Dias antes de se casar consigo mesma, após a desistência do noivo na véspera da cerimônia, a influenciadora digital Alinne Araújo, de 24 anos, já sinalizava, mais uma vez, que pensava em se matar. Era o dia de experimentar o sonhado vestido de noiva. E ela estava sozinha. Ali, a autoestima foi no pé. Mais uma vez ela recorreu aos medicamentos tarja preta. Exagerou. Socorrida a tempo, passou por uma lavagem estomacal. Sobreviveu.

No vídeo postado semanas antes do seu ‘autocasamento’, ela conta em detalhes o que sentiu naquele dia. E recomendava às pessoas exercitar a escuta ativa, uma ferramenta muito empregada nos consultórios de psicólogos para ajudar quem procura apoio para curar suas dores emocionais, muitas vezes inexplicáveis. “Escutem. Prestem atenção nos sinais que as pessoas dão”, conclamava.

Por várias vezes, ela já havia usado as redes sociais para falar sobre como enfrentava a depressão e a ansiedade. Acreditava que sua exposição acabava ajudando milhares de outras pessoas que também sofriam com as mesmas doenças. No sábado (13), ela tentou mais uma vez se matar. Atirou-se na frente de um carro após receber a mensagem do noivo de que não se casaria mais. Escapou mais uma vez. Horas depois, anunciou no Instagram a decisão de manter a festa, celebrando a vida.

Vocês sabem a dor de confiar em alguém cegamente e achar que encontrou o companheiro da vida e, um dia antes da celebração do amor de vocês, a pessoa some. Manda uma mensagem pelo WhatsApp e termina todos os sonhos de vocês. Fui pega de surpresa, quis morrer. Ele sempre soube da minha condição e não se importou em como eu estaria. Eu recebi a notícia [quando] estava dirigindo, tive uma crise no volante. Poderia ficar aqui chorando, mas tem uma festa linda me esperando, então hoje caso comigo mesmo em nome da minha vida nova. Me desejem sorte. Amo vocês”, escreveu em um post.

Até tomar esta decisão, Alinne tinha 26 mil seguidores. Após viralizar nas redes sociais, seu perfil ‘Sejje Sincera’ atingiu mais de 400 mil usuários. Mas não eram mais aqueles que se identificavam com seu drama. Ou pessoas que se inspiravam nela para enfrentar seus próprios dramas. Eram haters que a julgavam, dizendo que estava querendo aparecer para alcançar mais audiência. “Diziam que ela não tinha depressão, que só queria chamar atenção. As pessoas só acreditam que a pessoa tem depressão quando ela se mata”, ressaltou a tia, Saionara.

Diante dos impiedosos comentários nas redes sociais, mesmo após a corajosa decisão de se casar sozinha, ato máximo de amor próprio, ela sucumbiu. Atirou-se do nono andar. Tentaram mais uma vez salvá-la. Não foi possível. Alinne morreu na manhã de segunda-feira (15), quando estaria em plena lua de mel com Orlando.

No dia seguinte à morte, o ex-noivo quebrou o silêncio com uma publicação no Instagram e disse estar “acabado”. “Era uma rotina de sofrimento mútuo. Uma tortura psicológica para quem vivia aquilo ali”, contou ele dias depois ao ‘Domingo Espetacular’, da TV Record (veja a matéria aqui).

Estudante de Psicologia e de Teatro, Alinne foi diagnosticada com depressão e transtorno de ansiedade ainda na adolescência. A tia, Saionara Araújo, contou que aos 13, 14 anos, Alinne já falava de tirar a própria vida. Tomava remédios e por várias vezes foi levada ao hospital para fazer lavagem estomacal. “A gente mostrava que a vida tinha coisas boas. Mas ela não conseguia enxergar”, conta.

Quanto mais exposição nas redes, mais risco de depressão

Com crescimento acelerado da tecnologia, é constante a exposição das pessoas nas redes sociais, forçando na maioria das vezes, a construção de uma vida perfeita “imaginária”, ditada pela sociedade. Quanto maior o destaque, maior a pressão e a cobrança dos outros e de si próprio, fazendo com que percam suas características reais.

Toda exposição e vulnerabilidade, faz com que muitos até sofram agressão psicológica, difamação e insultos. Segundo a psicóloga Célia Siqueira, em alguns casos graves de bullying virtual, a vítima pode desencadear baixa estima, culpa profunda, sentimento de desamor, depressão severa, entre outras complicações que podem levar ao suicídio.

Pessoas que cometem suicídio, encontram na morte uma forma de se punir ou acabar com algum tipo de sofrimento, que na sua mente não tem solução. Num dia ser famoso na internet e no outro não tanto, somando ao ambiente de muito estresse, exigências, obrigações e até humilhação, pode gerar uma energia depressiva avassaladora, a ponto de tirar a própria vida”, diz Célia.

Segundo a psicóloga, os familiares de quem sofre de depressão, devem monitorar, acompanhar e ficar em alerta com sinais de suicídio como a tristeza excessiva, isolamento, raiva, irritabilidade, perda de interesse, ou seja, qualquer mudança brusca de comportamento.

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Instagram oferece suporte a quem pesquisa por ansiedade e depressão

Segundo uma pesquisa da Sociedade Real para Saúde Pública, da Grã-Bretanha, o Instagram é considerado a rede social mais nociva para a saúde mental, principalmente para adolescentes e jovens. Para tentar mudar esta realidade, a rede social resolveu inovar.

Ansiedade ou Depressão – ao digitar uma das duas palavras, abre um aviso na plataforma: “Publicações com as palavras ou tags que você está procurando muitas vezes incentivam um comportamento que pode fazer mal a uma pessoa e até levá-la à morte. Se você está passando por uma situação difícil, gostaríamos de ajudar”.

Ao clicar em “obter apoio”, o usuário é levado a uma página no navegador do smartphone que traz três alternativas: 1 – Falar com um amigo; 2 – Falar com um voluntário da linha de apoio (Centro de Valorização da Vida – CVV) ou 3 – Receber dicas sobre saúde mental. Em qualquer uma das formas escolhidas, o usuário receberá apoio em momentos delicados, como crises de ansiedade.

Para entrar em contato com o Centro de Valorização da Vida, basta ligar 188 de qualquer telefone. O centro possui voluntários de prontidão 24 horas por dia e a ligação é gratuita. A organização atua no apoio emocional e na prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo, por telefone, e-mail, chat e Skype 24 horas todos os dias.

Como responsabilizar quem ataca e ofende nas redes sociais

Diferente do que muitas pessoas pensam, a internet não é um ambiente sem regulação. A morte da blogueira, que foi alvo de xingamentos nas redes sociais e de acusações de que estaria tentando se promover com a situação, serve de alerta para as pessoas entenderem que não podem manifestar a sua opinião na internet inconsequentemente.

O advogado Alceu Machado Neto, do escritório AMSBC Advogados Associados, explica que a Constituição Federal assegura a livre manifestação de pensamento e expressão, a qual deve ser exercida de forma a não violar a imagem e honra do outro. “A internet não é um ambiente sem regulação, no qual as pessoas podem inconsequentemente manifestar a sua opinião” ,destaca Neto é mestrando em Direito dos Negócios pela FGV-SP,

“As pessoas têm o direito de se manifestar de forma livre nas redes sociais, desde que não violem a imagem e a honra de outrem. Na hipótese de extrapolarem esse direito, o ofendido poderá exigir indenização pelos danos causados a sua imagem e honra, além de exigir a retratação e indenização pelos eventuais danos materiais causados pela ofensa”, ressalta o especialista.

 

 

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