Ela tornou a nova queridinha na cozinha – seja doce, picante ou defumada. Extraída do pimentão, a páprica é rica em vitamina C, um poderoso antioxidante para cicatrização de feridas, formação de colágeno e manutenção da imunidade. Ela também contém vitaminas B6, K1, A, potássio e cobre. Na versão defumada, a páprica pode agir em benefício da nossa saúde, já que esse tempero é rico em antioxidantes carotenóides que previnem o estresse oxidativo.

Mas o que muita gente não sabe é que aquela páprica que se compra no supermercado ou na feira pode causar sérios problemas à saúde. Pesquisas do Instituto Adolfo Lutz revelam a presença de matérias no mínimo estranhas em ervas e especiarias. A páprica, por exemplo, também conhecida no interior como ‘colorau’, que virou um tempero muito popular nos últimos tempos, é a que mais oferece riscos.

A análise específica da páprica revelou que 30% das 43 amostras de 16 marcas distintas continham adulterações, com destaque para a adição frequente de amido de milho. Fragmentos de pelo de roedor e de insetos estavam presentes em 91% e 79% delas, respectivamente.

Em relação à legislação sanitária, 88% foram consideradas insatisfatórias e 77% apresentaram quantidade de matérias estranhas acima do limite tolerado. Os resultados confirmam a importância de os consumidores estarem atentos à qualidade, principalmente nos estabelecimentos que vendem esses produtos à granel, que muitas vezes escapam dos rígidos controles impostos pelos órgãos reguladores à indústria de alimentos.

Maria Marciano, pesquisadora e diretora técnica do Núcleo de Morfologia e Microscopia do Centro de Alimentos do IAL, explica que, embora a ocorrência das matérias estranhas deva ser reduzida ao máximo, algumas são consideradas inevitáveis para determinados alimentos, mesmo com a adoção das melhores práticas disponíveis.

Limites de tolerância para materiais estranhos em alimentos

Considerando esse fato, a Resolução RDC nº 623/22 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estabeleceu limites de tolerância para alguns grupos de alimentos como frutas, produtos de frutas e similares, farinhas, massas, produtos de panificação e outros derivados de cereais, café, chás, especiarias, cacau e derivados, queijos e cogumelos. 

“As matérias estranhas toleradas referem-se a algumas sujidades como fragmentos de insetos indicativos de falhas das boas práticas, fragmentos de pelos de roedor, bárbulas (parte das penas), exceto de pombo e ácaros, em quantidades variáveis de acordo com o produto”, explica. 

Para os itens que não foram contemplados com limites de tolerância, mas que tenham alimentos destas categorias em sua composição, os limites devem ser calculados caso a caso, com base na proporção em que estão presentes.

Para os alimentos em geral, independente da categoria, são tolerados cinco ácaros mortos na alíquota analisada, de acordo com a metodologia analítica preconizada.

A pesquisadora reforça que para a páprica, por exemplo, são tolerados até 80 fragmentos de insetos indicativos de falhas das boas práticas em 25 gramas. Para a canela em pó, 100 fragmentos em 50 gramas e, para o orégano, 20 em 10 gramas. 

Cúrcuma e noz-moscada deixam a desejar

Em outro estudo, o IAL analisou 180 amostras de seis diferentes tipos de especiarias e condimento em pó, sendo 31 de cúrcuma, 25 de gengibre, 29 de noz-moscada, 32 de páprica (doce, picante e picante defumada), 30 de pimenta-do-reino e 33 de colorífico, de marcas distintas com diferentes lotes e prazos de validade.

Os resultados das análises microscópicas revelaram que o amido de milho foi o elemento histológico estranho encontrado com maior frequência entre as amostras analisadas. 

