem tem fibromialgia passará a ser considerada pessoa com deficiência (PcD) a partir de janeiro de 2026 e vai usufruir de políticas públicas específicas, como cotas em concursos públicos e isenção de IPI na compra de veículos. A Lei 15.176, de 2025, foi sancionada sem vetos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na última quarta-feira (23) e publicada no Diário Oficial da União desta quinta (24).  A norma passa a valer em janeiro de 2026, 180 dias após a publicação.

Para sua equiparação como deficiência, será necessária a avaliação de cada caso por equipe multidisciplinar formada por médicos e psicólogos, por exemplo, que ateste a limitação da pessoa no desempenho de atividades e na participação em sociedade em igualdade com as outras pessoas.  A norma altera a Lei 14.705, de 2023, que estipula diretrizes para o Sistema Único de Saúde (SUS) realizar tratamento de pessoas com síndromes de fibromialgia, da fadiga crônica e de dor regional, que são doenças correlatas.

Em algumas unidades da federação, a pessoa com fibromialgia já pode ser considerada PcD, a exemplo do Distrito Federal, que aprovou uma norma sobre o assunto em 2024. Com a Lei 15.176, a prática será agora adotada em todo o país.

Fibromialgia também pode impactar a saúde ginecológica

Ginecologista explica impactos da doença na saúde íntima da mulher e alerta para sintomas como dor pélvica, desconforto sexual e alterações menstruais

Vamberto Maia Filho, ginecologista, obstetra e especialista em reprodução humana, explica que a doença é mais prevalente em mulheres entre 30 e 60 anos e não possui uma causa definida. “O diagnóstico é feito aos poucos e por exclusão, já que não existe um marcador laboratorial específico”, explica o médico.

Na prática clínica, os efeitos da fibromialgia podem se manifestar de forma bastante significativa no contexto ginecológico. Entre os sintomas mais comuns, estão: dores pélvicas persistentes, desconforto durante a relação sexual (dispareunia), alterações no ciclo menstrual e aumento da sensibilidade em regiões íntimas.

Segundo o Dr. Vamberto, a fibromialgia potencializa dores que já são comuns na vida da mulher, como aquelas relacionadas ao ciclo menstrual ou às relações sexuais. “Esse aumento da sensibilidade à dor faz com que algumas dores naturais fiquem exacerbadas, o que pode gerar muito desconforto e até confusão com diagnósticos como a endometriose”, alerta.

Além do impacto físico, o componente emocional não pode ser ignorado. “Ninguém gosta de conviver com dor, e isso afeta diretamente o psicológico da paciente”, pontua o ginecologista. Ele lembra que o ciclo hormonal da mulher é regulado por estruturas cerebrais ligadas às emoções, como o sistema límbico. Assim, o sofrimento emocional causado pela dor crônica pode desencadear alterações no ciclo menstrual e na liberação hormonal.

Esse ciclo de dor, impacto psicológico e desregulação hormonal cria um cenário que afeta significativamente a qualidade de vida da mulher. “A fibromialgia tem um impacto direto na saúde ginecológica, e o maior deles é a dor constante, que tira o conforto e interfere em momentos íntimos, sociais e profissionais”, resume o especialista.

Essa decisão reforça o quanto tais doenças crônicas afetam a vida do cidadão, e no caso das mulheres, os danos se entendem até para a saúde ginecológica.

A doença, conhecida pelas dores crônicas e fadiga, pode causar sintomas como:
• Dores pélvicas persistentes
• Desconforto durante a relação sexual (dispareunia)
• Alterações no ciclo menstrual
• Aumento da sensibilidade em região íntima

Tratamento vai além de remédios

O tratamento da fibromialgia deve ser feito de forma multidisciplinar, com foco na individualidade de cada mulher. “É importante combinar medicação para dor crônica, fisioterapia pélvica, psicoterapia, atividade física leve e, em alguns casos, terapia hormonal. Cuidar do corpo e da mente é essencial para reduzir o impacto dos sintomas”, afirma. Práticas como meditação, acupuntura e técnicas de relaxamento também podem ser associadas ao tratamento, ajudando a melhorar o bem-estar e a qualidade de vida.

