A atriz Márcia Cabrita morreu nesta sexta-feira (10), vítima de um câncer de ovário (Foto: GNT)
A atriz Márcia Cabrita morreu nesta sexta-feira (10), vítima de um câncer de ovário (Foto: GNT)

A morte nesta sexta-feira (10) da atriz Márcia Cabrita, de 53 anos, vítima de complicações decorrentes do câncer de ovário, atenta para a importância do diagnóstico precoce da doença. Pouco se ouve falar sobre esta doença, mas atualmente ela é considerada o tumor ginecológico mais difícil de ser diagnosticado e também combatido, pela ausência de sintomas e a falta de exames de rotina capazes de descobrir a doença com precisão em estágios iniciais. Por isso, é o tipo de câncer com menor sobrevida entre as mulheres.

Como se trata-se de uma doença silenciosa, os sintomas aparecem em fases avançadas, levando ao atraso do início do tratamento. O Instituto Nacional do Câncer (Inca) estimou 6.150 novos casos em 2016, o que representa, em média, 3% dos tumores femininos, sendo que três quartos são diagnosticados em estágios avançados. Ele ocupa a sétima posição dentre os cânceres malignos mais frequentes em mulheres no mundo, atingindo mais de 250 mil por ano, e a terceira posição entre os cânceres ginecológicos no Brasil, sendo a quinta maior causa de morte por câncer entre as mulheres. Essa elevada mortalidade está diretamente relacionada ao diagnóstico tardio.

“Atualmente 80% dos tumores são diagnosticados em fase avançada, reduzindo a sobrevida da paciente. Entender o comportamento e os fatores desencadeantes desse tipo de câncer é o primeiro passo”, aponta o oncologista clínico David Pinheiro Cunha, do Grupo SOnHe – Sasse Oncologia e Hematologia de Campinas. “Entre os fatores de risco estão antecedentes familiares, seja pelo lado materno ou paterno e idade. As mulheres acima de 50 anos têm mais propensão a desenvolver a doença. As chances do tumor aumentam após a menopausa”, explica o ginecologista e especialista em videocirurgia ginecológica, João Paulo Epprecht, membro da American Association for Gynecological Minimal Invasive Surgery (AAGL).

Uso de anticoncepcional por cinco anos reduz risco em 60%

O oncologista Daniel Gimenes, do Centro Paulista de Oncologia (CPO) – Grupo Oncoclínicas, afirma que o câncer de ovário possui maior incidência em mulheres acima dos 50 anos, sendo na grande maioria dos casos não é possível identificar previamente fatores de risco que justifiquem o aparecimento da condição. No entanto, diz ele, este tipo de tumor ginecológico tem baixa incidência e apresenta boas respostas ao tratamento quando diagnosticado precocemente.

“Um dos fatores que torna esse tipo de câncer tão agressivo é o fato de se iniciar a partir de mutações genéticas não hereditárias que, por sua vez, alteram as características das células e apresentam alta capacidade de se multiplicarem rapidamente, fazendo com que a doença atinja um estágio avançado rapidamente quando não tratado”, explica.

Entre os fatores que possivelmente contribuem para o aparecimento da doença alguns estudos sugerem que o número excessivo de ovulações pode levar ao surgimento de tumores, sendo possível adotar como método preventivo o uso de pílula anticoncepcional. “Esses levantamentos concluíram que o uso contínuo da medicação por cinco anos pode diminuir em até 60% a incidência deste de câncer de ovário”, diz o Dr. Daniel.

O especialista ainda ressalta que apenas 10% dos tumores ovarianos são decorrentes da predisposição genética hereditária – causados por uma mutação em certos genes, herdada de pai ou mãe, que pode aumentar o risco de surgimento do tumor. “Nestes casos, é possível realizar exames específicos de análise genética em mulheres cujo histórico familiar deste tipo de câncer sugira a possibilidade de hereditariedade como fator causador da condição – em especial quando avó e mãe apresentaram tumores de ovário. Nestas situações, diante de uma comprovação da suspeita, é possível indicar medidas como a cirurgia preventiva de retirada dos ovários, mas, ainda assim, esta é uma decisão que deve ser tomada de forma conjunta por paciente e médico”, pontua o oncologista do CPO.

