Tem sido comum nos depararmos com declarações nada esperançosas sobre os rumos da nossa civilização. Na Sler, a Lelei Teixeira também tem desabafado sobre discriminações e desencantos. Confesso que tenho procurado me resguardar das notícias e das insanidades espalhadas por aí. Está pesado. É hora de a gente fazer o que pode para resistir. Voltar para pra dentro, lamber as próprias feridas. Parar. Respirar fundo. Descansar e continuar na lida. Seguir em frente.

Precisamos encontrar formas de ver outros lados para não sucumbirmos. Estamos na mão de uma minoria que está se lixando para o que sentimos. Vale lembrar que poucos, suspeito que nem mil pessoas mandam no mundo hoje. Esse seletíssimo grupo de milionários, donos de big techs, de petroleiras e petroquímicas, da indústria farmacêutica, entre outros tomadores de decisão, define o rumo desse universo onde o dinheiro e o lucro mandam.

Só que, na margem, ao nosso lado, existem exemplos inacreditáveis de gente que está se destacando nas suas empreitadas. Mulheres de várias áreas têm demonstrado que precisamos aprender a superar nossas dificuldades e fazer acontecer. Precisamos direcionar nossas lanternas para quem está brilhando, mas ainda não foi reconhecida.

Pois um dos maiores problemas da humanidade pode ser resolvido por uma jovem daqui do Rio Grande do Sul: a mestranda Helen Kotekewis, do Laboratório de Materiais Poliméricos (Lapol) do Núcleo de Sustentabilidade da UFRGS. Ela desenvolveu um tipo de filme biodegradável que consegue substituir o plástico convencional em embalagens flexíveis.

Isso é uma descoberta maravilhosa, principalmente para a indústria alimentícia, pois a maior parte das embalagens que usamos não é reciclada. Ou porque não tem valor de mercado, ou porque está misturada com outras substâncias. O setor de alimentos é um dos principais demandantes do material, alcançando cerca de 20% da produção no Brasil. A cada dia também são lançados novos tipos de embalagem que dificultam o reaproveitamento e a reciclagem.

Eu fiquei radiante depois que li essa notícia no site da UFRGS, ainda mais porque não se conseguiu, mais uma vez, firmar um acordo para redução da produção de plástico derivado de petróleo. Para a ideia dar certo no mercado, precisa passar por várias fases. Rezo para que tenham investidores interessados em dar escala à invenção. A fórmula inclui a mistura de amido (natural, extraído do milho) e álcool polivinílico (PVA, sintético).

A combinação oferece resistência à umidade, é biodegradável e tem propriedades funcionais que prolongam a vida útil dos alimentos. A blenda – termo utilizado para quando se misturam dois tipos de polímeros – criada por Helen também contém aditivos naturais como lignina (resíduo da indústria de papel, com propriedades antioxidantes e antifúngicas) e ácido málico (proveniente de frutas como a maçã).

Ou seja, ela ainda aproveita algo que era resíduo em outro processo industrial! A matéria conta que Helen estudou diferentes formas de produção e combinações de aditivos até que achou um bom desempenho técnico do material quanto ao seu custo e viabilidade prática. Os aditivos naturais, além de reduzirem significativamente a absorção de umidade – fator essencial para embalagens flexíveis –, também melhoraram as propriedades mecânicas e conferiram efeitos antifúngicos e antioxidantes ao material sem prejudicar sua transparência ou capacidade de se degradar no meio ambiente.

Com a adição de lignina, resíduo da indústria do papel, a pesquisadora observou melhora nas propriedades mecânicas e térmicas, além de redução de até 35% na absorção de umidade e efeitos antifúngicos e antioxidantes – características especialmente relevantes para a conservação de alimentos. A pesquisa demonstra como a Ciência pode transformar resíduos industriais e substâncias naturais em soluções sustentáveis para problemas urgentes da sociedade, como o impacto ambiental causado por plásticos de curto ciclo de vida.

Tratado para redução de plásticos é protelado mais uma vez

Enquanto Helen faz essas descobertas, centenas de representantes de governos, de diversos segmentos da sociedade civil, indústrias, organizações ficaram vários dias em Genebra tentando fazer um acordo internacional para a redução da produção do plástico. O encontro, que terminou dia 15 de agosto, mais uma vez, foi palco para demonstração de forças do lobby de países e da indústria petroquímica.

Rafael Eudes, da Aliança Resíduo Zero Brasil, me contou que os países que mais atrapalham e atuam pela continuação da produção de plástico são Arábia Saudita, Rússia, Irã, Índia, Cuba (vejam só), e a partir das últimas negociações, Estados Unidos (com incentivo do seu presidente, of course). Ou seja, praticamente os mesmos que também impõem entraves na Conferência das Partes do Clima (não basta ser negacionista, é preciso empacar as negociações).

Rafael acredita que “por mais frustrante que seja, não ter chegado a um tratado em Genebra, para a sociedade civil, nenhum acordo é melhor que um acordo fraco e ineficiente que não possa ser melhorado posteriormente”.

Segundo ele, há problemas de transparência nas negociações, com pouca participação dos observadores. Mais de 100 países defendem cortes na produção de plástico. Iniciadas em 2022, as tratativas já tinham fracassado na rodada anterior, realizada na Coreia do Sul, em dezembro de 2024. 

O ambientalista entende que o sistema do debate não tem funcionado, que é preciso criar um novo processo com os países que, de fato, queiram seguir em frente, sem se manterem reféns da “tirania do consenso”. Está mais do que provado que esse modus operandi de negociações já se esgotou. A humanidade precisa se reinventar para encontrar soluções para o futuro, mas quando isso vai acontecer? Só Deus sabe…

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