A Ilha de Paquetá, bairro carioca localizado em plena Baía de Guanabara, a 15 quilômetros da costa do Centro, quer se tornar o primeiro território livre da Covid-19 no Rio de Janeiro. Uma experiência liderada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em parceria com a prefeitura, começou nesta quinta-feira (17), com a proposta de imunizar 1,5 mil moradores da ilha no próximo domingo (20).

O experimento quer avaliar em quanto tempo a população não terá que seguir medidas restritivas, como o isolamento social e o uso de máscaras, alcançando a famosa “imunidade de rebanho” ou “proteção coletiva” contra o novo coronavírus. A partir daí, a ideia é estender a experiência para outras regiões da cidade para sustentar a volta à ‘normalidade’ pós-vacinação. O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, vai falar sobre a importância do estudo nesta sexta (18), durante a divulgação do 24° Boletim Epidemiológico da Covid-19, pelo prefeito do Rio, Eduardo Paes.

A expectativa é que Paquetá seja a primeira área do Rio de Janeiro livre da Covid-19, o que deve acontecer a partir de 14 dias após a segunda dose, mas pode ser que isso já ocorra na primeira dose. Vamos avaliar a curva de casos, para investigar qualquer aumento. Vamos antecipar em Paquetá o que vai acontecer no resto da cidade”, explicou o secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz, durante uma live promovida esta semana pela Associação de Moradores de Paquetá, a Morena.

Coleta de sangue realizada em moradora de Paquetá (Foto: Divulgação/Morena)

Carnaval fora de época

Gerou protestos e muita desconfiança entre os moradores, no início da semana, a declaração do prefeito sobre um carnaval fora de época em Paquetá, anunciado para setembro. Ele foi criticado pelos moradores.  “É irresponsável, infeliz e desrespeitoso. Fica o sentimento de que estamos virando cobaias”, disparou o presidente da Morena, Guto Pires, ao Diário do Porto – veja aqui.

Horas depois do mal estar às vésperas do estudo, o secretário Daniel Soranz explicou aos moradores que a ideia, na verdade, é realizar uma festa sem o uso de máscara ou distanciamento social para testar a eficácia da imunização dos moradores do bairro, mas tudo vai depender da adesão dos moradores na primeira fase do estudo e da cobertura vacinal.

Queremos fazer o teste com 100% das pessoas imunizadas, em um evento controlado, que só irá ocorrer 14 dias após a segunda dose e quando não tiver circulação do vírus na Ilha. Se a pesquisa não alcançar o número desejado, que possa garantir a proteção coletiva, não vamos poder caminhar para isso (evento-teste)”, disse ele.

https://www.youtube.com/watch?v=hiGbB5gJ4aI

Soranz explicou que a ideia é fazer um evento reservado, apenas com pessoas da ilha, com controle de acesso, ao ar livre, para que todos possam participar sem máscara. “Mesmo que exista uma pessoa infectada naquele ambiente, o fato de ter um cinturão não vai contaminar. Mas tudo isso vai depender da adesão ao estudo, por isso não pode definir de largada como e quando será o evento-teste”, ressaltou.

Termo de responsabilidade

Sobre a insegurança de muitos moradores, o pesquisador da Fiocruz, José Cerbiano Neto, explicou: “Há uma grande diferença entre ser cobaia e voluntário. É importante que o morador queira participar com total ciência de tudo que irá ocorrer. A pesquisa segue normas éticas e a legislação”.

Ele explicou que as pessoas são totalmente voluntárias e assinarão um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Em qualquer momento da pesquisa, elas podem decidir se querem permanecer ou não. Além disso, nenhum nome ou informação individual será divulgada pela prefeitura.

“Nenhuma etapa do estudo será realizada de forma obrigatória. Nenhuma etapa é condicionante de outra. Pode colher o sangue e não se vacinar ou pode fazer as duas coisas e não participar do evento-teste”, disse ele. O benefício é que o morador poderá saber o resultado do seu próprio exame.

A partir da testagem, os pesquisadores poderão identificar quem está positivo para a Covid-19 e será avaliada qual a variante que está circulando na área. Amostras de sangue ficarão no biobanco da Fiocruz, que vai processar os exames e realizar as análises comparativas com testagens posteriores.

Conheça as etapas do estudo

O primeiro passo é um censo epidemiológico de todos os moradores para identificar a existência do coronavírus – ou suas variantes – na comunidade. Os moradores – inclusive crianças – passarão por exame de sangue sorológico, que será repetido ao longo da duração da pesquisa. Voluntários que estão trabalhando na pesquisa estão sendo treinados para esclarecer a população.