Fique atenta aos possíveis sinais

O ginecologista João Paulo Epprecht alerta para os sintomas que são muito parecidos com doenças gastrintestinais, como aumento do volume abdominal, sensação de saciedade ao se alimentar, azia, dor abdominal e sangramento e necessidade urgente ou frequente de urinar. “Os sintomas podem vir juntos ou separados. É importante estar atenta e não ignorá-los, procurando um médico. As consultas e exames de rotina podem contribuir no diagnóstico precoce”, ressalta.

O oncologista clínico do Grupo SOnHe explica que na fase inicial, a grande maioria das pacientes são assintomáticas ou apresentam sintomas inespecíficos como dores abdominais, náuseas e alteração do hábito intestinal, não levando a paciente a procurar seu médico. “Quando os sintomas tornam-se intensos, podendo cursar com aumento do volume do abdômen pela formação de liquido (ascite) ou obstrução do intestino causando dificuldade para evacuar, a doença já está avançada e a chance de cura é menor”, explica o Dr David.

De acordo com o Dr. Daniel, o sintoma do câncer de ovário é discreto e demora a se manifestar. Por isso, na maioria dos casos, é diagnosticado tardiamente, quando a doença já se espalhou pelo aparelho reprodutor, dificultando o tratamento. “Quando aparentes, pode ocorrer um aumento do volume abdominal, aumento na vontade de urinar, alterações no ciclo menstrual, dor durante a relação sexual, entre outros. Mesmo sendo o câncer ginecológico com maior índice de óbito no mundo, se diagnosticado precocemente, existem altas chances de cura. Exames como palpação abdominal, toque vaginal e ultrassom são muito recomendados para detectar a doença e tentar reverter, assim, este cenário.

“O problema é que os sintomas, quando aparentes, são parecidos com os desconfortos do dia a dia da mulher e, na maioria dos casos, são deixados de lado. Por isso, é recomendado que a mulher procure um especialista caso perceba qualquer alteração, mesmo que pareça usual. Além disso, é aconselhável realizar os exames ginecológicos anualmente”, afirma o Dr. Daniel.

Diagnóstico nem sempre é preciso

David Pinheiro Cunha, do Grupo SOnHe – Sasse Oncologia e Hematologia de Campinas, explica que o câncer de ovário pode ser dividido em três principais tipos: tumores epiteliais, que se iniciam nas células que recobrem a superfície externa no ovário, responsáveis por 95% dos casos; tumores de células germinativas, que originam os espermatozoides e os ovócitos, responsáveis por 2-3% dos casos e tumores estromais, constituídos a partir do cordão sexual da gônada, responsáveis por 5% dos casos.

“É importante saber que todas as mulheres podem ter câncer de ovário, mas as que apresentam maior risco são: as com histórico familiar de câncer de ovário ou mama, idade avançada (acima dos 60 anos), nunca ter ficado grávida, menarca precoce, menopausa tardia, endometriose, reposição hormonal na pós-menopausa e tabagismo. As síndromes hereditárias também aumentam significativamente esse risco, predispondo a doença em idades mais jovens. As mutações de maior importância são BRCA 1, BRCA 2 e a síndrome de Lynch (alteração genética em genes do DNA)”, afirma.

Para o diagnóstico o médico necessita de uma avaliação clínica, exame físico e ginecológico, exames de sangue com marcador tumoral (Ca 125) e exames de imagem (ultrassom transvaginal, tomografia computadorizada e ressonância magnética). “Quando o tumor está em fase inicial, os exames de imagem identificam uma lesão nodular ou uma massa restrita aos ovários. Na doença avançada pode ocorrer disseminação dos nódulos para o peritônio (camada que reveste o intestino), formação de liquido no abdômen e metástase para outros órgãos como fígado e pulmão. Importante ressaltar que para o diagnóstico definitivo é necessário uma biópsia da tumoração apontada no exame de imagem”, explica o médico.