“O colorífico foi o único produto que não apresentou adulterações, porém, a grande variação de concentração de bixina (substância química presente no urucum) sugere a necessidade de uma padronização, ou seja, estabelecer valor do teor de bixina nos coloríficos, pelos órgãos reguladores. O estudo demonstrou a necessidade da intensificação do monitoramento de adulterações em especiarias para que a comercialização de alimentos confiáveis seja garantida”, sugere Maria Marciano.

Falta inspeção nas ervas comercializadas

No Brasil existem dois órgãos que fiscalizam a produção de alimentos, sendo eles a Anvisa e o Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). O nível de exigência de cada regulamento irá depender da categoria do alimento e, no caso de especiarias e ervas culinárias, a Anvisa atualmente é a responsável pela regulamentação e fiscalização.

Além dos órgãos regulamentadores, há certificações de empresas que atestam a qualidade. A FSSC 22000, por exemplo, contém requisitos de diversas áreas, como gerenciamento de alérgenos, programas de monitoramento ambiental, controle de qualidade, defesa e segurança alimentar, cultura de qualidade e fraude alimentar, garantindo assim uma robustez maior na gestão de segurança dos alimentos.

O diretor de Assuntos Regulatórios e Científicos da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia), Alexandre Novachi, reforça, entretanto, que nem todas as empresas seguem essas normas, por isso é preciso que o consumidor esteja atento ao comprar ervas e especiarias, procurando fabricantes idôneos e que obedeçam aos rígidos padrões de qualidade.

Mas essas normas não deveriam ser respeitadas por todos? Novachi esclarece: “A FSSC 22000 é um modelo de certificação semelhante à ISO. Não é mandatória, trata-se de uma certificação de qualidade que dá ainda mais segurança para os consumidores que adquirem produtos de empresas que são certificadas”.

Práticas milenares na produção de ervas

A produção de ervas e especiarias se baseia em práticas milenares e os controles vão desde o plantio até a embalagem final, que garantem a segurança e a qualidade desses alimentos.

“Boas práticas agrícolas devem estar associadas a controles das cadeias de abastecimento, boas práticas de fabricação, processos de tratamento validados – que envolvem etapas de limpeza, classificação, corte, moagem e quebra -, e processos de redução microbiológica que garantem a inocuidade”, complementa o porta-voz da ABIA. 

Ele ratifica que as fraudes ocorrem com maior frequência no mercado informal ou em comércios à granel. “É preciso maior fiscalização e maior conhecimento por parte da população. Empresas sérias são comprometidas com a segurança do alimento e do consumidor e comercializam produtos 100% puros. Elas conseguem garantir a pureza do produto fornecido a partir da gestão eficiente de qualidade e compra de ingredientes de origem confiável. Outro ponto crítico é que o mercado informal não sofre qualquer tipo de inspeção”.

Como evitar? desconfie do preço

Sobre a grande quantidade de amostras com amido de milho, Novachi lembra que, por se tratar de uma matéria-prima barata e considerada inerte, ou seja, que não agrega cor ou sabor quando adicionada, acaba sendo utilizada com o objetivo de aumentar o volume, principalmente em ervas e especiarias em pó. Geralmente, adulterações com milho e amido de milho são consideradas intencionais, pois o grão não está envolvido no processamento da maioria das especiarias. 

“A cadeia de suprimentos de ervas e especiarias é extensa, complexa e globalizada, e é exatamente essa complexidade da cadeia, associada a questões de demanda, que acabam criando oportunidades para a adulteração, muitas vezes por motivos econômicos”.

Novachi alerta para o fato de que, além dos programas oficiais de combate à fraude de alimentos implementados nos estados e a fiscalização de órgãos regulamentadores, os consumidores também devem ser protagonistas nas suas escolhas e adquirir produtos de marcas e empresas confiáveis.

“Quando o preço está muito baixo pode-se desconfiar que a especiaria tenha sido adulterada, pois normalmente o produto 100% puro é mais caro, devido a todo o controle que deve ser feito ao longo da cadeia de produção”, finaliza.

Fonte: Abia

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