Maior consumidor de agrotóxicos do mundo, o Brasil registra uma média de 15 pessoas intoxicadas por dia por estes produtos, sendo que esse número pode ser ainda maior, conforme estima o próprio Ministério da Saúde, ao admitir que o número de subnotificações é elevado. Entre os anos 2010 e 2019, 56.870 pessoas foram envenenadas por agrotóxicos, sendo 9.806 registros de crianças entre 0 e 14 anos, ocasionando em 91 mortes.

Estimativas relacionadas aos impactos da intoxicação por agrotóxicos, com base em dados oficiais coletados entre 2007 e 2014, estimam possível ocorrência de 59,3 mil mortes em um total de 1,25 milhão de pessoas contaminadas. Os dados são do recém-lançado ‘Atlas dos Agrotóxicos’, divulgado pela Fundação Heinrich Böll – uma organização política alemã, presente em mais de 35 países.

O estudo revela ainda que esses produtos são associados ao risco aumentado para câncer de fígado e de mama, diabetes tipo 2, asma, obesidade, distúrbios endócrinos, entre outras doenças, além de maior risco de aborto e má formação fetal. Muitas das pessoas afetadas por envenenamento pelos agrotóxicos sofrem de efeitos a longo prazo: há evidências sobre a relação entre exposição a agrotóxicos e taxa elevada de doenças crônicas, como Parkinson ou leucemia infantil.

No curto prazo, a exposição aguda a esses insumos está ligada a uma série de sintomas debilitantes, como fadiga extrema, apatia, dores de cabeça intensas e dor nos membros. Em situações críticas, há o risco de falha de órgãos vitais, incluindo coração, pulmões e rins.

O Atlas mostra que o Sistema Único de Saúde (SUS) pode gastar até 150 reais por caso de intoxicação por agrotóxicos, totalizando um custo estimado anual de R$ 45 milhões. Estudos compilados na publicação, mostram um mau negócio a partir do uso excessivo desses defensivos agrícolas. O custo para o SUS pode chegar a US$ 1,28 para cada US$ 1 investido em pesticidas, a depender do tratamento. Já as perdas em serviços ecossistêmicos alcançam dimensão totalmente desconhecida,

Impactos são maiores para a saúde das mulheres e das crianças

Os dados levantados pelo “Atlas dos Agrotóxicos” mostram ainda que há um recorte de gênero com relação à saúde, revelando um quadro grave de impacto sobre a saúde das mulheres e também à infância.

Isso porque a ameaça à vida das crianças começa antes mesmo que elas nasçam. Há registros de casos de abortos em função da exposição aos agrotóxicos, partos prematuros, bebês gerados com malformação fetal e/ou que apresentam puberdade precoce nos primeiros anos de vida.

Este impacto se dá, também, na saúde de  crianças e adolescentes. Cerca de 15% de todas as vítimas de intoxicação por agrotóxicos no Brasil pertencem a esse grupo etário. Já entre os bebês, foram 542 intoxicados no período de 2010 a 2019.

As gestantes também sofreram com esse cenário: 293 delas foram intoxicadas no mesmo período. Com efeitos que se estendem além do próprio corpo, a situação pode afetar  a saúde de seus bebês por meio do leite materno e até mesmo antes do nascimento.

Os riscos com a aprovação do PL do Veneno

Com a recente aprovação pelo Senado Federal do chamado Pacote do Veneno, que flexibiliza o registro de novos agrotóxicos no Brasil, a expectativa é de que o número de novos registros de agrotóxicos cresça ainda mais, uma vez que o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) passa a ser o único órgão registrante desses produtos.

Com isso, restaria a órgãos como Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) um papel subordinado na avaliação ou homologação das avaliações.

Outra alteração prevista pelo Projeto de Lei 1459/2022 – o chamado PL do Veneno – é a criação do “risco aceitável” para substâncias que atualmente tem registro proibido por terem impactos relacionados ao desenvolvimento de câncer, alterações hormonais, problemas reprodutivos ou danos genéticos.