Embora a doença não tenha cura, o diagnóstico precoce e a abordagem integrada são fundamentais para o controle dos sintomas e para que a paciente retome sua rotina com mais conforto”,  finaliza o médico.

Para especialistas, o tratamento precisa ir além dos medicamentos e incluir práticas integrativas, como o Pilates, e principalmente, o cuidado com a saúde mental — sempre lembrando que essas técnicas complementam, e não substituem, o tratamento médico e psicológico.

Durante muito tempo, o foco foi apenas no controle da dor. Mas quem trata pacientes com fibromialgia sabe que a dor está profundamente conectada com fatores emocionais. A ansiedade, o estresse e o esgotamento mental são gatilhos fortes. Por isso, é essencial uma abordagem integrativa, que trate o corpo, mas também escute a mente”, explica a fisioterapeuta Luciana Geraissate, especialista em reabilitação funcional, dor crônica e Pilates clínico.

Saúde mental: o elo esquecido

Diagnóstico tardio, dores crônicas e sofrimento psicológico marcam a vida de quem convive com a síndrome

A fibromialgia é caracterizada por dor musculoesquelética difusa, associada a fadiga, alterações do sono, distúrbios de memória e concentração, além de forte impacto emocional.  Com origem desconhecida, a fibromialgia é uma síndrome caracterizada por dores nos músculos e nas articulações, entre outros sintomas, como tontura, fadiga, ansiedade e depressão.

Dados da Faculdade de Medicina da USP indicam que 30% dos pacientes com fibromialgia desenvolvem quadros de depressão ou ansiedade. Muitos enfrentam descrédito ao longo da vida, sendo vistos como “dramáticos” ou “preguiçosos” — o que agrava ainda mais o sofrimento emocional.

É uma dor que ninguém vê. Por isso, a escuta ativa, o acolhimento e a validação dos sintomas são tão importantes. Cuidar da mente é fundamental para que o corpo responda melhor aos estímulos físicos”, reforça Luciana.

Ela também alerta para a importância de uma rede de apoio e de um plano terapêutico personalizado, que pode incluir, além da fisioterapia, o acompanhamento psicológico, reeducação do sono, práticas de relaxamento e orientação nutricional.

Diagnóstico precoce é essencial

O diagnóstico de fibromialgia ainda é um desafio: não há exames laboratoriais específicos para identificá-la. O critério é clínico e exige atenção de profissionais preparados para reconhecer os sintomas, descartar outras doenças e ouvir o paciente em profundidade.

O reconhecimento precoce da condição possibilita um planejamento terapêutico mais eficaz e aumenta as probabilidades de estabilização da qualidade de vida. No entanto, é fundamental lembrar que o diagnóstico, por si só, não assegura o controle completo da dor. Em diversas situações, mesmo após o diagnóstico, os sintomas persistem, reforçando a importância de um cuidado contínuo e humanizado”, complementa a fisioterapeuta.

Movimento e reconexão

Estudos recentes confirmam os benefícios do Pilates na redução da dor e no aumento da qualidade de vida de pacientes com fibromialgia. Publicada na revista Clinical Rheumatology, uma pesquisa acompanhou mulheres com a síndrome durante 12 semanas de prática contínua e apontou melhorias significativas em aspectos como dor, sono, depressão e função física.

O Pilates não é só exercício. É consciência corporal, respiração, presença. É uma forma de o paciente retomar o controle sobre seu próprio corpo e perceber que ele ainda pode se mover sem sofrimento. Isso muda tudo”, comenta Luciana.

Ela ressalta que a técnica fortalece a musculatura, melhora a postura, reduz tensões e promove alívio da dor sem impacto nas articulações — o que é ideal para quem já vive com sensibilidade generalizada. Além disso, a prática promove liberação de endorfinas, substâncias naturais do corpo que reduzem a dor e aumentam a sensação de bem-estar.

Com Assessorias

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