De acordo com o Dr. David, “infelizmente os métodos de rastreamento para câncer de ovário não se mostraram efetivos para a população geral como é o caso do Papanicolau no câncer de colo de útero. A realização de exames de ultrassom transvaginal e marcador tumoral (Ca 125) apenas resultou em maior número de procedimentos e gastos para a saúde sem benefício significativo em reduzir a mortalidade, portanto, não sendo indicado de rotina”, aponta o especialista.

Tratamentos incluem cirurgia e quimioterapia

A definição do tratamento para pacientes com câncer de ovário depende do tipo e estágio da doença. As opções principais são cirurgia seguido de quimioterapia ou, quando o tumor apresenta-se mais avançado, iniciar quimioterapia e posterior avaliação cirúrgica. Entre os fatores analisados estão ainda a idade e desejo de ter filhos da paciente.

“A orientação depende de uma avaliação do histórico da mulher e suas condições de saúde como um todo. Em linhas gerais, a cirurgia ainda é o principal tratamento, podendo significar a retirada bilateral ou unilateral do órgão – quando há a possibilidade de preservação de um ovário e uma trompa de Falópio. A quimioterapia pode ser indicada, dependendo do caso, antes ou após a intervenção cirúrgica”, destaca o Dr. Daniel. “A busca por gestações após câncer de ovário deve ser discutida com o médico, já que dependerá de uma abordagem personalizada do caso”, finaliza.

Câncer ginecológico

Os tumores no colo de útero e de ovário são os mais incidentes, mas os  tumores de endométrio, vagina e vulva também podem acometer a região. O diagnóstico precoce pode ser a principal arma no combate à doença. Andreia Melo, oncologista clínica do Grupo Oncologia D’Or, explica que a prevenção primária de alguns dos principais tumores ginecológicos está relacionada à diminuição do risco de contágio pelo HPV.

“A transmissão do HPV ocorre por via sexual e por isso o uso de preservativos durante a relação sexual com penetração protege parcialmente do contágio pelo HPV, que também pode ocorrer pelo contato com a pele da vulva, região perineal, perianal e escroto”, explica a especialista. “As mulheres precisam estar atentas aos tumores ginecológicos, pois os seus sintomas podem ser difíceis de serem reconhecidos logo no início”, explica Andreia Melo.

É o que acontece com o câncer do colo de útero, terceiro tipo de tumor mais frequente na população feminina no Brasil. “A doença possui um desenvolvimento lento, podendo evoluir para quadros de sangramento vaginal intermitente ou após uma relação sexual, corrimento vaginal anormal e dor abdominal associada a queixas urinárias ou intestinais já nos casos avançados”, diz. 

O método principal e mais amplamente utilizado para rastreamento do câncer do colo de útero é o teste de Papanicolaou (exame citopatológico do colo do útero). De acordo com o resultado do citopatológico e dos achados ao exame clínico outros exames como a colposcopia com biópsia também são indicados.

Além dos exames periódicos, desde março de 2014 o Sistema Único de Saúde – SUS oferece a vacinação gratuita contra o HPV para meninas entre 9 e 13 anos de idade, e meninos entre 11 e 15 anos. “Uma vez que o vírus é transmitido por via sexual, o ideal é que as meninas sejam imunizadas nesta idade, antes do início da atividade sexual”, finaliza a oncologista.

Oito mitos e verdades sobre o câncer de ovário

1. O câncer de ovário só acomete mulheres idosas ou após a menopausa – MITO

Ainda que a maior taxa de mortalidade da doença ser observada na sétima década de vida, a incidência do câncer de ovário começa a aumentar a partir dos 40 anos de idade, apesar de também ser diagnosticado em pacientes jovens. Por ser uma doença silenciosa, é importante que mulheres com idade entre 30 e 60 anos conversem com seu médico para avaliar quais estratégias podem seguir para diminuir o risco de desenvolvimento da doença

2. Existem três principais tipos de câncer de ovário – VERDADE

Os três principais tipos de tumores de ovário são:

Câncer Epitelial de Ovário – Se desenvolve a partir das células que cobrem a superfície externa do ovário. Os subtipos desse tumor incluem: tumores com baixo potencial de malignidade, tumores epiteliais malignos de ovário, carcinoma peritoneal primário e câncer das trompas de Falópio.