A primeira testagem dos moradores acontece entre esta quinta e sábado 19, em vários pontos da ilha, para evitar aglomerações. A partir da coleta de sangue, o objetivo é saber quantas pessoas já foram infectadas e se desenvolveram anticorpos. Quem já tomou as duas doses do calendário (Coronavac, Astrazeneca ou Pfizer) também poderá participar da coleta do sangue para a pesquisa.

A testagem será dividida em três etapas: os que já se vacinaram, os que não receberam a vacina ou não podem se vacinar e um terceiro grupo, chamado de “grupo de intervenção”, com pessoas acima de 18 anos que ainda não tiverem sido vacinadas.

No domingo 20, as pessoas do grupo de intervenção receberão a primeira dose da Oxford/Astrazeneca, produzida pela Fiocruz. Em oito semanas (meados de agosto), a segunda dose será aplicada neste mesmo grupo. Hoje, a segunda dose da vacina do imunizante é aplicada em 12 semanas, por conta da disponibilidade de doses.

Após a vacinação, haverá uma nova testagem, para comparar quem recebeu a vacina agora com grupos anteriores e quem não foi vacinado, para identificar a ‘soro-conversão”, avaliando a efetividade da vacina. Aqueles que já tomaram a primeira dose devem aguardar o seu calendário para realizar a segunda dose.

A vacinação de adolescentes a partir de 18 anos não está descartada, mas vai depender da inclusão desse grupo pelo Plano Nacional de Imunização (PNI), do Ministério da Saúde. Guto Pires calcula que pelo menos metade dos moradores da ilha, em sua maior parte idosos, já está vacinada.

Pesquisa sorológica realizada em Paquetá (Foto: Divulgação/Morena)

Estudo completo vai durar um ano

De acordo com a SMS, o projeto vai avaliar também a segurança do imunizante e como a vacinação em massa atua na proteção também das pessoas que não foram vacinadas, como é o caso das crianças e adolescentes. Será observado, também, se a primeira dose da vacina será capaz de evitar a transmissão dos casos na região ou se isso só acontece efetivamente após a aplicação da segunda dose.

Segundo Soranz, o estudo completo dura 12 meses, mas terá etapas com divulgação de resultados ao longo de todo o estudo. Também será divulgado um boletim epidemiológico. O passo seguinte será a segunda testagem nos habitantes da Ilha, para que os pesquisadores possam fazer análises e comparações de taxas da doença. Eles esperam que todos os mais de três mil moradores se voluntariem para participar do estudo.

Uma pesquisa semelhante foi desenvolvida na cidade de Serrana, no interior de São Paulo, que demonstrou efeitos positivos de uma campanha de vacinação em massa. “Após atingir o percentual de 75% da população vacinada, o município, de 45 mil habitantes, apresentou uma redução significativa na identificação de novos casos de covid-19 e óbitos relacionados à doença.

Por que Paquetá?

Paquetá foi escolhida por ter uma única unidade de saúde que pode monitorar os casos que podem acontecer ao longo do estudo. O cadastro da Saúde da Família de Paquetá é antigo e apurado. “Algumas pessoas mudaram recentemente, não usavam a unidade, mas o bairro tem cadastro antigo e bem estável”, disse o secretário.

Apenas a população residente será vacinada na ação, conforme os cadastros da Estratégia Saúde da Família, sendo vetada a participação de turistas que tenham ido passar o domingo na ilha. O controle rigoroso será feito na entrada das Barcas.

A SMS informou que Paquetá tem uma população de 4.180 moradores, entre eles, 3.530 são maiores de 18 anos cadastrados na Estratégia Saúde da Família. Dados da secretaria indicam que até o dia 31 de maio, foram aplicadas 2.923 doses da vacina contra a covid-19 pelo calendário do município para os grupos prioritários, sendo 1.853 primeiras doses (D1) e 1.070 segundas doses (D2).

Localizada em meio à Baía de Guanabara, a cerca de 15km da estação das barcas na Praça XV, no Centro da cidade, Paquetá tem 1.253 residências e 170,57 hectares, segundo dados do Instituto Pereira Passos (IPP), coletados em 2010. O acesso à ilha é feito somente por barcas. A vacinação neste domingo 20 será acompanhada pelo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga; pelo prefeito Eduardo Paes; pelo secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz; e pela presidente da Fiocruz, Nisia Trindade.

Com informações da SMS e fotos da Morena

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