No dia 28 de dezembro, o Diário Oficial da União publicou o texto do Projeto de Lei 1.459, sancionado com vetos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Um dos vetos derruba a exclusividade do Mapa para coordenação das reanálises dos riscos dos pesticidas. Com o veto, Anvisa e Ibama permanecem responsáveis, junto ao Mapa, sobre esses pedidos técnicos de reanálises.

Embora concorde que o processo de registros atual seja lento, Alan Tygel, da Campanha Contra os Agrotóxicos, acredita que o ideal, na verdade, seria haver mais participação do Ibama, Anvisa e Ministério da Agricultura para análises, em vez de flexibilização da lei.

Recordes na liberação de agrotóxicos no Brasil

A publicação “Atlas dos Agrotóxicos”, produzida pela Fundação Heinrich Böll, revela ainda que. desde 2016, o Brasil tem batido consecutivos recordes na série histórica de registro de agrotóxicos, que teve início em 2000. Em 2022, foram 652 agrotóxicos liberados, sendo 43 princípios ativos inéditos.

Das 2,6 milhões de toneladas de agrotóxicos utilizadas ao ano no mundo, o Brasil emerge como um dos maiores consumidores desse mercado que movimentou quase 28 bilhões de euros, cerca de 101 bilhões de reais, apenas em 2020, de acordo com o Atlas dos Agrotóxicos.

O estudo, coordenado pela Fundação Heinrich Böll Brasil, mostra que em 2021, o país se tornou o maior importador mundial dessas substâncias, com um salto de 384.501 toneladas em 2010 para 720.870 toneladas em 2021, portanto, um aumento de 87%.

Agrotóxicos no mundo

A exposição a esse risco não se restringe ao Brasil. Atualmente, estima-se que ocorram cerca de 385 milhões de casos de intoxicações agudas por agrotóxicos a cada ano em todo o mundo; em 1990, de acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS),  o número total de intoxicações era de 25 milhões.

A escalada desses números ao longo dos anos pode ser atribuída  ao uso intensificado de agrotóxicos em escala global. Aproximadamente 11 mil pessoas morrem anualmente em todo o mundo devido a envenenamentos não intencionais por agrotóxicos.

Desde 1990, a quantidade mundial de agrotóxicos utilizados aumentou em quase 62%, com crescimento  expressivos em regiões específicas: 484% na América do Sul e 97% na Ásia. Essa aceleração  no uso de agrotóxicos é particularmente preocupante em regiões do Sul Global, onde as regulamentações ambientais, de saúde e segurança são muitas vezes mais fracas.

Confira alguns números da pesquisa

  • – Entre 2010 e 2019, quase 57 mil pessoas foram intoxicadas com agrotóxicos no País, uma média de 15 pessoas por dia.
    – No mesmo período, foram 9.806 registros de intoxicação de crianças de 0 a 14 anos, sendo 91 mortes.
    – O impacto do atendimento para esses casos de intoxicação gera um custo de R$45 milhões para o SUS.
    – Cada US$ 1 gasto na compra de agrotóxico pode onerar o SUS em US$1,28.
    – O estudo revela ainda um recorte de gênero com relação à saúde, mostrando um quadro grave de impacto sobre a saúde das mulheres e também à infância.
    – Os agrotóxicos têm sido associados a um risco aumentado de câncer de fígado e de mama, diabetes tipo 2, asma, alergia, obesidade, entre outros distúrbios endócrinos.
    – Há evidências sobre a relação entre exposição a agrotóxicos e taxa elevada de doenças crônicas, como Parkinson ou leucemia infantil.
    – Aproximadamente 11 mil pessoas morrem anualmente em todo o mundo devido a envenenamentos não intencionais por agrotóxicos.
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Com Assessorias

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