‘Meu pai teve sepse no hospital, mas foi o erro médico que o matou’

Aos 51 anos, Seu Zezinho foi internado para retirar um rim. Fez mais cinco cirurgias e não resistiu à infecção generalizada

Meu pai, José Jesus de Macedo, o Seu Zezinho, foi vítima da sepse. Não fosse o erro médico, talvez tivesse sobrevivido (Foto: Arquivo de família)
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Meu pai, José Jesus de Macedo, o Seu Zezinho, foi vítima da sepse. Não fosse o erro médico, talvez tivesse sobrevivido (Foto: Arquivo de família)
Meu pai, José Jesus de Macedo, o Seu Zezinho, foi vítima da sepse. Não fosse o erro médico, talvez tivesse sobrevivido (Foto: Álbum de família)

Há mais de 22 anos, em 18 de março de 1995, o cara forte e alegre aí da foto nos deixava, vítima de um choque séptico. A terrível saga que levou meu pai à morte com apenas 51 anos começou no dia 7 de dezembro de 1994, quando foi submetido a uma cirurgia para retirar pedras nos rins, na Clínica São Camilo de Lélis, em Itaperuna, no Noroeste Fluminense. José Jesus de Macedo, o Seu Zezinho, pegou uma infecção hospitalar e, mesmo com sintomas aparentes até para um leigo, recebeu alta e foi despachado para casa.

Levado de volta ao consultório do médico que o operou, o mesmo disse que a falta de apetite, que explicaria o emagrecimento súbito do meu pai (em duas semanas ele perdeu 20 quilos) era “só manha” e que era para dar comida a ele. Dias depois,  já fazendo confusão mental, ele foi internado no Hospital São José do Avaí, também na nossa cidade. A infecção hospitalar, agravada pelo evidente erro médico, evoluiu para um quadro de infecção generalizada, também conhecida como sepse.

Do dia em que operou  o rim até nos deixar, foram exatamente 100 dias de uma batalha que parecia não ter fim, em meio a pelo menos outras cinco novas cirurgias: uma para retirar o rim contaminado, outras duas para tratar uma hemorragia interna, decorrente do agravamento do quadro, e duas para colocação do catéter com o qual receberia hemodiálise (as veias dele já não suportavam o procedimento).

Lembro que abandonei meu emprego no jornal O Dia, sucursal de Macaé, para acompanhar meu pai no hospital em Itaperuna, já que minha mãe, em forte crise de depressão, e minha irmã, menor de idade, não tinham condições de acompanhar o passo a passo do seu tratamento, enquanto seu filho mais velho tomava conta do comércio da família.

É preciso ressaltar que o Hospital São José do Avaí, um dos mais modernos centros de excelência em saúde do interior do Estado do Rio de Janeiro, proporcionou ao meu pai o melhor e mais digno tratamento possível. Graças, sobretudo, a minha tia Lili, que era uma enfermeira muito querida lá, e também a um médico amigo, que havia estudado com meu irmão no primário. Ao contrário da Clínica São Camilo de Lélis, que o havia despachado para casa sem observar a estranha infecção que minava dos pontos da cirurgia do rim, no hospital toda a assistência e recursos foram devidamente dispensados para a sua recuperação.

Eu passava os dias inteiros lá, me revezando com o ‘Tio Vovô” e minhas tias, que ficavam com ele durante a noite, e pude acompanhar o tratamento absolutamente responsável e profissional que lhe foi dedicado. Cheguei também a doar meu sangue e comprar albumina humana para que ele conseguisse sobreviver, um recurso de custo elevadíssimo na época. Mas infelizmente não foi possível. Meu pai já chegou lá tarde demais, quando todos os seus órgãos já estavam comprometidos.

Mesmo assim, para o que foi considerado um milagre pelos médicos que o assistiram, ele voltou para o quarto e chegou a andar, amparado por mim, nos corredores do hospital. Mas a danada da infecção estava lá, em todos os seus exames, e por isso ele não poderia receber alta. Aquela era a chamada ‘melhora da morte’. Dias depois, meu pai voltava para a UTI intermediária, onde faleceu. Não havia mais nada a fazer.

Se movi uma ação contra o médico que negligenciou seu caso? Não. Eu era muito jovem, morava e trabalhava em outra cidade e fui desestimulada pela minha família na época a tocar isso em frente. “Um processo não vai resolver, não vai trazer o seu pai de volta”, me diziam. Hoje tenho certeza que errei: aquele médico não poderia ter continuado a clinicar. E submeter outros pacientes ao risco de morte pela absoluta incapacidade de identificar o que parecia óbvio: um quadro agudo de sepse.

Mas tristeza e indignação à parte, relembro o caso do meu pai para ilustrar esse post sobre o Dia Mundial do Sepse (13 de setembro), doença que tem no Brasil uma das mais altas taxas de mortalidades no mundo. A alta taxa de mortalidade e morbidade por sepse em nosso país é devido a uma série de fatores. Acredita-se que o pouco conhecimento da população sobre a doença e a dificuldade dos profissionais de saúde em diagnosticar rapidamente a síndrome sejam razões importantes que devem ser trabalhadas.

Mas ninguém fala sobre os erros médicos cometidos em hospitais, da negligência cometida em muitos casos e tampouco dos alarmantes índices de infecção hospitalar, que favorecem os quadros de sepse, ceifando vidas inocentes, sem que ninguém seja punido. E é sobre isso que esperamos ouvir especialistas a respeito também aqui no Vida & Ação.

  • Se você, alguém da sua família ou um amigo foi vítima de erro médico ou qualquer procedimento médico-hospitalar suspeito, envie um relato para a seção ‘Eu Vivo’, pelo email blogvidaeacao@gmail.com e contato@vidaeacao.com.br. Também queremos ouvir o Cremerj e outras instituições que deveriam zelar por vidas humanas, antes de proteger somente interesses corporativos.
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