Ultimamente, muito se escuta falar sobre pessoas tóxicas, relações abusivas e ambientes contaminados por alta carga de ‘toxicidade’, que contribuem, muitas vezes, para minar um relacionamento ou mesmo para levar as pessoas a um profundo sofrimento psíquico e um estado de adoecimento que inclui ansiedade e até depressão.
Nem sempre esta situação está presente como forma de vínculo entre os casais. Um relacionamento abusivo pode ocorrer em qualquer tipo de relação humana e não necessariamente entre namorados ou cônjuges, mas também entre pais e filhos, irmãos, amigos, colegas de trabalho, entre outros.
É uma trama de difícil digestão mental, com esgotamento de energia emocional que potencializa a fragilidade de uma das partes, devido ao alto grau de conteúdo inconsciente existente na dupla”, afirma a psicóloga e psicanalista Renata Bento.
Mas como saber se está vivendo uma relação abusiva ou está enredado em um relacionamento tóxico? Especialista em criança, adulto, adolescente e família e membro da Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro, Renata compara as relações tóxicas ao sadomasoquismo e à dependência de drogas, mas diz que há cura. Ao ViDA & Ação, ela responde algumas dúvidas sobre o assunto e ainda apresenta nove dicas práticas para ajudar a pessoa a sair de uma relação tóxica.
As pessoas envolvidas nesse tipo de relacionamento devem buscar apoio de seu círculo social e familiar, bem como ajuda psicológica, pois apresentam tendência a experimentar em suas vidas uma dose excessiva de sofrimento que as impossibilita de trocas afetivas mais ricas e verdadeiras. E isso está longe de ser o que se procura, que é o amor”, recomenda a especialista.
1 – Como podemos definir e reconhecer uma relação tóxica?
Chamamos de relação tóxica “a forma assimétrica de se relacionar entre duas pessoas”, onde uma delas sofre intensamente com o modo de ser da outra e em nada se modifica a esse respeito. É uma relação empobrecida, sem criatividade e enrijecida num padrão de sofrimento excessivo, não necessariamente com presença de violência física; mas uma trama psicológica inconsciente com alto teor de agressividade subjacente. A pessoa sente-se aprisionada e emocionalmente dependente; tornando-se refém de um vínculo empobrecido, pouco fecundo, pautado no dissabor, no desrespeito e na falta de confiança e empatia. Nesse cenário, a relação não progride e a possibilidade de gratificação com trocas mais ricas fica abalada.
2 – Podemos chamar esse tipo de relação de ‘doentia’?
Em Psicanálise, podemos pensar se tratar de uma dinâmica destrutiva em que a doença de um necessita ou completa a doença do outro: de um lado, há alguém incapaz de sentir os sentimentos e as emoções, isto é, incapacitado de sentir compaixão, remorso ou culpa. Do outro lado, está alguém empático, preocupado, doador e que carrega em si culpa inconsciente, senso de obrigação e responsabilidade para com os outros e com a vida, mas fica fragilizado porque não se conhece bem e lida mal com as projeções vindas do outro. E nesse caso, seu lado frágil, inconsciente, à espera de reasseguramento está mais agudo. Há uma espécie de relação adicta entre o par tal qual há na de usuários de substância psicoativa. Existe o prazer e depois a dor e esse ciclo é continuo, desgastante e tende a piorar com o tempo.
3 – Como se constrói essa relação?
Trata-se de uma trama complexa encenada por uma dupla onde quem se sente ameaçado não consegue enxergar suas qualidades e potenciais e fica à espera de que o outro o perceba, o que não ocorre. As cobranças emocionais são acionadas e vira um círculo vicioso altamente destrutivo e difícil de sair. Exemplificando: é possível pensar numa relação sadomasoquista onde os papéis podem se alternar; o masoquista, que tem prazer em sofrer, busca o estado de humilhação e o sádico, com prazer em torturar e fazer sofrer, se apresenta.
4 – Quais são as dificuldades de se livrar desse tipo de relação?
Não é simples conseguir sair de uma relação tóxica, principalmente se existe vínculo econômico que acaba se misturando à dependência emocional. Nesse caso observa-se que as dificuldades mais comuns seriam:
Econômicas: quando o parceiro (a) não é autônomo e independente;
Emocionais: relacionadas à dependência afetiva – o medo de se sentir desamparado, medo das reações do parceiro, temor de ficar sozinho e crença de que não conseguirá refazer sua vida amorosa. Como existe um ciclo de calmaria na relação, a pessoa tende a acreditar que o parceiro (a) irá se modificar, ou que ela (e) será capaz de fazê-lo (a) mudar. Há um receio de se deparar com o desconhecido, que pode significar o seu autodesconhecimento, isto é, o próprio não saber sobre si mesmo;
Sociais: a relação abusiva tem por característica o isolamento do casal do seu meio social, afastando-se de amigos e familiares.
Questões jurídicas: existe um nó emocional inconsciente na relação abusiva que cega a vítima. Assim ela não busca ajuda ou desconhece as questões legais.
Dicas de como sair de uma relação tóxica
1- A primeira é tomar consciência de que se está vivendo uma relação tóxica para sair dela;
2- Não ceder às chantagens emocionais ou às vitimizações;
3- Identificar as próprias fragilidades afetivas;
4- Tomar conhecimento dos aspectos legais de se estar vivendo esse tipo de relacionamento;
5- Buscar se fortalecer emocionalmente, seja com familiares, amigos ou buscando ajuda psicológica. Não ter vergonha de conversar a respeito.
6- Identificar seu próprio medo de sair dessa relação e enfrentá-lo – fazer a travessia desse sentimento;
7- Investir em si próprio e seus aspectos mais frágeis;
8- Saber dizer NÃO – colocar limite na relação
9- Requer coragem e autoestima. Se ainda assim não conseguir, não hesite em buscar ajuda profissional.
Com colaboração da Contexto Comunicação
Nesse caso os dois são adictos? Para o abusador sair da relação também é difícil?