Câncer de Células Germinativas do Ovário – O tumor de células germinativas do ovário se desenvolve a partir das células que produzem os óvulos. A maioria dos tumores de células germinativas é benigna, embora alguns sejam cancerosos. Menos de 2% dos cânceres de ovário são tumores de células germinativas.

Câncer Estromal do Ovário – Se desenvolve a partir de células do tecido conjuntivo que mantêm os ovários juntos para a produção dos hormônios femininos estrogênio e progesterona.

3. Micro cistos no ovário e no útero podem evoluir para o câncer – MITO

Segundo o Dr. Marcelo Horácio, diretor médico da AstraZeneca Brasil, as lesões benignas permanecem benignas durante toda a sua evolução, e lesões malignas já surgem com o potencial de se dividir e se espalhar pelo corpo. Sendo assim, as lesões que são comprovadamente benignas não evoluem para um câncer.

4. Mudanças nos hábitos de vida são capazes de prevenir o surgimento do câncer de ovário – VERDADE

Um dos principais fatores de risco para o câncer de ovário é a obesidade, portanto, ter uma alimentação saudável que promova o controle do peso é uma das estratégias para a prevenção da doença. Entretanto, existem fatores genéticos responsáveis pelo aumento do risco dos tumores, como pacientes portadoras de mutações germinativas nos genes BRCA1 e 2, como o famoso caso da atriz Angelina Jolie, portadora da mutação no gene BRCA1 e que optou pela retirada dos ovários e trompas de falópio.

5. Endometriose é um dos fatores de risco para o câncer de ovário? – MITO

De acordo com o Dr. Marcelo Horácio, a endometriose não representa um fator de risco para o câncer de ovário, ainda que existam controvérsias sobre a doença ser responsável pelo aumento de risco de tipos específicos de tumores de ovário, como o carcinoma endometrioide e células claras. Os fatores de risco principais para câncer de ovário são: idade, obesidade, primeira gestação tardia (após os 30 anos), síndrome do ovário policístico (SOP), terapias de reposição hormonal após a menopausa, histórico familiar de câncer de mama, ovário e peritônio, além da presença de mutação hereditária em genes de predisposição ao câncer de ovário (por exemplo, BRCA1 e BRCA2).

6. Mulheres que usam anticoncepcionais por muitos anos têm mais chances de ter câncer de ovário – MITO

Não. Na verdade, estudos recentes mostram que o uso de anticoncepcionais é um fator de proteção contra o câncer de ovário.

7. Dor na relação sexual é um dos sintomas de câncer de ovário – VERDADE

Apesar de assintomático em estágios iniciais, o câncer de ovário apresenta diversos sintomas nas fases mais avançadas da doença: dor abdominal, aumento do volume abdominal, perda de peso, fadiga, mudança no funcionamento do intestino e dor durante a relação sexual são alguns dos sintomas observados. Segundo o Dr. Marcelo Horácio, vale salientar que esses sintomas podem ser causados por outras doenças benignas e até mesmo por outros tipos de câncer. No entanto, quando são causados pelo câncer de ovário, tendem a ser persistentes e apresentam uma alteração fora do normal, ocorrendo com mais frequência. Se a mulher apresentar esses sintomas quase que diariamente por mais de algumas semanas, deve consultar seu médico, de preferência um ginecologista.

8. Uma mulher diagnosticada com câncer de ovário não poderá ter filhos após o tratamento – MITO

Como a incidência de câncer de ovário ocorre, na maioria das vezes, em mulheres na pós-menopausa, esse cenário não é muito comum. Além disso, a grande maioria dos casos são diagnosticados em estágios avançados, nos quais a retirada dos órgãos genitais femininos é realizada durante a cirurgia de citorredução, inviabilizando a gravidez futura nesta paciente. No entanto, se um paciente tem estágio inicial da doença e tem intenção de engravidar, apenas o ovário com o tumor e a trompa de Falópio do mesmo lado são retirados. Se o tumor está localizado apenas em um dos ovários, ela é acompanhada, com consultas semestrais, sem tratamento adicional.

Fonte: Grupo Oncoclinicas, Grupo SOnHe e AstraZeneca Brasil

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