Cientistas mapeiam ‘pegada’ de micro-organismos deixada durante os Jogos

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Pesquisa realiza coletas semanais em nove estações do metrô (Foto: Divulgação)
Pesquisa realiza coletas semanais em nove estações do metrô (Foto: Divulgação)

Mais de 1,17 milhão de pessoas visitaram o Rio de Janeiro durante os Jogos Olímpicos. Muitos já foram embora. E deixaram para trás suas marcas, um rastro infinito de micro-organismos nos espaços públicos da cidade que podem ser inofensivos, protetores ou  até mesmo favorecer o surgimento de doenças. Essa gama enorme de bactérias, fungos, vírus e outros micro-organismos está sendo mapeada em estações de metrô por  especialistas em genômica, análise de dados, engenharia, epidemiologia e saúde pública.

Chamado de Olimpioma, o projeto começou antes dos Jogos Olímpicos e vai se estender até depois das Paralímpicos.  É o primeiro evento mundial no qual a migração destes seres microscópicos é estudada. Mais de 1 mil amostras estão sendo  coletadas dentro das composições e em nove estações com grande fluxo de passageiros: Vicente de Carvalho, Del Castilho, Maracanã, Central, Carioca, Saens Peña, Botafogo, Cardeal Arcoverde e General Osório para analisar a transformação provocada pelo megaevento no microbioma carioca.

Para investigar a diversidade de micro-organismos no ambiente, os pesquisadores utilizam uma haste flexível, espécie de cotonete especial com fibras sintéticas chamada de swab, para coletar amostras de superfícies como bancos, corrimões, catracas, balcões e terminais de autoatendimento. As amostras coletadas são transportadas para análise em laboratório, onde é feita a extração de DNA e o sequenciamento genético (leitura do DNA), que permite identificar todos os micro-organismos e seres vivos cujos traços podem ser identificados, incluindo insetos e restos alimentares e plantas.

Milton Ozório Moraes, chefe do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), coordenador do projeto no Rio, explica que trilhões de micro-organismos habitam o corpo de qualquer indivíduo saudável, desempenhando funções relevantes para a saúde. E estudar essa diversidade é fundamental. “Uma vez que as Olimpíadas trazem visitantes de todas as regiões do planeta para o Rio e grande parte deles passa pelas estações de metrô, poderemos verificar o impacto desse fluxo de pessoas sobre a diversidade de micro-organismos que normalmente existe nesses locais”, afirma.

Com ajuda de uma espécie de cotonete, o swab, vestígios deixados no metrô são mapeados (Foto: Divulgação)
Com ajuda de uma espécie de cotonete, o swab, vestígios deixados no metrô são mapeados (Foto: Divulgação)

Aplicação em estudos para o câncer

A iniciativa é resultado do Consórcio Internacional Metagenômica e Metadesenho do Metrô e Biomas Urbanos, conhecido como MetaSUB, com participação de pesquisadores do A.C.Camargo Cancer Center, fundado em 1953 e referência internacional em oncologia, atuando na prevenção, tratamento, ensino e pesquisa do câncer e oferece serviços de assistência oncológica para a Saúde Suplementar e para o Sistema Único de Saúde (SUS).

Líder do MetaSUB em São Paulo e coordenador adjunto do projeto Olimpioma, o pesquisador Emmanuel Dias-Neto, afirma que a ideia é analisar de que forma os micro-organismos são transportados com as pessoas, como eles podem permanecer na cidade sede e suas consequências na saúde pública local, ajudando em ações que venham a prevenir a dispersão de doenças.

O biólogo Emmanuel Dias-Neto explica que o microbioma é uma nova área de pesquisa que tem diversas implicações em medicina e saúde. Em câncer, tem sido demonstrado que os micro-organismos ajudam a modular inflamações e o sistema imunológico, o que pode ajudar na resposta terapêutica “Acreditamos que teremos importantes respostas sobre o papel da diversidade do microbioma no processo de carcinogênese, ampliando assim as perspectivas para o uso de bactérias benéficas (probióticos) e para o desenvolvimento de terapias personalizadas, além de nortear possíveis estratégias de prevenção e vigilância de saúde para a população”, afirma.

Em junho, os pesquisadores do MetaSUB realizaram o primeiro dia de amostragem global de DNA, com coleta de amostras em 56 cidades de 33 países nos seis continentes, incluindo as cidades de São Paulo e Ribeirão Preto.. O objetivo é que a avaliação do Olimpioma seja realizada novamente nos Jogos de Tóquio, em 2020. O trabalho no Rio termina em novembro e os primeiros resultados da análise das amostras da Rio 2016 serão divulgados em 2017.

A pesquisa ainda deve ajudar a compreensão mecanismos que tornam determinados genes e patógenos resistentes aos antibióticos, abrindo caminho para o desenvolvimento de novos medicamentos mais eficazes contra estes agentes, além de poder antecipar possíveis epidemias, norteando a adoção de medidas preventivas, uso mais racional dos espaços públicos e preservação da saúde na presença de reservatórios microbiais. O estudo também pode levar a alterações nos materiais usados na construção de espaços públicos que sejam menos favoráveis à colonização por certos micro-organismos.

Microorganismos podem produzir novos antibióticos

O consórcio internacional MetaSUB surgiu a partir da pesquisa de Christopher Mason, professor associado de fisiologia, biofísica e genômica computacional no Instituto de Biomedicina Computacional, do Weill Cornell Medicine, nos Estados Unidos, líder da iniciativa. Em 2013, ele e sua equipe mapearam o microbioma do metrô de Nova York.

Em 2015, um estudo  publicado na revista Cell Systems –http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/26594662 – apontou que quase metade (48,3%) das bactérias e outros organismos coletados no sistema de metrô, parques e outras áreas públicas da área metropolitana de Nova York era desconhecida. Esse dado sinalizou que a análise do microbioma em ambientes urbanos é uma área vasta a ser explorada.

A pesquisa, liderada por Christopher Mason, teve o objetivo de analisar o DNA presente em uma região urbana com um trânsito diário de mais de 5 milhões de pessoas. As amostras foram recolhidas ao longo de 17 meses. Segundo os autores, foram encontradas centenas de bactérias, a maioria delas inofensivas para o ser humano, mas algumas sendo associadas com problemas digestivos, infecções por estafilococo e meningite.

Segundo o pesquisador, os sistemas de transporte de massa nas cidades são os maiores locais de troca de DNA e RNA entre as pessoas no mundo, refletindo o microbioma de bilhões de indivíduos. “Estudamos estes sistemas para construir um mapa do microbioma, o que pode levar à descoberta de novas espécies e novos métodos de análise forense de DNA”, explica.

“O estudo também busca acompanhar os marcadores genéticos de resistência aos antimicrobianos e pesquisar novos genes de biossíntese em micro-organismos desconhecidos, que podem ser capazes de produzir antibióticos”, diz Mason, que também atua como WorldQuant Research Foundation Scholar, no Weill Cornell Medicine.

Fontes: Fiocruz e A.C. Camargo Cancer Center

 

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